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Capitalização de gastos
24 August 2020
Capitalização de gastos
20-07-2020

A empresa "X”, sujeito passivo de IRC, tem por atividade a conceção, desenvolvimento e modificação de software, nomeadamente a programação e edição de videojogos para todas as plataformas, bem como aplicações móveis, websites, soluções em realidade virtual e aumentada; consultoria em equipamento, programas informáticos e outras tecnologias de informação; prestação de serviços diversos relacionados com as tecnologias de informação e informática; design de comunicação e marketing, assim como comercialização de qualquer dos bens ou atividades anteriormente referidas.
Atualmente a empresa encontra-se exclusivamente a desenvolver um jogo (já patenteado em seu nome) para venda em formato físico e online. A empresa detém o controlo integral sobre o mesmo.
No decurso do ano foram incorridos diversos gastos, os quais encontram-se registados nas respetivas rúbricas da classe 6, nomeadamente:
- Serviços prestados por terceiros (programação e outros serviços) contabilizados em FSE conta 62.
– Deslocações e estadas (gastos incorridos no estrangeiro nomeadamente alimentação, estadias, passagens aéreas) inerentes a formações obtidas no âmbito do desenvolvimento do jogo, contabilizados em FSE conta 62.
– Gastos com pessoal (remunerações, segurança social, seguro de acidentes de trabalho) exclusivamente relacionados com trabalhadores no âmbito do desenvolvimento do jogo, contabilizados na conta 63.
Atendendo a que todos os gastos acima referidos estão subjacentes ao desenvolvimento do jogo, podem os mesmos ser capitalizados e considerados ativo intangível em curso (conta 454). Que tipo de gastos podem ser capitalizados enquanto o jogo continuar em desenvolvimento?

Parecer técnico

A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico dos dispêndios incorridos com o desenvolvimento interno de um programa informático com o objetivo de o comercializar.
Se essa comercialização do software desenvolvido pela empresa determinar a cedência temporária de utilização a terceiros, através da venda de licenças de uso, mas mantendo a empresa os direitos de propriedade, o desenvolvimento interno do programa deve ser contabilizado como um ativo intangível nos termos da norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 6 – Ativos intangíveis.
Se o software desenvolvido internamente pela empresa for destinado à respetiva transmissão a título definitivo, existindo uma cedência dos direitos de propriedade do software, este deve ser contabilizado como um inventário nos termos da NCRF 18 – Inventários, quando esse desenvolvimento não tiver resultado de uma contratação específica de um cliente, ou como um contrato de construção nos termos da NCRF 19 – Contratos de construção, quando o desenvolvimento tiver sido encomendado especificamente por um cliente, conforme determina o parágrafo 3 a) da NCRF 6.
Caso se trate do desenvolvimento interno de um programa informático com o objetivo de efetuar a cedência temporária de licenças de utilização, os procedimentos contabilísticos podem ser os que se seguem.
Os ativos intangíveis referentes às despesas de investigação e desenvolvimento interno de produtos ou processos, para serem utilizados pela própria empresa ou para serem comercializados, devem ser entendidos como a criação de propriedade intelectual, ou seja, são itens sem substância física, mas que vão gerar benefícios económicos futuros para empresa, através do seu controlo.
Na prática, o que está aqui em causa, por exemplo, no que diz respeito ao desenvolvimento de software, é a possibilidade, de acordo com certos requisitos, de reconhecer como ativo todas as despesas com o desenvolvimento desses itens sem substância física, a partir do momento em que exista uma forte probabilidade deste vir a gerar benefícios económicos para entidade.
Este procedimento contabilístico apenas deve ser aplicado, quando esse recurso intangível, o capital intelectual, o know-how, ou seja, o conceito e trabalho efetuado no desenvolvimento do software permaneça na propriedade ou controlo da entidade, ainda que exista a comercialização do software, através da cedência temporária das respetivas licenças, mas mantendo-se os direitos de propriedade (copyrigths) na entidade.
Este controlo é sempre exercido, por exemplo, enquanto a entidade detiver os direitos de autor (copyrigths), mesmo que comercialize as licenças de software no mercado genérico. No fundo, nestas situações a empresa detentora desses direitos não está a vender o software, mas apenas a ceder temporariamente a sua utilização a terceiros, mantendo essa empresa o completo controlo pelo capital intelectual existente no produto.
Por essa cedência da utilização a terceiros da utilização do software, a empresa deve reconhecer réditos de royalties e não rédito de vendas, pois o ativo continua sempre na sua posse, apesar de existir a respetiva comercialização da utilização.
Essa comercialização da utilização do software tanto pode ser efetuada através de um suporte físico, como CD, DVD, "flash drives” ou outro suporte, ou através de downloads da Internet, sendo que no primeiro caso, juntamente com o reconhecimento do rédito do royalty da cedência, pode ser reconhecido o rédito de venda do suporte físico.
Por outro lado, este procedimento contabilístico de reconhecimento do ativo intangível referente às despesas com o desenvolvimento de software não deve ser aplicado quando esse software seja destinado especificamente para uma entidade em concreto, existindo a venda efetiva, transferência de propriedade ou controlo, do próprio software.
Normalmente, esta última situação acontece quando as empresas de software criam e desenvolvem programas específicos para serem utilizados exclusivamente pelo seu cliente. Nestes casos, os procedimentos contabilísticos a aplicar são os relacionados com a produção de inventários, ou eventualmente um contrato de construção celebrado com o cliente.
Tratando-se de um recurso intangível (software para comercializar as licenças, mantendo-se os direitos de autor), há que atender ao cumprimento da definição e dos critérios de reconhecimento de ativo intangível previsto na NCRF 6 – "Ativos intangíveis”, para verificar os custos incorridos com a investigação e desenvolvimento desse recurso intangível que podem ser reconhecidos como custo do ativo intangível, bem como aqueles que devem ser reconhecidos como gastos do período.
Há então que atender aos critérios estabelecidos para o reconhecimento de ativos intangíveis, neste caso, ativos gerados internamente (de produção pela própria entidade).

Reconhecimento de ativo intangível

Antes de verificar se algum item ou dispêndio cumpre os critérios de reconhecimento como ativo intangível, há a necessidade de verificar se estes cumprem essa definição, através da existência de três condições: identificabilidade, controlo e benefícios económicos futuros.
Um ativo intangível satisfaz a condição de identificabilidade quando este for separável do conjunto da entidade, de modo a que possa ser vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, ou então, quando este resultar de direitos contratuais ou legais separáveis da entidade.
Este software tem necessariamente que ser um item separado do valor intrínseco da entidade, sendo mensurado por um valor claramente independente do valor global da atividade da entidade. Este recurso intangível pode ainda ser vendido, alugado ou trocado em separado, sendo, portanto, um valor separável da entidade.
Uma entidade controla um ativo se tiver o poder de obter benefícios económicos futuros relacionados diretamente com esse ativo intangível, e possa restringir o acesso de terceiros a esses benefícios. Normalmente, esse poder advém de direitos legais que a empresa possua sobre esse ativo intangível (por exemplo, copyrights).
Neste caso, o referido software pode ser efetuado exclusivamente para a utilização da empresa em concreto, ou então ceder o uso desse recurso a terceiros, tendo essa entidade o direito legal sobre esses produtos ou processos (nomeadamente através do registo de propriedade industrial), restringindo o acesso a terceiros a esse ativo, podendo dizer-se que existe o controlo desse recurso intangível pela entidade.
Os benefícios económicos futuros relacionados com o ativo intangível podem incluir réditos da venda ou prestações de serviços, poupanças de custos ou outros benefícios resultantes do uso desse ativo pela entidade.
Neste caso, o cumprimento deste critério de reconhecimento também parece estar assegurado, uma vez que é fácil atribuir os benefícios económicos futuros exclusivos pela utilização deste recurso intangível na atividade da entidade que fluam para a entidade, sejam, pela poupança de custos pelo aperfeiçoamento de processos na entidade, ou pela obtenção de rendimentos (réditos) pela cedência do uso, através do recebimento de royalties.
Quanto ao reconhecimento, como critério geral de reconhecimento dos ativos intangíveis, a NCRF 6 estabelece que estes apenas devem ser reconhecidos como tal, quando seja provável que os benefícios económicos futuros relacionados diretamente com esse ativo intangível fluam para a entidade, e quando o custo desse ativo possa ser fiavelmente mensurado.
Para se poder verificar do cumprimento destes critérios de reconhecimento quanto aos itens ou dispêndios realizados pela entidade, há que atender às diferentes situações em que se pode estar perante um ativo intangível.
Em relação aos dispêndios relacionados com ativos gerados internamente, como é o caso do desenvolvimento do software pela própria empresa com o objetivo de exploração própria (ou cedência do uso a terceiros), para reconhecimento destes itens como ativos intangíveis há a necessidade do cumprimento de critérios específicos de reconhecimento, tendo em atenção a fase de pesquisa e a fase de desenvolvimento.
Os critérios de reconhecimento para ativos intangíveis gerados internamente são de difícil avaliação, uma vez que não é fácil distinguir um ativo intangível que venha a gerar benefícios económicos futuros de uma forma autónoma em relação aos restantes custos necessário ao desenvolvimento da empresa.
A mensuração do custo de um ativo intangível também pode não ser exatamente fiável, uma vez que não é fácil distinguir os custos incorridos para gerar internamente o ativo intangível, dos custos necessários ao decorrer operacional do dia-a-dia, ou mesmo dos custos para gerar e aumentar internamente o valor de goodwill (intrínseco) da empresa.
A empresa pode incorrer em custos para melhorar os benefícios económicos futuros da entidade, como por exemplo, o desenvolvimento próprio de um produto ou processo a ser vendido ou utilizado na atividade da empresa, mas tal não resulta necessariamente na criação de um ativo intangível, pois tais dispêndios podem não satisfazer os critérios de reconhecimento de um ativo intangível.
A NCRF 6 estabelece critérios de reconhecimento específicos para os dispêndios relativos a um ativo intangível gerado internamente, distinguindo entre as despesas relacionadas com a fase de pesquisa e as despesas relacionadas com a fase de desenvolvimento.
Apesar da NCRF 6 estabelecer conceitos concretos para os termos "pesquisa” e "desenvolvimento”, a fase de pesquisa e fase desenvolvimento deve ter um sentido mais amplo no que respeita à aplicação desta norma, conforme estabelecido no parágrafo 51 da NCRF 6.
Os conceitos pesquisa e desenvolvimento estão normalmente associados a investigação de caráter científico para aplicação em desenvolvimentos de processos produtivos ou na produção de novos produtos, conhecidas como despesas de I&D (investigação e desenvolvimento), mas para efeitos desta norma, as fases de pesquisa e desenvolvimento devem ser aplicadas para se verificar se algum item gerado internamente cumpre os critérios de reconhecimento como ativo intangível.
No caso concreto, deve aplicar-se estes conceitos ao desenvolvimento do software, cujo objetivo seja a exploração pela própria entidade ou por cedência do uso a terceiros.
A diferença entre estas duas fases (pesquisa e desenvolvimento) resulta das definições estabelecidas no parágrafo 8 da NCRF 6. Todavia, a separação objetiva destas duas fases pode não ser possível, ou claramente identificável, sendo que se tal acontecer, a empresa deve tratar todas as despesas (da pesquisa e do desenvolvimento) como despesas de pesquisa, conforme o disposto no parágrafo 51 da NCRF 6.
Os parágrafos 54 e 57 da NCRF 6 estabelecem alguns exemplos de despesas relacionadas com a fase de pesquisa e a fase de desenvolvimento:
Fase de pesquisa:
- Atividades visando a obtenção de novos conhecimentos;
- A procura de avaliação e seleção final de aplicações das descobertas de pesquisa ou de outros conhecimentos;
- A procura de alternativas para materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços; e
- A formulação, conceção, avaliação e seleção final de possíveis alternativas de materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou melhorados.
Fase de desenvolvimento:
- A conceção, construção e teste do programa informático e modelos de pré-produção ou de pré-uso;
- A conceção de ferramentas, utensílios, moldes e suportes envolvendo nova tecnologia;
- A conceção, construção e operação de uma fábrica piloto que não seja de uma escala económica exequível para produção comercial; e
- A conceção, construção e teste de uma alternativa escolhida para materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou melhorados.
O parágrafo 52 da NCRF 6 estabelece que as despesas relacionadas com a fase de pesquisa nunca devem ser reconhecidas como um ativo intangível, devendo ser sempre reconhecidas como um gasto incorrido no período, uma vez que nesse momento ainda não existe uma demonstração fiável de que essas despesas venham a originar um bem que gere benefícios económicos futuros, não cumprindo com um dos critérios de reconhecimento de ativo intangível.
Adequando estes conceitos ao caso em concreto, a fase de pesquisa no caso do desenvolvimento de software podem ser as atividades realizadas antes da decisão de se realizar, ou não, o projeto, nomeadamente atividades relacionadas com seleção dos processos tecnológicos a desenvolver, bem como da formulação da conceção da estrutura da produção e das respetivas alternativas.
O parágrafo 55 da NCRF 6 estabelece que as despesas relacionadas com a fase de desenvolvimento podem ser reconhecidas como um ativo intangível, se, e apenas se, a entidade puder demonstrar o cumprimento integral de todas as seguintes condições:
- A viabilidade técnica de concluir o ativo intangível a fim de que o mesmo esteja disponível para uso ou venda.
- A sua intenção de concluir o ativo intangível e usá-lo, licenciá-lo ou vendê-lo.
- A sua capacidade de usar, licenciar ou vender o ativo intangível.
- A forma como o ativo intangível gerará prováveis benefícios económicos futuros. Entre outras coisas, a entidade pode demonstrar a existência de um mercado para a produção do ativo intangível ou para o próprio ativo intangível ou, se for para ser usado internamente, a utilidade do ativo intangível.
- A disponibilidade de adequados recursos técnicos, financeiros e outros para concluir o desenvolvimento e usar ou vender o ativo intangível.
- A sua capacidade para mensurar fiavelmente o dispêndio atribuível ao ativo intangível durante a sua fase de desenvolvimento.
No caso do desenvolvimento do software, a fase do desenvolvimento é a aplicação, conceção e realização do referido projeto de produção.
O cumprimento integral destas condições pode levar a que seja mais fácil a demonstração de que esse ativo intangível pode vir a gerar benefícios económicos futuros, cumprindo com requisito primordial de reconhecimento com ativo intangível.
No entanto, se tal não for possível, as despesas incorridas na fase de desenvolvimento também têm que ser reconhecidas como um gasto incorrido no período.
A forma de demonstrar se essas despesas de desenvolvimento levam à criação de um ativo intangível que irá gerar benefícios económicos futuros pode passar por um plano e orçamento empresarial que demonstre os recursos técnicos, financeiros e outros necessários e a capacidade da entidade para assegurar esses recursos, bem como os aumentos de rendimentos diretamente associados à cedência de utilização do software a terceiros.
Quando for possível capitalizar essas despesas de desenvolvimento como um ativo intangível, o valor do custo desse ativo deve corresponder à soma de todos os dispêndios incorridos nessa fase, desde o momento em que o ativo passa a cumprir os requisitos mencionados em cima até o momento da sua conclusão, conforme estabelecido no parágrafo 63 da NCRF 6.
O custo do ativo intangível pode incluir materiais e serviços usados ou consumidos diretamente ao gerar o ativo intangível (software), nomeadamente:
- Mão-de-obra diretamente utilizada na produção de ativo;
- Custos com subcontratação de parte do trabalho de desenvolvimento do software;
- Taxas de registo do direito legal (registo de propriedade industrial) ou outras semelhantes;
- Honorários de prestadores de serviços;
- Depreciação de equipamentos utilizados na produção do ativo intangível;
- Materiais e serviços diversos a utilizar na produção do processo;
-E ainda, custos de empréstimos obtidos (juros e outros encargos), nos termos da NCRF 10.
Devem ser criados centros de custos ou utilizadas folhas de obras por cada produção para imputar todos os custos diretamente relacionados com essa produção.
As amortizações devem ser determinadas em função da respetiva vida útil estimada para o ativo intangível, sendo iniciadas a partir do momento em que o software esteja pronto para ser usado pela própria entidade ou para ser cedido o seu uso a terceiros.
Essa vida útil deve ser necessariamente curta no caso de desenvolvimento de processos informáticos, face à rápida evolução tecnológica no setor. Efetivamente, atendendo à possível necessidade de efetuar novas versões do software, a estimativa de vida útil deve ter em conta o tempo previsível de utilização desse ativo no âmbito da atividade da empresa. Este tipo de estimativas deve ser efetuado pelos engenheiros informáticos e pela gestão da empresa.
A estimativa da vida útil de ativos intangíveis pode ser alterada nos períodos seguintes se existirem novas informações ou novos acontecimentos que levem ao aumento ou diminuição desse período de vida útil.
Os registos contabilísticos podem ser:
Pela aquisição ou consumo dos materiais e serviços a aplicar diretamente na produção do processo tecnológico inovador:
- Débito da respetiva conta de gastos (31/43/61/62/63/64x – conforme a natureza do custo) por contrapartida conta de contas a pagar, conta de meios financeiros líquidos, consoante exista, ou não, diferimento do pagamento, depreciações acumuladas, etc. (incluindo os custos com os subcontratos e a mão-de-obra e outros custos internos);
Pelo reconhecimento do ativo intangível em curso (em produção):
- Débito da conta 454 – Ativos intangíveis em curso por contrapartida a crédito da conta 742 – Trabalhos para a própria entidade – Ativos intangíveis, pelo custo de produção do desenvolvimento do software (determinado de acordo com a folha de obra).
Quando o ativo intangível (software) estiver terminado e pronto a ser usado:
- Débito da conta 445x – Software – Produção própria – Produção X por contrapartida a crédito da conta 454 - Ativos intangíveis em curso, pelo custo total de produção do projeto.
Estes dois últimos registos apenas são de aplicar aos custos incorridos na fase de desenvolvimento, e a partir do momento, em que se estime com fiabilidade a viabilidade do software e de que venham a fluir benefícios económicos futuros pela respetiva utilização (ou cedência) desse recurso intangível.
Pelas amortizações do ativo intangível, durante a vida útil estimada:
- Débito da conta 643 – Gastos de depreciação e de amortização – ativo intangível por contrapartida a crédito da conta 448 – Amortizações acumuladas.
A comercialização das licenças implica o reconhecimento de rédito relacionado com royalties, nos termos do parágrafo 30b) da NCRF 20.
Em termos fiscais, como regra, as amortizações dos ativos intangíveis desenvolvidos internamente podem ser deduzidas fiscalmente em 3 anos, conforme decorre da aplicação da taxa de 33,33 por cento prevista no código 2470 da Tabela I – Taxas genéricas anexa ao Decreto-Regulamentar n.º 25/2009.
Caso essas despesas com o desenvolvimento do software possam ser consideradas como despesas com projetos de desenvolvimento, visando a exploração de resultados de trabalhos da investigação ou de outros conhecimentos científicos ou técnicos com vista à descoberta ou à melhoria substancial de matérias-primas, produtos, serviços ou processos de produção, essas despesas incorridas, ainda que contabilizadas como ativos intangíveis, podem ser deduzidas fiscalmente integralmente no período de tributação em que forem suportadas, conforme previsto no artigo 32.º do Código do IRC.

Classificação dos encargos

Quanto aos encargos suportados e incorridos com o desenvolvimento de um programa informático para uma terceira entidade, mediante um contrato de construção, há que atender aos procedimentos previstos na NCRF 19, conforme se explica de seguida.
Quando se esteja perante um contrato acordado para a construção de um ativo específico (por exemplo, programa informático), ou seja, quando o comprador conseguir especificar os principais elementos estruturais da conceção desse ativo antes ou no decorrer do início da construção e/ou especificar as principais alterações estruturais quando a construção estiver em curso (independentemente de ele exercer, ou não, essa capacidade), há que ter em conta que tal operação se enquadra no conceito de contrato de construção conforme as definições e os procedimentos da NCRF n.º 19 – Contratos de construção.
Se, no caso, em concreto, a entidade estiver a realizar o desenvolvimento de um programa informático para um determinado cliente, que tenha contratado previamente essa construção, tendo especificado à priori, à empresa construtora, as características principais e os elementos estruturais do programa informático, então esta entidade construtora não está produzir inventários, mas está a realizar um contrato de construção.
A NCRF 19 estabelece os procedimentos de reconhecimento do rédito e gastos de um contrato de construção em cada período contabilístico em que os trabalhos foram sendo realizados, atendendo à execução desse trabalho, normalmente conhecida como fase do acabamento.
Assim os procedimentos da NCRF 19 apenas devem ser aplicados quando a data em que a atividade do contrato é iniciada e a data em que a atividade é concluída ocorram em períodos contabilísticos diferentes, ou eventualmente, ocorram entre relatos intercalares (por exemplo, mensais).
Não faz sentido aplicar a NCRF 19, quando o início e o final da construção do ativo em causa ocorram no mesmo período, pois se tal acontecer todos os gastos e o rédito do contrato são contabilizados ao mesmo tempo no mesmo período, quando o ativo estiver pronto e for entregue ao cliente, tal como acontece nos procedimentos do reconhecimento do rédito previsto na NCRF 20. Se a entidade estiver a preparar relatos financeiros intercalares (p.e. mensais, trimestrais), o período de relato aqui deve ser entendido como o período utilizado no relato financeiro intercalar.
No caso em concreto, há que verificar se o desenvolvimento do programa informático tem as características de um contrato de construção nos termos da NCRF 19, ou se é considerada como um inventário, em que os riscos e vantagens da posse desse ativo em construção apenas sejam transferidos para os clientes no momento da venda do ativo (após a construção se ter finalizado).
Na prática, há que verificar se, para essa produção existe um cliente que tenha elaborado e/ou aprovado um plano e orçamento (caderno de encargos da produção) da construção do ativo, sendo que nesse caso pode estar-se perante um contrato de construção, nos termos da NCRF 19.
No caso do desenvolvimento do programa informático se enquadrar como contrato de construção nos termos da NCRF 19, e puder ser determinada com fiabilidade a fase de acabamento a essa data, há que proceder ao reconhecimento do rédito e de gastos com referência à fase de acabamento de um contrato de construção, que é referido como o método da percentagem de acabamento, conforme disposto no parágrafo 25 da NCRF 19.
Essa fase de acabamento (método da percentagem do acabamento) de um contrato de construção pode ser determinada de várias maneiras, tais como os indicados no parágrafo 30 da NCRF 19.
No entanto, o método usado mais habitualmente para determinar essa fase de acabamento será através da proporção dos custos do contrato incorridos no trabalho executado até à data face aos custos estimados totais do contrato. Definição que pode ser reduzida à seguinte fórmula:
% acabamento = Custos incorridos no período / Custos estimados totais da obra
Em termos de registos contabilísticos, os custos incorridos no contrato de construção têm um tratamento idêntico ao referido para a produção dos inventários.
Na prática, os custos incorridos no contrato de construção devem ser normalmente reconhecidos como gastos do período (utilizando as contas de acordo com as respetivas naturezas do gasto, à medida que forem sendo consumidos e utilizados no desenvolvimento do programa informático, conforme previsto no parágrafo 26 da NCRF 19.
O rédito do contrato de construção é reconhecido em função da referida percentagem de acabamento, conforme previsto no parágrafo 22 da NCRF 19.
O reconhecimento do rédito do contrato de construção (tal como o rédito da venda de inventários) não está dependente da emissão de faturas ou de recebimentos antecipados, conforme previsto na parte final do parágrafo 30 da NCRF 19.
Os registos contabilísticos do reconhecimento do rédito do contrato de construção podem ser:
Se a fatura for emitida apenas no final da construção:
Durante o período da construção:
Pelos custos incorridos e imputados à construção:
- Débito da conta 61/62/63/6x (dependendo da respetiva natureza dos encargos) por contrapartida a crédito da conta 12/2x/3x/4x8 (dependendo da operação), pelo custo de aquisição dos bens e/ou serviços, depreciações e outros.
Pelo reconhecimento do rédito do contrato de construção (no final do período de relato):
- Débito da conta 2721 – Devedores por acréscimos de rendimentos por contrapartida da conta 72 – Prestação de serviços, pelo rédito do contrato de construção determinado pelo método da percentagem de acabamento.
Pela emissão da fatura no momento da aceitação do programa informático pelo cliente:
- Débito da conta 21 – Clientes, pelo total do contrato de construção;
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 2721 – Devedores por acréscimos de rendimentos, pela anulação desta conta face ao rédito já reconhecido anteriormente;
(Incluir a liquidação do IVA, se for caso disso).
Pelo recebimento do cliente:
- Débito da conta 12 – Depósitos à ordem, pelo valor recebido restante;
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 21 – Clientes, pelo total do contrato de construção.