IVA - Transmissão do património
PT28345 - outubro de 2024
Determinado sujeito passivo “X” alugou um espaço, paredes nuas, ao sujeito passivo “Y”, que adaptou o espaço para café.
Agora “Y” quer cessar atividade e negociou o equipamento que está montado no espaço de “X” ao sujeito passivo “Z”, ou seja, “Z” vai pagar as adaptações e imobiliário a “Y” e vai pagar aluguer do espaço a “X”.
Esta transferência do equipamento e das obras efetuadas no espaço ficam isentas de IVA ao abrigo do n.º 4 do artigo 3.º do CIVA?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se com o enquadramento fiscal da transferência de uma atividade exercida em nome individual.
A transmissão de bens e/ou direitos e obrigações de uma pessoa jurídica, no âmbito de uma atividade comercial (empresário em nome individual) para outra pessoa jurídica (sociedade ou empresário em nome individual) ficará sujeita as regras gerais de cada um dos impostos, IVA e IRS/IRC, aplicando-se-lhe os mesmos pressupostos que em qualquer outra transmissão ou prestação de serviços.
Importa considerar a possibilidade de se estar perante a venda de uma atividade comercial.
A operação de venda de uma atividade é considerada, para efeitos legais, como um trespasse, pressupondo que esteja também em causa a cedência de posição de arrendatário do espaço comercial, nos termos do artigo 1112.º do Código Civil. Neste sentido, não se considera trespasse, para efeitos civis, se não incluir a cedência do direito ao arrendamento.
Neste âmbito, realçamos que o contrato de trespasse deve incluir relação do património da atividade que irá ser objeto de cedência, nomeadamente os inventários, ativos tangíveis e intangíveis, bem como os demais ativos e passivos cedidos, se for o caso, como financiamentos a entidades bancárias, dívidas a pagar a fornecedores e a outros credores, dívidas a receber de clientes e de outros devedores.
Ainda que tais bens não sejam incluídos diretamente no contrato, é conveniente a elaboração de um balanço, inventário ou relação, suportado por informação complementar e reportado à data da transmissão, que deve ser anexado e onde os elementos patrimoniais sejam devidamente discriminados e valorizados.
Este documento permite apurar resultados em sede do cedente e abrir a contabilidade em sede do adquirente.
Assim, com o contrato de trespasse, poderá existir a transmissão de todo o património (ativo e passivo) desse estabelecimento comercial, nomeadamente das mercadorias, dos equipamentos (mobiliário e outros equipamentos), dos direitos, como por exemplo, as dívidas de clientes, e também das obrigações, como por exemplo, dívidas a fornecedores, ao pessoal, etc. Todos estes bens, direitos e obrigações transmitidos devem ser valorizados para que o cedente possa fazer o apuramento, item a item, dos rendimentos gerados e evidenciá-los apropriadamente.
No que respeita aos valores do passivo, nomeadamente dívidas a fornecedores, poderá também efetuar-se a transferência desses mesmos valores, desde que tenha havido o prévio consentimento por parte das entidades credoras, não sendo, pois, indispensável o seu pagamento prévio.
Há a considerar, de facto, a particularidade que aqui pode ocorrer e que é a exclusão da tributação em sede de IVA, conforme prevista no n.º 4 artigo 3.º e n.º 5 artigo 4.º do CIVA, e que consiste na não tributação da operação de transmissão quando em causa esteja a transmissão da totalidade, ou parte, do património suscetível de constituir uma atividade independente, sujeita a IVA.
Para que se verifique a aplicação desta norma é necessário que:
a) Ocorra uma transmissão definitiva, a título oneroso ou gratuito, de:
- Uma unidade económica complexa - universalidade de facto ou de direito - englobando a cedência dos elementos corpóreos e dos elementos incorpóreos que a constituem (estes últimos, por força do disposto no n.º 5 do artigo 4.º do CIVA, considerando que a cedência de direitos é qualificada como prestação de serviços para efeitos de IVA); ou
- Parte de um património, que pelas características que reúne, tenha aptidão para o exercício de um ramo de atividade autónomo e independente.
b) Que o adquirente já seja, ou venha a ser pelo facto da aquisição, um sujeito passivo do imposto dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA.
A segunda condição, à partida, estará garantida, dado que entendemos que o adquirente será uma sociedade ou um empresário que irá desenvolver essa atividade comercial e que será, presumimos, um sujeito passivo de IVA do regime geral.
A primeira condição deverá ser avaliada face aos elementos concretos da operação, no conhecimento pleno das condições em que tal irá decorrer, sendo de começar por determinar quais as operações a desenvolver no âmbito da atividade da sociedade e em que medida é que, pegando exclusivamente nos elementos adquiridos, é possível proceder às operações necessárias - caso não seja possível, muito provavelmente não terá uma situação consentânea com a prevista na norma aqui analisada.
O objetivo do n.º 4 do artigo 3.º e do n.º 5 do artigo 4.º, ambos do CIVA, é estabelecer um regime de neutralidade fiscal a operações de cedência de uma atividade, pois ainda que exista uma alteração do sujeito passivo, o estabelecimento ou o património continua em desenvolvimento, nunca existindo uma cessação propriamente dita dessa atividade.
De referir que não bastará existir a transmissão de determinados ativos, seja por venda ou por cedência de posição contratual, para se aplicar o referido regime de neutralidade.
Terá de estar em causa, a transmissão de um conjunto de ativos (e eventualmente passivos) que constituam um património (uma universalidade), com o qual possa ser desenvolvida uma atividade independente da atividade anterior.
Portanto, esta disposição afasta de tributação em IVA, as cessões de um património, mas apenas no caso em que este constitua uma «universalidade», como atrás já referido, ou seja, uma certa unidade funcional (constituída, por exemplo, pelo imobilizado, existências, carteira de clientes, fornecedores, que sustentam o desenrolar daquela atividade), de modo a proporcionar um ramo de atividade autónomo e independente, e que o adquirente seja, ou venha a ser, pelo ato de aquisição um sujeito passivo do imposto. Apenas se poderá aplicar o disposto naquele artigo, quando cumpridas cumulativamente as exigências aí estipuladas.
Deixamos ainda referência a um entendimento da Autoridade Tributária que poderá ajudar no enquadramento da operação em análise - Informação vinculativa - Despacho de 12-09-2005 - Proc. A100 2005026 «Cessão de estabelecimento».
No pressuposto de considerar uma transmissão da totalidade ou de parte do património que possa constituir por si uma atividade independe nos termos já referidos anteriormente, então nestas circunstâncias, não se considerando transmissão de bens nem prestação de serviços para efeitos de IVA, não há obrigação de emissão de fatura para titular essa operação, podendo estar documentalmente comprovada através de um contrato, recomendando-se, contudo, que o mesmo inclua todos os dados previstos no n.º 5 do artigo 36.º do CIVA.
No entanto, poderá ser emitida fatura, a qual não será sujeita a IVA, nos termos n.º 4 do artigo 3.º e/ou do n.º 5 do artigo 4.º, ambos do CIVA.
Se não houver forma de assegurar que estão reunidos os requisitos para a sua aplicação, a transmissão do património não beneficia de qualquer exclusão, devendo o IVA ser liquidado sobre os bens e/ou direitos transmitidos de acordo com as regras gerais do imposto e às taxas (ou eventuais isenções) que estejam previstas.
Relativamente à sujeição a imposto de selo, importa esclarecer que se estamos perante operações não tributáveis em sede de IVA, temos de observar a sujeição a imposto de selo.
Assim, se a operação se enquadrar como um trespasse oneroso de estabelecimento comercial nos termos da lei civil, neste caso a operação estará sujeita a imposto do selo nos termos da verba 27.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo - TGIS (trespasses de estabelecimento comercial, industrial ou agrícola) da tabela geral de imposto de selo, e à taxa de 5% sobre o seu valor. Para efeitos de aplicação desta verba, deve atender-se ao conceito jurídico de trespasse (artigo 1 112.º do Código Civil), o que implica, necessariamente, a transmissão de direito de arrendamento.