Pareceres
Imposto do selo
25 June 2024
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC:


Imposto do selo
PT28004 - fevereiro de 2024

 

A sociedade "A" e a sociedade "B" são detidas pelos mesmos acionistas, mas não têm qualquer participação entre si.
A sociedade "A" tem como atividade principal o transporte de mercadorias, enquanto a "B" é uma sociedade imobiliária.
A sociedade "B" tem adquirido alguns imóveis, através de empréstimos efetuados pela sociedade "A", uma vez que esta tem disponibilidade de tesouraria, existindo planos de pagamentos aprovados, que incluem o pagamento de juros, para efeitos de liquidação dos valores em dívida.
Apesar de ambas as sociedades serem detidas pelos mesmos acionistas, estes tipos de operações podem ser realizadas dado não existir qualquer tipo de participação entre as mesmas?

 

Parecer técnico

 


O pedido de parecer está relacionado com enquadramento legal e fiscal de empréstimos entre empresas em que os sócios são comuns.
Começamos por dar nota que a concessão de crédito enquanto atividade, em Portugal, é reservada às instituições de crédito e sociedades financeiras. No entanto, pessoas ou entidades não financeiras podem celebrar contratos de suprimento ou de mútuo por razões determinadas e de forma ocasional, devendo haver razões justificadas para tal facto.
Assim, importa salientar que neste tipo de operações deve ser aferido o seu âmbito jurídico, devendo para o efeito, recorrer a um jurista ou advogado.
Mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra, dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade (artigo 1142.º do Código Civil).
O Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de julho, veio dar uma nova redação ao artigo 1 143.º do Código Civil, e o contrato de mútuo de valor superior a 25 mil euros só passa a ser válido se for celebrado por escritura pública, salvo disposição legal em contrário, e o de valor superior a 2 500 euros se o for por documento assinado pelo mutuário.
Caso venham a ser estabelecidos juros dos referidos empréstimos, deve-se ter em atenção o conceito de usura definido pelo artigo 1146.º do Código Civil:
«1. É havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros anuais que excedam os juros legais, acrescidos de 3 ou 5 por cento, conforme exista ou não garantia real.
2. É havida também como usurária a cláusula penal que fixar como indemnização devida pela falta de restituição de empréstimo relativamente ao tempo de mora mais do que o correspondente a 7 ou a 9 por cento acima dos juros legais, conforme exista ou não garantia real.
3. Se a taxa de juros estipulada ou o montante da indemnização exceder o máximo fixado nos números precedentes, considera-se reduzido a esses máximos, ainda que seja outra a vontade dos contraentes.
4. O respeito dos limites máximos referidos neste artigo não obsta a aplicabilidade dos artigos 282.º a 284.º.»
Relativamente aos documentos de suporte (obrigação referida na alínea a) do n.º 2 do artigo 123.º do CIRC), que devem apoiar os lançamentos contabilísticos, podem ser os próprios contratos mútuos ou neste caso a escritura pública, pois o valor do empréstimo ultrapassa os 25000€. Assim, como as fotocópias dos cheques, ou documentos bancários referentes às transferências para as contas dos acionistas/sócios.
De referir ainda que os termos e condições do contrato de mútuo, nomeadamente definição de prazos de reembolso, e determinação de taxa de juro caso seja estipulado entre as partes deverá ser contratualizado de forma idêntica aos que normalmente seriam contratados por entidades independentes, em operações idênticas. Neste sentido, deve ser aferida a existência de relações especiais nos termos do artigo 63.º do CIRC.
O n.º 1 do artigo 63.º do CIRC transmite-nos que:
«Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efetuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.»
Nos termos da alínea a) do n.º 4 do artigo 63.º do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades «nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:
a) Uma entidade e os titulares do respetivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20% do capital ou dos direitos de voto;
(...).»
Neste sentido em termos fiscais deverão ser cumpridos os preços da plena concorrência, e sem prejuízo de a sociedade não ter de fazer nenhuma correção fiscal na sua declaração modelo 22 (sendo os sócios também residentes em território nacional não há obrigação de na esfera da sociedade, se proceder a correção na modelo 22), a Autoridade Tributária, poderá proceder a uma correção correlativa nos termos do n.º 9 do artigo 63.º do CIRC.
Nos contratos de mútuo pode ser convencionado entre as partes o pagamento de juro, como retribuição desse empréstimo. Todavia, a taxa de juro desses empréstimos é considerada uma taxa supletiva, ou seja, não pode exceder os juros legais acrescidos de 3 ou 5 por cento, conforme exista, ou não, garantia real, sob pena de ser considerado usura. Os juros legais estão estabelecidos atualmente em 4 por cento, pela Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril de 2003, ao abrigo do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil.
Se for definida uma taxa de juro considerada usurária, conforme explicado em cima, apenas é devido o juro até ao limite da taxa legal acrescida das percentagens mencionadas, independentemente do acordado entre as partes.
Do ponto de vista fiscal, esta operação pode ficar sujeita quer a imposto do selo, quer a imposto sobre o rendimento.
O Código do Imposto do Selo determina (verba 17 da tabela geral do imposto de selo) que, quer a utilização do crédito quer o pagamento de juros, são operações sujeitas. Importa ter presente fatores como, tipo de sujeito passivo, valor e prazo para efeitos de liquidação do imposto.
Nas operações de crédito, o nascimento da obrigação tributária verifica-se quando forem realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês, conforme previsto na alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º do CIS.
Neste caso, tratando-se de um empréstimo da sociedade (não financeira) a terceiros (sócios e clientes, etc.), apenas a operação de concessão do crédito fica sujeita a imposto selo, sendo que a taxa a aplicar varia consoante o prazo definido para reembolso do empréstimo, pela verba 17.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.
O sujeito passivo de imposto do selo é o concedente do crédito, conforme a alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do Imposto do Selo (CIS), sendo deste a obrigação de efetuar a declaração, liquidação e entrega do imposto do selo ao Estado, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º e artigo 41.º, ambos do CIS.
Porém, o encargo do imposto do selo relacionado com operações de concessão de crédito é sempre do utilizador do crédito, conforme previsto na alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º do CIS, que no caso é o sócio-gerente. Desta forma, o valor do imposto do selo deve ser imputado ao utilizador do crédito, sob pena do encargo não ser fiscalmente aceite no âmbito da sociedade, conforme estabelecido na alínea f) do n.º 1 do artigo 23.º-A do CIRC.
Pela imputação do imposto do selo ao cliente, a sociedade emite uma fatura, com o respetivo registo contabilístico inverso ao referido acima.
Relativamente ao empréstimo, a taxa de imposto do selo é definida em função do período de vencimento do empréstimo, conforme decorre da verba 17.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo:
17.1.1 - Crédito de prazo inferior a um ano - por cada mês ou fração: 0,04 por cento
17.1.2 - Crédito de prazo igual ou superior a um ano: 0,50 por cento
17.1.3 - Crédito de prazo igual ou superior a cinco anos: 0,60 por cento
17.1.4 - Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30: 0,04 por cento.
De qualquer forma, os juros apenas estão sujeitos a imposto de selo, quando debitados por instituições de crédito ou outras entidades financeiras, o que não será o caso em questão.
A DMIS destina-se ao cumprimento da obrigação prevista no artigo 52.º-A do Código do Imposto do Selo (CIS) e deve ser apresentada pelos sujeitos passivos referidos no n.º 1 do artigo 2.º do CIS, ou seus representantes legais, que tenham realizado operações, atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstas na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), sobre os quais incida imposto do selo.
Esta declaração deve ser sempre apresentada pelos sujeitos passivos, quer estes tenham liquidado imposto, quer só tenham realizado operações isentas. Ou seja, só não existe obrigação de entrega da mesma se relativamente ao período de referência não tiver sido realizada nenhuma operação sujeita a imposto do selo.
Determina, assim, o n.º 1 do artigo 52.º-A do CIS, que os sujeitos passivos referidos no n.º 1 do artigo 2.º do CIS são obrigados a apresentar declaração discriminativa, por verba aplicável da TGIS, com os seguintes dados:
a) O valor tributável das operações e factos sujeitos a imposto do selo;
b) O valor do imposto liquidado, identificando os titulares do encargo;
c) As normas legais ao abrigo das quais foram reconhecidas isenções, identificando os respetivos beneficiários.
A DMIS deve ser entregue e, se aplicável, o correspondente imposto deve ser pago, até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que a obrigação tributária se tenha constituído (conforme prazos estabelecidos no n.º 2 do artigo 52.º-A e n.º 1 do artigo 44.º, ambos do CIS).
No caso exposto, se o valor total do empréstimo foi disponibilizado ao cliente numa só tranche, ocorrendo o reembolso do empréstimo ao final de uma data pré-determinada, apenas haverá lugar à entrega de uma DMIS, nomeadamente até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que o empréstimo foi disponibilizado ao sócio (utilizador do crédito) e liquidado Imposto do selo de acordo com a taxa 17.1.x (uma única vez, desde que o contrato de empréstimo se mantenha inalterado durante toda a sua vigência).
Apenas haveria lugar à entrega de uma DMIS mensal relativamente a esta operação se o empréstimo fosse disponibilizado na forma de conta corrente, caso em que seria de aplicar a verba 17.1.4.
As instruções de preenchimento da DMIS podem ser consultadas nesta ligação.
Neste caso, tratando-se de empréstimos entre sociedades que não detêm uma participação direta entre si, haverá sujeição a imposto do selo pelos empréstimos efetuados, não se expectando a possibilidade de aplicação de qualquer das isenções previstas no artigo 7.º do Código do Imposto do selo.
O imposto do selo deve ser entregue até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que a obrigação tributária se tenha constituído, nos termos previstos no artigo 5.º do CIS.

 

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