PT25278 – Herança indivisa
17-07-2020
Determinado empresário em nome individual, com atividade de construção civil e obras públicas, faleceu, tendo-se constituído uma herança indivisa. Verifica-se que esta não pode ter alvará, uma vez que não tem personalidade jurídica, segundo o IMPIC, e segundo o mesmo organismo não poderá exercer a atividade de prestação de serviço de mão-de-obra para outras empresas. Neste momento a empresa (herança indivisa) está impossibilitada de exercer a atividade, colocando-se a hipótese de os herdeiros quererem a sua parte da herança, ou venderem todo o património e cessarem a atividade.
Na hipótese de venda, terão que liquidar o IVA e as mais-valias serão imputadas a cada um dos herdeiros pela quota que lhes pertence, o que deverá ser refletido no final do ano na declaração de IRS, e respetivos anexos D e I.
Quanto à primeira hipótese, ou seja, a distribuição dos bens que estão na contabilidade, como é que se procede no mapa de amortizações? Os bens sairão pelo valor líquido que está no mapa de amortizações? Há liquidação de IVA?
Ocorreu o falecimento de um empresário em nome individual com a atividade de construção civil e obras públicas. A herança indivisa não poderá continuar a exercer a atividade por impossibilidade de obter o alvará junto do IMPIC, pelo que pretende proceder-se à cessação de atividade e partilha dos itens patrimoniais pelos herdeiros. Questiona sobre o procedimento a adotar nesta situação.
A herança indivisa é considerada, para efeitos de tributação, como uma situação de contitularidade. Desta forma, cada herdeiro será tributado relativamente à sua quota-parte dos rendimentos por ela gerados, atento o disposto no artigo 19.º e alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º, ambos do Código do IRS.
A imputação dos rendimentos aos herdeiros terá diferentes tratamentos conforme o tipo de rendimentos em análise.
Quando estamos perante rendimentos prediais (categoria F), mais-valias (categoria G), e rendimentos de pensões (categoria H) cada contitular englobará os rendimentos ilíquidos e as deduções legalmente permitidas, na proporção das respetivas quotas hereditárias – alínea b) do n.º 2 do artigo 22.° do Código do IRS. Isto é, cada um dos herdeiros incluirá na sua declaração de rendimentos modelo 3, o anexo correspondente ao tipo de rendimentos em análise e de acordo com a sua quota hereditária.
Quando os rendimentos obtidos pela herança indivisa resultam do exercício de atividades empresariais ou profissionais, então o cabeça de casal terá aqui um papel preponderante. Continua a ser aplicável a regra de que cada contitular englobará a parte do lucro tributável que lhe couber, na proporção da sua quota hereditária. No entanto, em termos declarativos, o procedimento é diferente das categorias de rendimento que anteriormente referimos.
Neste tipo de rendimentos, incumbe ao contitular a quem pertencer a administração da herança indivisa apresentar na sua declaração de rendimentos a totalidade dos elementos contabilísticos exigidos para determinação do rendimento líquido da categoria B, nela identificando os restantes contitulares e a parte que lhes couber (anexo I). Este procedimento é efetuado mediante apresentação de anexos próprios, em função de o estabelecimento estar no regime simplificado (anexo B) ou no regime normal de tributação (anexo C), que evidenciará os elementos necessários para a determinação do rendimento líquido, e de um outro anexo, onde serão identificados todos os contitulares e será feita a imputação não apenas do rendimento, mas também dos montantes dedutíveis (nomeadamente por retenções na fonte) a que tenham direito (n.º 3 do art.º 57.° do Código do IRS).
Conforme instruções de preenchimento do anexo I (quadro 8) «(…) na imputação dos rendimentos líquidos apurados de acordo com o regime simplificado (anexo B), será de considerar que os rendimentos respeitantes aos herdeiros são os obtidos depois da data do óbito. Se os rendimentos líquidos forem apurados no anexo C, a parte correspondente aos herdeiros determina-se em função do número de dias que decorreu desde a data do óbito até 31 de dezembro (…).»
Cada um dos herdeiros deverá preencher o anexo D onde incluirá os rendimentos imputados de acordo com a sua quota na herança.
Ou seja, o cabeça de casal ou administrador da herança entrega o anexo B ou o anexo C, conforme o regime de tributação em que a herança estiver enquadrada, o anexo I (neste indicando os diversos herdeiros e quotas hereditárias e também o anexo D (onde considera a imputação dos rendimentos da categoria B que lhe são imputáveis a ele enquanto herdeiro). Os restantes herdeiros entregarão apenas o anexo D, declarando assim os rendimentos da categoria B imputáveis pela herança.
Feito este enquadramento relativamente aos procedimentos gerais a adotar no âmbito das heranças, isto é, o modo como se apuram e declaram as diversas categorias de rendimentos, importa proceder à análise do caso em concreto.
No caso exposto a herança indivisa pretende proceder à cessação de atividade, pelo que importa determinar o destino dos itens patrimoniais que integram a herança indivisa, enquanto atividade empresarial. Considerando, de acordo com as informações disponibilizadas que se vai partilhar o património pelos herdeiros e no pressuposto de que estes não irão continuar a exercer uma atividade empresarial, tratar-se-á de uma operação equivalente à afetação de bens.
Isto é, para efeitos de IRS deverá ser considerado o disposto no n.º 3 do artigo 29.º do Código do IRS que dispõe: «(…) no caso de transferência para o património particular do sujeito passivo de bens afetos à sua atividade empresarial e profissional, o valor dos bens corresponde ao valor de mercado dos mesmos à data da transferência (…).»
Isto é, no apuramento do resultado tributável da herança indivisa, os bens deverão ser desreconhecidos pelo seu valor de mercado. As mais-valias ou menos-valias relativas a itens do ativo fixo tangível e o resultado tributável relativo a itens dos inventários serão apurados tendo em consideração um valor de realização equivalente ao seu valor de mercado.
No que se refere ao IVA, a operação de afetação será enquadrada na alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do IVA, ou seja, é equiparada a uma transmissão de bens para efeitos de IVA.
Resulta da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do IVA que:
«(…) 3 - Consideram-se ainda transmissões de bens, nos termos do n.º 1 deste artigo:
(…)
f) Ressalvado o disposto no artigo 26.º, a afetação permanente de bens da empresa, a uso próprio do seu titular, do pessoal, ou em geral a fins alheios à mesma, bem como a sua transmissão gratuita, quando, relativamente a esses bens ou aos elementos que os constituem, tenha havido dedução total ou parcial do imposto; (…).»
Ou seja, os itens cujo imposto suportado na aquisição foi dedutível serão agora, pela afetação ao património particular, operação equiparada a transmissão de bens, havendo assim lugar a liquidação de IVA.
Após afetação dos itens ao património particular da herança, esta deverá verificar se cumpre as condições para proceder à cessação de atividade.
Determina o artigo 114.º do Código do IRS, que se considera verificada a cessação da atividade quando:
- Deixem de praticar-se habitualmente atos relacionados com a atividade empresarial e profissional, se não houver imóveis afetos ao exercício da atividade;
- Termine a liquidação das existências e a venda dos equipamentos, se os imóveis afetos ao exercício da atividade pertencerem ao dono do estabelecimento;
- Se extinga o direito ao uso e fruição dos imóveis afetos ao exercício da atividade ou lhe seja dado outro destino, quando tais imóveis não pertençam ao sujeito passivo;
- Seja partilhada a herança indivisa de que o estabelecimento faça parte, mas sem prejuízo do disposto nas alíneas anteriores;
- Se dê a transferência, a qualquer título, da propriedade do estabelecimento.
Por sua vez, para a cessação de atividade em sede de IVA, importa atender ao disposto no n.º 1 do artigo 34.º do Código do IVA:
«(…) 1 - Para efeitos do disposto no artigo anterior, considera-se verificada a cessação da atividade exercida pelo sujeito passivo no momento em que ocorra qualquer dos seguintes factos:
a) Deixem de praticar-se atos relacionados com atividades determinantes da tributação durante um período de dois anos consecutivos, caso em que se presumem transmitidos, nos termos da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º, os bens a essa data existentes no ativo da empresa;
b) Se esgote o ativo da empresa, pela venda dos bens que o constituem ou pela sua afetação a uso próprio do titular, do pessoal ou, em geral, a fins alheios à mesma, bem como pela sua transmissão gratuita;
c) Seja partilhada a herança indivisa de que façam parte o estabelecimento ou os bens afetos ao exercício da atividade;
d) Se dê a transferência, a qualquer outro título, da propriedade do estabelecimento (…).»
Deste modo, desde que reunidas as condições previstas no artigo 114.º do Código do IRS e artigo 34.º do Código do IVA, pode ser considerada a cessação de atividade empresarial de uma herança indivisa, a qual em termos práticos, se concretiza com a entrega da declaração de cessação, no prazo previsto no n.º 3 do artigo 112.º do Código do IRS e artigo 33.º do Código do IVA, assinada unicamente pelo contitular a quem pertencer a administração da herança indivisa.
A partir do momento em que o património é transferido para a esfera particular da herança, o património será partilhado atendendo aos aspetos legais previstos para o efeito.