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IRC - Benefícios fiscais
24 May 2022
IRC - Benefícios fiscais
PT 27002 - maio de 2022

No âmbito da dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR) constante do novo Código Fiscal do Investimento, consideram-se aplicações relevantes os ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, com a exceção de construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas.
Determinada empresa, cuja atividade é o arrendamento de imóveis, decidiu construir um prédio com apartamentos para arrendar. A construção deste prédio é elegível no âmbito do referido apoio uma vez que é para a atividade produtiva da empresa?

Parecer técnico

O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento para efeitos da DLRR da construção de imóvel com destino ao arrendamento.
O benefício fiscal da dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR) encontra-se previsto nos artigos 27.º a 34.º do Código Fiscal ao Investimento (CFI), anexo ao Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, e foi regulamentado pela Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro.
A DLRR constitui um regime de incentivo fiscal ao investimento em favor de micro, pequenas e médias empresas nos termos do Regulamento Geral de Isenção por Categoria (RGIC).

Âmbito de aplicação subjetivo

Podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos de IRC residentes em território português, bem como os sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável neste território, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:
- Sejam micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003;
- Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
- O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
- Tenham a situação fiscal e contributiva regularizada.

Operacionalidade do incentivo fiscal

A DLRR consiste numa dedução à coleta do IRC, nos períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de janeiro de 2014, de até 10 por cento dos lucros retidos que sejam reinvestidos em aplicações relevantes nos termos do artigo 30.º do CFI, no prazo de quatro anos contado a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos.
Esta dedução abrange as situações em que durante o período de tributação se encontram reunidos os requisitos previstos na legislação comercial para adiantamento por conta de lucros, não podendo essa dedução ser superior àquela que seria obtida com base no lucro apurado no final desse período de tributação.
O montante máximo dos lucros retidos e reinvestidos, em cada período de tributação, é de 12 milhões de euros, por sujeito passivo.
A dedução é feita, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC, até à concorrência de 25 por cento da coleta do IRC, exceto no caso dos sujeitos passivos que sejam micro e pequenas empresas, tal como definidas na Recomendação 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, cuja dedução é feita até à concorrência de 50% da coleta do IRC.

Despesas de investimento elegíveis

Consideram-se aplicações relevantes, para efeitos da DLRR, os ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
- Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em projetos de indústria extrativa;
- Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas;
- Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, salvo quando afetas à exploração de serviço público de transportes ou destinadas a serem alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, barcos de recreio e aeronaves de turismo;
- Artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
- Ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do setor público.
Consideram-se ainda aplicações relevantes, para efeitos da DLRR, os ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, know-how ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente, desde que cumpridos cumulativamente os seguintes requisitos:
- Estejam sujeitos a amortizações ou depreciações para efeitos fiscais;
- Não sejam adquiridos a entidades com as quais existam relações especiais nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do CIRC.
Considera-se investimento realizado em aplicações relevantes o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis ou ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.
Não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso.
No caso de ativos adquiridos em regime de locação financeira, a dedução é condicionada ao exercício da opção de compra pelo sujeito passivo no prazo de sete anos contado da data da aquisição.
As aplicações relevantes em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos devem ser detidas e contabilizadas de acordo com as regras que determinaram a sua elegibilidade, por um período mínimo de cinco anos.
Quando ocorra a transmissão onerosa dos ativos em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos antes de decorrido o prazo previsto no parágrafo anterior, o sujeito passivo deve reinvestir, no mesmo período de tributação ou no período de tributação seguinte, o respetivo valor de realização em aplicações relevantes nos termos do presente artigo, os quais devem ser detidos, pelo menos, pelo período necessário para completar aquele prazo.

Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro

Dispõe o n.º 1 do artigo 9.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que, nos termos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 1.º do RGIC, a DLRR não é aplicável ao reinvestimento de lucros retidos nos setores da pesca, da aquicultura e da produção agrícola primária, tal como definida no parágrafo 9 do artigo 2.º do RGIC.
Adicionalmente, de acordo com o artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 30.º do CFI, apenas são elegíveis as aplicações relevantes em ativos aí previstos que respeitem a um «investimento inicial», tal como definido nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da mesma Portaria, considerando-se como tal:
- Os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento;
- O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente;
- A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento;
- Ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
E tem de se conseguir demonstrar este incremento.
Ou seja, nos termos da Portaria que regulamenta a DLRR, para além dos ativos fixos tangíveis adquiridos para o efeito terem de ser adquiridos em estado de novo, terão de se qualificar como aplicações relevantes nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 30.º do CFI, e os investimentos em causa têm que integrar o conceito de «investimento inicial», para além da observação dos demais requisitos inerentes ao benefício fiscal da DLRR previstos na legislação referida.
Sobre esta temática recomendamos a análise das seguintes informações vinculativas da Autoridade Tributária:
- Processo n.º 2018004093, PIV 14588 - Aplicações relevantes no RFAI e na DLRR, despacho de 27 de novembro de 2018 da diretora de serviços do IRC.
- Processo n.º 2018001593, PIV 13746 - Dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR) - Aplicações relevantes (investimento de expansão da capacidade de armazenagem), despacho da subdiretora-geral do IRC, de 2018.10.29.

Não cumulação com outros regimes

Sem prejuízo do disposto no parágrafo seguinte, a DLRR não é cumulável, relativamente às mesmas aplicações relevantes elegíveis, com quaisquer outros benefícios fiscais ao investimento da mesma natureza.
Porém, a DLRR é cumulável com o regime de benefícios contratuais e com o RFAI, nos termos e condições previstos nos artigos 13.º e 24.º do CFI, respetivamente.

Reserva especial por lucros retidos e reinvestidos

Os sujeitos passivos que beneficiem da DLRR devem proceder à constituição, no balanço, de reserva especial correspondente ao montante dos lucros retidos e reinvestidos, a qual não pode ser utilizada para distribuição aos sócios antes do fim do quinto exercício posterior ao da sua constituição, sem prejuízo dos demais requisitos legais exigíveis.

Outras obrigações acessórias

A DLRR deve ser justificada por documento a integrar o dossiê fiscal da entidade beneficiária, identificando discriminadamente o montante dos lucros retidos e reinvestidos, as aplicações relevantes objeto de reinvestimento, o respetivo montante e outros elementos considerados relevantes.
A contabilidade dos sujeitos passivos de IRC beneficiários da DLRR deve evidenciar o imposto que deixe de ser pago em resultado da utilização deste benefício fiscal, mediante menção do valor correspondente no anexo às demonstrações financeiras relativa ao exercício em que se efetua a dedução.

Incumprimento

O artigo 34.º do CFI prevê penalizações para situações de incumprimento.
No caso em apreço, a construção do imóvel tem como destino o arrendamento.
Ora, o tratamento contabilístico referente aos imóveis detidos pelas entidades pode variar tendo em conta o destino ou função na atividade. Estes diferentes tratamentos contabilísticos estão estreitamente ligados com o tipo de rendimento a reconhecer pela exploração desses imóveis.
Em termos genéricos, no âmbito do SNC, há que atender às normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) n.º 7 - Ativos fixos tangíveis, n.º 11 - Propriedades de investimento e n.º 18 - Inventários, que estabelecem o tratamento contabilísticos dos imóveis, dentro da atividade das entidades.
Se a entidade se enquadra no conceito de microentidades, e esteja a adotar a norma contabilística para microentidades (NC-ME), há que atender aos procedimentos contabilísticos aí previstos.
É necessário, também, atender às notas de enquadramento do Código de Contas do SNC, que estabelecem as contas a utilizar conforme o tipo de ativo reconhecido pelas NCRF, não existindo, no entanto, uma relação direta entre estas contas e as rubricas dos modelos das demonstrações financeiras.
Os imóveis devem ser classificados como inventários, quando tenham sido adquiridos ou construídos pela empresa e sejam destinados a serem vendidos no decurso da atividade normal da empresa, ou seja, durante o ciclo operacional, sendo essa atividade a aquisição ou construção para venda de imóveis. Efetivamente, tratando-se de imóveis cujo destino é a venda no decurso da atividade corrente da entidade, estes têm a natureza de inventários (existências), conforme o parágrafo 6 da NCRF 18, situação que não se coloca no caso exposto, considerando as informações fornecidas.
Situação diferente é no caso de os imóveis terem sido adquiridos com o objetivo de se verificar uma valorização do capital investido e cujo destino seja a sua venda, sendo esta uma mera atividade de investimento da empresa, acessória à sua atividade corrente (que não é a compra ou construção para venda de imóveis), os imóveis devem ser classificados como propriedades de Investimento, nos termos do parágrafo 5 da NCRF 11.
De acordo com o mesmo parágrafo 5 da NCRF 11, os imóveis adquiridos ou construídos e que sejam destinados ao arrendamento, quer a empresa exerça a atividade de arrendamento de imóveis, ou não, e quer estejam arrendados, ou não, devem ser também classificados como propriedades de investimento.
De outra forma, os imóveis detidos pelas entidades devem ser classificados como itens do ativo fixo tangível quando estejam ocupados pela própria entidade, e essa ocupação se destine ao seu uso no processo de produção, fornecimento bens/ou serviços ou para fins administrativos, de acordo com o parágrafo 6 da NCRF 7.
Esta diferente classificação preconizada no SNC está relacionada com a forma como cada tipo de imóvel irá gerar benefícios económicos para a entidade, e não tanto em relação à atividade desenvolvida pela entidade, exceto no caso de a entidade ter como atividade a compra e (ou construção para) venda de imóveis.
Assim, estamos perante propriedades de investimento quando os imóveis são detidos com o objetivo de gerar rendas ou ganhos na valorização do imóvel, sendo que esses benefícios económicos são completamente independentes da restante atividade da entidade e da utilização de outros ativos, estando apenas dependentes das condições de mercado. Desta forma, ainda que estes bens estejam classificados como ativos fixos tangíveis por aplicação do normativo das microentidades, estes não perdem a sua natureza de propriedade de investimento (Seriam contabilizadas como tal se fossem utilizadas as NCRF completas)
Ora, tendo por base os benefícios fiscais que nos refere, nomeadamente a DLRR e o CFEI II, nenhum deles prevê como aplicação relevante a aquisição de propriedades de investimento, mas apenas de alguns ativos fixo tangíveis e intangíveis.
Ainda que nas disposições que regulam a aplicação destes benefícios fiscais não tenhamos norma identifica àquela que se encontra vertida no n.º 10 do artigo 48.º do CIRC («Não são suscetíveis de beneficiar deste regime as propriedades de investimento, ainda que reconhecidas na contabilidade como ativo fixo tangível.»), parece-nos que não foi intuito do legislador considerar este tipo de investimentos como investimento relevantes para efeito do CFEI II e da DLRR.
Desta forma, salvo melhor opinião, tratando-se de investimentos em propriedades de investimento, ainda que estas estejam reconhecidas como ativo fixo tangível por aplicação do NC-ME, entendemos que estes investimentos não configuram aplicações relevantes para efeitos do CFEI II e da DLRR, por falta de enquadramento, respetivamente, no disposto no artigo 4.º do Anexo V da Lei n.º 27-A/2020 e do artigo 30.º do CFI.
A este propósito, recomendamos a consulta da informação vinculativa da Autoridade Tributária, Processo n.º 2019 000478, por despacho de 23 de janeiro de 2019, da diretora de serviços do IRC, PIV 15044, sob o tema «DLRR - Reinvestimento em imóvel para rendimento», da qual transcrevemos o parágrafo seguinte e que pode consultar aqui na íntegra:
«(...) 8. As propriedades de investimento ainda que reconhecidas na contabilidade como ativos fixos tangíveis não podem beneficiar deste benefício fiscal, como aliás, também não beneficiam do regime do reinvestimento dos valores de realização previsto no artigo 48.º do Código do IRC e conforme o n.º 10 deste artigo. (...)»
Sem prejuízo do acima disposto, poderá o sujeito passivo questionar diretamente à Autoridade Tributária e Aduaneira, através da apresentação de pedido de informação vinculativa, nos termos e prazos previstos no artigo 68.º da LGT, por forma a obter um entendimento vinculativo para a sua situação concreta.