PT27198 - outubro de 2022
Numa empresa unipessoal, com a atividade de compra e venda de imóveis, o sócio faz várias transferências de montante elevado para possibilitar que a empresa proceda à compra de mercadorias. Prevê-se a sua devolução num período superior a um ano e sem juros.
Que contas devem ser movimentadas para que a devolução do dinheiro ao sócio esteja isenta de qualquer pagamento ao Estado?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico de empréstimos efetuados pelo sócio a uma sociedade, com característica de suprimento. Questiona concretamente qual a conta do plano de contas que deve utilizar no registo contabilístico.
Os empréstimos efetuados pelos sócios à sociedade podem ser considerados como suprimentos quando cumpram os termos previstos no artigo 243.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
São considerados como suprimentos o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência, conforme o n.º 1 do artigo 243.º do CSC.
O n.º 2 e 3 do artigo 243.º do CSC dispõe que constitui índice do carácter de permanência a estipulação de um prazo de reembolso superior a um ano, quer tal estipulação seja contemporânea da constituição do crédito quer seja posterior a esta. No caso de diferimento do vencimento de um crédito, computa-se nesse prazo o tempo decorrido desde a constituição do crédito até ao negócio de diferimento.
É igualmente índice do carácter de permanência a não utilização da faculdade de exigir o reembolso devido pela sociedade durante um ano contado da constituição do crédito, quer não tenha sido estipulado prazo quer tenha sido convencionado prazo inferior.
O n.º 3 do artigo 244.º do CSC estabelece que a celebração de contratos de suprimentos não depende de prévia deliberação dos sócios, salvo disposição contratual em contrário.
A celebração do contrato de suprimentos entre os sócios e a sociedade não está dependente de uma forma especial, podendo ser titulado por um documento escrito ou por qualquer outra forma, conforme o n.º 6 do artigo 243.º do CSC.
Cabe aos sócios que irão assumir a realização dos suprimentos para a sociedade estabelecer os formalismos e condições desse empréstimo, conforme previsto no n.º 2 do artigo 244.º do CSC, podendo os mesmos serem efetuados a título oneroso ou gratuito, e com ou sem prazo de vencimento definido por remissão para o artigo 209.º do CSC.
Estes sócios podem deliberar sobre se os suprimentos devem ser titulados através de um documento escrito, se o mesmo deve ser objeto de autenticação notarial ou mesmo por escritura pública, bem como definir as condições do empréstimo, tal como o prazo de vencimento e o estabelecimento de juros.
Os empréstimos com características de suprimentos, incluindo os respetivos juros, efetuados pelos sócios à sociedade estão isentos de imposto do selo, desde que realizados por sócios que detenham diretamente uma participação no capital não inferior a 10 por cento e que esta tenha permanecido na sua titularidade durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, contando que, neste caso, a participação seja mantida durante aquele período, conforme na alínea i) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo (CIS).
Em termos contabilísticos, no Sistema de Normalização Contabilística (SNC), as operações de financiamentos obtidos estão concentradas numa mesma conta (25 - Financiamentos obtidos), independentemente do tipo de entidades envolvidas.
A conta 25 - Financiamentos obtidos do SNC destina-se a registar os financiamentos obtidos, sejam de instituições de crédito (bancos, sociedades de leasing e outros similares), dos participantes de capital (sócios) ou de outras empresas do grupo.
Esta conta é apresentada no balanço, na parte do passivo, mais concretamente na rubrica «Financiamentos obtidos», sendo que as quantias podem ser apresentadas de modo distinto, em função do prazo de maturidade desses financiamentos, ou seja, de estar previsto que venham a ser liquidadas num período até doze meses após a data do balanço (passivo corrente) ou a mais de doze meses (passivo não corrente).
A conta 253 - Participantes de capital destina-se ao registo dos financiamentos obtidos, nomeadamente suprimentos e outros mútuos, que tenham origem em entidades participantes de capital, pessoas singulares ou outras sociedades.
No âmbito das 28 NCRF, pode utilizar a conta 2532 - Financiamentos obtidos - Participantes de capital - Outros participantes - Suprimentos e outros mútuos, para registar o suprimento, considerando a taxonomia 100 ou 101 para a classificação como corrente ou não corrente, respetivamente.
Caso o normativo contabilístico onde se enquadre a entidade seja o das microentidades (NC-ME), pode utilizar a conta 258 - Financiamentos obtidos - Outros financiadores, para registar o suprimento, considerando a taxonomia 55 ou 56 para a classificação como corrente ou não corrente, respetivamente.
No âmbito da NC-ME, não está prevista a utilização da conta 253 - Participantes de capital, tal como decorre do Código de Contas do SNC (publicado pela Portaria n.º 218/2015, de 23 de julho), na coluna «Ajustamentos ao Código de Contas para as ME.»