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Valorização de inventários
9 July 2021
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem
Valorização de inventários
01-07-2021

Um cliente de um contabilista tem uma empresa de venda de automóveis, bem como de peças e artigos para veículos. Quer as viaturas usadas, quer os artigos e peças estão registados como mercadorias.
Numa das viaturas para venda, usada, pretende substituir os pneus da mesma por um outro conjunto, de melhor qualidade e gama, valorizando a viatura. Esse novo kit de pneus que pretende instalar faz parte do seu stock de artigos e peças para vendas (ou seja, estes pneus estavam registados como mercadorias suas pois destinavam-se a venda ao público). Quais os lançamentos contabilísticos a efetuar caso proceda efetivamente ao upgrade da viatura com a instalação do kit de pneus atualmente registados em inventário? O objetivo é também depois vender a viatura (aliás, o objetivo é precisamente valorizar para venda).

O caso em concreto refere-se ao tratamento contabilístico da aquisição de viaturas destinadas a revenda, classificadas como inventários, que podem ser objeto de pequenas reparações e adaptações.
No caso em concreto, a entidade, que exerce a atividade de compra e venda de viaturas e de peças para automóveis, pretende colocar um novo kit de pneus na viatura.
O tratamento contabilístico dos inventários está previsto na Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 18 "Inventários”.
Em termos de conceito, as mercadorias são bens adquiridos pela empresa com destino a venda, sem que sejam objeto de qualquer transformação substancial.
Por outro lado, as matérias-primas (matérias subsidiárias e de consumo) são bens adquiridos pela empresa que se destinam a ser incorporados no processo de produção, com o objetivo de obter produtos finais ou na realização de prestações de serviços.
Os produtos acabados são os bens provenientes do processo produtivo da empresa, para serem objeto de venda.
Os produtos intermédios são bens provenientes do processo produtivo da empresa, mas destinados a serem usados em processos produtivos subsequentes.
Os subprodutos são bens provenientes do processo produtivo da empresa, diversos dos produtos acabados, que normalmente não tem valor comercial, ainda que possam ser vendidos.
Os bens adquiridos com o objetivo de integrarem o processo produtivo, que implique uma transformação substancial, devem ser classificados como "matérias-primas”, quando sejam o principal elemento constituinte dos produtos a produzir, ou como matérias subsidiárias ou de consumo, quando forem materiais para incorporar na produção ou na realização de prestações de serviços, com o registo inicial na conta 312 – "Compras - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo”.
O registo inicial na conta de matérias-primas deve ser efetuado pelo respetivo custo de aquisição, podendo incluir todos os custos diretamente suportados com essa aquisição.
Pela entrada desses materiais em armazém, há que proceder ao reconhecimento do inventário, conforme se segue:
- Débito da conta 33 – "Matérias-primas, subsidiárias e de consumo” por contrapartida a crédito da conta 312 - "Compras - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo”, pelo custo de aquisição.
Quando essas matérias-primas ou materiais de consumo entrarem em produção ou na realização da prestação de serviços, o custo dessas matérias-primas e outros materiais deve ser imputado ao custo de produção, em função das respetivas quantidades consumidas.
O registo contabilístico do consumo desses materiais pode ser:
- Débito da conta 612 – "Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas – Matérias-primas, subsidiárias e de consumo” por contrapartida a crédito da conta 33 – "Matérias-primas, subsidiárias e de consumo”, pelo custo dos inventários determinado pela fórmula de custeio utilizada pela entidade (custo específico, custo médio ponderado ou FIFO).
No caso dos bens adquiridos serem destinados a venda sem transformação substancial, os registos contabilísticos podem ser:
Pela aquisição dos bens destinados a revenda:
- Débito da conta 311 – "Compras – Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 22 – "Fornecedores” (ou conta 12 – Depósitos à ordem”), pelo custo de aquisição do bem.
Pelo reconhecimento do bem como inventário:
- Débito da conta 32 – "Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 311 – "Compras – Mercadorias, pelo custo de aquisição do bem, incluindo os custos incorridos com os pequenos ajustes e reparações.
No momento da venda, pelo rédito de vendas:
- Débito da conta 21 – "Clientes” por contrapartida a crédito da conta 711 – "Vendas – Mercadorias”, pelo preço de venda do bem;
Pelo gasto de vendas:
- Débito da conta 611 – "Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas – Mercadorias” por contrapartida da conta 32 – "Mercadorias”, pelo custo do bem (de acordo com a fórmula de custeio utilizada).
Em termos contabilísticos, os bens destinados a serem vendidos no decurso da atividade normal da empresa, que, normalmente, se prevê de curto prazo, ou para serem objeto de consumo na realização de produção ou de prestação de serviços, são classificados como inventários, nos termos do parágrafo 6 da NCRF 18.
Se o bem, classificado como inventário, tiver como objetivo a venda no estado em que for adquirido, este é registados na conta 32 – "Mercadorias”.
A venda no estado em que está, não significa que não se possam efetuar pequenas intervenções (reparações e melhorias), para colocar o bem nas condições necessárias para o colocar à venda.
De acordo com o parágrafo 10 da NCRF 18, a mensuração dos inventários pelo custo, pode incluir os custos de compra, como o preço de aquisição e impostos e outros suportados na aquisição, e ainda, outros custos incorridos para colocar o bem no seu local e na sua condição atual.
Estes outros custos podem ser estas pequenas reparações ou melhorias para ser possível efetuar a venda ao cliente em questão.
O valor destas pequenas reparações subcontratadas ou realizadas pela própria entidade e os materiais adquiridos podem ser incluídos no custo do inventário, no valor contabilizado na conta 32 – "Mercadorias”.
Apenas se deve classificar o bem como matérias-primas ou de consumo, quando faça parte integrante na execução de um produto acabado (conta 34) ou da realização duma prestação de serviços.
No caso em concreto, se o bem não é objeto de qualquer transformação substancial, sem prejuízo da necessidade de se efetuar alguns ajustes ou reparações para adaptação às necessidades do cliente, este é classificado como mercadorias e vendido como tal.
Os registos contabilísticos podem ser:
Pela aquisição de peças, materiais e serviços a terceiros, a serem incorporados no custo do inventário, classificado como mercadorias:
- Débito da conta 311 – "Compras – Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 22 – "Fornecedores”, pelo custo de aquisição.
De seguida, ou no final do período (dependendo se está adotar sistema de inventário permanente ou intermitente), efetua-se a transferência da conta de compras 311 para a conta 32 de mercadorias.
Pela imputação de peças e outros materiais, já adquiridos anteriormente, destinados a ser utilizados na reparação de viaturas, e que estão no stock (inventários, classificados como materiais para consumo na prestação de serviços), procede-se à reclassificação do custo dessas peças de materiais para mercadorias:
- Débito da conta 383 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo” por contrapartida a crédito da conta 33 – "Matérias-primas, subsidiárias e de consumo”, pelo custo das peças (em função da fórmula de custeio utilizada);
Pela imputação do custo das peças ao custo da viatura, classificada como mercadorias:
- Débito da conta 32 – "Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 382 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Mercadorias”, pelo custo das peças (em função da fórmula de custeio utilizada).
Pela anulação das contas de reclassificações de inventários:
- Débito da conta 382 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos – Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 383 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo”, pelo custo das peças (em função da fórmula de custeio utilizada).
Pela imputação de mão-de-obra utilizada nas reparações e melhorias:
- Débito da conta 32 – "Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 382 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Mercadorias”, pelo custo da mão-de-obra (de acordo com a folha de obra).
Pelo desreconhecimento dos gastos com o pessoal, referente à mão-de-obra imputada ao custo dos inventários:
- Débito da conta 382 – "Reclassificação e regularização de inventários e ativos biológicos - Mercadorias” por contrapartida a crédito da conta 63x – "Gastos com o pessoal”, pelo custo da mão-de-obra (de acordo com a folha de obra).
No caso em concreto, para se efetuar a imputação dos gastos com pessoal, referente à mão-de-obra, no custo das viaturas, classificadas como mercadorias, não pode ser utilizada a conta 74 – "Trabalhos para a própria entidade”, pois essa conta apenas é utilizada na construção própria de ativos não correntes, nem pode ser utilizada a conta 73 – "Variação dos inventários de produção”, pois essa conta apenas é utilizada para a produção própria de produtos acabados, e não para mercadorias.
Estando perante a imputação de custos de atividade própria da empresa ao custo das mercadorias, sugerimos efetuar essa imputação através do crédito da respetiva conta de gastos (conta 63), onde foram reconhecidos os gastos no processamento de salários.
Face ao exposto, no caso em concreto, tratando-se de reparações necessárias para colocar a viatura automóvel no seu local e condições atuais de venda, conforme previsto no paragrafo 15 da NCRF 18, quer a reparação seja interna ou contratada a terceiros, deverá ser capitalizada no custo do inventário refletido na classe 3.
Relativamente aos gastos subsequentes, tais como: o imposto único de circulação, inspeção das viaturas e combustível, entendemos que, estes gastos subsequentes à compra devem ser registados em contas apropriadas da classe 6, de acordo com a natureza do encargo, por contrapartida da conta meios monetários ou de terceiros.
Contudo, sem prejuízo do acima disposto, note que se a entidade aplicar o Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão (DL n.º 199/96 - 18/10) na venda das viaturas, as despesas de reparação, manutenção ou outras prestações de serviços respeitantes aos bens sujeitos ao regime especial de tributação da margem não são incluídas no preço de compra para efeitos de cálculo da margem, apesar de o imposto que tenha onerado estas reparações ser dedutível (independentemente de reparar a viatura internamente em oficina própria ou recorrer a terceiros), nos termos gerais do CIVA (n.º 2 do artigo 5.º do Regime Especial Bens em 2.ª Mão).
Ou seja, no preço de compra para efeitos do IVA a liquidar no âmbito do Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, apenas se poderá incluir o valor pago ao fornecedor como contraprestação pela aquisição do bem. Não são incluídas quaisquer despesas associadas à aquisição (estadias, alimentação, portagens, combustíveis,), nem o ISV.
Desta forma, quando se verificar a revendas destas viaturas haverá que efetuar um cálculo de acordo com as regras contabilísticas para o apuramento do CMVMC, e um cálculo autónomo para aferir a base do IVA de cada operação, de acordo com o Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão.