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IRC – Gratificações de balanço
19 April 2022
IRC – Gratificações de balanço
Abril 2022

Em 2019 foram reconhecidas gratificações de balanço. No entanto, como não foram reunidas as condições necessárias, as gratificações não foram pagas aos colaboradores em 2020. Desde então o valor dessas gratificações está numa conta de acréscimo. No final de 2021, a administração assumiu que pretende pagar no exercício de 2022 as gratificações planeadas aos seus colaboradores. Quais as implicações a serem reportadas na declaração modelo 22 relativa ao período fiscal de 2021, de forma a acautelar ou a garantir que o imposto seja bem refletido em matéria de IRC?

Parecer técnico

A questão colocada refere-se ao impacto fiscal decorrente do não pagamento de gratificações de balanço até ao final do período de tributação seguinte àquele a que os lucros diziam respeito.
No caso concreto, determinada empresa terá reconhecido, no exercício de 2019, em gastos do período, gratificações de balanço a atribuir aos colaboradores (contas 63x), as quais não foram pagas no decorrer do exercício de 2020.
Por gratificações de balanço entender-se-ão as importâncias atribuídas à gerência e/ou aos trabalhadores, a título de participação nos lucros da empresa, lucros estes que, nos termos da legislação comercial, pertencem aos sócios ou acionistas, ou seja, falamos dos valores apurados no resultado, após estarem fechadas as contas, que são distribuíveis aos sócios ou acionistas, abdicando estes de parte desses valores em prol dos trabalhadores, como gratificação pelos resultados alcançados.
Falamos, portanto, de valores apurados na conta de resultados que transitariam desta conta (conta 56x – Resultados transitados) para a conta dos gerentes ou trabalhadores, com as tributações devidas em sede de imposto sobre o rendimento, nos termos propostos e acordados na deliberação relativa à distribuição de lucros.
Logo, só é possível a existência destas gratificações havendo lucro, uma vez que, havendo resultados negativos não existe montante que possa ser distribuído.
Este movimento (débito da conta 56x – Resultados transitados, por contrapartida a crédito da conta 231x – Remunerações a pagar) não afeta contas de gastos e não está incluído no resultado contabilístico da empresa nem, consequentemente, no resultado fiscal, pelo que, o CIRC prevê as condições em que pode ser deduzida fiscalmente esta variação patrimonial (por via da correção no quadro 07 da declaração modelo 22), refletindo-o desta forma no resultado fiscal.
Acontece que, com a entrada em vigor do SNC em 2010 e as consequentes modificações ao nível do registo contabilístico, alteraram-se as regras sobre a forma de contabilização das «gratificações de balanço», quando essa gratificação resulte de uma obrigação legal ou construtiva de fazer tal pagamento, ou até mesmo de uma prática reiterada da entidade, e desde que os custos possam ser definidos com fiabilidade.
De acordo com os parágrafos 11 e 18 da NCRF 28 – Benefícios dos empregados, nestes casos, a participação dos empregados (trabalhadores e/ou gerentes) nos lucros deve ser reconhecida como um gasto do período a que esse lucro se refere e não como variação patrimonial.
A existência de uma obrigação presente verifica-se quando a entidade não tem uma alternativa realista senão a de fazer esses pagamentos.
Isto acontecerá, por exemplo, quando, mesmo não tendo uma obrigação legal que imponha essa atribuição, a empresa adotou uma prática de pagamento anual dessas gratificações, ou, não havendo essa prática, pretende adotá-la no presente e faz essa comunicação aos trabalhadores antes do final do ano. Daqui resulta uma obrigação construtiva, dado que a empresa não tem alternativa realista senão a de efetuar esse pagamento.
Nestas circunstâncias, o valor deve ser registado em gastos com pessoal (contas 63x) logo no ano a que se refere o resultado, desde que possa ser feita uma estimativa fiável da obrigação.
No entanto, continua a verificar-se a obrigação de deliberação na assembleia geral e respetivas menções na ata e relatório de gestão.
E sendo assim, o gasto que for contabilizado nesse exercício pode concorrer para a formação do respetivo lucro tributável até aos limites previstos nas alíneas n) e o) do n.º 1 do artigo 23.º-A do CIRC que se transcrevem de seguida:
«(…) 1 - Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:
(…)
n) Os gastos relativos à participação nos lucros por membros de órgãos sociais e trabalhadores da empresa, quando as respetivas importâncias não sejam pagas ou colocadas à disposição dos beneficiários até ao fim do período de tributação seguinte;
o) Sem prejuízo do disposto na alínea anterior, os gastos relativos à participação nos lucros por membros de órgãos sociais, quando os beneficiários sejam titulares, direta ou indiretamente, de partes representativas de, pelo menos, 1% do capital social, na parte em que exceda o dobro da remuneração mensal auferida no período de tributação a que respeita o resultado em que participam; (…).»
Sendo que a restrição prevista na alínea n) deve ser entendida como respeitando ao período de tributação seguinte àquele a que respeita o lucro.
Nos termos do n.º 5 do artigo 23.º-A do CIRC, no caso de não se verificar o requisito enunciado na alínea n) do n.º 1, ao valor do IRC liquidado relativamente ao período de tributação seguinte adiciona-se o IRC que deixou de ser liquidado em resultado da dedução das importâncias que não tenham sido pagas ou colocadas à disposição dos interessados no prazo indicado, acrescido dos juros compensatórios correspondentes.
Exemplificando:
Considerando que determinada empresa reconheceu em gastos com pessoal (contas 63x), a título de gratificações de balanço, e nos termos das normas contabilísticas, no exercício de 2019, o valor de 100 mil euros.
Contudo, a 31/12/2020 verificou que não tinham sido pagos 20 mil euros, porque, entretanto, a empresa deixou de ter capacidade financeira para liquidar a totalidade do valor que tinha sido estimado.
Admitindo que a empresa já não iria pagar estes 20 mil euros, e visto tratar-se de uma alteração de estimativa, a regularização a efetuar deveria ficar refletida contabilisticamente no exercício de 2020, podendo ser efetuada a débito da conta 2722 – Credores por acréscimos de gastos, por contrapartida a crédito da conta 7881 – Correções relativas a períodos anteriores.
Este rendimento reconhecido por força da regularização na conta 7881 – Correções relativas a períodos anteriores, poderia ser deduzido no quadro 07 da declaração modelo 22 de 2020.
Caso a empresa mantivesse a intenção de pagar os referidos 20 mil euros, ainda que após 31/12/2020, então, poderia manter o valor na conta 2722.
Em qualquer dos casos, não tendo o valor sido pago até 31/12/2020, haveria que efetuar a correção prevista no n.º 5 do artigo 23.º-A do CIRC, conforme segue:
- No campo 363 («IRC de períodos anteriores») do quadro 10 da declaração modelo 22, inscrever o IRC que deixou de ser liquidado no exercício de 2019 por terem considerado o gasto de 20 mil euros que não foi pago até 31 de dezembro de 2020;
- No campo 366 («Juros compensatórios») do quadro 10 da declaração modelo 22, os respetivos juros compensatórios (calculados nos termos do artigo 35.º da LGT);
- E ainda, no campo 364 («Derrama municipal») do quadro 10 da declaração modelo 22, a respetiva derrama, se for caso disso.
Como se verifica do exposto, a correção fiscal a efetuar já deveria estar refletida na declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2020.
No exercício de 2021 ou 2022, no cenário de se manter a intenção de pagamento do valor de 20 mil euros estimado na conta 2722, então, contabilisticamente, apenas ocorreria o respetivo movimento financeiro, sem impacto em resultados.
Quando são atribuídas estas gratificações deve ainda ser analisada a tributação autónoma prevista na alínea b) do n.º 13 do artigo 88.º do CIRC.
Sobre este tema recomendamos a leitura da Circular n.º 9/2011, da Autoridade Tributária, de maio de 2011.