IRC - Benefícios fiscais
Fevereiro, 2022
Determinada empresa beneficiou em 2017, 2018 e 2019 da dedução dos lucros retidos e reinvestidos (DLRR). A aquisição em 2018 de um imóvel usado para desenvolvimento da atividade da empresa é considerada investimento elegível?
No caso concreto, o imóvel adquirido permitiu à empresa abrir um novo estabelecimento, numa localidade onde ainda não exercia atividade (a empresa tem estabelecimentos em diversas localidades). Este estabelecimento começou a gerar rendimento em setembro de 2018.
Partindo do pressuposto que o imóvel é considerado investimento elegível, não se duvida que justifica a DLRR de 2017, mas o valor do imóvel é muito superior ao valor da DLRR de 2017. Pode este imóvel justificar a DLRR de 2017 e 2018?
Em 2019 a mesma empresa abriu um novo estabelecimento, noutra cidade, tendo que adquirir equipamento para desenvolver a sua atividade. Contudo, em 2020, já em plena pandemia, a gerência optou por encerrar este novo estabelecimento, tendo ficado com o equipamento. Este equipamento é elegível para efeitos de DLRR?
A dúvida surge no seguimento de um ato inspetivo da DLRR dos anos de 2015 e 2016 em que a Autoridade Tributária considerou equipamento elegível todo o equipamento adquirido para um novo estabelecimento, mas o equipamento adquirido para estabelecimentos já existentes, como a empresa não conseguiu demonstrar o aumento da capacidade produtiva, não foi aceite.
No caso exposto efetivamente o equipamento foi adquirido para um novo estabelecimento, mas depois esse estabelecimento foi encerrado e o equipamento foi distribuído por outros estabelecimentos da empresa, permitindo a substituição de equipamentos já existentes.
Parecer técnico
A questão colocada refere-se aos investimentos relevantes para efeitos de concretização de investimento para efeitos de dedução dos lucros retidos e reinvestidos (DLRR). No caso concreto, questiona se o investimento num imóvel usado é elegível para este benefício. Questiona ainda acerca das condições a observar relativamente à elegibilidade dos investimentos.
A DLRR constitui um regime de incentivos fiscais ao investimento a favor de micro, pequenas e médias empresas, contribuindo para o reforço da estrutura de capital das empresas.
Podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos de IRC residentes em território português, bem como os sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável neste território, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:
- Sejam micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003;
- Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
- O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
- Tenham a situação fiscal e contributiva regularizada.
O DLRR não é aplicável ao reinvestimento de lucros retidos nos setores da pesca, da aquicultura e da produção agrícola primária (produção de produtos da terra e da criação animal).
Não podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos que:
- Estejam sujeitos a uma injunção de recuperação na sequência de uma decisão da Comissão Europeia, ainda pendente, que declare um auxílio ilegal e incompatível com mercado interno;
- Sejam empresas em dificuldade, nos termos do parágrafo 18 do artigo 2.º RGIC.
Os sujeitos passivos podem deduzir à coleta do IRC, nos períodos de tributação que se iniciem em/ou após 1 de janeiro de 2014, até 10 por cento dos lucros retidos que sejam reinvestidos em aplicações relevantes nos termos do artigo 30.º, no prazo de três anos contados a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos.
O montante máximo dos lucros retidos e reinvestidos, em cada período de tributação, era de sete milhões e 500 mil euros, por sujeito passivo. Este limite foi alterado pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2019) para dez milhões de euros de euros. Já em 2020, este valor foi alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março (Orçamento do Estado suplementar) para 12 milhões de euros.
A dedução é feita, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, até à concorrência de 25 por cento da coleta do IRC.
No caso dos sujeitos passivos que sejam micro e pequenas empresas, tal como definidas na Recomendação 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, a dedução prevista no n.º 2, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, é feita até à concorrência de 50 por cento da coleta do IRC.
Os sujeitos passivos que beneficiem da DLRR devem proceder à constituição, no balanço, de reserva especial correspondente ao montante dos lucros retidos e reinvestidos. A reserva especial assim constituída não pode ser utilizada para distribuição aos sócios antes do fim do quinto exercício posterior ao da sua constituição, sem prejuízo dos demais requisitos legais exigíveis.
Consideram-se aplicações relevantes, os ativos fixos tangíveis (AFT) adquiridos em estado de novo, com exceção de:
- Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em projetos de indústria extrativa;
- Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas;
- Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, salvo quando afetas à exploração de serviço público de transportes ou destinadas a serem alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, barcos de recreio e aeronaves de turismo;
- Artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
- Ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do setor público.
A dedução à coleta de IRC a efetuar por aplicação do benefício fiscal da DLRR é efetuada no período em que os lucros obtidos são retidos através da criação de uma reserva especial prevista no artigo 32.º do Código Fiscal do Investimento.
Como há a obrigação dos lucros obtidos no período serem retidos na sociedade através da criação de uma reserva no Balanço da sociedade, esta é uma operação que apenas pode ser efetuada mediante uma deliberação dos sócios em Assembleia Geral da sociedade.
Essa deliberação da criação da reserva pode ser efetuada na Assembleia Geral ordinária, convocada para efetuar a aprovação e aplicação dos resultados do período, que normalmente é realizada até final de março do ano seguinte ao período a que os lucros obtidos respeitam, conforme o n.º 5 do artigo 65.º do Código das Sociedades Comerciais.
Em termos de registos contabilísticos, em primeiro lugar, no dia 1 de janeiro do "N+1”, deve proceder-se imediatamente à transferência do resultado líquido do período "N” para a conta de resultados transitados.
Será sobre o valor dos resultados transitados, existente em saldo na data da deliberação dos sócios em assembleia geral, que inclui o resultado líquido do período "N” a ser utilizado para a aplicação do benefício fiscal da DLRR, que os sócios irão proceder à aprovação da constituição da reserva.
De acordo com o n.º 2 do artigo 32.º do CFI, essa reserva especial tem que ser mantida até ao do fim do quinto exercício posterior ao da sua constituição, não podendo ser utilizada para distribuição para os sócios durante esse período.
Tal como decorre do n.º 1 do artigo 29.º do CFI, o benefício fiscal da DLRR apenas pode ser aplicado a lucros obtidos e retidos referentes ao período no prazo de três anos contado a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos.
O benefício fiscal da DLRR opera por dedução à coleta de IRC do período em que tiver sido obtido o lucro e este tenha sido retido, com a constituição da respetiva reserva no capital próprio, não existindo a possibilidade de utilização de lucros obtidos e retidos de períodos anteriores para utilizar o benefício fiscal de um determinado período, nem a possibilidade de dedução à coleta do benefício fiscal calculado em períodos seguintes, quando a coleta não seja suficiente no período da obtenção do lucro retido.
A utilização do benefício fiscal da DLRR está ainda regulamentada através da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro.
Quanto às obrigações acessórias, a utilização da DLRR é justificada por documento a integrar o processo de documentação fiscal (dossier fiscal), que identifique discriminadamente o montante dos lucros retidos e reinvestidos, as aplicações relevantes objeto de reinvestimento, o respetivo montante e outros elementos considerados relevantes, conforme previsto no artigo 33.º do CFI.
A contabilidade dos sujeitos passivos de IRC beneficiários da DLRR deve evidenciar o imposto que deixe de ser pago em resultado da utilização do benefício, mediante menção do valor correspondente no anexo às demonstrações financeiras relativa ao exercício em que se efetua a dedução.
Relativamente à elegibilidade dos investimentos referidos, conforme referido anteriormente, no que se refere aos investimentos em aplicações relevantes para efeitos da aplicação da DLRR, o artigo 30.º do CFI estabelece que devem ser considerados os ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, com exceção de:
- Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em projetos de indústria extrativa;
- Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas;
- Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, barcos de recreio e aeronaves de turismo;
- Artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
- Ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do setor público.
Considera-se investimento realizado em aplicações relevantes o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso. Não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso.
No caso de ativos adquiridos em regime de locação financeira, a dedução é condicionada ao exercício da opção de compra pelo sujeito passivo no prazo de cinco anos contado da data da aquisição.
As aplicações relevantes em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos devem ser detidas e contabilizadas de acordo com as regras que determinaram a sua elegibilidade, por um período mínimo de cinco anos.
Quando ocorra a transmissão onerosa dos ativos em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos antes de decorrido o prazo previsto no número anterior, o sujeito passivo deve reinvestir, no mesmo período de tributação ou no período de tributação seguinte, o respetivo valor de realização em aplicações relevantes nos termos do presente artigo, os quais devem ser detidos, pelo menos, pelo período necessário para completar aquele prazo.
Assim, no caso concreto, de acordo com o anteriormente referido, consideramos que o imóvel usado não é elegível como aplicação relevante, atento o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 30.º do CFI. Este mesmo entendimento foi adotado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no processo 2019 000478. Despacho de 23 de janeiro de 2019 da Diretora de Serviços do IRC. PIV 15044.
Relativamente à elegibilidade dos restantes investimentos abordados na questão, importa observar o artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, que refere:
«Para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 30.º do Código Fiscal do Investimento, apenas são elegíveis as aplicações relevantes em ativos aí previstos que respeitem a um investimento inicial, tal como definido nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da presente portaria.»
Por sua vez dispõe a alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º do CFI, que «os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.»
Ainda de acordo com o n.º 2 do artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, «nos casos em que o investimento inicial consista na diversificação da atividade de um estabelecimento existente, as aplicações relevantes devem exceder em, pelo menos, 200% o valor líquido contabilístico dos ativos que são reutilizados, tal como registado no período de tributação anterior ao do início da realização do investimento.»
Consideramos ainda que se a tipologia do investimento se enquadrasse no «aumento da capacidade de um estabelecimento já existente» competiria à entidade demonstrar em que medida os investimentos contribuíram para esse aumento, que pelo exposto não foi ficou verificado.