Contabilista – O número de turistas que nos visitam continua a subir de ano para ano. Quais são as perspetivas para o presente ano turístico?
Bernardo Trindade – Felizmente para o setor os registos, ano após ano, têm sido superados. Significa por isso que a relação de confiança entre quem nos visita e o produto que preparamos tem sido bem conseguido e bem construído. Mérito para todos os que compõem a enorme família do setor. O sentimento dos nossos associados é de que 2025 será moderadamente positivo. O primeiro trimestre esteve muito alinhado com o ano transato. Abril, coincidindo com a Páscoa, foi ligeiramente melhor e estima-se que o verão seja um pouco melhor que o período estival de 2024. Em síntese, se 2025 não for melhor, será muito equiparado com o ano anterior que foi só o melhor de sempre.
O fator sazonalidade está a mostrar uma tendência de redução?
Esse é um tema que varia de região para região, mas há uma tendência de que o efeito da sazonalidade no país, de uma forma geral, se ter esbatido. Na Madeira, praticamente, não existe. O Algarve tem uma sazonalidade que se inicia em novembro e termina, por norma, em março. Nos centros urbanos, como Lisboa e Porto, a sazonalidade sente-se, particularmente, em dezembro, janeiro e fevereiro.
Para além da saturação em período de pico, têm-se verificado constrangimentos nos controlos de fronteiras nos aeroportos de Lisboa e Faro, especialmente nas chegadas de voos de fora do espaço europeu/Schengen. Situações desta natureza podem ser um desagradável cartão de visita associado à marca Portugal?
A dificuldade nas entradas por via aérea em Portugal é o principal desafio para este verão, em particular nos aeroportos de Lisboa e Faro. O Aeroporto Humberto Delgado está profundamente constrangido com severos condicionamentos nos mecanismos de entrada de passageiros – O número de boxes disponíveis não chega, a que acresce o facto de os sistemas automáticos de acesso, nomeadamente o «RAPID», que valida os passaportes eletrónicos, disporem, neste momento, de um software que não é compatível e nos aeroportos de Porto e Faro encontram-se mesmo inoperacionais. Para conseguir escoar todas as pessoas que demandam Portugal em busca de uns dias de lazer, precisamos de dotar estas infraestruturas aeroportuárias de meios técnicos e humanos para que esta primeira experiência no nosso país não seja traumatizante. Seria desencorajador, quando ao mesmo tempo o setor turístico tudo faz para tornar o mais atrativa possível esta experiência.
A AHP é a maior associação patronal da indústria hoteleira do país, contando com mais de 950 associados. Disse na tomada de posse para mais um mandato na associação que «ainda existe muita desinformação e muito ataque vil ao nosso setor do turismo». Quer concretizar?
Os números são o que são e demonstram uma realidade e um efeito inexorável. O efeito turístico é, para além disso, democrático, visto que é sentido em todo o país. O setor turístico é a atividade económica mais importante e que mais entrega ao país - 28 mil milhões de euros de receita. Temos cerca de meio milhão de pessoas a trabalhar no setor. O que está em causa é que nomeadamente os residentes têm, de alguma maneira, de sentir os efeitos positivos da atividade turística. Isto implica por parte de todos os agentes do setor um trabalho permanente de aproximação. Na minha opinião, os equipamentos que existem nas nossas cidades (higiene urbana, monumentos, etc.) e que são financiados pela taxa turística coletada por mais de 60 municípios portugueses, devem ter um selo a informar que o investimento nesta infraestrutura foi financiado pelos turistas que nos visitam. Seria uma forma de diminuir o fosso entre turistas e residentes.
Enquanto isso não for feito corremos o risco, como diz, de banalizar a aplicação de taxas turísticas?
Deve haver um compromisso nacional para que exista clareza na mensagem que é transmitida. Nós, hoteleiros, que cobramos a taxa turística, estamos disponíveis para trabalhar com os municípios neste esforço de divulgação. Só passando uma mensagem clara será possível esbater alguma animosidade que possa haver com o turismo. São os hoteleiros que cobram e entregam o produto da taxa aos municípios, sendo que estes fazem a gestão dos montantes arrecadados. Acredito que, num exercício de humildade, devia ser constituído um fundo de desenvolvimento turístico com a participação das autarquias, dos hoteleiros e dos restaurantes. E que daí surgisse um bom debate e uma melhor decisão e aplicação das taxas. Infelizmente, este objetivo só foi conseguido em Lisboa. Mas tudo faremos para que se alargue ao restante país.
O que é que pode fazer o Estado para disponibilizar instrumentos financeiros mais adequados às necessidades do setor?
A autoridade turística nacional – o Turismo de Portugal – é dotada de verbas próprias, mas que devem ser articuladas com fundos provenientes das autarquias como a taxa turística para que, em conjunto, possamos ter, de facto, uma oferta de qualidade que se sinta em todo o país. Considero que o essencial é que se verifique a aplicação harmoniosa destas verbas para o desenvolvimento do setor turístico.
Falou há pouco da necessidade de reduzir o fosso entre residentes e turistas. Não teme que, se nada for feito, tenhamos nas grandes cidades portuguesas, à semelhança do que já aconteceu em destinos mais saturados, manifestações e protestos contestando o que dizem ser a massificação turística?
É precisamente esse potencial cenário que queremos esbater, através de uma mensagem clara e transparente sobre os reais benefícios do setor para a vida em sociedade. Nomeadamente, como atrás referi, nas receitas arrecadadas pela taxa turística e as suas implicações no dia a dia as pessoas. A questão da higiene urbana, por ser tão sensível, seria um bom exemplo de como determinado equipamento, financiado pela taxa turística, está agora ao serviço das populações, numa qualquer freguesia das nossas cidades.