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Ativos intangíveis – Direito de superfície
26 January 2018
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem
PT19838 - Ativos intangíveis – Direito de superfície
01-11-2017

Determinada empresa está a aplicar a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para as Pequenas Entidades (NCRF-PE).
A empresa efetuou uma escritura de constituição do direito de superfície de um terreno pelo valor de cinco mil euros. O direito de superfície destina-se à construção de um edifício, por conta da sociedade, de instalações que visam a prossecução da sua atividade comercial. A empresa tem como atividade a manutenção e reparação automóvel. Enquanto não existem projetos aprovados e não é iniciada a construção, a empresa usa o terreno para o estacionamento das viaturas dos clientes que aguardam reparação, assim como daquelas prontas a serem entregues aos clientes.
O direito de superfície é constituído pelo prazo de vinte anos, contados a partir da data da escritura, renovável por períodos de vinte anos, até que qualquer das partes o denuncie.
O direito de superfície foi registado na contabilidade como um ativo intangível, ao custo de aquisição, pelo valor da escritura acrescido dos encargos diretamente relacionados com a aquisição, registos, Imposto do Selo e Imposto Municipal sobre as Transmissões onerosas de imóveis.
Pretende-se a confirmação da contabilização efetuada.
Qual o número de anos a amortizar o ativo?
Qual o número de anos de amortização fiscalmente dedutíveis?

Parecer técnico

A questão colocada refere-se à celebração de um contrato de aquisição do direito de superfície, com o objetivo de efetuar a construção de um edifício destinado a exercer a atividade da empresa.
Esse contrato de cedência do direito de superfície terá a duração de 20 anos, com o pagamento da respetiva contraprestação pela realização do contrato num valor acordado. O contrato é renovável automaticamente por períodos de 20 anos, até que qualquer das partes o denuncie.
Em termos legais, este tipo de contratos está regulado pelos artigos 1524.º a 1542.º do Código Civil (CC).
Conceptualmente, o direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações.
No momento da extinção do contrato pelo decurso do prazo, o proprietário do terreno tem o direito de adquirir as obras, mediante o pagamento de uma indemnização ao superficiário, exceto convenção em contrário entre as partes, conforme previsto no artigo 1538.º do CC.
Para efetuar a contabilização apropriada para esta operação, em primeiro lugar, há que verificar as condições desta cedência, que estão devidamente estabelecidas no contrato.
A questão em concreto refere-se ao tratamento contabilístico e fiscal desta operação na esfera da empresa que adquire o direito de superfície.
Antes de responder à questão, há que estabelecer alguns conceitos contabilísticos fundamentais, como a definição de ativo e os seus critérios de reconhecimento.
A empresa em causa está a aplicar a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para as Pequenas Entidades (NCRF-PE).
De acordo com o parágrafo 49 da Estrutura Conceptual (EC) do SNC, um ativo é um recurso controlado por uma entidade como resultado de acontecimentos passados e do qual se espera que fluam para a entidade benefícios económicos futuros.
Na avaliação de um item para verificar se o mesmo satisfaz a definição de ativo, a entidade (empresa) deve, ainda, atender à substância e realidade económica subjacente e não meramente à sua forma legal, conforme previsto no parágrafo 51 da EC.
Para que um item seja reconhecido no balanço como ativo, não basta cumprir a definição de ativo, sendo necessário que cumpra os critérios de reconhecimento (§ 87 da EC):
- Seja provável que os benefícios económicos futuros fluam para a entidade;
- O ativo tenha um custo que possa ser mensurado com fiabilidade.
Existindo um pagamento pela aquisição do direito de superfície do terreno, este dispêndio cumpre com os requisitos da definição e critérios de reconhecimento de um ativo na entidade superficiária (empresa), devendo ser classificado como ativo desta entidade durante o período da vigência do referido contrato, ou seja, durante o período de 20 anos (ou mais, se existir a expetativa de que o contrato venha a ser renovado sem quaisquer encargos adicionais).
Na realidade, o terreno e as construções aí realizadas, para serem exploradas no decurso ordinário da atividade, passam a ser recursos controlados pela entidade superficiária (empresa que adquire o direito de superfície), pois é esta entidade que irá controlar os benefícios que se espera que fluam da exploração do terreno durante o período de 20 anos, por força do direito, que está consignado no contrato estabelecido, de explorar esses bens na atividade operativa dessa entidade.
Por outro lado, é igualmente a empresa superficiária quem irá suportar todos os encargos com a manutenção e conservação do terreno e edifícios, situação que vem reforçar o cumprimento do critério do controlo do ativo por parte daquela entidade.
Esse controlo do ativo resulta também de acontecimentos passados, que é a emissão do contrato de direito de superfície, cujos custos são suportados pela entidade superficiária (empresa que adquire o direito de superfície).
Esse ativo irá gerar benefícios económicos futuros: parece-nos claro que a exploração dos edifícios e equipamentos instalados no terreno pela entidade superficiária (empresa que adquire o direito de superfície) irá gerar benefícios económicos futuros, no decurso do prazo de 20 anos, pela respetiva prossecução da atividade da empresa nesse imóvel.
Relativamente aos critérios de reconhecimento, também não há dúvida que o direito de superfície tem uma mensuração fiável, pois o seu custo é o que resulta dos dispêndios com o contrato de cedência do direito de superfície.
Atendendo ao cumprimento de todos estes critérios, existindo um pagamento pela obtenção do direito de superfície, esse dispêndio pode ser classificado como ativo não corrente na entidade superficiária (empresa que adquire o direito de superfície), durante os 20 anos da vigência do contrato, prevalecendo a substância económica da operação em detrimento da sua forma legal.
A entidade superficiária (empresa que adquire o direito de superfície) pode classificar esse direito de superfície como um ativo intangível nos termos do capítulo 8 da NCRF-PE, onde irá ser exercida a atividade da empresa.
Como o ativo intangível tem uma vida útil definida e finita, atendendo ao número de anos do contrato, este deve ser objeto de amortização por esse período estipulado no contrato, conforme parágrafo 88 da NCRF 6 - "Ativos intangíveis".
No caso em concreto, o período do contrato está estabelecido em 20 anos, pelo que o período de vida útil desse ativo intangível pode ser estimado em 20 anos. Como o mesmo contrato prevê a renovação do contrato, caso essa renovação não implique qualquer encargo substancial, a estimativa vida útil pode ter em consideração essa renovação.
Esse ativo intangível, referente ao direito de superfície adquirido, deve ser mensurado inicialmente pelo respetivo custo de aquisição, incluindo o preço de compra e os custos diretamente relacionados com a aquisição, como os encargos com a escritura e impostos não recuperáveis (IMT, imposto de selo).
Em termos de IRC, as amortizações contabilizadas do ativo intangível, direito de utilização do direito de superfície, podem ser aceites como gastos fiscais atendendo ao período de utilidade esperada, pelo período do contrato, desde o momento em que esse direito esteja pronto para ser utilizado, pois não existe uma taxa específica nas tabelas anexas ao DR 25/2009, conforme disposto no n.º 3 do artigo 5.º desse DR 25/2009.