PT20843 – Gratificações e tributação autónoma
Maio 2018
De acordo com o artigo 88º nº 13 b) CIRC, entendo que para evitar o pagamento de tributação autónoma destas gratificações de balanço (bónus) atribuído a administradores de valores superiores aos limites apresentados neste artigo, o seu pagamento deverá estar subordinado ao diferimento de uma parte não inferior a 50% por um período mínimo de três anos e condicionado ao desempenho positivo da sociedade ao longo desse período.
Por outro lado, o artigo 23º-A, n) CIRC menciona que não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável, os gastos relativos à participação nos lucros por membros de órgãos sociais e trabalhadores da empresa, quando as respetivas importâncias não sejam pagas ou colocadas à disposição dos beneficiários até ao fim do período de tributação seguinte.
Tendo em conta o seguinte exemplo:
Uma determinada entidade enquadrada no regime geral do IRC, regista em acréscimo de gastos em 2016 um valor de 50.000€ de gratificações de balanço para um administrador (de salientar que o administrador não é acionista).
Questões:
Para evitar o pagamento da tributação autónoma:
Quando deverá iniciar o período dos 3 anos? (em 2017?)
O diferimento do pagamento de uma parte não inferior a 50% por um período mínimo de três anos, será o pagamento de 1/3 em cada ano ou apenas no final do período dos 3 anos? (será por exemplo 50% em 2017 e posteriormente os restantes 50% dividido por 3 anos – 2018, 2019, 2020?)
Como deverá ser medido e comprovado o desempenho positivo da sociedade ao longo do período dos 3 anos? Adicionalmente como a entidade deverá fazer no ano do gasto do bónus, sendo que poderá a entidade perspetivar um desempenho positivo e não efetuar a Tributação autónoma e posteriormente verificar que este requisito não foi cumprido.
Aceitação do gasto:
Neste exemplo se o pagamento for diferido da seguinte forma:
- 50% (25.000€) pago em 2017
- 50%*1/3 (8.333,33€) pago em 2018
- 50%*1/3 (8.333,33€) pago em 2019
- 50%*1/3 (8.333,33€) pago em 2020
A entidade apenas poderá aceitar em 2016 o gasto das gratificações de balanço no valor de 25.000€ (pagamento em 2017), o restante deverá ser acrescido na modelo 22 de 2016?
E nos anos seguintes, por exemplo em 2018 quando existir o próximo pagamento (8.333,33€), poderá este montante ser deduzido na modelo 22? Dado que foi acrescido na modelo 22 de 2016 de acordo com a regra do artigo 23º-A, n) CIRC?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se à sujeição a tributação autónoma sobre prémios e bónus pagos a administradores de empresas.
Nos termos da alínea b) do n.º 13 do artigo 88.º do Código do IRC, serão tributados autonomamente, à taxa de 35 %, os gastos ou encargos relativos a bónus e outras remunerações variáveis pagas a administradores quando estas representem uma parcela superior a 25 % da remuneração anual e possuam valor superior a 27.500 euros, salvo se o seu pagamento estiver subordinado ao diferimento de uma parte não inferior a 50 % por um período mínimo de três anos e condicionado ao desempenho positivo da sociedade ao longo desse período.
Em primeiro lugar, as condições referidas na norma serão cumulativas, pelo que a tributação autónoma só se aplica quando ambas se verificarem, ou seja, quando esse prémio for superior a 25% da remuneração anual do administrador e o montante do prémio ultrapasse 27.500 euros.
A análise deve ser efetuada por cada administrador e não pela totalidade dos gastos com suportados pela empresa com prémios atribuídos à Administração, em termos gerais.
Se estas duas condições cumulativas não estiverem cumpridas, o prémio atribuído aos administradores não está sujeito a tributação autónoma, independentemente se for pago de uma só vez.
Por outro lado, ainda que os prémios atribuídos aos administradores ultrapassem os limites definidos na primeira parte da alínea b) do nº 13 do artigo 88º do CIRC, se pelo menos 50% desse prémio for diferido e pago num período mínimo de 3 anos, sendo o desempenho da empresa positivo, esses encargos também não estão sujeitos a tributação autónoma.
Face a esta regra, a tributação autónoma pode incidir apenas sobre os valores efetivamente pagos, ou seja, há lugar a tributação autónoma no mesmo período de tributação em que o beneficiário fica sujeito a IRS (se as condições não forem cumpridas), ainda que tenha sido reconhecido como gasto em período de tributação distinto.
Segundo o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 197/2016, "No caso da al. b) do n.º 13 do artigo 88.º, a intenção da lei parece ser a de sujeitar a tributação autónoma as remunerações variáveis que se não encontrem associadas a critérios de produtividade, isso porque se excecionam da tributação aquelas situações em que o pagamento estiver subordinado ao diferimento de uma parte não inferior a 50% por um período mínimo de três anos e condicionado ao desempenho positivo da sociedade ao longo desse período.”
O n.º 13 do artigo 88.ºdo Código do IRC foi introduzido pela Lei n.º 3-B/2010, de 8 de abril, diploma que aprovou o Orçamento de Estado para 2010.
O relatório do Orçamento de Estado para 2010 justifica essas medidas como uma forma de assegurar "uma distribuição mais justa dos encargos tributários e a uma moralização progressiva das políticas remuneratórias das empresas”, em conformidade com "a política de boas práticas que o Governo tem vindo a estimular junto do sector financeiro e, bem assim, com as orientações mais recentes da CMVM quanto às sociedades cotadas.”
Em comum a todos estes normativos está o objetivo de evitar os efeitos perversos e de curto prazo que uma política de remunerações pode suscitar. Para tal, as componentes variáveis da remuneração devem depender de critérios de desempenho pré-definidos e mensuráveis, numa perspetiva de médio-prazo, para que se possa aferir se foi criado valor de forma sustentada.
Como a doutrina tem reconhecido, trata-se, neste caso, de mecanismos de tributação autónoma que se afastam do desígnio inicial de combater a fraude e a evasão fiscais, como sucedia com as despesas não documentadas, mas que poderão ainda enquadrar-se no objetivo de limitar despesas que poderão repercutir-se no rendimento coletável das empresas.
Não está aqui em causa a indeterminação dos beneficiários e risco de fuga ao pagamento do imposto devido pelo recebimento das importâncias que são despendidas pelas empresas, visto que os beneficiários são identificáveis e as verbas estão sujeitas à correspondente tributação em IRS.
Não se trata, por isso, de medidas diretamente dirigidas ao combate à fraude e evasão fiscais, pretendendo-se antes reduzir, mediante a incidência do imposto, a vantagem fiscal que resulta para as empresas da realização de despesas que são dedutíveis mas não têm uma causa empresarial.
A empresa revela disponibilidade financeira para atribuir aos seus gestores indemnizações excessivas e não contratualmente previstas e que não têm direta relação com o desempenho individual na obtenção de resultados económicos positivos.
Nessa circunstância, no entendimento do legislador, o contribuinte deverá estar em condições de suportar um encargo fiscal adicional relativamente a esses mesmos gastos (que poderiam ser evitados) e que se destina a compensar a vantagem fiscal que resulta da redução da matéria coletável por efeito da realização dessas despesas, conforme resulta de entendimento do Tribunal Constitucional (Acórdão do TC n.º 267/2017, processo n.º 466/16).
Quanto ao conceito de "diferimento por um período mínimo de três anos”, não existe um entendimento claro sobre esta matéria, tanto podendo significar o diferimento para um termo mínimo de três anos ou o diferimento ao longo de um período de três anos (ex.: 1/3 cada ano).
De acordo com a jurisprudência do CAAD, verifica-se que a posição da AT tende a ser esta última, contrariamente à do Tribunal, de acordo com a qual se substituirmos a palavra diferimento por um dos seus significados (adiamento, por exemplo) o sentido da norma será: "adiamento por um período mínimo de três anos” (Cfr. Processo n.º 363/2017-T do CAAD).
Assim, atendendo à interpretação da AT, o período de 3 anos para efetuar o diferimento do pagamento de pelo menos 50% do prémio parece poder ser considerado desde o ano que é efetuado o primeiro pagamento e nos dois anos seguintes, dividindo esse montante em 3 pagamentos em três anos sucessivos.
O procedimento considerado parece poder ser aquele referido na questão colocada.
Como desempenho positivo da empresa deve entender-se a obtenção de resultado líquido do período positivo (lucros), podendo ainda considerar-se ainda outros critérios para complementar a análise, nomeadamente a evolução dos resultados ao longo do tempo.
Este entendimento resulta da posição da AT incluída numa Informação Vinculativa não disponibilizada publicamente através do Portal das Finanças.
Em termos contabilísticos, nos termos do parágrafo 42d) da Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) nº 28 – "Benefícios dos empregados”, os prémios atribuídos aos empregados, incluindo a administradores, que sejam pagáveis a 12 meses ou mais da data do balanço do período no qual os empregados prestam o respetivo serviço, deverão ser classificados como "outros benefícios a longo prazo de empregados”.
Esses prémios devem ser reconhecidos como gasto (conta 63) e passivo (conta 23) no período em que o respetivo serviço tiver sido prestado, estabelecendo a obrigação presente à empresa de pagar esse prémio.
Esses prémios, classificados como "outros benefícios a longo prazo de empregados”, devem ser mensurados pelo valor presente dessa obrigação de benefícios definidos à data do balanço, conforme o parágrafo 14 da NCRF 28.
Como esses prémios não tem um juro definido, o valor presente desses prémios pode ser determinado pela atualização dos fluxos de saída em função de uma taxa de desconto determinada em função de taxas de juro normalmente obtidas pela entidade.
Nos períodos seguintes, a diferença entre o valor nominal e o valor presente dos prémios deverá ser reconhecido como gasto de juros (conta 691), em função do período decorrido.
Em termos de IRC, esses prémios, classificados como "outros benefícios a longo prazo de empregados”, apenas podem ser deduzidos ao lucro tributável no período em que forem efetivamente pagos aos empregados, conforme o nº 12 do artigo 18º do Código desse imposto.
Dessa forma, no período em que for reconhecido o gasto nos resultados, a parte ainda não paga aos empregados deve ser acrescida na determinação do lucro tributável desse período (campo 715 do quadro 07 da Modelo 22).
No período em que for pago, pode ser efetuada a dedução na determinação do lucro tributável desse período do respetivo montante pago (tendo em consideração o gasto de juros reconhecido nesse mesmo período).
Os procedimentos fiscais no quadro 07 das Modelos 22 dos vários períodos de tributação podem ser aqueles sugeridos na questão colocada.