A nossa vivência em sociedade assenta num conjunto de regras e valores que os responsáveis pela sua conduta, definem como «boas» para a sua gestão. Isto é, que são aconselháveis para a vivência harmónica dos elementos que constituem essa sociedade.
Regras e valores que assentam, umas em dados históricos, outras na evolução que a própria sociedade tornou necessárias.
As regras de conduta social, que em termos genéricos denominamos por leis, têm uma natureza imperativa e aplicação universal.
Porque se destinam a serem observadas por cidadãos, em bom rigor, deveriam deles emergir, mas sobretudo serem cotejadas entre si para evitar a contradição que a sua falta pode originar.
Não raras vezes, confrontamo-nos com normas reguladoras que são boas nos seus princípios, mas contraditórias com outras disposições.
É o caso da alteração no Orçamento de Estado da obrigatoriedade de possuir uma conta bancária em que se registe obrigatoriamente determinados valores inerentes ao exercício de uma actividade comercial, industrial ou profissional.
O principio desde há muito reclamado pelos Técnicos Oficiais de Contas, cujos méritos em nosso entender são indiscutíveis para a implementação de um maior rigor e transparência na vida das empresas e dos empresários, não foi devidamente estudado, com vista a possibilitar a sua aplicação universal.
Na verdade, imagine-se que determinada empresa ou empresário que estejam inibidos do uso de cheque: como podem dar cumprimento àquela disposição se pura e simplesmente não têm cheques para emitir?
Evidentemente que estou de acordo que pessoas ou empresas que não cumpram com as suas obrigações no que respeita à emissão de cheques, sejam inibidos do seu uso.
Compreendendo e estando de acordo, julgo que, perante a possibilidade da inibição do uso de cheque e, consequentemente, a sua inexistência, deveriam ser previstas alternativas a esta situação. Existir uma lacuna nesta questão demonstra, de algum modo, a forma aligeirada como se produzem as leis em Portugal.
Perante a impossibilidade do cumprimento da norma o que é que os empresários e empresas que se vejam perante a inibição do uso de cheque podem fazer, para não se colocarem numa situação de incumprimento no que concerne às disposições fiscais?
A «novela» a que temos assistido, inerente às alterações do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais é um outro exemplo característico sobre a consciência que deve existir do legislador ao fazer as leis e do rigor que deve colocar na sua concepção, para que o cidadão, ao ver a lei, a compreenda e respeite.
Continuamos a cultivar, independentemente da função que cada um desempenha no circuito funcional da sociedade, uma cultura autista, como se cada um estivesse a gerir a sua própria quinta, vertendo nela a sua visão hermética das coisas e do mundo.
A interacção de experiências e conhecimentos, com especial realce daquele que é de experiência feito, é uma fonte de saber, sem menosprezo de outros que, continuamos a pensar.
Mas para que tal seja possível impõe-se uma mudança de mentalidades, onde a competência se sobreponha ao oportunismo e o saber prevaleça sobre o «aventureirismo».