Pareceres
IVA - transações intracomunitárias
29 April 2024
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

IVA - transações intracomunitárias
PT27956 - fevereiro de 2024

 

Um sujeito passivo espanhol pretende efetuar um acordo de autofaturação, uma vez que o mesmo tem todo o sistema montado para essa operação e aplica a mesma a todos os seus fornecedores.
Tratando-se de um sujeito passivo espanhol, de que forma pode ser cumprida a obrigação de envio do SAF-T?
Em relação à declaração recapitulativa, se vão faturar em nome do sujeito passivo português, será que vão comunicar os valores ou tem de ser o sujeito passivo a comunicar?

 

Parecer técnico

 

O pedido de parecer está relacionado com as obrigações de faturação e comunicação das faturas, quando o adquirente, sujeito passivo de IVA em Espanha, se substitui ao fornecedor português, na emissão desses documentos.
De conformidade com o n.º 1 do artigo 29.º do Código do IVA (CIVA), para além da obrigação do pagamento do imposto, os sujeitos passivos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º devem, sem prejuízo do previsto em disposições especiais:
«b) Emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.»
Prevê, no entanto, o n.º 14 do mesmo artigo 29.º que, «[p]ara cumprimento do disposto na alínea b) do n.º 1, as faturas podem ser elaboradas pelo próprio adquirente dos bens ou serviços ou por um terceiro, em nome e por conta do sujeito passivo.»
Ter em atenção que, nos termos do n.º 11 do artigo 36.º do CIVA, a elaboração de faturas por parte do adquirente dos bens ou dos serviços fica sujeita às seguintes condições:
- A existência de um acordo prévio, na forma escrita, entre o sujeito passivo transmitente dos bens ou prestador dos serviços e o adquirente ou destinatário dos mesmos;
- O adquirente provar que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tomou conhecimento da emissão da fatura e aceitou o seu conteúdo.
- Conter a menção «autofacturação».
O Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro, introduziu algumas alterações e clarificações às obrigações de emissão e processamento de documentos de faturação e outros documentos fiscalmente relevantes.
O artigo 37.º-A do Decreto-Lei n.º 28/2019 aditou o artigo 35.º-A ao CIVA, com a seguinte redação:
«Artigo 35.º-A - Delimitação de competências em matéria de faturação
1 - A emissão de fatura pelas transmissões de bens e prestações de serviços efetuadas no território nacional está sujeita às regras estabelecidas no presente Código.
2 - A emissão de fatura fica ainda sujeita às regras previstas no presente Código quando o sujeito passivo tenha no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio a partir do qual a transmissão de bens ou prestação de serviços é efetuada e, de acordo com as regras de localização:
a) A operação se considere localizada noutro Estado-membro e a obrigação de liquidação do imposto recair sobre o sujeito passivo a quem os bens foram transmitidos ou os serviços prestados;
b) A operação não se considere efetuada na União Europeia.
3 - Não obstante o disposto no n.º 1, a emissão de fatura por sujeito passivo que não possua no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio a partir do qual a transmissão de bens ou prestação de serviços é efetuada, não está sujeita às regras estabelecidas no presente Código quando a obrigação de liquidação do imposto recai sobre o sujeito passivo adquirente dos bens ou destinatário dos serviços.
4 - As regras previstas no presente Código são ainda aplicáveis à fatura elaborada pelo sujeito passivo adquirente dos bens ou destinatário dos serviços que tenha sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio em território nacional, quando as operações aqui se considerem efetuadas e a obrigação de liquidação do imposto recair sobre ele.
5 - Não obstante o disposto no n.º 1, a emissão de fatura pelas operações efetuadas por sujeitos passivos que utilizem Portugal como Estado membro de identificação para efeitos do regime especial aprovado pelo Decreto-Lei n.º 158/2014, de 24 de outubro, está sujeita às regras estabelecidas no presente Código.»
A Autoridade Tributária e Aduaneira já emitiu algumas instruções administrativas relacionadas com as alterações ao CIVA promovidas pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, através do Ofício-Circulado n.º 30 211/2019, de 15 de março.
Esta norma acolhe o artigo 219.º-A da diretiva IVA e define a competência territorial em matéria de faturação, clarificando as situações em que a emissão de fatura está sujeita às regras estabelecidas no CIVA.
Como regra geral, a emissão de faturas que titulem operações localizadas no território nacional (aqui tributáveis) está sujeita às regras do CIVA.
Não obstante, ainda que localizadas em território nacional (nos termos do artigo 6.º do CIVA), nas operações em que se aplica o reverse charge, a emissão de fatura por sujeito passivo que não possua no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio não está sujeita às disposições do CIVA, exceto quando o adquirente, sujeito passivo nacional, procede a autofaturação nos termos do n.º 11 do artigo 36.º do CIVA.
Nas operações localizadas em outro Estado-membro, realizadas por sujeitos passivos com sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio em território nacional, em que ocorre o reverse charge, a emissão de fatura está sujeita às disposições do CIVA, exceto quando o adquirente, sujeito passivo estabelecido naquele Estado-membro, procede a autofaturação. No caso em concreto, admitimos estar perante este cenário.
Veja-se, que para efeitos do IVA, as regras de localização das prestações de serviços encontram-se definidas no artigo 6.º do CIVA.
Estando perante prestações de serviços, o que entendemos ser o caso, atualmente temos duas regras gerais de localização que se encontram no n.º 6 do artigo 6.º do CIVA:
«6 - São tributáveis as prestações de serviços efetuadas a:
a) Um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador;
b) Uma pessoa que não seja sujeito passivo, quando o prestador tenha no território nacional a sede da sua atividade, um estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, a partir do qual os serviços são prestados.»
As duas regras gerais são vulgarmente designadas por B2B e B2C, isto é, na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA é tratada a territorialidade das operações realizadas entre dois sujeitos passivos (business to business), na alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA é tratada a territorialidade das operações realizadas com não sujeitos passivos (business to consumer). Estas regras têm um âmbito de aplicação universal.
A regra geral patente na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, que corresponde ao artigo 44.º da diretiva IVA (diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, determina que, quando o adquirente dos serviços é um sujeito passivo do IVA - as designadas operações B2B - as operações são tributáveis no lugar onde o adquirente tem a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio fiscal, para o qual os serviços são prestados.
Para este efeito, é indiferente se os sujeitos passivos envolvidos se encontram estabelecidos num Estado-membro da União Europeia ou num país terceiro.
Assim, se um sujeito passivo português prestar um serviço abrangido pela regra geral da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA a um sujeito passivo espanhol ou a um sujeito passivo angolano, a operação não é localizada no território nacional, mas em Espanha ou em Angola, cabendo a liquidação do IVA aos sujeitos passivos espanhol ou angolano, adquirentes dos serviços.
A segunda regra geral está contida na alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, que corresponde ao artigo 45.º da diretiva IVA, segundo a qual, quando o adquirente dos serviços for uma pessoa que não seja sujeito passivo do IVA - as chamadas operações B2C - as operações são localizadas na sede, estabelecimento estável ou domicílio do prestador dos serviços.
Assim, no caso em concreto, a localização das prestações de serviços, segue, em princípio, a regra do denominado «princípio do país do adquirente», isto é, a tributação é efetuada onde o adquirente tiver a sua sede, estabelecimento estável ou domicílio desde que, este seja sujeito passivo.
A respeito desta matéria, e para efeitos de verificação da qualidade do adquirente, sugerimos leitura do disposto no ofício-circulado n.º 30 115/2009, de 29 de dezembro. O ponto III deste diploma que se refere à incidência subjetiva dispõe:
«Para efeitos da aplicação das regras estabelecidas no artigo 6.º, consideram-se sujeitos passivos do imposto:
a) As pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, relativamente aos serviços que lhes são prestados, quando o respetivo prestador não tenha, no território nacional a sede, estabelecimento estável ou domicílio [alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º];
b) Outras pessoas coletivas que, de acordo com o disposto no n.º 5 do artigo 2.º do CIVA, devam estar registadas para efeitos do artigo 5.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI), ou seja, qualquer pessoa coletiva que, não sendo sujeito passivo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, mas se encontra registada para efeitos das aquisições intracomunitárias de bens, é considerada sujeito passivo do imposto quando adquire serviços a um prestador que não tenha, no território nacional, a sede, estabelecimento estável ou domicílio a partir do qual os serviços são prestados;
c) Qualquer pessoa, singular ou coletiva, estabelecida fora do território da comunidade, pela aquisição ou fornecimento de serviços a entidades com a sede, estabelecimento estável ou domicílio no território nacional, que faça prova dessa qualidade, nomeadamente, através da apresentação de um número de identificação fiscal ou similar, atribuído pelo país de estabelecimento, ou de elementos obtidos das autoridades fiscais competentes, atestando a qualidade de sujeito passivo. Esta qualidade de sujeito passivo pode, ainda, ser comprovada mediante apresentação de um certificado, normalmente utilizado para efeitos de pedido de reembolso da 13.ª Diretiva, emitido pelas autoridades fiscais competentes, confirmando que o adquirente exerce uma atividade económica.»
As regras gerais patentes no n.º 6 do artigo 6.º do CIVA podem ser afastadas por aplicação das regras de exceção dos números seguintes da mesma norma. Assim, determinadas prestações de serviços devidamente identificadas devem ser enquadradas, caso as suas condições se verifiquem, nas normas (de territorialidade) em que as mesmas se inserem.
No caso concreto, dos serviços cobrados pela empresa portuguesa, residente em Portugal, importa verificar se os mesmos são abrangidos pelas regras gerais ou pelas exceções, pelo que deverá avaliar desde logo o tipo de serviço prestado face às regras do artigo 6.º do CIVA, bem como quanto à qualificação do adquirente.
Face à legislação referida, se um sujeito passivo português presta um serviço a um sujeito passivo de outro Estado membro, ao qual se aplica a regra de autoliquidação (reverse charge), como entendemos ser o caso em apreço, e tendo o sujeito passivo adquirente procedido à autofaturação, a emissão destas faturas pelo adquirente espanhol não está sujeita às disposições do CIVA e, consequentemente, parece-nos que não está sujeita à comunicação do SAF-T (PT) da faturação prevista no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto.
Em conformidade com o acima exposto, é normal e expectável a existência de diferenças entre o volume de negócios relevado na declaração periódica de IVA da empresa e o SAF-T (PT) da faturação.
Não obstante, somos da opinião que o sujeito passivo, caso pretenda, poderá recolher para o seu sistema informático de faturação certificado pela AT a fatura emitida pelo adquirente, ficando a mesma na base de dados desse programa como documento emitido por programa externo e tendo uma série distintas das séries de faturação normal. Desta forma, poderá o sujeito passivo proceder à sua comunicação.
Sugerimos ainda a leitura da informação vinculativa processo: n.º 15 948, por despacho de 2019-08-22, da diretora de serviços do IVA, (por subdelegação).
Não obstante a opinião expressa, e dadas as recentes alterações legislativas em matéria de faturação, as quais carecem ainda de diversas clarificações, para evitar orientações distintas por parte da Autoridade Tributária, recomendamos que efetue um pedido de informação vinculativa, nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária.
Em alternativa, caso não estejam cumpridos os requisitos para a autofaturação, deverá a entidade com sede em Portugal cumprir todas as obrigações de emissão de faturas, nos termos do CIVA, e da sua consequente comunicação, nos termos previstos no Decreto-lei n.º 198/2012.
Por fim, no que se refere à recapitulativa, mais uma vez alertamos para o facto de que a autofaturação reside na elaboração da fatura pelo adquirente, mas que deverá ser emitida como se o fosse pelo prestador.
De acordo com a alínea i) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA, na declaração recapitulativa são incluídas as prestações de serviços efetuadas a sujeitos passivos que tenham noutro Estado-membro da Comunidade a sede, um estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, quando tais operações não sejam tributáveis em território nacional em resultado da aplicação do disposto na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do mesmo Código.
No caso de prestações de serviços, em causa, caso a mesma seja enquadrada na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, uma vez que o adquirente é sujeito passivo de IVA noutro Estado-membro, deve ser enviada a declaração recapitulativa, com identificação da operação e do número fiscal do adquirente;
Relativamente à comunicação da autofaturação à Autoridade Tributária, a informação que poderá consultar no portal e-Fatura disponível em www.portaldasfinancas.gov.pt nas «Perguntas Frequentes» nas opções e-Fatura > Emitentes > Comunicação Elementos Faturas, não aborda, as situações como a nossa em questão. Contudo transcrevemos duas questões sobre o tema:
«19-3629 - A obrigação da comunicação é sempre do "emitente" (prestador do serviço/transmitente), ou seja, do sujeito passivo em nome do qual é emitida a fatura. Para que possa comunicar essas faturas pode optar por várias vias:
1 - A entidade que elabora as faturas (o cliente) produz o ficheiro SAF-T com os dados do prestador/transmitente, e disponibiliza-o para que este o submeta.
Ou
2 - O cliente, que autofatura, utiliza o webservice para enviar os elementos obrigatórios das faturas, tendo sido previamente criado um subutilizador, pelo emitente, para autorizar a empresa que elabora as faturas a remeter a informação obrigatória a elas respeitantes.»
«16-4950 Como é que o emitente cria um subutilizador? E qual o perfil a selecionar?
No Portal das Finanças, está disponível uma funcionalidade para este efeito:
Serviços Tributários > Serviços > Autenticação de Contribuintes > Gestão de utilizadores > Criar Novo Utilizador, que permite, após autenticação, criar um perfil de "subutilizador".
Para a comunicação dos elementos das faturas por um subutilizador, o emitente deverá atribuir-lhe o perfil WFA - Comunicação de dados de faturas, fornecendo o n.º de "subutilizador" e a respetiva senha de acesso.
Ao ser atribuído um perfil de subutilizador, o acesso é dado à área do e-Fatura e não ao tipo de operação que pode efetuar, permitindo a comunicação e consulta de documentos.
Esta funcionalidade permite aos sujeitos passivos organizar a distribuição interna dos acessos ao Portal das Finanças.
A responsabilidade de qualquer operação por parte de um subutilizador é sempre do sujeito passivo.»

 

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