Residente não habitual
Determinado contribuinte viveu na Suíça durante mais de 10 anos. Ao regressar, em 2020, pediu e foi-lhe atribuída a condição de residente não habitual. Recebeu indemnização pela saída da Suíça, na totalidade e o cônjuge ficará a receber durante alguns anos a mesma indemnização, mas distribuída por prestações mensais. Não auferem qualquer rendimento em Portugal.
Esses valores - embora isentos - deverão constar no anexo J da modelo 3 de IRS, mas a situação de «residente não habitual» é aferida automaticamente pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) ou há necessidade de mencionar essa situação em algum dos campos da declaração modelo 3 de IRS?
A questão colocada refere-se às obrigações fiscais inerentes a um contribuinte com estatuto de residente não habitual.
O Código Fiscal do Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/2009, de 23 de setembro, criou o regime fiscal para o residente não habitual em sede de IRS, tendo em vista atrair para Portugal profissionais não residentes qualificados em atividades de elevado valor acrescentado ou da propriedade intelectual, industrial ou know-how, bem como beneficiários de pensões obtidas no estrangeiro.
Tendo obtido o estatuto de residente não habitual, o sujeito passivo adquire o direito a ser tributado em IRS como residente não habitual, pelo período de 10 anos consecutivos, renováveis, com a respetiva inscrição dessa qualidade para efeitos cadastrais no registo de contribuintes da Autoridade Tributaria (n.º 9 do artigo 16.º do Código do IRS).
O gozo do direito a ser tributado como residente não habitual em cada ano do período referido requer que o sujeito passivo seja considerado residente em Portugal para efeitos do IRS (n.º 11 do artigo 16.º) podendo, no entanto, caso não tenha gozado daquele direito num ou mais anos do período, retomar o gozo do mesmo em qualquer dos anos em falta para terminar os 10 anos, contando que nele volte a ser considerado residente para efeitos de IRS (n.º 12 do artigo 16.º).
Trata-se, pois, de um direito que o sujeito passivo adquire que não é obrigatório podendo o mesmo, caso o entenda e nada faça, ser tributado como residente, nos termos gerais.
O regime de tributação aplicável aos sujeitos passivos residentes não habituais caracteriza-se por:
- Não englobamento, para efeitos da sua tributação, salvo opção dos respetivos titulares, dos rendimentos líquidos das categorias A e B auferidos em território nacional em atividades de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico (n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS). Tais rendimentos serão sujeitos a tributação através de uma taxa especial de 20 por cento.
- Opção pela aplicação do método da isenção relativamente aos rendimentos obtidos no estrangeiro das categorias E, F, G e da categoria B em atividades de prestação de serviços de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico, ou provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, desde que, alternativamente (conforme n.º 5 do artigo 81.º):
- Caso exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com o Estado da fonte, tais rendimentos possam ser tributados neste Estado;
- Caso não exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com o Estado da fonte, tais rendimentos possam ser tributados no outro país, território ou região, em conformidade com o modelo de convenção fiscal sobre o rendimento e o património da OCDE, interpretado de acordo com as observações e reservas formuladas por Portugal, desde que aqueles não constem de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, relativa a regimes de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis e, bem assim, desde que os rendimentos, pelos critérios previstos no artigo 18.º, não sejam de considerar obtidos em território português.
- Opção pela aplicação do método de isenção relativamente aos rendimentos obtidos no estrangeiro da categoria A, quando:
- Sejam tributados no outro Estado contratante, em conformidade com convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com esse Estado; ou
- Sejam tributados no outro país, território ou região, nos casos em que não exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, desde que os rendimentos, pelos critérios previstos no n.º 1 do artigo 18.º, não sejam de considerar obtidos em território português
- Opção pela aplicação do método da isenção relativamente aos rendimentos obtidos no estrangeiro da categoria H, na parte em que os mesmos, quando tenham origem em contribuições, não tenham gerado uma dedução para efeitos do n.º 2 do artigo 25.º, desde que, se verifique qualquer das condições seguintes:
- Sejam tributados no outro Estado contratante, em conformidade com convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com esse Estado; ou
- Pelos critérios previstos no n.º 1 do artigo 18.º, não sejam de considerar obtidos em território português
Nestes casos, e conforme o n.º 7 do artigo 81.º do Código do IRS, os rendimentos isentos, são obrigatoriamente englobados para efeitos de determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos (exceto os rendimentos previstos nas alíneas c) a e) do n.º 1 e no n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS).
O OE de 2020 passou a determinar uma taxa de 10 por cento para os rendimentos de pensões obtidas no estrangeiro por residentes não habituais, estando, no entanto, previsto um regime transitório o qual determina que se mantêm as regras em vigor para quem já aderiu ao regime (até que termine o período do benefício) e para quem já fez o pedido e está a aguardar resposta.
Poderão igualmente beneficiar da isenção, nos termos do artigo 329.º da Lei n.º 2/2020, de 31 de março os pensionistas estrangeiros que «à data de entrada em vigor da presente lei, sejam considerados residentes para efeitos fiscais e que solicitem a respetiva inscrição como residentes não habituais até 31 de março de 2020 ou 2021, por reunirem as respetivas condições em 2019 ou 2020, respetivamente.» Na prática, o residente não habitual deve apresentar um pedido de concessão do estatuto até 31 de março do ano seguinte ao primeiro ano de residência fiscal em Portugal.
O sujeito passivo em causa, para efeito do pedido de inscrição como residente não habitual poderia, por isso, efetuar o pedido para obtenção do estatuto de RNH até 31 de março de 2021, obtendo o estatuto pretendido para o ano de 2020 e 9 anos seguintes, num total de 10.
Com efeito, a alteração com o OE para 2020, de acordo com o n.º 12 do artigo 72.º do CIRS, as pensões auferidas por residentes não habituais deixam de beneficiar de isenção, passando a ser sujeitas a uma taxa especial de 10% (com opção pelo respetivo englobamento). Esta taxa aplica-se aos rendimentos líquidos de pensões quando não sejam de considerar obtidos em território português, na parte em que os mesmos, quando tenham origem em contribuições, não tenham gerado uma dedução aos rendimentos do trabalho dependente.
Para estes efeitos, são tidos como rendimentos líquidos de pensões, os rendimentos da categoria H e, ainda, os valores recebidos:
- Em virtude de situação de pré-reforma, pré-aposentação ou reserva, independentemente da prestação de trabalho, antes da passagem à reforma (que pela pesquisa efetuada, poderá ser o caso em concreto);
- As importâncias despendidas pela entidade patronal com seguros e operações do ramo "Vida”, contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, quando não tenham sido sujeitas a tributação em momento anterior e ocorra o respetivo recebimento em capital.
Por sua vez, os rendimentos que passam a estar sujeitos a esta tributação autónoma, deixam de contribuir para o aumento da taxa progressiva de IRS a incidir sobre outros rendimentos auferidos pelo sujeito passivo, que sejam sujeitos a tributação e de englobamento obrigatório.
Há lugar à atribuição de um crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional, quando haja imposto pago no estrangeiro (dedutível até ao limite da taxa especial, ou nos termos geralmente aplicáveis em caso de opção pelo englobamento).
Os residentes não habituais, são em primeiro lugar residentes fiscais em Portugal, pelo que estão sujeitos à regra da universalidade prevista no n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS. Assim, se estivermos perante rendimentos que não se enquadrem em nenhuma das situações elencadas anteriormente como tendo vantagem pelo estatuto de residente não habitual, serão tributados como "normais" contribuintes, sujeitos passivos residentes em território nacional.
O anexo L, destina-se a declarar os rendimentos auferidos por residentes não habituais em território português, em atividades de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico, tal como se encontram identificadas na tabela constante no fim destas instruções (categorias A e B), destinando-se ainda a evidenciar a opção pelo método pretendido para eliminar a dupla tributação internacional relativamente àqueles rendimentos, bem como aos rendimentos das categorias E, F, G e H obtidos no estrangeiro, como se refere no Quadro 6-B.
Face ao exposto, respondendo à questão em concreto, o sujeito passivo que detém o estatuto de residente não habitual é um sujeito passivo em território nacional e como tal, respeita as diversas normas previstas nos códigos, nos termos gerais, nestas circunstâncias é aqui que ele deve declarar a totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo aqueles que proveem do estrangeiro (anexo J), atentos à regra da universalidade prevista no n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS.
Ora, para que seja possível determinar o tratamento fiscal destes rendimentos, é necessário em primeiro lugar identificar exatamente que tipo de rendimentos se trata e em segundo lugar aferir qual o seu enquadramento nos termos da Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CDT) assinada entre Portugal e a Suíça.
Assim, no caso em concreto, de acordo com os esclarecimentos prestados por telefone, sugerimos a identificação do rendimento em causa junto do cliente para que os possa enquadrar corretamente nos termos da Convenção.
Para o sujeito passivo de IRS, RNH em Portugal, optar pela aplicação do método da isenção ou do método do crédito de imposto, deverá preencher igualmente o quadro 6B do anexo L.
Assim, tendo por base a informação acima exposta, estes rendimentos:
· Têm de ser declarados em território português, sempre que sejam auferidos por um residente fiscal em território nacional; e,
· No que concerne à sua tributação em território nacional, o sujeito passivo pode optar:
o Pelo método do crédito de imposto pago no estrangeiro, em que terá igualmente de optar pelo englobamento ou tributação autónoma destes rendimentos; ou,
o Pelo método da isenção, que se traduzirá numa isenção com progressividade, para estes rendimentos.
Por fim, deixamos indicação da ajuda ao preenchimento do quadro 6B do anexo L da modelo 3, que dispõe o seguinte:
«Assinalar o campo 07 (SIM), caso se tenha tornado fiscalmente residente em território português até 31/03/2020, ou o campo 08 (NÃO), se se tornou residente em território português em data posterior;
Caso tenha assinalado o campo 07 (SIM) e tenha obtido o estatuto de Residente não Habitual para os anos de 2020 ou anteriores, deve assinalar o campo 09 (SIM), se pretender optar pela tributação dos rendimentos nos termos do n.º 12 do artigo 72.º do Código do IRS, ou o campo 10 (NÃO), se não pretender efetuar a referida opção.
Se assinalou o campo 09 (SIM) deve assinalar o campo 11 ou o campo 12, consoante pretenda optar, respetivamente, pela tributação autónoma à taxa especial de 10% prevista no artigo 72.º do Código do IRS ou pelo englobamento dos rendimentos, nos termos do n.º 13 do mesmo artigo;
Se assinalou o campo 10 (NÃO) deve proceder ao preenchimento do campo 05 (método de isenção) ou do campo 06 (método de crédito de imposto) do Q6C1, de acordo com a opção que pretenda efetuar.
No caso de ter indicado que se tornou fiscalmente residente em território português após 31/03/2020, campo 08 (NÃO), deve assinalar o campo 11 ou o campo 12, consoante pretenda optar, respetivamente, pela respetiva tributação autónoma à taxa especial de 10% prevista no artigo 72.º do Código do IRS ou pelo englobamento dos rendimentos, nos termos do n.º 13 do mesmo artigo.»