IRC - atribuição de prémio por entidade do setor não lucrativo
PT27917 – janeiro de 2024
Determinada entidade, associação sem fins lucrativos, criou um prémio para jovens investigadores que se distinguem por produzirem textos de investigação/análise na área de atividade da associação.
O prémio em causa é de 2 500 euros.
Foi agora decidido atribuir - ex aequo - a dois investigadores por trabalhos realizados em 2023, pelo que cada um tem a receber 1 250 euros de prémio.
Trata-se de dois jovens estrangeiros (países da União Europeia) que não têm atividade em Portugal.
Como pagar os prémios por forma a que recebam o valor líquido e que tipo de documento/declaração os premiados têm de emitir? Qual o seu tratamento contabilístico?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento fiscal e contabilístico da atribuição de um prémio por uma entidade do setor não lucrativo (ESNL).
No caso em concreto é referido que os prémios serão entregues a dois jovens estrangeiros (da União Europeia) que não têm atividade em Portugal.
Para efeitos de enquadramento fiscal da atribuição de um prémio, quer a tributação do rendimento na esfera do beneficiário quer a dedutibilidade fiscal do gasto na esfera da entidade pagadora, importa proceder à qualificação da operação.
A alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA (CIVA) estabelece que as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal, são operações abrangidas pelas regras de incidência objetiva deste Código.
Consideram-se prestações de serviços, conforme disposto no n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, as operações efetuadas a título oneroso que não sejam transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens. De salientar a abrangência desta definição face ao caráter residual que a mesma possui.
As operações que se encontram sujeitas a IVA e não isentas deste imposto não são sujeitas a imposto do selo, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo (CIS).
No que se refere ao prémio atribuído, importaria analisar as condições subjacentes, nomeadamente, se inerente a este processo está a realização de prestações de serviços por parte das entidades que concorrem, situação que poderia remeter para a sujeição a IVA e a imposto sobre o rendimento.
Neste caso, seria ao beneficiário do rendimento e/ou prestador dos serviços, a quem competiria a obrigação de emissão de documento (fatura).
No cenário em que, subjacente à atribuição do prémio e, como contraprestação, exista cedência dos direitos de autor importa verificar da aplicação da isenção prevista no n.º 16 do artigo 9.º do CIVA, o qual prevê a isenção deste imposto na «(...) transmissão do direito de autor ou de direitos conexos e a autorização para a utilização da obra intelectual ou prestação, definidas no Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos, quando efetuadas pelos próprios titulares, seus herdeiros ou legatários, ou ainda por terceiros, por conta deles, ainda que o titular do direito seja pessoa coletiva, incluindo a consignação ou afetação, imposta por lei, dos montantes recebidos pelas respetivas entidades de gestão coletiva, a fins sociais, culturais e de investigação e divulgação dos direitos de autor e direitos conexos.»
Caso se venha a concluir pela não sujeição a IVA, por não existir qualquer serviço prestado pelo beneficiário do prémio, fica a referência ao disposto na verba 11.2.2 da tabela anexa ao CIS, a qual transcrevemos por simplicidade:
«11 - Jogo: (...)
11.2 - Os prémios do bingo, de rifas e do jogo do loto, bem como de quaisquer sorteios ou concursos, com exceção dos prémios dos jogos sociais previstos na verba n.º 11.3 da presente Tabela - sobre o valor ilíquido, acrescendo 10% quando atribuídos em espécie: (...)
11.2.2 - Dos restantes: 35%.»
A entrega do imposto deve ser efetuada pela entidade que concede o prémio, devendo a mesma anunciar o valor do prémio pelo valor líquido. Ou seja, o valor do prémio anunciado é deduzido do valor do imposto do selo.
A obrigação tributária nasce no momento da atribuição do prémio, devendo tal operação ser declarada da declaração mensal do imposto do selo, nos termos do artigo 52.º-A do CIS.
Contudo, a Autoridade Tributária já se pronunciou sobre esta temática, através de despacho vinculativo, Processo: 2017001105 - IVE n.º 12749, com despacho concordante de 29.11.2017, da diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, referindo que:
«[a]inda que os rendimentos em espécie recebidos sejam designados de "prémios" e que estes sejam obtidos no decurso de uma prova, ainda que denominada de "concurso", verificado que esteja que com a iniciativa se pretende premiar o mérito profissional/técnico/artístico dos candidatos, e não se vislumbrando em momento algum que o fator "sorte" possa influir no resultado final, deve entender-se que não se encontram aqueles sujeitos a imposto do selo.»
Assim, no caso exposto, considerando que não é o fator sorte que determina o vencedor, mas sim a análise dos conhecimentos técnicos e avaliação do trabalho final, esta operação deverá ser tratada como prestação de serviços.
Estando o participante a agir no âmbito de uma atividade empresarial (artigo 3.º do Código do IRS (CIRS)), será este a emitir fatura e a tributação deste rendimento ocorrerá ou por retenção na fonte, ou no final do período de tributação.
Porém, será de equacionar a não sujeição a imposto prevista no n.º 2 do artigo 12.º do CIRS, nos termos da qual se excluem «(...) deste imposto os prémios literários, artísticos ou científicos, quando não envolvam a cedência, temporária ou definitiva, dos respetivos direitos de autor, desde que atribuídos em concurso, mediante anúncio público em que se definam as respetivas condições de atribuição, não podendo a participação no mesmo sofrer restrições que não se conexionem com a natureza do prémio.»
Estes estão fora da incidência do IRS, se forem cumpridos, cumulativamente os seguintes requisitos:
- Não envolverem a cedência temporária ou definitiva, dos respetivos direitos do autor; e
- Serem atribuídos em concurso, mediante anúncio público em que se definam as respetivas condições de atribuição, não podendo a participação no mesmo sofrer restrições que não sejam conexas com a natureza do prémio.
Deste modo, caso nos encontremos perante um prémio científico, atribuído por uma associação sem fins lucrativos, parece-nos estar cumprida a disposição prevista no ponto 2, ou seja, a atribuição de prémio em concurso, efetuada mediante anúncio público, em que foram publicitadas as condições de atribuição, pelo que poderá o mesmo beneficiar da delimitação negativa da incidência prevista no n.º 2 do artigo 12.º do CIRS.
Por seu turno, se se vier a concluir que se trata de uma normal prestação de serviços de caráter técnico onde, inclusive, exista a cedência dos direitos de autor, o rendimento em questão será sujeito a tributação, não ficando abrangido por esta exclusão de tributação.
Neste caso, o prémio literário, artístico ou científico será tributável nas categorias B, E ou G, consoante haja sido atribuído, efetivamente ao criador do trabalho premiado (categoria B) ou dele seja beneficiária entidade diversa, (sucessão mortis causa - herdeiros), situação em que estando em causa uma cedência meramente temporária dos respetivos direitos, a importância recebida, será havida como rendimento de capitais (categoria E, artigo 5.º, alínea m), do CIRS) ou envolvendo a cedência a título definitivo daqueles direitos, será incluída na categoria G como rendimento de mais-valias nos termos conjugados dos artigos 9.º e 10.º, n.º 1, alínea c).
Na esfera da entidade pagadora, o prémio pago (aquisição de prestação de serviços) será gasto dedutível na medida em que reúna as condições previstas no artigo 23.º do Código do IRC.
Tratando-se de prémio atribuído por uma associação só será de equacionar a aceitação como gasto fiscal na medida em que o prémio e prestação de serviços inerente à sua atribuição resultem de atividade sujeita e não isenta de IRC.
Caso se venha a concluir pela não sujeição a IVA e a IRS, a atribuição do prémio apenas será suportada por recibo de quitação assinado pelo respetivo beneficiário.
No caso em concreto, caso o beneficiário do prémio seja um não residente em território nacional, temos:
- Caso se venha a concluir pela não sujeição a IVA e a IRS, a atribuição do prémio apenas será suportada por recibo de quitação assinado pelo respetivo beneficiário.
- Se se vier a concluir que se trata de uma normal prestação de serviços de caráter técnico onde, inclusive, exista a cedência dos direitos de autor, o rendimento em questão será sujeito a tributação, não ficando abrangido por esta exclusão de tributação.
No caso de se considerar uma normal prestação de serviços, tratando-se de um não residente, importa dar nota do seguinte:
O CIRS, através da regra da territorialidade, patente no n.º 2 do artigo 15.º do CIRS, determina que estão sujeitos a tributação em território nacional os rendimentos aqui obtidos por pessoa singular que não tenha sede nem direção efetiva em território português.
A expressão «rendimentos obtidos em território português» é esclarecida pelo n.º 1 do artigo 18.º do CIRS, norma que enumera as diversas situações que se consideram rendimentos obtidos em território nacional.
Os elementos de conexão territorial que permitem a tributação dos rendimentos obtidos em território português encontram-se consagrados no artigo 18.º do CIRS (igualmente no artigo 4.º do CIRC), são constituídos, essencialmente, pela fonte económica dos rendimentos, pela fonte financeira dos rendimentos ou pela localização em território português dos bens ou direitos geradores dos rendimentos.
Assim, estabelece a alínea e) do n.º 1 do artigo 18.º do CIRS que os rendimentos de atividades empresariais e profissionais imputáveis a estabelecimento estável nele situado, são considerados rendimentos obtidos em território nacional.
Por sua vez, prevê a alínea f) do referido normativo que se consideram obtidos em território nacional «[o]s rendimentos que não se encontrem previstos na alínea anterior decorrentes de atividades profissionais e de outras prestações de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico, técnico e de intermediação na celebração de quaisquer contratos, realizadas ou utilizadas em território português, com exceção das relativas a transportes, telecomunicações e atividades financeiras, desde que devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento.»
Na hipótese de estarmos perante um rendimento obtido em território nacional, diremos que o rendimento proveniente de prestações de serviços, quando pago por sujeito passivo português a entidade não residente é tributado mediante retenção na fonte a título definitivo, conforme resulta da conjugação da alínea g) do n.º 1 e do n.º 3, ambos do artigo 94.º do CIRC.
A taxa a aplicar é de 25 por cento, conforme disposto na alínea a) do n.º 4 do artigo 71.º do CIRS.
Não obstante a legislação nacional impor a tributação do rendimento em causa, importa sempre, quando estamos perante transações internacionais, aferir a existência, ou não, de acordo internacional. O artigo 101.º-C do CIRS refere-se, quanto à dispensa de efetuar retenção na fonte (ou efetuá-la a taxa reduzida), aquando do pagamento de determinado rendimento a entidade não residente quando tal resulte de acordo internacional.
Assim, sempre que o sujeito passivo português, enquanto entidade pagadora de rendimentos a entidades não residentes (pessoas singulares ou pessoas coletivas) que queiram acionar a convenção, esteja na posse do formulário 21-RFI devidamente preenchido pela entidade pagadora acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência (beneficiário do rendimento) para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado, deverá agir conforme o disposto na convenção em causa para os rendimentos obtidos.
Ou seja, deverá sempre existir o formulário 21-RFI devidamente preenchido pela entidade pagadora, sendo anexado a este um certificado de residência fiscal.
Referimos também o Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de janeiro, pois este diploma veio estabelecer a obrigatoriedade de as entidades residentes em território português que se encontrem obrigadas a proceder à retenção na fonte a título definitivo, aquando do pagamento a entidades não residentes, procederem à inscrição dessas entidades para efeitos de atribuição de número de identificação fiscal.
Posteriormente assiste à entidade residente em território nacional a obrigatoriedade de entrega da declaração modelo 30 (aprovada pela Portaria n.º 438/2004, de 30 de abril), até ao fim do 2.º mês seguinte ao do pagamento ou colocação à disposição dos respetivos beneficiários, em conformidade com o disposto na alínea a) do n.º 7 do artigo 119.º do CIRS, por remissão do artigo 128.º do CIRC.
Cumpre ainda fazer a referência ao disposto no artigo 139.º do CIRS, mediante o qual «[n]ão se podem realizar transferências para o estrangeiro de rendimentos sujeitos a IRS obtidos em território português por sujeitos passivos não residentes sem que se mostre pago ou assegurado o imposto que for devido.»
Ou seja, sendo devidamente acionado o acordo internacional pelo beneficiário do rendimento, o sujeito passivo português não deverá proceder à retenção de imposto.
Consideramos que independentemente deste acordo ser, ou não, acionado, o contabilista certificado deverá proceder à entrega da declaração modelo 30.
Em termos contabilísticos, a atribuição do prémio poderá ser contabilizada numa subconta da conta 62 - Fornecimentos e serviços externos.