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Barco de recreio
12 Maio 2021
Barco de recreio
26-04-2021

Uma empresa adquiriu um barco de recreio para efeitos da atividade de animação turística (passeios turísticos e sessões de pesca).
No entanto, as faturas foram emitidas sem IVA ou qualquer outro imposto. A Autoridade Marítima Nacional, aquando do registo da embarcação, insinua que as faturas foram mal emitidas pelo facto de não liquidarem quaisquer impostos.
Uma fatura emitida nestas condições está correta? Poderá haver lugar à liquidação de algum imposto?

Parecer técnico

As questões colocadas referem-se ao enquadramento, em sede de IVA, da aquisição de uma embarcação a um sujeito passivo espanhol.
No caso concreto, «uma empresa adquiriu um barco de recreio para efeitos da atividade de animação turística (passeios turísticos e sessões de pesca).»
É referido que, «no entanto, as faturas foram emitidas sem IVA ou qualquer outro imposto.»
É ainda referido que «a Autoridade Marítima Nacional, aquando do registo da embarcação, insinua que as faturas foram mal emitidas pelo facto de não se liquidarem quaisquer impostos.»
Pretende-se saber, neste sentido, o enquadramento em sede de IVA desta aquisição.
No caso concreto, tendo em conta que se trata de um sujeito passivo nacional, poderemos estar, em circunstâncias normais, perante duas situações possíveis:
- O comprador adquiriu o veículo usado ao abrigo de um regime similar ao nosso Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objetos de Arte, de Coleção e Antiguidades, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 199/96, de 18 de outubro; ou
- O comprador adquiriu o veículo usado ao abrigo do regime normal das transações intracomunitárias.
Se o fornecedor tivesse aplicado o regime da margem, em Espanha, a fatura de suporte à operação deverá, em princípio, conter a seguinte expressão: «Entrega com arreglo a lo dispuesto en la directiva 94/5/CE», conforme anexo II da Circular n.º 54/2005, da DGAIEC.
Contudo, analisando o documento anexo, encontramos, na penúltima componente da segunda página, a seguinte referência:
«Nota: entrega intracomunitaria de bienes exenta de IVA de acuerdo con el art.º 25 de la Ley 37/1992 del IVA.»
A isenção prevista neste artigo mencionado é similar à isenção do nosso artigo 14.º do RITI, pelo que se confirma que o fornecedor espanhol utilizou, de facto, o regime normal das transmissões intracomunitárias, o que significa que, ao contrário do que a Autoridade Marítima Nacional refere, a fatura encontra-se bem emitida.
Neste sentido, conforme resulta da alínea a) do número 1 do artigo 2.º RITI:
«1 – São considerados sujeitos passivos do imposto pela aquisição intracomunitária de bens:
a) As pessoas singulares ou coletivas mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA que realizem transmissões de bens ou prestações de serviços que conferem direito à dedução total ou parcial do imposto.»
Este entendimento vai de encontro ao disposto na alínea d) do número 1 do artigo 2.º do CIVA, que refere que:
«1 – São sujeitos passivos do imposto:
(…)
d) As pessoas singulares ou coletivas que efetuem operações intracomunitárias, nos termos do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias.»
Assim, pelo facto de efetuar uma aquisição intracomunitária, torna-se o sujeito passivo português, adquirente da embarcação, sujeito passivo do imposto, devendo, desse modo, proceder à autoliquidação do respetivo imposto em Portugal.
A aquisição deverá ser relevada nos campos 12 (valor tributável) e 13 (imposto liquidado à taxa normal), materializando, neste sentido, a autoliquidação do imposto devido em Portugal, nos termos dos parágrafos anteriores.
Será preciso, agora, analisar se o sujeito passivo poderá, ou não, exercer o direito à dedução.
Em sede de IVA, o mecanismo das deduções está previsto nos artigos 19.º a 26.º do Código do IVA (CIVA). No tocante a esta matéria, como sabemos, nos termos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA, o sujeito passivo pode deduzir todo o imposto suportado na aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos, desde que esses bens e serviços sejam utilizados pelo sujeito passivo para a realização de operações sujeitas a imposto e dele não isento, bem como as operações mencionadas na alínea b) do número 1 do artigo 20.º do CIVA.
Todavia, além da limitação consagrada no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, há que atender ao disposto no artigo 21.º do CIVA, que estabelece limitações ao exercício do direito à dedução, derivadas da natureza dos bens e serviços adquiridos.
Neste sentido, salienta-se o disposto na alínea a) do número 1 do artigo 21.º do CIVA, que indica que não são dedutíveis as:
«a) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação, à utilização, à transformação e reparação de (…) barcos de recreio, (…).»
Deste modo, de acordo com esta alínea, as despesas relativas à aquisição de barcos de recreio, não conferem o direito à dedução (apesar de na questão não ser referido se estamos, ou não, perante um barco de recreio, iremos partir desse pressuposto).
No entanto, o número 2 do mesmo artigo 21.º do CIVA contempla exceções onde o IVA poderá ser passível de ser deduzido, entre as quais se salienta a alínea a), que contém a seguinte redação:
«a) Despesas mencionadas na alínea a) do número anterior, quando respeitem a bens cuja venda ou exploração constitua objeto de atividade do sujeito passivo, sem prejuízo do disposto na alínea b) do mesmo número, relativamente a combustíveis que não sejam adquiridos para revenda.»
Assim, poderá ser aplicada uma exceção a esta exclusão, nos termos da alínea a) do mesmo número 2 do mesmo artigo 21.º do CIVA, se estas despesas forem relativas a barcos de recreio cuja venda ou exploração constitua objeto de atividade do sujeito passivo.
De acordo com o número 9 do Ofício-Circulado n.º 30 152/2013, de 16 de outubro, são exemplos desta exceção o ensino da condução e a exploração de táxis, atividades onde as viaturas são indispensáveis para a prática de operações sujeitas a IVA e dele não isentas e cuja exploração constitui o seu objeto.
Poderá encontrar este Ofício-Circulado no seguinte link:
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/legislacao/instrucoes_administrativas/Documents/IVA-of%20circ%2030152.pdf
Deste modo, somos de opinião de que, a confirmar-se que a exploração da viatura irá constituir o objeto da atividade do sujeito passivo (condição que, à partida, se encontra cumprida, uma vez que a atividade do sujeito passivo é «passeios turísticos e sessões de pesca»), desde que cumpridos os restantes critérios do direito à dedução, o IVA suportado na aquisição e demais despesas mencionadas na alínea a) do número 1 do artigo 21.º do CIVA poderá, de facto, ser deduzido.
A confirmar-se esta dedutibilidade, deverá ser inscrito no campo 20 (ativos não correntes) do quadro 06 da declaração periódica o valor do IVA autoliquidado inserido no campo 13.