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Contratos de construção em microentidades
20 August 2021
Contratos de construção em microentidades
04-08-2021

Numa microentidade, normativo NC-ME, como devem ser contabilizadas as variações de réditos, positivas e negativas, resultantes do apuramento dos contratos de construção? O método usado é o da percentagem de acabamento. Se usar a conta 73 - Variações de produção, a IES não aceita. Se usar a conta 72 - Prestações de serviços, altera-se o volume de negócios que deixa de ter correspondência com a faturação efetivamente realizada no exercício.

Parecer técnico

A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico da celebração de contratos de construção com clientes para a realização de obras em imóveis dos próprios clientes. A entidade adota a norma contabilística para microentidades (NC-ME)
A NC-ME não prevê um tratamento contabilístico para os contratos de construções, estabelecendo procedimentos para o reconhecimento do rédito e respetivos gastos para as vendas de bens e para a realização de prestações de serviços no seu capítulo 12 – Rédito.
Não existindo um tratamento específico para as operações relacionadas com os contratos de construção, a entidade pode adotar políticas contabilísticas para os procedimentos a aplicar às operações em causa.
Nos termos do parágrafo 6.3 da NC-ME, esses procedimentos podem ser escolhidos tendo em conta os requisitos e a orientação desta norma que tratam de assuntos semelhantes e relacionados.
No caso em concreto, a operação em causa é a realização de obras em imóveis dos clientes, pelo que se podem atender aos procedimentos para o reconhecimento do rédito das prestações de serviços previsto nos parágrafos 12.5 e 12.6 da NC-ME.
O reconhecimento do rédito de prestações de serviços é similar aos tratamentos contabilísticos dos contratos de construção, utilizando-se a fase de acabamento para determinar o montante de rédito a reconhecer em cada período.
Nas prestações de serviços de construção, em que não existe a construção de um ativo (por exemplo, imóvel), mas apenas meras prestações de serviços referentes, normalmente, a reparações ou instalações de infraestruturas no edifício (por exemplo, pintura de paredes, reparações de canalizações, instalações elétricas, de ar condicionado central, etc.), a entidade deve reconhecer o rédito dessas prestações de serviços em função da fase acabamento.
Enquadrando-se as obras de construção civil como contratos de construção (implicando a construção de um ativo, por exemplo, um imóvel para um terceiro), e puder ser determinada com fiabilidade o desfecho da transação (neste caso do contrato) em cada data de relato, procede-se ao reconhecimento do rédito e de gastos com referência à fase de acabamento de cada contrato de construção, que é conhecido como o método da percentagem de acabamento, conforme disposto no parágrafo 12.5 da NC-ME.
O desfecho da transação pode ser fiavelmente determinado quando todas as seguintes condições estejam cumpridas:
- A quantia de rédito possa ser fiavelmente mensurada;
- Seja provável que os benefícios económicos associados à transação fluam para a entidade;
- A fase de acabamento da transação à data do balanço possa ser fiavelmente mensurada; e
- Os custos incorridos com a transação e os custos para concluir a transação possam ser fiavelmente mensurados.
A primeira condição está cumprida, se a quantia do rédito pode ser fiavelmente mensurada, atendendo às condições estabelecidas para a realização da construção do equipamento.
Caso não se preveja que a entidade adquirente não tem capacidade para pagar este contrato, não existindo, à partida, um risco de cobrabilidade da transação, a segunda condição está também cumprida.
A fase de acabamento do contrato também deve ser fiavelmente determinada, estando dependente do método utilizado pela entidade em função da operação em causa a realizar.
Essa fase de acabamento (método da percentagem do acabamento) de um contrato de construção pode ser determinada de várias maneiras, nomeadamente através de vistorias físicas ao trabalho executado (através de autos de medição), serviços executados até à data, expressos em percentagem do total dos serviços a serem executados (conhecido como milestones) e a proporção dos custos incorridos até à data face aos custos totais estimados da transação.
No entanto, o método usado mais habitualmente para determinar essa fase de acabamento é através da proporção dos custos do contrato incorridos no trabalho executado até à data face aos custos estimados totais do contrato. Definição que pode ser reduzida à seguinte fórmula:
% de acabamento = Custos incorridos no período / Custos estimados totais do contrato
Apesar de este ser o método mais utilizado, para efeitos contabilísticos, nada impede a empresa de utilizar algum dos outros métodos para determinar a fase de acabamento do contrato, caso entenda que a utilização desse método seja mais apropriado para determinada obra.
Quanto à última condição, a empresa deve possuir sistemas de controlo para determinar com fiabilidade os custos incorridos com cada contrato e os custos para concluir cada contrato.
Para que tal seja possível, devem ser criados procedimentos contabilísticos ou extracontabilísticos, que possam suportar a contabilidade, para determinar os custos incorridos e a incorrer para terminar o contrato, bem como controlar os respetivos registos na contabilidade.
Desde logo, é obrigatória a existência de um orçamento de custos para a realização de cada fabricação, que deve incluir a estimativa de todos os custos, com o respetivo detalhe conforme a sua natureza, que irão ser incorridos na obra (materiais, mão-de-obra, utilização de equipamentos, etc.).
A seguir, para controlar a aquisição de bens e serviços e imputação de cada custo no contrato, devem existir sistemas de controlo de contabilidade analítica, através da criação de folhas de obra, criação de centros de custos ou subcontas no plano de contas, ou sistemas similares.
Estes procedimentos são mais ou menos complexos dependendo das necessidades de cada empresa, sendo fundamentais para o cumprimento integral das referidas condições de aplicação da fase de acabamento na realização dos contratos com os clientes.
Deve ter-se em atenção o princípio da relação custo/benefício, não se devendo criar sistemas tão complexos e dispendiosos que não possam ser utilizados pela empresa. A criação desses procedimentos de controlo deve ser adaptada em função da capacidade organizativa da empresa atendendo às necessidades de informação de que necessita.
O rédito do contrato é então reconhecido pela aplicação da referida percentagem de acabamento, determinada pelo método escolhido pela empresa, (à data de 31 de dezembro de cada período) ao total dos réditos estimados da obra (preço de venda da obra).
A contrapartida pelo reconhecimento do rédito (na conta 71 ou 72), pressupondo que ainda não foi emitida qualquer fatura (total ou parcial) da obra, será a conta de acréscimo de rendimentos (conta 2721 – Devedores por acréscimos de rendimentos).
Os custos incorridos no contrato são integralmente reconhecidos como gastos do período em que forem incorridos, nas respetivas contas, de acordo com a respetiva natureza.
Desta forma, com o reconhecimento dos custos incorridos na obra como gastos desde o início da obra até 31 de dezembro do período respetivo, face aos respetivos réditos reconhecidos na mesma proporção, conseguirá determinar-se o lucro pela execução desse contrato, cumprindo-se com o princípio contabilístico do balanceamento entre rendimentos e gastos.
Nos períodos seguintes, devem reconhecer-se os restantes gastos e réditos, face ao total dos réditos e gastos incorridos com o contrato, deduzidos dos réditos e gastos já reconhecidos anteriormente.
No caso de contratos de construção, o reconhecimento do rédito e dos gastos do contrato não está relacionado com a emissão de faturas ou recebimento de qualquer adiantamento.
A emissão de faturas antes de ser reconhecido qualquer rédito no âmbito do parágrafo 12 da NC-ME deve ser registado na conta 282 – Rendimentos a reconhecer.
O recebimento de qualquer montante antes da emissão de faturas ou reconhecimento do rédito deverá ser contabilizado como adiantamentos de clientes (ou adiantamentos por conta de vendas), dependendo se está, ou não, o preço fixado previamente.
Quando não seja possível determinar com fiabilidade o desfecho da transação, por não ser possível determinar a fase de acabamento, a entidade deve reconhecer o rédito da prestação de serviços pelo exato montante dos respetivos custos incorridos, que se considerem recuperáveis. Este método é conhecido pelo método do lucro nulo.
Há a referir que as entidades que estejam a aplicar a NC-ME não são obrigadas a preparar e apresentar divulgações no anexo, como parte integrante das demonstrações financeiras, para além das informações adicionais a incluir na face do balanço previstas no anexo 18 da Portaria n.º 220/2015.
O tratamento contabilístico referido é aplicado quando a empresa em causa assume uma obrigação contratual com um cliente para a realização da construção das obras, independentemente de os serviços serem realizados por meios próprios da empresa ou através de serviços subcontratos a outros empreiteiros.
Em termos de IRC, de acordo com a alínea b) do n.º 3 do artigo 18.º do Código desse imposto, os réditos relativos a prestações de serviços consideram-se em geral realizados, e consequentemente sujeitos a tributação, e os correspondentes gastos suportados, na data em que o serviço é concluído, exceto tratando-se de serviços que consistam na prestação de mais de um ato ou numa prestação continuada ou sucessiva, que são imputáveis proporcionalmente à sua execução.
Como se constata, esta norma do IRC acompanha o tratamento contabilístico de acréscimo e diferimento do reconhecimento do rédito das prestações de serviços em função do seu acabamento ou proporcionalmente a cada período, quando sejam atos ou prestações de carácter continuado ou sucessivo.