IVA - Regras de localização
PT28204 - maio 2024
A sociedade "A", indústria, sujeito passivo português, efetua transmissões intracomunitárias de bens com destino a Espanha ou França.
Essas transmissões têm a intermediação da sociedade "B", empresa de prestação de serviços, também sujeito passivo português. As comissões são faturadas pela empresa "B" à empresa "A".
Estas comissões devem ser faturadas com IVA à taxa normal ou estão sujeitas a alguma isenção ao abrigo do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA?
Para ficarem isentas ao abrigo do artigo 14.º do CIVA deve a empresa "A" comprovar perante a empresa "B" a operação intracomunitária através da emissão de uma declaração?
Se a empresa "B" optar por liquidar IVA à taxa normal, poderá a dedução do IVA ser colocada em causa na esfera da empresa "A"?
Estas comissões não estão sujeitas a qualquer retenção por parte da empresa "A" aquando do pagamento?
Parecer técnico
O entendimento da Direção de Serviços do IVA sobre as comissões de intermediação relacionadas com as transmissões intracomunitárias de bens foi sempre no sentido de que as mesmas beneficiavam da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA.
Segundo entendemos, o pensamento da Direção de Serviços do IVA resultava da aplicação do chamado «princípio da tributação no país de destino», que implica que os bens destinados ao estrangeiro saiam do país de origem libertos de qualquer carga tributária ao nível do IVA, para que a tributação se dê no destino.
É isso que resulta da ficha doutrinária referente ao processo n.º 2 955, sancionado por despacho 2012-02-15, do SDG dos Impostos, na qual a referida Direção de Serviços do IVA se pronuncia no sentido de que:
«8. Contudo, se a intermediação estiver relacionada com uma transmissão intracomunitária, a operação beneficia da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do Código do IVA, como é caso em apreço. O prestador é uma entidade não residente no território nacional, pelo que sendo a operação localizada em território nacional, cabe ao adquirente fazer essa referência no documento.
9. Segundo a alínea q) do artigo 14.º do Código do IVA, estão isentas do imposto “as prestações de serviços, com exceção das referidas no artigo 9.º deste diploma, que se relacionem com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto, dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, registado em imposto sobre o valor acrescentado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.”
10. De referir, que as prestações de serviços relacionadas com uma transmissão intracomunitária de bens, abrangidas pela isenção da alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º Código do IVA, devem ser comprovadas através de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado, nos termos do n.º 8 do artigo 29.º do referido diploma.
11. Em termos declarativos, o montante total das prestações de serviços adquiridas não é de relevar na declaração periódica, na medida que se trata de operações isentas nos termos da alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do Código do IVA.»
Mais recentemente, porém, a referida Direção de Serviços do IVA veio a pronunciar-se em sentido totalmente diferente na ficha doutrinária n.º 26 000, com despacho de 2024-04-29, do Diretor de Serviços da DSIVA, na qual se pode ler que:
«6. Estabelece a alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do Código do IVA (CIVA), serem isentas de imposto:
“As prestações de serviços, com exceção das referidas no artigo 9.º deste diploma, que se relacionem com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto, dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, registado em imposto sobre o valor acrescentado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.”
7. Assim, a norma em causa isenta do imposto as prestações de serviços, que se relacionem com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto, dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, registado em imposto sobre o valor acrescentado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.
8. Esta disposição legal é aplicável independentemente da condição do prestador ou do local onde o serviço é prestado, abrangendo, prestações como o transporte de mercadorias destinado a outros Estados membros, prestações acessórias ao transporte, como sejam a carga, descarga ou outras relacionadas com a movimentação dos bens transportados, o aluguer de meios de transporte, a armazenagem e guarda de mercadorias, entre outros similares.
9. Não obstante, a norma não abrange operações de intermediação, uma vez que a mesma não se relaciona com a expedição ou transporte dos bens, mas com a sua transação.
10. Mais se informa que no âmbito das operações intracomunitárias, os "serviços efetuados por intermediários agindo em nome e por conta de outrem", quando o seu adquirente seja um sujeito passivo de imposto (dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA), são também tratados como operação sujeita a imposto e dele não isenta, no que a regras de localização diz respeito, conforme se pode verificar no Oficio circulado n.º 30115, de 2009/12/29, da Direção de Serviços do IVA.
11. Reportando-nos ao caso sob análise, a Requerente começa por questionar acerca da possibilidade de isenção de comissões, variáveis em função das transmissões intracomunitárias de bens angariadas para a Requerente, sendo o referido comissionista um sujeito passivo de imposto, com sede em território nacional.
12. Atendendo à descrição apresentada, a referida operação não tem condições para beneficiar da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, porque se trata de uma comissão relacionada com a transação dos bens; não se trata de uma prestação de serviços relacionada com o transporte das mercadorias.»
Segundo este novo entendimento, a alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, não abrange operações de intermediação, uma vez que a mesma não se relaciona com a expedição ou transporte dos bens, mas com a sua transação.
Conclui, por isso, a Direção de Serviços do IVA que o débito de comissões de intermediação respeitantes a transmissões intracomunitárias de bens está sujeito a IVA, à taxa de 23 por cento.
Neste mesmo sentido já se havia manifestado o CAAD na sua Decisão de 15/02/2013, proferida no Processo n.º 96/2012-T, na parte em que refere que:
«Por outro lado, invocou o Requerente ser aplicável aos serviços prestados a isenção prevista no artigo 14.º, n.º 1, alínea q) do Código do IVA, em vigor à data dos factos, que estabelece que estão isentas de IVA as "prestações de serviços, com exceção das referidas no artigo 9.º deste diploma, que se relacionem com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto, dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, registado em imposto sobre o valor acrescentado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.»
Ora, refira-se, em primeiro lugar, que não se vê como possam os serviços prestados pelo Requerente - intermediação de vendas e controlo de qualidade - estar por qualquer forma relacionados com a expedição ou o transporte de bens para outros Estados-membros, a que se refere expressamente o artigo 14.º, n.º 1, alínea q) do Código do IVA (exemplo de operações ali previstas seriam, desde logo, e para além do transporte propriamente dito, os serviços acessórios ao transporte como a carga e descarga e os transportes de aproximação rodo/ferroviários), pelo que tal disposição não poderá ser aplicável ao caso em apreço.»
Entendendo a Direção de Serviços do IVA que as comissões de intermediação respeitantes a transmissões intracomunitárias de bens estão sujeitas a IVA e não beneficiam de qualquer isenção, o IVA que for liquidado pelo comissionista será, necessariamente, dedutível pela entidade a quem o serviço foi prestado.
É questionado se estas comissões estão sujeitas a qualquer retenção na fonte por parte da empresa "A" aquando do pagamento.
Sendo o comissionista um sujeito passivo português há lugar a retenção na fonte se ele for uma pessoa singular e não haverá lugar a essa retenção, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 97.º do Código do IRC, se ele for uma pessoa coletiva.
Sendo o comissionista não residente, as comissões são consideradas rendimentos obtidos em Portugal, por força do disposto na subalínea 6) da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC, no caso de os comissionistas serem pessoas coletivas, e por força do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 18.º do CIRS, no caso de os comissionistas serem pessoas singulares.
Poderá, no entanto, haver dispensa de retenção na fonte se o comissionista, quer seja uma pessoa coletiva ou uma pessoa singular, acionar a Convenção de Dupla Tributação existente entre o país onde ele se encontra estabelecido e Portugal, mediante a apresentação do formulário modelo 21-RFI e do certificado de residência fiscal emitido pelas competentes autoridades fiscais, nos termos do artigo 98.º do CIRC, se for uma pessoa coletiva e do artigo 101.º-C do CIRS, se for uma pessoa singular.