Pareceres
IVA - autofaturação
20 February 2023
IVA - autofaturação
PT27324 – dezembro de 2022

Determinada empresa, dedicada à atividade de limpezas de viaturas, efetua parcerias com estabelecimentos de vendas de viaturas e coloca equipas de técnicos nos estabelecimentos para a execução das tarefas de limpeza, sendo o primeiro contacto direto com os potenciais clientes efetuado pelos técnicos de venda dos estabelecimentos com quem contrata a parceria.
Assim, pretende atribuir, de acordo com o desempenho e o negócio angariado, uma determinada verba (comissão) a esses técnicos (consultores externos).
Para o efeito, ao invés de serem os técnicos a emitirem uma fatura (recibo verde), pode a empresa que atribui a comissão emitir uma autofatura por cada valor atribuído?
A considerar-se possível, quais os procedimentos a seguir? Uma vez que os consultores externos não têm qualquer registo de atividade, a possível autofatura terá de ser emitida com IVA? Desse modo, os consultores externos têm de proceder à entrega do IVA ao Estado?

Parecer técnico

Na situação em análise a questão colocada refere-se aos procedimentos fiscais no âmbito de um acordo de autofaturação (fatura processada pelo adquirente).
Os sujeitos passivos de IVA são obrigados, de acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA, a emitir uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como está definido nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.
Assim, genericamente, deverá ser o vendedor dos bens, ou o prestador de serviços, a emitir a fatura relativamente à operação por si realizada.
No que diz respeito à autofaturação citamos o artigo 2.º, n.º 3, alínea a) da Diretiva 2001/115/CE do Conselho, de 20 de dezembro de 2001, que altera a Diretiva 77/388/CEE, temos que:
«É permitida a elaboração de faturas pelos clientes de sujeitos passivos para as entregas de bens ou as prestações de serviços fornecidas por esses sujeitos passivos, desde que exista um acordo prévio entre as duas partes e na condição de que cada fatura seja sujeita a um processo de aceitação pelos sujeitos passivos que efetuem as entregas de bens ou a prestação de serviços. Os Estados-membros em cujo território sejam efetuadas as entregas de bens ou as prestações de serviços determinarão as condições e modalidades dos acordos prévios e dos procedimentos de aceitação entre os sujeitos passivos e os seus clientes.»
A adoção, no plano comunitário, da Diretiva pretendeu simplificar, modernizar e harmonizar, em matéria de IVA, vários aspetos e condicionalismos relacionados com a obrigação de faturação.
Não obstante a obrigação de emissão do documento ser da entidade que pratica a operação ativa, ou seja, do vendedor dos bens ou do prestador de serviços, no n.º 11 do artigo 36.º, no n.º 5 do artigo 19.º e no n.º 14 do artigo 29.º, todos do CIVA, bem como no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro, está previsto o mecanismo da autofaturação, que foi transposto da diretiva.
Assim, o enquadramento legal da autofaturação está contemplado no n.º 11 do artigo 36.º, no n.º 5 do artigo 19.º e no n.º 14 do artigo 29.º do Código do IVA (CIVA) e artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro, não sendo necessária a autorização prévia dos da Autoridade Tribuária e Aduaneira, quando efetuado entre sujeitos passivos nacionais e de outros Estados-membros da União Europeia, e sendo aceite desde que se verifiquem as condições previstas no n.º 11 do artigo 36.º do CIVA:
«11 - A elaboração de faturas por parte do adquirente dos bens ou dos serviços fica sujeita às seguintes condições:
a) A existência de um acordo prévio, na forma escrita, entre o sujeito passivo transmitente dos bens ou prestador dos serviços e o adquirente ou destinatário dos mesmos;
b) O adquirente provar que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tomou conhecimento da emissão da fatura e aceitou o seu conteúdo.»
Deve ainda ser tido em consideração o seguinte:
- A fatura, apesar de elaborada pelo adquirente, deve ser emitida tal como se fosse o transmitente dos bens ou o prestador dos serviços a emiti-la (o adquirente apenas elabora a fatura);
- A fatura deve conter todos os elementos previstos no n.º 5 do artigo 36.º do CIVA e no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 198/90, de 19 de junho, com redações posteriores, para poder ser considerada como documento passado na forma legal, e ainda todos os elementos que sejam exigidos pela legislação nacional, nomeadamente pelo artigo 171.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
Por outro lado, é de referir que a autofaturação implica que o transmitente conserve em arquivo o duplicado das faturas, proceda ao seu registo contabilístico e mencione, na declaração periódica, o IVA liquidado nas faturas elaboradas pelos adquirentes.
Ou seja, a autofaturação não desobriga o sujeito passivo do cumprimento de todas as obrigações impostas pelo CIVA, libertando-o apenas da obrigação de elaboração da fatura.
Desta forma, será com base na fatura emitida pelo sujeito passivo adquirente que faz a autofaturação, que o vendedor efetuará a mensuração na contabilidade do rédito da venda, tal como procede quando é ele (vendedor) o emitente das faturas.
Há a referir que caso exista o acordo de autofaturação mencionado, o transmitente não poderá emitir fatura para titular a mesma operação, pois estará a duplicar o procedimento de obrigação de faturação.
Relativamente à comunicação da autofaturação à AT, poderá consultar a FAQ n.º 19-3629 quanto à E-fatura disponível no site www.portaldasfinancas.gov.pt, que transcrevemos:
«Perguntas frequentes - comerciantes - comunicação elementos de faturas (ver aqui)
(...)
19-3629 No caso das entidades com acordos de autofaturação com os seus clientes, em que o adquirente (que utiliza programa informático de faturação) elabora a fatura (autofatura) por conta do prestador do serviço/transmitente do bem ("vendedor"), a quem incumbe a obrigação de comunicar as faturas em causa?
A obrigação da comunicação é sempre do "emitente" (prestador do serviço/transmitente), ou seja, do sujeito passivo em nome do qual é emitida a fatura. Para que possa comunicar essas faturas pode optar por várias vias:
1 - A entidade que elabora as faturas (o cliente) produz o ficheiro SAF-T com os dados do prestador/transmitente, e disponibiliza-o para que este o submeta; ou
2 - O cliente, que autofatura, utiliza o webservice para enviar os elementos obrigatórios das faturas, tendo sido previamente criado um subutilizador, pelo emitente, para autorizar a empresa que elabora as faturas a remeter a informação obrigatória a elas respeitantes.»
Face ao exposto, no caso em concreto, dever-se-á aferir se estão cumpridos todos os requisitos elencados no n.º 11 do artigo 36.º do CIVA, nomeadamente a existência de um acordo escrito para a utilização da autofaturação.