PT27420 - fevereiro de 2023
Determinada empresa está a reconstruir um imóvel que tomou de arrendamento, com um contrato de 20 anos. Esta reconstrução implica significativas obras de melhoramento, despesas de arquitetura e engenharia, entre outras. Este imóvel destina-se ao desenvolvimento de uma nova atividade da empresa, mais concretamente uma unidade hoteleira.
As obras e outros investimentos, móveis, etc., poderão ser considerados investimento elegível para efeitos da dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR)?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao benefício fiscal «Dedução por lucros retidos e reinvestidos» (DLRR), previsto nos artigos 27.º a 34.º do Código Fiscal ao Investimento (CFI) anexo ao Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, regulamentado pela Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro. Nomeadamente no justificativo do montante dos lucros retidos e reinvestidos.
A DLRR constitui um regime de incentivos fiscais ao investimento a favor de micro, pequenas e médias empresas, contribuindo para o reforço da estrutura de capital das empresas.
Podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos de IRC residentes em território português, bem como os sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável neste território, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:
- Sejam micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003;
- Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
- O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
- Tenham a situação fiscal e contributiva regularizada.
O DLRR não é aplicável ao reinvestimento de lucros retidos nos setores da pesca, da aquicultura e da produção agrícola primária (produção de produtos da terra e da criação animal).
Não podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos que:
- Estejam sujeitos a uma injunção de recuperação na sequência de uma decisão da Comissão Europeia, ainda pendente, que declare um auxílio ilegal e incompatível com mercado interno;
- Sejam empresa em dificuldade, nos termos do parágrafo 18 do artigo 2.º do RGIC.
Os sujeitos passivos podem deduzir à coleta do IRC, nos períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de janeiro de 2014, até 10 por cento dos lucros retidos que sejam reinvestidos em aplicações relevantes nos termos do artigo 30.º, no prazo de quatro anos contados a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos.
O montante máximo dos lucros retidos e reinvestidos, em cada período de tributação, é 10 dez milhões de euros, de acordo com o n.º 2 do artigo 29.º do CFI.
A dedução é feita, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, até à concorrência de 25 por cento da coleta do IRC.
No caso dos sujeitos passivos que sejam micro e pequenas empresas, tal como definidas na Recomendação 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, a dedução prevista no n.º 2, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, é feita até à concorrência de 50 por cento da coleta do IRC.
Os sujeitos passivos que beneficiem da DLRR devem proceder à constituição, no balanço, de reserva especial correspondente ao montante dos lucros retidos e reinvestidos. A reserva especial assim constituída não pode ser utilizada para distribuição aos sócios antes do fim do quinto exercício posterior ao da sua constituição, sem prejuízo dos demais requisitos legais exigíveis.
Consideram-se aplicações relevantes os ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
- Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em projetos de indústria extrativa;
- Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas;
- Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, salvo quando afetas à exploração de serviço público de transportes ou destinadas a serem alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, barcos de recreio e aeronaves de turismo;
- Artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
- Ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do setor público.
Considera-se investimento realizado em aplicações relevantes o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso. Não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso.
No caso de ativos adquiridos em regime de locação financeira, a dedução é condicionada ao exercício da opção de compra pelo sujeito passivo no prazo de cinco anos contado da data da aquisição.
As aplicações relevantes em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos devem ser detidas e contabilizadas de acordo com as regras que determinaram a sua elegibilidade, por um período mínimo de cinco anos.
Quando ocorra a transmissão onerosa dos ativos em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos antes de decorrido o prazo previsto no parágrafo anterior, o sujeito passivo deve reinvestir, no mesmo período de tributação ou no período de tributação seguinte, o respetivo valor de realização em aplicações relevantes nos termos do presente artigo, os quais devem ser detidos, pelo menos, pelo período necessário para completar aquele prazo.
Apenas são elegíveis as aplicações relevantes nos ativos previstos que respeitem a um investimento inicial, tal como definido na alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro.
Investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, consideram-se os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
A dedução à coleta é justificada por documento a integrar o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º do Código do IRC, que identifique discriminadamente o montante dos lucros retidos e reinvestidos, as aplicações relevantes objeto de reinvestimento, o respetivo montante e outros elementos considerados relevantes.
A contabilidade dos sujeitos passivos de IRC beneficiários da DLRR deve evidenciar o imposto que deixe de ser pago em resultado da dedução a que se refere o artigo 29.º, mediante menção do valor correspondente no anexo às demonstrações financeiras relativa ao exercício em que se efetua a dedução.
Sem prejuízo do disposto no Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 15 de junho:
- A não concretização da totalidade do investimento nos termos previstos no artigo 30.º até ao termo do prazo de três anos previsto no n.º 1 do artigo 29.º implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente ao montante dos lucros não reinvestidos, ao qual é adicionado o montante de imposto a pagar relativo ao terceiro período de tributação seguinte, acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais;
- O incumprimento do disposto nos números 4, 5 ou 6 do artigo 30.º, implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente aos ativos relativamente aos quais não seja exercida a opção de compra ou que sejam transmitidos antes de decorrido o prazo de cinco anos, o qual é adicionado ao montante de imposto a pagar relativo ao período em que se verifiquem esses factos, acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais;
- A não constituição da reserva especial, nos termos do n.º 1 do artigo 32.º, implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado, ao qual é adicionado o montante de imposto a pagar relativo ao terceiro período de tributação seguinte, acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais;
- O incumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 32.º implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado correspondente à parte da reserva que seja utilizada para distribuição aos sócios, ao qual é adicionado o montante de imposto a pagar relativo ao terceiro período de tributação seguinte, acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais.
Concretamente em relação à questão colocada, conforme dispõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 30.º consideram-se aplicações relevantes, para efeitos da DLRR, os ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, incluindo a construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, desde que afetos a atividades produtivas ou administrativas.
Com efeito, o n.º 2 do artigo 30.º do Código Fiscal do Investimento determina como relevante o investimento em ativos tangíveis desde que afetos à exploração.
No entanto, há limitações estabelecidas na Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que devemos analisar.
Pelo artigo 11.º da Portaria acima citada, para efeitos da DLRR apenas são elegíveis as aplicações relevantes em ativos aí previstos que respeitem a um investimento inicial, tal como definido na alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015.
Analisando, então, o conceito de investimento inicial estabelecido na Portaria n.º 297/2015, artigo 2.º, n.º 2 alínea d), temos que será considerado como tal o investimento relacionado com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente, ou a alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento já existente.
Pelo que, no pressuposto de se estar perante a execução de obras para adaptação do imóvel à atividade administrativa ou produtiva da entidade pode ser elegível para efeitos de benefício da DLRR.
A este respeito referimos o processo: 2021 000036, PIV n.º 19533, sancionado por despacho, de 5 de março de 2021, da diretora de serviços do IRC, que aconselhamos a leitura, e onde é referido que «caso as obras de adaptação e beneficiação do edifício/pavilhão consubstanciem investimentos considerados de uma forma global, que se qualifiquem contabilisticamente como "grandes reparações ou beneficiações" de edifícios afetos a atividades produtivas ou administrativas, de forma a aumentarem o seu valor escriturado e respetiva vida útil, e que sejam consideradas no ativo fixo tangível da entidade, ficando sujeitas ao regime de depreciações, previsto no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro (que estabelece o regime das depreciações e amortizações para efeitos do IRC), poderão considerar-se aplicações relevantes para efeitos da DLRR, desde que se encontrem cumpridos os demais requisitos.»
Por fim, importa dar nota que a DLRR foi revogada pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro.