Opinião
Ordem nos media
As novas regras do art. .º 35 do CSC
4 February 2005
Opinião de Amândio Silva, jurista da CTOC
Após muita polémica e incerteza sobre a produção ou não de efeitos durante o ano de 2005 do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais, o governo, com a publicação do Decreto-Lei n.º 19/2005, de 18 de Janeiro, veio alterar o regime aplicável às sociedade que tenham perdido metade do capital social, limitando o efeito imediato da dissolução automática. No presente artigo, analisaremos o novo regime jurídico do artigo 35.º e abordaremos também o papel dos TOC no cumprimento destas obrigações. I ¿ Regime jurídico do artigo 35.º Nos termos da nova redacção do n.º 1, se dos resultados das contas do exercício ou de contas intercalares resultar que foi perdido metade do capital social, ou havendo, em qualquer momento, razões sérias para admitir que tal possa vir a acontecer, a gerência da sociedade deve, de imediato, convocar uma assembleia geral. No caso das sociedades anónimas, a administração ou direcção, deve requerer ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral a convocação da assembleia geral (artigo 377.º do CSC). Na convocatória da assembleia geral devem constar, pelo menos, os seguintes assuntos (n.º 3): - A dissolução da sociedade; - A redução do capital social para montante não inferior ao capital próprio da sociedade, com respeito, se for o caso, do disposto no artigo 96.º; - A realização pelos sócios de entradas para reforço da cobertura do capital. De acordo com o n.º 2, considera-se estar perdida metade do capital social quando o capital próprio da sociedade for igual ou inferior a metade do capital social. Em termos práticos, caberá, num primeiro momento, ao TOC alertar formalmente a gerência ou a administração para a perda de metade do capital social quando proceder ao encerramento da contabilidade do exercício ou quando, durante o exercício, suspeitar que tal possa vir a acontecer. A violação pela gerência do dever de convocar uma assembleia geral ou, no caso da administração, de o solicitar, tem como consequência a sua responsabilização civil, nos termos do artigo 72.º - os gerentes, administradores ou directores respondem para com a sociedade, pelos danos a esta causados por actos ou omissões praticados com preterição dos deveres legais ou contratuais ¿ e criminal, de acordo com o artigo 523.º - O gerente, administrador ou director de sociedade que, verificando pelas contas de exercício estar perdida metade do capital, não der cumprimento ao disposto no artigo 35º, n.ºs 1 e 2, será punido com prisão até meses e multa até 90 dias. Se, pelo contrário, a gerência ou a administração da sociedade cumprir com estes deveres, ainda que a assembleia não adopte as medidas por si propostas, a sua responsabilidade cessa. II - Medidas a adoptar pela Assembleia Geral As medidas a adoptar pelas sociedade, nos termos da nova redacção do n.º 3, são, genericamente, as mesmas que já estavam previstas. A saber: a) Dissolução da sociedade Perante a situação financeira da sociedade, os sócios poderão concluir que a melhor opção será dissolve-la. Para tal, a deliberação da dissolução da sociedade, nas sociedades por quotas, deve ser tomada por maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social, a não ser que o contrato exija maioria mais elevada ou outros requisitos (artigo 270.º). Nas sociedades anónimas, a deliberação deve ser aprovada por dois terços dos votos emitidos (artigo 286.º n.º 3). A assembleia geral só poderá, no entanto, deliberar em primeira convocação se estiverem presentes ou representados accionistas que detenham, pelo menos acções correspondentes a um terço do capital social. b) Redução do capital A redução do capital aparenta ter o efeito contrário daquele que o artigo 35.º pretende prosseguir já que diminuindo o capital social também diminuem as garantias dos credores. No caso, o objectivo será essencialmente assegurar uma maior transparência e verdade na correlação capital social e capitais próprios. A deliberação de redução do capital social está, excepcionalmente, dispensada de autorização judicial (artigo 95.º n.º 3) e, correspondendo a uma alteração do pacto social, está sujeito às maiorias previstas nos artigos 265.º, 283.º n.º 2 e 386.º n.º 4. Na nova redacção da al. b) relativa à redução do capital social refere-se a possibilidade de o capital social ser reduzido para um montante inferior ao capital social mas não inferior ao capital próprio. Deverá, no entanto, ficar expressamente previsto que, nos 60 dias seguintes a esta deliberação, se efectivará um aumento do capital para montante igual ou superior ao mínimo legal (vide artigo 96.º n.º 1 do CSC). c) Realização de entradas pelos sócios para cobertura do capital O aumento de capital será a opção aparentemente mais lógica para resolver a falta de capitais próprios. O esforço exigido aos sócios poderá, no entanto, ser muito elevado e, no futuro, a sociedade ver-se confrontada com algumas dificuldades em obter o equilíbrio desejado entre capitais próprios e o capital social. Acresce que a deliberação de aumento do capital, salvo cláusula contratual em contrário, só poderá se adoptada por unanimidade, o que poderá dificultar a aprovação em assembleia geral. Assim, em alternativa, poderão os sócios efectuar prestações suplementares, nos termos do artigo 210.º do CSC. As prestações suplementares têm sempre dinheiro por objecto (201.º n.º 2 do CSC). Compete à assembleia geral fixar o montante exigível - respeitando os limites estatutários - e o prazo da prestação, o qual não poderá ser inferior a 30 dias a contar da comunicação aos sócios. Por fim, os sócios poderão também optar por realizar entradas directamente para cobertura de prejuízos . Esta possibilidade pressupõe uma prévia deliberação dos sócios por unanimidade. III ¿ INCUMPRIMENTO DO ARTIGO 35.º Na redacção até agora em vigor, a cominação pelo incumprimento seria a dissolução automática. Com o novo regime, a dissolução automática por incumprimento do artigo 35.º, cessa por revogação do n.º 4 do artigo 35.º e da alínea f) do artigo 141.º. De acordo com o preâmbulo do presente decreto-lei, «já não se justifica, porém, que a manutenção de uma qualquer desconformidade entre o capital social e o capital próprio se assuma como fundamento de dissolução da sociedade...». Em substituição, nas menções externas (contratos, correspondência, publicações, anúncios, etc) as sociedades por quotas, anónimas e em comandita por acções devem indicar o capital social, o montante do capital realizado, se for diverso, e o montante do capital próprio segundo o último balanço aprovado, sempre que este for igual ou inferior a metade do capital social (artigo 171.º n.º 2).