PT23741 – RCCS – Impostos diferidos
19-11-2019
Uma empresa realizou aumento de capital em maio de 2019 a título de aplicação dos resultados de 2018 para usufruir do benefício fiscal plasmado no artigo 41.º-A dos Estatuto dos Benefícios Fiscais. Quais são os lançamentos contabilísticos a ter em conta no referido aumento? Em termos de impostos diferidos terá que ser feito algum lançamento?Parecer técnico
A questão refere-se ao benefício fiscal da remuneração convencional do capital social.
O benefício fiscal da remuneração convencional do capital social está previsto no artigo 41.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).
Na determinação do lucro tributável das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas, empresas públicas e demais pessoas coletivas de direito público ou privado com sede ou direção efetiva em território português, pode ser deduzida uma importância correspondente à remuneração convencional do capital social, calculada mediante a aplicação, limitada a cada exercício, da taxa de sete por cento ao montante das entradas realizadas até dois milhões de euros, por entregas em dinheiro ou através da conversão de créditos, ou do recurso aos lucros do próprio exercício no âmbito da constituição de sociedade ou do aumento do capital social, desde que:
- O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
- A sociedade beneficiária não reduza o seu capital social com restituição aos sócios, quer no período de tributação em que sejam realizadas as entradas relevantes para efeitos da remuneração convencional do capital social, quer nos cinco períodos de tributação seguintes.
A dedução em apreço:
- Aplica-se exclusivamente às entradas efetivamente realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital social da sociedade beneficiária, às entradas em espécie realizadas no âmbito de aumento do capital social que correspondam à conversão de créditos em capital, e ao aumento de capital com recurso aos lucros gerados no próprio exercício, desde que, neste último caso, o registo do aumento de capital se realize até à entrega da declaração de rendimentos relativa ao exercício em causa;
- É efetuada no apuramento do lucro tributável relativo ao período de tributação em que sejam realizadas as entradas mencionadas na alínea anterior e nos cinco períodos de tributação seguintes;
- Apenas considera as entradas em espécie correspondentes à conversão de suprimentos ou de empréstimos de sócios realizadas a partir de 1 de janeiro de 2017 ou a partir do primeiro dia do período de tributação que se inicie após essa data, quando este não coincida com o ano civil;
- Apenas considera as entradas em espécie correspondentes à conversão de créditos de terceiros realizadas a partir de 1 de janeiro de 2018 ou a partir do primeiro dia do período de tributação que se inicie após essa data, quando este não coincida com o ano civil.
Na redação dada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro (OE 2018), apenas devem relevar para o benefício fiscal previsto no artigo 41.º-A do EBF, os aumentos de capital registados até à entrega da declaração modelo 22 de um determinado período de tributação relativamente a lucros gerados (nesse período) na vigência da Lei do Orçamento do Estado para 2018, ou seja, em períodos iniciados em, ou após, 1 de janeiro de 2018 (consultar ficha doutrinária; processo 2018000831, com despacho 185/2018-XXI, de 25 de maio do SEAF).
Caso a sociedade beneficiária reduza o seu capital social com restituição aos sócios, quer no período de tributação em que sejam realizadas as entradas quer nos cinco períodos de tributação seguintes, deverá considerar, como rendimento do período de tributação em que ocorra a redução do capital com restituição aos sócios, do somatório das importâncias deduzidas a título de remuneração convencional do capital social, majorado em 15%.
Limitação à dedutibilidade dos gastos de financiamento
É reduzido para 25 por cento o limite previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 67.º do CIRC quando os sujeitos passivos beneficiem da dedução prevista no n.º 1 do artigo 41.º-A do EBF.
Quando os sujeitos passivos beneficiem da dedução relativa ao benefício fiscal da remuneração convencional do capital social, o limite dos gastos de financiamento líquido estabelecido passará então a ser o maior entre:
- Um milhão de euros; e
- 25 por cento do EBITDA (esta taxa é de 30 por cento quando estejam em causa sujeitos passivos que não usufruam da remuneração convencional do capital social).
Medida antiabusoA remuneração convencional do capital social não se aplica quando, no mesmo período de tributação ou num dos cinco períodos de tributação anteriores, o mesmo seja ou haja sido aplicado a sociedades que detenham direta ou indiretamente uma participação no capital social da empresa beneficiária, ou sejam participadas, direta ou indiretamente, pela mesma sociedade, na parte referente ao montante das entradas realizadas no capital social daquelas sociedades que haja beneficiado do presente regime.
No tocante às obrigações declarativas, faz-se a dedução no campo 774 do quadro 07 da declaração de rendimentos da declaração modelo 22 e, consequentemente, preenchimento do campo 409 do quadro 04 do anexo D da referida declaração fiscal.
A dedução no campo 774 do quadro 07 da declaração de rendimentos da declaração modelo 22 poderá contribuir para a criação ou aumento de prejuízo fiscal.
Exemplo de aplicação práticaA empresa "X” procedeu, em 2018, à utilização do benefício fiscal de remuneração convencional do capital social, considerando um aumento de capital social no valor total de 100 mil euros, com recurso aos lucros gerados no próprio exercício.
Admitindo que o registo do aumento de capital se realizou até à entrega da declaração de rendimentos relativa ao ano de 2018, qual o valor do benefício?
7% x 100 000 euros = 7 000 euros – a deduzir ao lucro tributável nos exercícios de 2018, 2019, 2020, 2021, 2022 e 2023.
No que diz respeito à contabilização do aumento de capital por aplicação dos resultados de 2018, em termos contabilísticos, o aumento do capital social apenas é realizado no momento da respetiva subscrição, o que ocorre quando se efetue o registo na conservatória do registo comercial.
Quando esse aumento de capital social decorre da aplicação dos resultados de 2018, os registos contabilísticos são os referidos de seguida.
Em 1/1/2019:
Pela transferência do resultado líquido do período anterior para resultados transitados:
- Débito da conta 818 – Resultado líquido, por contrapartida a crédito da conta 56x – Resultados transitados, pelo montante do lucro obtido.
Em 2019, na data da deliberação do aumento do capital social por aplicação do lucro do período anterior:
- Débito da conta 56x – Resultados transitados, por contrapartida a crédito da conta 51x – Capital subscrito, pelo montante do aumento do capital.
Relativamente aos impostos diferidos, visto que não é indicado o normativo contabilístico adotado pela entidade, iremos abordar esta temática no âmbito das normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) previstas no aviso n.º 8 256/2015, de 29 de julho.
A NCRF 25 – Impostos sobre o Rendimento trata exatamente da contabilização destes impostos.
Os impostos sobre rendimento (lucros) compreendem os impostos correntes e os impostos diferidos e são reconhecidos em resultados, exceto quando estão relacionados com itens que são reconhecidos diretamente nos capitais próprios, caso em que são também registados por contrapartida dos capitais próprios.
Os impostos diferidos são calculados sobre as diferenças temporárias entre os valores contabilísticos dos ativos e passivos e a sua base fiscal, utilizando as taxas de imposto aprovadas ou substancialmente aprovadas à data de balanço em cada jurisdição relevante e que se espera virem a ser aplicadas quando as diferenças temporárias se reverterem.
Em conformidade com o parágrafo 25 da NCRF 25, um ativo por impostos diferidos deve ser reconhecido para todas as diferenças temporárias dedutíveis até ao ponto em que seja provável que exista um lucro tributável relativamente ao qual a diferença temporária dedutível possa ser usada.
De acordo com os parágrafos 31 e 32 da NCRF 25:
«(…) 31 - Um ativo por impostos diferidos deve ser reconhecido para o reporte de prejuízos fiscais não usados e créditos tributáveis não usados até ao ponto em que seja provável que lucros tributáveis futuros estarão disponíveis contra os quais possam ser usados prejuízos fiscais não usados e créditos tributáveis não usados.
32 - Os critérios para reconhecer ativos por impostos diferidos provenientes do reporte de prejuízos fiscais e de créditos de impostos não utilizados são os mesmos que os critérios para o reconhecimento de ativos por impostos diferidos provenientes de diferenças temporárias dedutíveis. Porém, a existência de prejuízos fiscais não usados é forte prova de que podem não estar disponíveis lucros tributáveis futuros. Por isso, quando uma entidade tenha uma história de perdas recentes, a entidade reconhece um ativo por impostos diferidos proveniente de prejuízos fiscais ou de créditos tributáveis não utilizados somente até ao ponto que a entidade tenha suficientes diferenças temporárias tributáveis ou que haja outras provas convincentes de que lucros tributáveis suficientes estarão disponíveis contra os quais os prejuízos fiscais não utilizados ou créditos tributáveis não utilizados possam ser utilizados pela entidade. Em tais circunstâncias exige-se a divulgação da quantia do ativo por impostos diferidos e da natureza da prova que suporta o seu reconhecimento. (…).»
Face ao exposto, entendemos que o benefício fiscal da remuneração convencional do capital social enquadra-se no conceito de «créditos tributáveis não usados» referido nos parágrafos da norma acima transcritos e, portanto, deve ser reconhecido um ativo por impostos diferidos para este benefício fiscal que será utilizado somente nos anos seguintes, nos termos do artigo 41.º-A do EBF, mas somente até ao ponto em que seja provável que existirão lucros tributáveis futuros capazes de absorver estes créditos fiscais.
Retomando o exemplo acima, no qual a empresa "X” procedeu, em 2018, a um aumento de capital social no valor total de 100 mil euros. Temos o seguinte benefício:
7% x 100 000 euros = 7 000 euros – a deduzir ao lucro tributável nos exercícios de 2018, 2019, 2020, 2021, 2022 e 2023.
No ano de 2018 seriam deduzidos 7 000 euros ao respetivo lucro tributável.
Os 35 mil euros a deduzir de 2019 a 2023 (7 000 euros em cada ano), implicam o reconhecimento de um ativo por impostos diferidos no total de 7 350 euros (35 000 euros x 21%). Anualmente, de 2019 a 2023, deve ser revertido o montante de 1 470 euros relativo a este imposto diferido, à medida que a entidade vai deduzindo 7 000 euros de benefício fiscal relativo à remuneração convencional do capital social.