Ordem nos media
Comunicados
Combates prioritários
7 December 2006
Artigo de Domingues Azevedo, presidente da CTOC

                                            

As últimas semanas foram férteis na publicação de matérias de natureza tributária e afins. Como sempre acontece, umas com tratamento jornalístico mais pormenorizado e outras, com direito a menos destaque. Porventura, um dos temas que captou de forma mais particular a minha atenção, estava remetido para uma curta chamada ao fundo da página num diário especializado. A notícia tinha como título: «Juízes com "falta de preparação" para crimes fiscais».  Dizia a dita «peça» que o Ministério das Finanças e da Administração Pública «vai começar a dar formação no Centro de Estudos Judiciários (CEJ) aos juízes que tenham de avaliar sobre processos complicados que envolvam intrincadas matérias fiscais». Deste modo, a tutela, na pessoa do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, põe o dedo na ferida. Alguns casos que nos têm chegado ao conhecimento são exemplares da falta de preparação, formação e sensibilidade de muitos magistrados quando confrontados a julgar crimes de natureza fiscal. Um deles é mesmo denunciado na discreta notícia pelo próprio João Amaral Tomaz: «Houve um julgamento que foi adiado porque o advogado disse que não tinha havido peritagem, num caso de "fraude carrossel", mas noutro julgamento o argumento para o adiamento foi exactamente o contrário, ou seja, adiou-se porque tinha havido peritagem».

Esta é apenas uma pequena amostra do estado da nossa Justiça, neste caso tributária, e dos nossos tribunais. O anúncio do secretário de Estado, que acrescenta ainda que serão criados «módulos orientados para o combate à fraude e evasão fiscais no CEJ», não nos pode deixar indiferentes. Os «novos» crimes requerem respostas à alturas, mas exigem igualmente algumas cautelas. Já há muito que venho repetindo que a intensificação do esforço de combate às práticas ilícitas no domínio fiscal deve ser acompanhada em paralelo pelo bom senso e sensibilização da totalidade dos agentes envolvidos.

É preciso enfraquecer o fenómeno da fraude e evasão, mas não a qualquer custo. Os direitos e as garantias básicas dos cidadãos não podem ser pisados. A lógica de gato e do rato que, aqui e ali, ainda perdura no por vezes nem sempre pacifico relacionamento entre a administração fiscal e o contribuinte, e as condutas, não raro prepotentes e desprovidas de bom senso com a génese na nossa justiça tributária, terão de ser reduzidas a incidentes pontuais e não a actos recorrentes.

Perante a multiplicação da actividade fraudulenta (também segundo os «media», o Ministério Público abre 13 inquéritos  por dia a crimes económicos e de corrupção), exige-se mais, mas especialmente, melhores magistrados, tanto do ponto de vista técnico, como humano. Nas sociedades modernas, não há actividade que possa iludir a componente formativa: é uma matéria que está na ordem do dia e penso que também em matéria tributária, será fundamental, na longa, e quase sempre desigual, batalha contra o ilícito.

Em estreita ligação com a decisão de julgar por parte dos juízes, encontra-se o enquadramento legal. A Unidade de Missão Para a Reforma Penal, liderada pelo jurista Rui Pereira, apresta-se para submeter à apreciação do Governo o projecto de lei de política criminal, estando prevista a introdução da corrupção e do terrorismo como crimes prioritários. Daqui se depreende que os crimes contra o Estado, que tão pouca atenção têm merecido, estão na primeira linha das preocupações do Executivo até ao final desta legislatura, em 2009. Os crimes de fraude fiscal, aduaneiras e contra a Segurança Social, que têm registado resultados encorajadores nos últimos meses, prometem ser combatidos com mais afinco. Não partilho da tese que existem crimes mais prioritários do que outros, mas a prevenção e a repressão dos ilícitos fiscais terá de merecer um enfoque muito particular.

 

P.S. - São hoje conhecidos os galardoados da primeira edição dos «Prémios Europeus de Iniciativa Empresarial». A boa notícia é que o projecto português «Empresa na Hora» é um dos 13 candidatos deste prémio, lançado em 2005, que visa reconhecer e recompensar o espírito empresarial, tendo aderido à competição mais de 400 autoridade locais e regionais de todos os países da União Europeia. Esta é, sem dúvida, mais uma razão para que se continue a apostar com convicção em projectos nacionais de qualidade e um sério aviso aos «velhos do Restelo» que preenchem o seu tempo a praguejar sobre os pretensos males da nação.