Contabilização do FCT e FGCT
Ao longo de vários meses uma microempresa não pagou a guia do fundo de compensação do trabalho (FCT) e do fundo de garantia de compensação do trabalho (FGCT), chegando ao final do ano com vários meses em dívida. Como contabilizar estas operações? Contabiliza-se o FCT na conta 414, o FGCT na conta 635, os juros e as despesas administrativas na conta 68, tudo por contrapartida da conta 248, ficando nesta conta o valor em dívida? Sendo o FCT um fundo, ao assumir-se esta contabilização está-se a assumir que existiram entradas para esse fundo quando, na realidade, não existiram…
A questão colocada relaciona-se com a contabilização de dividas ao fundo de compensação de trabalho, pelas entidades empregadoras.
A Lei n.º 70/2013, de 30 de agosto, atualizada pelo Decreto-Lei n.º 210/2015, de 25 de setembro, estabelece os regimes jurídicos do fundo de compensação do trabalho (FCT), do mecanismo equivalente (ME) e do fundo de garantia de compensação do trabalho (FGCT).
O FCT e o FGCT são fundos destinados a assegurar o direito dos trabalhadores ao recebimento efetivo de metade do valor da compensação devida por cessação do contrato de trabalho, calculada nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, conforme refere o artigo 3.º daquela Lei.
O FCT e o FGCT são fundos de adesão individual e obrigatória, pelo empregador, podendo o FCT ser substituído pela adesão a ME (desde que concedida garantia idêntica ao trabalhador), que terá de ser constituído junto de instituições sujeitas a supervisão do Banco de Portugal ou do Instituto de Seguros de Portugal.
O FCT, também de acordo com o artigo 3.º, é um fundo de capitalização individual, que visa garantir o pagamento até metade do valor da compensação devida por cessação do contrato de trabalho, calculada nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, e que responde até ao limite dos montantes entregues pelo empregador e eventual valorização positiva.
O FGCT é um fundo de natureza mutualista, que visa garantir o valor necessário à cobertura de metade do valor da compensação devida por cessação do contrato de trabalho calculada nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, subtraído do montante já pago pelo empregador ao trabalhador.
O empregador é obrigado a aderir ao FCT (ou ME) o que determina a adesão automática ao FGCT, relativamente aos contratos de trabalho que se iniciem após a data de entrada em vigor desta Lei, ou seja, 1 de outubro de 2013, conforme seu artigo 61.º, n.º 1.
As entregas são da responsabilidade do empregador (isto é, não são deduzidas ao rendimento dos trabalhadores), pagas 12 vezes por ano, entregues mensalmente nos prazos previstos para o pagamento de contribuições e quotizações à Segurança Social, correspondendo a um por cento da retribuição base e diuturnidades devidas a cada trabalhador abrangido, com a seguinte partição:
- As entregas para o FCT correspondem a 0,925 por cento da retribuição, por cada trabalhador;
- As entregas para o FGCT correspondem a 0,075 por cento da retribuição base e diuturnidades devidas a cada trabalhador abrangido pelo FCT ou ME.
Falamos, por isso, de duas contribuições que totalizam um por cento, mas referentes a fundos distintos, pelo que a contabilização de cada uma das contribuições terá de ser efetuada em separado e de acordo com as características de cada um dos fundos.
De acordo com o artigo 57.º desta Lei, que contém as referências às disposições aplicáveis a estes fundos, as entregas efetuadas ao FGCT são consideradas gasto fiscal, nos termos da alínea d) n.º 1 artigo 23.º do CIRC, no período em que são efetuadas.
As entregas para o FCT, dadas as características deste fundo, não revestem a natureza de gasto da entidade contribuidora, pelo que, sendo reconhecidas como tal, de acordo com o n.º 4 do mesmo artigo 57.º, o reembolso à entidade empregadora do saldo da conta de registo individualizado do trabalhador é considerado rendimento para efeitos fiscais, pelo montante correspondente à valorização positiva gerada pelas aplicações financeiras dos valores afetos ao FCT, deduzido das respetivas despesas administrativas.
Para mais informações sobre o regime jurídico do FCT e do FGCT aconselhamos a consulta de um jurista que poderá consultar o próprio site dos fundos de compensação: www.fundoscompensacao.pt.
No que se refere à contabilização das contribuições efetuadas ao abrigo desta norma legal, bem como dos rendimentos/gastos e/ou ativos gerados, a Comissão de Normalização Contabilística (CNC) divulgou qual o procedimento que poderia ser seguido, em resposta às questões que lhe foram colocadas neste âmbito. A contabilização poderá, por isso, seguir o indicado naquela resposta (FAQ 28, divulgada no sítio da CNC) que transcrevemos abaixo:
«Pergunta 28: Como deve ser efetuado o tratamento a nível do reconhecimento, mensuração e registo contabilístico das contribuições para o fundo de compensação do trabalho (FCT) e para o fundo de garantia de compensação do trabalho (FGCT), cujos regimes jurídicos foram estabelecidos pela Lei n.º 70/2013, de 30 de agosto?
Resposta: A CNC entende que relativamente às entidades que apliquem o regime geral consignado no SNC:
1. As entregas mensais para o FCT, efetuadas pela entidade empregadora, devem ser reconhecidas como um ativo financeiro dessa entidade, mensurado pelo justo valor, com as respetivas variações reconhecidas em resultados, considerando-se que o valor das unidades de participação divulgado pela entidade gestora do fundo poderá ser um referencial prático para o efeito.
2. O registo contabilístico do ativo financeiro referido em 1 será feito numa subconta adequada da conta 415 – Outros investimentos financeiros.
3. As variações de justo valor devem ser registadas na conta 772 – Ganhos por aumentos de justo valor - Em investimentos financeiros ou na conta 662 – Perdas por reduções de justo valor - Em investimentos financeiros.
4. Haverá lugar ao reconhecimento de impostos diferidos, uma vez que a quantia da eventual valorização gerada pelas aplicações financeiras dos valores do FCT será considerada rendimento para efeitos tributários no momento do reembolso à entidade empregadora.
5. As entregas mensais para o FGCT, efetuadas pela entidade empregadora, devem ser reconhecidas como gasto do período a que respeitam, utilizando-se, para o efeito, uma subconta apropriada da conta 635 – Gastos com o pessoal - Encargos sobre remunerações, com o título "Fundo de garantia de compensação do trabalho.”
Relativamente às entidades que apliquem a norma das pequenas entidades ou das microentidades previstas no SNC:
6. As entregas mensais para o FCT, efetuadas pela entidade empregadora, devem ser reconhecidas como um ativo financeiro dessa entidade, mensurado ao custo.
7. O registo contabilístico do ativo financeiro referido em 6 será feito na conta 41 – Investimentos financeiros.
8. A eventual valorização gerada pelas aplicações financeiras dos valores do FCT será reconhecida como rendimento na data em que ocorrer o reembolso à entidade empregadora.
9. As entregas mensais para o FGCT seguem o referido no ponto 5.
(Revista pelo CNCE em 15 de fevereiro de 2017).»
O reembolso do FCT deverá ser reconhecido a débito da conta 12 – Depósitos à ordem, por contrapartida a crédito da conta 41x (investimento financeiro) que seja aplicável.
No caso de entidades que apliquem a norma das pequenas entidades ou das microentidades, conforme já foi referido, aquando do reembolso deve ser reconhecido o respetivo rendimento associado à valorização do fundo.
O justo valor poderá ser verificado no portal dos Fundos de Compensação, através do seguinte acesso: http://www.fundoscompensacao.pt/inicio.
Por sua vez, se a entidade não estiver a cumprir com o pagamento destas contribuições, que é a situações expostas pela colega, esta deve ainda assim refletir contabilisticamente essa obrigação, através do procedimento contabilístico acima referido, sendo de reconhecer o valor em divida ao FCT e ao FGCT na conta #248 – Outras tributações, tal como refere a colega.
Adicionalmente, quanto à questão do incumprimento do pagamento, nas FAQ disponíveis no sítio referido, podemos encontrar a seguinte informação:
«Incumprimento
O que acontece se a entidade empregadora não realizar as entregas?
A entidade empregadora aderente do FCT que não realize a entrega mensal ao FCT até ao dia 20 de cada mês entra em incumprimento, facto que constitui contraordenação muito grave.
O valor em falta não é sujeito a capitalização durante esse período.
A entidade empregadora é notificada para proceder à regularização dos pagamentos em falta, o que se não vier a ser realizado de forma voluntária dará lugar à respetiva cobrança coerciva.
O incumprimento da obrigação de entrega é comunicado à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) com vista à eventual realização de ação inspetiva e aplicação de coimas.
São debitados juros, devidos desde o dia 20 do mês a que a entrega diz respeito até ao momento da liquidação efetiva dos valores em dívida.
São igualmente debitadas na conta global da entidade empregadora as despesas inerentes ao procedimento de regularização (ou seja, incrementará o valor do pagamento seguinte).»
A taxa de juro de mora a aplicar no âmbito das dívidas ao FCT usa como referência a taxa de juro em vigor no momento em que a dívida se vence, nos termos do parágrafo 4.º do artigo 102.º do Código Comercial (juro comercial).
As despesas de regularização destinam-se à cobertura dos custos administrativos adicionais que o incumprimento por parte dos empregadores acarreta à entidade gestora.
Nos termos definidos no regulamento de gestão do fundo, o valor é fixo e corresponde atualmente a 50 cêntimos por cada mês de incumprimento. As despesas são cobradas por empregador, independentemente do número de trabalhadores a que a situação de incumprimento se reporta.
O valor das despesas associadas ao incumprimento consta do documento para pagamento seguinte e é pago em conjunto com as entregas e juros de mora neles incluídos.
Para solicitar o pagamento em prestações deverá efetuar um pedido por email (igfcss.fct@seg-social.pt) dirigido ao Presidente do Conselho de Gestão do FCT e FGCT.