Opinião
Ordem nos media
Ajudas de custo: Novas penalizações para as empresas
1 Dezembro 2006
Artigo de Ana Cristina Silva, Consultora da CTOC

 

                                      

É sabido que os rendimentos do trabalho dependente são aqueles que sofrem mais tributação. Porém, nos últimos anos vulgarizaram-se esquemas que, fazendo uso de recursos legais, serviam para aumentar o ordenado do trabalhador mas sem aumentar a sua tributação. Um desses expedientes é o recurso a abonos que, normalmente visam compensar o trabalhador de gastos que suporta ao serviço da empresa, é o caso das ajudas de custo e da compensação pelo uso de viatura própria, os designados «quilómetros».
Se o trabalhador fica beneficiado pela atribuição destes montantes, não sujeitos a IRS e a Segurança Social até um determinado limite, a entidade patronal não deixa de ter também uma vantagem, na medida em que não tem de pagar Segurança Social sobre estes subsídios.
Mas quem conhece o funcionamento da Administração Fiscal sabe que quando se forçam determinados limites, mais tarde ou mais cedo surge uma resposta. Assim, não só nas inspecções tributárias se passou a verificar ao pormenor os fundamentos da atribuição destes abonos e a esmiuçar os boletins itinerários que suportam a sua atribuição, como se começou a penalizar efectivamente as empresas pela sua atribuição através da tributação autónoma dos montantes de ajudas de custo e de «quilómetros» concedidos sem serem facturados a clientes.

E falamos em penalização efectiva porque antes de 2000 a desconsideração como custo fiscal de 20 por cento das ajudas de custo e «quilómetros» atribuídos não tinha reflexo efectivo nas empresas que apresentavam prejuízos fiscais, pois estas apenas viam reduzidos o montante dos prejuízos fiscais que sucessivamente iam reportando.

Esta penalidade «por grosso» ou indistinta, como já dissemos, não relegou para segundo plano os esforços de detecção de todos aqueles que usavam estas regras como expediente para atribuir mais ordenado ao trabalhador sem tributação. Neste ponto, os Serviços de Inspecção foram «ajudados» por algum exagero do recurso a falsas ajudas de custo, que se institucionalizavam junto das entidades empregadoras, chegando estas a atribuí-las para remunerar trabalhadores independentes, situação claramente fora da previsão da norma legal.
Mas quando o esquema é detectado, é o trabalhador que tem de arcar com o imposto que não foi liquidado. Certo que beneficiou do rendimento e portanto assiste à Administração Fiscal o direito de o tributar, mas se pensarmos que muitas vezes o trabalhador é a parte mais fraca da relação laboral, e que em muitos casos desconhece as consequências desse procedimento irregular, até nos podemos questionar o motivo pelo qual a sua entidade patronal não é também penalizada em Imposto sobre o Rendimento. Até agora, descoberta a irregularidade do uso deste mecanismo legal, a entidade empregadora apenas poderia vir a ser sujeita a juros compensatórios pelo pagamento do imposto em falta correspondente à retenção na fonte que deveria incidir sobre este rendimento, juros esses contados desde o momento que a retenção deveria ter sido feita até à data em que o trabalhador declarou os rendimentos.
Pretende-se agora com o Orçamento do Estado para 2007, segundo a proposta apresentada pelo Governo, que seja atribuída responsabilidade solidária ao empregador pelos montantes não retidos na fonte, ou seja, este pode vir a ser chamado a pagar o imposto em falta. É este o conteúdo do n.º 4 do art. 103º do CIRS segundo aquela Proposta de Lei, que se irá aplicar a todos valores qualificados como rendimentos do trabalho dependente e sujeitos a retenção na fonte mas que não tenham sido considerados como tal pela entidade empregadora.
E se a penalização é uma forma de desmotivar comportamentos ilegais, podemos dizer que ambas as partes infractoras ficam em igualdade de circunstâncias perante a lei, na medida em que a responsabilidade pelas entregas dos valores em falta é atribuída a ambos e não só ao trabalhador.