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Bicicleta elétrica
9 September 2020
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem
Bicicleta elétrica
05-08-2020

Uma empresa que adquira uma bicicleta elétrica, com 250 watts e velocidade assistida máxima de 25 quilómetros/hora, poderá deduzir o IVA?
Em termos de IRC, poderá ser aceite este gasto e haverá lugar a tributação autónoma?

Parecer técnico

As questões colocadas referem-se ao enquadramento fiscal da compra de uma bicicleta elétrica.

No caso concreto, equaciona-se a hipótese de uma empresa adquirir «uma bicicleta elétrica, com 250 watts e velocidade assistida máxima de 25 quilómetros/hora.» Pretende-se saber, neste sentido, o enquadramento em sede de IVA e de IRC desta operação.

Em sede de IVA, o mecanismo de dedutibilidade do imposto está previsto nos termos dos artigos 19.º e seguintes do CIVA.
A possibilidade de exercício do direito à dedução do imposto, suportado a montante da atividade desenvolvida pelo sujeito passivo, está consagrado no artigo 20.º do CIVA.

Nos termos do n.º 1 do mesmo, só confere direito à dedução o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de operações sujeitas a imposto e dele não isentas. Por conseguinte, todo o imposto que tenha onerado aquisições de bens e serviços utilizados na realização de operações tributáveis confere, em princípio, direito à dedução.

Todavia, além da limitação consagrada no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, há que atender ao disposto no artigo 21.º do CIVA, que estabelece limitações ao exercício do direito à dedução, derivadas da natureza dos bens e serviços adquiridos.

Deste modo, de acordo com a alínea a) do número 1 do artigo 21.º do CIVA, as despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação, à utilização, à transformação e reparação de viaturas de turismo, não conferem o direito à dedução.

No entanto, o número 2 do mesmo artigo 21.º do CIVA contempla exceções onde o IVA poderá ser passível de ser deduzido, entre as quais se salientam as alíneas f) e g).

Estas alíneas foram aditadas ao número 2 do artigo 21.º do CIVA na sequência da Reforma da Fiscalidade Verde, consagrada na Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro, que teve como objetivo motivar os contribuintes a adotarem práticas mais eficientes e sustentáveis.

Contudo, ambas as alíneas abrangem, apenas, as viaturas ligeiras de passageiros, quando consideradas viaturas de turismo, pelo que não poderá ser exercida a dedução do IVA da aquisição de uma bicicleta pelo simples facto de esta ser totalmente elétrica.

Apesar disto, podemos estar perante um veículo que, pelas suas características, seja passível de não ser sequer enquadrado na alínea a) do número 1 do artigo 21.º do CIVA.

Ora, de modo a verificarmos o enquadramento das bicicletas elétricas no seio rodoviário nacional, socorrer-nos-emos, agora, do artigo 112.º do Código da Estrada da ESNR (Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, na sua 23.ª versão, mais recentemente alterado pelo Decreto-Lei n.º 2/2020, de 14 de janeiro), que refere o seguinte:
«Artigo 112.º
Velocípedes
1 – Velocípede é o veículo com duas ou mais rodas acionado pelo esforço do próprio condutor por meio de pedais ou dispositivos análogos.
2 – Velocípede com motor é o velocípede equipado com motor auxiliar com potência máxima contínua de 0,25 kW, cuja alimentação é reduzida progressivamente com o aumento da velocidade e interrompida se atingir a velocidade de 25 km/h, ou antes, se o condutor deixar de pedalar.
3 – Para efeitos do presente Código, os velocípedes com motor, as trotinetas com motor, bem como os dispositivos de circulação com motor elétrico, autoequilibrados e automotores ou outros meios de circulação análogos com motor são equiparados a velocípedes.»
Quer isto dizer que, de acordo com o número 2, para estarmos perante um velocípede com motor (regra aplicável aos motores elétricos), basta que:
- O motor auxiliar tenha uma potência máxima contínua de 0,25 Kilowatts (kW); e
- A alimentação deste motor seja reduzida progressivamente com o aumento da velocidade e interrompida aos 25 quilómetros por hora (km/h), ou antes caso o condutor deixe de pedalar.

De modo a fazermos a conversão para kilowatts de watts, basta dividir o número de watts por mil, o que, no caso concreto, corresponde ao limite dos 0,25 kW (250/1000) imposto pelo número 1 do referido artigo 112.º, pelo que a primeira condição se encontra cumprida.

Em relação à segunda condição, uma vez que é referido que a velocidade máxima da bicicleta são 25 km/h, somos de opinião que esta se encontra igualmente cumprida, pois o limite de velocidade para alimentação do motor se encontra cumprido.

Aconselhamos, de todo o modo, a que seja averiguada esta segunda condição, ou seja, se o limite dos 25 km/h referido é, de facto, relativo à velocidade máxima, ou relativo ao limite de alimentação do motor.

A verificarem-se cumpridas estas duas condições, estaremos, de facto, perante um velocípede movido a energia elétrica, cujo direito à dedução suportado na aquisição não se encontra limitado pela alínea a) do número 1 do artigo 21.º do CIVA, aplicando-se apenas os requisitos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA.

Contudo, chamamos a atenção para o facto de que terá de existir conexão direta e inequívoca entre a utilização da referida bicicleta elétrica com o tipo de operações praticadas pelo sujeito passivo, só assim se verificando o requisito exigido no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA.

A confirmar-se esta conexão, desde que, como já referido, cumpridos os restantes requisitos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA, somos de opinião de que o IVA suportado na aquisição da bicicleta elétrica em causa será, de facto, dedutível.

Caso uma das condições não se encontre cumprida, o IVA suportado não será dedutível.

Este entendimento é corroborado pela informação vinculativa referente ao processo n.º 12 539, por despacho de 2017-10-25, da diretora de serviços do IVA, (por subdelegação), que poderá encontrar no seguinte link:
https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/informacoes_vinculativas/despesa/civa/Documents/INFORMACAO_12539.pdf

Aconselhamos, apesar do exposto, a que a questão seja colocada junto da AT, pois trata-se de um tema suscetível de diferentes interpretações, sobre o qual não existe muita doutrina.

Em sede de IRC, no tocante à aceitação fiscal, o número 1 do artigo 23.º do CIRC indica que «para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC».

Uma vez que não é referido o fim a que a bicicleta vai ser afeta, terá de ser analisada esta indispensabilidade, tendo esta análise terá de ser feita, quer pela colega quer pela administração da empresa.

Contudo, caso a viatura seja adquirida para, por exemplo, ser utilizada por um sócio-gerente ou por um administrador, refira-se que dificilmente se encontra cumprido este requisito, exceto, claro, se a bicicleta for utilizada no âmbito da atividade da empresa (por exemplo, deslocações do administrador ou do sócio-gerente para a realização de serviços externos).

Refira-se ainda que o número 2 do mesmo artigo 23.º contempla exemplos de despesas que, geralmente, são abrangidas pelo número anterior, tendo estas de estar documentalmente comprovadas (conforme o número 3) e conter os elementos constantes do número 4.

Em suma, para que os gastos relacionados com a bicicleta elétrica sejam aceites fiscalmente, podemos concluir o seguinte:
- O gasto ter sido incorrido na empresa para a obtenção de rendimentos sujeitos a IRC (n.º 1 do artigo 23.º do CIRC); e
- O gasto estar devidamente comprovado por fatura com todos os elementos identificativos da prova desse mesmo gasto (vide números 3 e 4 do artigo 23.º do CIRC).

No tocante à sujeição a tributação autónoma, refira-se que, por falta de menção no número 3 do artigo 88.º do CIRC, as despesas relativas à bicicleta elétrica não estarão sujeitas a tributação autónoma.