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Doação de inventários
21 January 2021
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem
Doação de inventários
15-01-2021

Determinada empresa de serviços de contabilidade que presta serviços de contabilidade apenas para empresas do grupo, recebeu uma doação de inventario de uma subsidiária para venda a colaboradores da própria empresa. 
Esta empresa não tem como CAE a venda de vendas, apenas a prestação de serviços. Como se trata de uma situação esporádica ou que possa ocorrer uma ou duas vezes ao ano, a gerência decidiu não alterar o CAE para as categorias de venda.
No momento da doação esta empresa registou o valor da mercadoria numa conta 32(Mercadorias) a débito por contrapartida de 594 (Doações) crédito.
No momento da venda aos colaboradores, foi emitida uma fatura com os seguintes postings: 211 -clientes consumidor final a débito, 7816 outros ganhos a crédito  e 2433 Iva liquidado a crédito.
Para desreconhecimento do inventario e reconhecimento do CMVMC teremos de considerar o lançamento na conta de 611 - CMVMC a débito e 32-Mercadorias a crédito.
Em relação ao valor reconhecido na conta de doações 594, este não deveria ser também desreconhecido com a venda? Faz sentido que o valor fique registado na conta 594 mesmo tendo a mercadoria a zero?


Na situação exposta a questão colocada é sobre o tratamento contabilístico da receção de bens a título gratuito.
A entidade em causa tem como atividade principal a prestação de serviços de contabilidade para um grupo de empresas. Recebe de uma das empresas bens a título gratuito, com a finalidade de os vender aos colaboradores.
Atendendo que no pedido de apreciação é referido que esta operação de venda de bens aos colaboradores pode ocorrer uma ou dua vezes ao ano, importa dar nota do seguinte:
No que se refere à inclusão de novo Código de Atividade Económica, refira-se que o CAE tem, sobretudo, relevância estatística, mas é frequentemente utilizado para efeitos fiscais para demonstrar as atividades efetivamente exercidas pelas entidades, nomeadamente para efeito de enquadramento fiscal em certos impostos (por exemplo, regimes de dedução do IVA ou acesso a benefícios fiscais). Por isso, é importante que o CAE esteja em linha com o objeto social e ambos sejam atualizados sempre que aplicável.
Em termos de pacto social, de acordo com o artigo 9.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), do contrato de qualquer tipo de sociedade devem constar entre outros:
a) Os nomes ou firmas de todos os sócios fundadores e os outros dados de identificação destes;
b) O tipo de sociedade;
c) A firma da sociedade;
d) O objeto da sociedade;
Por sua vez, o artigo 11.º do mesmo diploma refere no seu n.º 2 que como objeto da sociedade devem ser indicadas no contrato as atividades que os sócios propõem que a sociedade venha a exercer.
Perante tal enquadramento, querendo a empresa praticar operações que não estão definidas no objeto social da mesma, somos da opinião que deverá alterar o pacto social de forma a contemplar todas as atividades que a sociedade irá desenvolver não sendo relevante as atividades secundárias serem distintas da atividade principal exercida.
Em relação ao cadastro fiscal, somos de opinião que este deve estar devidamente atualizado com as atividades praticadas pelo sujeito passivo, pelo que deverá proceder à entrega da declaração de alterações.
Neste âmbito, o sujeito passivo deverá incluir todas as atividades exercidas, ainda que acessórias ou secundárias.
Ora, se o sujeito passivo em causa exerce diferentes atividades, deverá adequar os CAE às atividades desenvolvidas. Este pedido de atualização pode ser efetuado através da internet no portal das finanças (www.portaldasfinanças.gov.pt) ou presencialmente no serviço de finanças.
Relativamente ao tratamento contabilístico da obtenção gratuita de itens de inventário, somos do seguinte entendimento:
Esses itens de inventário são destinados a venda posterior a clientes (colaboradores), a classificar como mercadorias.
Para se proceder à respetiva contabilização, há que perceber se existe o estabelecimento de qualquer contrapartida associada a essa atribuição, ou seja, se se obriga a entidade a afetar esses bens doados a qualquer investimento específico ou, se os mesmos são destinados à utilização no decurso ordinário da atividade da entidade.
Nos termos dos parágrafos 52 a 58 e 81 da Estrutura Conceptual do SNC, existe uma relação direta entre um dispêndio e o reconhecimento de um ativo, pois tal constitui prova que benefícios económicos foram procurados com esses dispêndios. Todavia, tal não é prova suficiente de que se deve reconhecer um ativo, pois para além disso deve cumprir as restantes definições e critérios de reconhecimento como tal.
Da mesma forma, a não existência de um dispêndio com a aquisição de um item não significa que este não cumpra a definição de ativo, e não possa ser candidato a reconhecimento como tal. Estas situações são por exemplo a obtenção de ativos através de doações ou outras operações gratuitas, conforme previsto no parágrafo 58 da Estrutura Conceptual.
Se os bens doados forem destinados para utilização no decurso ordinário da atividade da entidade, com classificação como inventário, a sua atribuição pode ser classificada por contrapartida do reconhecimento de rendimento nos resultados do período, na conta 78 - "Outros rendimentos".
Se os bens doados forem destinados à atividade de investimento, por exemplo como um item do ativo fixo tangível, essa atribuição pode ser classificada como um ganho diretamente em capitais próprios, na conta 594 - "Doações".
Tratando de bens doados com destino a serem utilizados na atividade administrativa ou operacional, ou para a execução da prestação de serviços, esses bens devem ser reconhecidos como itens do ativo fixo tangível, nos termos da Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 7 - "Ativos fixos tangíveis".
Tratando de bens doados com destino a serem utilizados no decurso ordinário da atividade da entidade, estes devem ser classificados como inventários, nos termos da NCRF 18 - "Inventários"
No caso em concreto, como a entidade irá utilizar os bens obtidos a título gratuito para serem vendidos no decurso ordinário da atividade pelo que, estes devem ser reconhecidos como itens do inventário nos termos da NCRF 18 por contrapartida nos resultados do período.
Em termos de mensuração, de acordo com o parágrafo 9 da NCRF 18, os bens do inventário devem ser mensurados pelo custo ou valor realizável líquido, dos dois o mais baixo.
Como esses bens são atribuídos a título gratuito, não existe um custo de aquisição para esses itens, pelo que podem ser mensurados pelo custo corrente (preço de custo de mercado para os mesmos bens).
Essa quantia escriturada passa a constituir o custo para efeitos de mensuração do item. O registo contabilístico pode ser:
Pela obtenção a título gratuito, dos itens de inventário destinados a ser vendidos no decurso ordinário da atividade da empresa:
- Débito da conta 382 - "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Mercadorias" por contrapartida a crédito da conta 784 - "Ganhos em inventários", pelo custo corrente dos bens.
Pelo reconhecimento como itens do inventário:
- Débito da conta 32 - "Mercadorias" por contrapartida a crédito da conta 382 - "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Mercadorias", pelo custo corrente dos bens.
Alternativamente, os bens de inventário obtidos gratuitamente podem ser registados meramente no programa de gestão de stocks, sem qualquer reconhecimento contabilístico como ativo.
Nesse caso, o registo dos bens adquiridos a título gratuito é efetuado a zero, no programa de gestão de stocks, influenciando (diminuindo) o custo unitário de todos os bens de inventário, pela aplicação da fórmula de custeio do custo médio ponderado.
Com este procedimento, não há reconhecimento de qualquer rendimento no momento da aquisição a título gratuito desses bens, sendo o rendimento obtido pela doação apenas reconhecido no momento da venda dos bens, em função da diminuição do custo das vendas dos inventários vendidos.