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Brexit – Transportes
8 Janeiro 2021
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem
Brexit – Transportes
05-01-2021

O caso em apreço visa a solicitação de esclarecimento técnico sobre a liquidação e isenção de IVA com prestação de serviços de importação/exportação de/para Inglaterra de uma empresa transportes.
Serviço de transporte (sujeitos passivos):
1-Cliente PT:
Inicio da carga - Inglaterra
Descarga - Portugal
2-Cliente MC:
Inicio da carga - Inglaterra
Descarga - Portugal
3-Cliente MC:
Inicio da carga - Inglaterra
Descarga - UE
4-Cliente PT:
Inicio da carga - Inglaterra
Descarga - UE
Mercadorias (Sujeitos passivos)
Uma empresa de transporte ao transportar uma mercadoria de Inglaterra para Portugal paga IVA ao despachante e liquida em conjunto com o serviço de transporte ao adquirente? Existe possibilidade de o adquirente pagar o IVA diretamente ao despachante, e a empresa transportadora só liquidar o IVA do serviço de transporte? 

Em resposta às questões apresentadas e de acordo com a informação de que dispomos presentemente, o entendimento é o seguinte: 
A)        Localização das prestações de serviços
1.         De acordo com a atual redação do artigo 6.º do CIVA, há duas regras gerais de localização das prestações de serviços, que se diferenciam em função da natureza do adquirente.
2.         A 1.ª regra geral consta da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA e corresponde ao artigo 44.º da Diretiva IVA. Segundo ela, quando o adquirente dos serviços é um sujeito passivo do IVA - operações B2B – as operações são tributáveis no lugar onde o adquirente tem a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio fiscal, para o qual os serviços são prestados.
3.         A 2.ª regra geral está contida na alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA e corresponde ao artigo 45.º da Diretiva IVA. Segundo ela, quando o adquirente dos serviços for uma pessoa que não seja sujeito passivo do IVA – operações B2C – as operações são localizadas na sede, estabelecimento estável ou domicílio do prestador dos serviços.
4.         As regras gerais acabadas de definir comportam, no entanto, determinadas exceções, algumas das quais são comuns às duas regras gerais, enquanto outras são específicas das operações entre sujeitos passivos e não sujeitos passivos.
5.         Nestes casos, temos de esquecer as regras gerais antes enunciadas, uma vez que existem regras específicas de localização para estas prestações de serviços.
6.         Nos números 7 e 8 do artigo 6.º do CIVA temos as exceções às duas regras gerais e nos números 9, 10 e 11 as exceções à regra geral das prestações de serviços efetuadas por sujeitos passivos a não sujeitos passivos. No n.º 12 temos algumas situações especiais que, a não terem sido previstas, ocasionariam ausência de tributação e nefastas distorções de concorrência.
7.         As exceções que são comuns às duas regras gerais são as seguintes, cujas prestações de serviços são tributadas do modo a seguir indicado:

 

Natureza da prestação de serviços

Local de tributação

Prestações de serviços relacionadas com imóveis

Lugar onde se situa o imóvel, independentemente da qualidade do adquirente

Prestações de serviços de transporte de passageiros

Lugar onde se efetua o transporte, em função das distâncias percorridas, independentemente da qualidade do adquirente

Prestações de serviços de alimentação e bebidas, que não as executadas a bordo de uma embarcação, de uma aeronave ou de um comboio, durante um transporte intracomunitário de passageiros

Lugar onde ocorre o fornecimento dos serviços, independentemente da qualidade do adquirente

 

Prestações de serviços de alimentação e bebidas, executadas a bordo de uma embarcação, de uma aeronave ou de um comboio, durante um transporte intracomunitário de passageiros

Lugar de partida do transporte, independentemente da qualidade do adquirente

 

Prestações de serviços relativas ao acesso a manifestações de caráter cultural, artístico, científico, desportivo, recreativo, de ensino e similares, incluindo o acesso a feiras e exposições, assim como as prestações de serviços acessórias relacionadas com o acesso

Lugar onde as manifestações são materialmente executadas, independentemente da qualidade do adquirente

 


8.         Como se vê, não existe nenhuma regra específica para as prestações de serviços de transporte de mercadorias entre sujeitos passivos (operações B2B), o que significa que em tais prestações de serviços se aplica a regra geral prevista na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, segundo a qual tais prestações de serviços são localizadas e, consequentemente, tributáveis no lugar onde o adquirente tem a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio fiscal, para o qual os serviços são prestados.  
9.         Neste caso, a liquidação do IVA compete ao adquirente, o que significa que, sendo o adquirente um sujeito passivo português, é ele, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, o sujeito passivo do imposto, ou seja, é ele que tem de proceder à autoliquidação do IVA. Sendo o adquirente um sujeito passivo que não tenha no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio fiscal, para o qual os serviços são prestados, é a ele que compete proceder à autoliquidação do IVA.
10.     Após chegarmos à conclusão de que uma operação se localiza no território nacional, isso não significa que ela seja efetivamente tributada, pois pode beneficiar de alguma das isenções previstas nos artigos 9.º a 15.º do CIVA.
11.     De referir, ainda, que as regras de localização das prestações de serviços estabelecidas no artigo 6.º do CIVA têm uma aplicação de âmbito universal.
12.     Quer isto significar que a saída do Reino Unido da União Europeia e o fim do período transitório previsto no respetivo Acordo de Saída, que terminou em 31/12/2012, e que fez com que o Reino Unido passasse a ser um país terceiro a partir de 01/01/2021, não alterou as referidas regras, com exceção das aplicáveis no domínio das prestações de serviços por via eletrónica abrangidas pelo MOSS.
13.     No que toca às operações entre sujeitos passivos (operações B2B), que é o que está em causa no pedido em apreciação neste parecer, as regras de localização das prestações de serviços estabelecidas no artigo 6.º do CIVA continuarão a aplicar-se nos mesmos moldes. A única alteração decorrente do facto de o Reino Unido ter passado, a partir de 01/01/2021, a ser um país terceiro, tem a ver com o preenchimento das declarações periódicas do IVA. 
14.     Sendo o prestador dos serviços um sujeito passivo português e estando em causa prestações de serviços abrangidos pela regra geral da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, as faturas por si emitidas a sujeitos passivos do Reino Unido, que nas declarações periódicas respeitantes ao ano de 2020 eram incluídas no campo 7 do quadro 06 e, em consequência disso, na declaração recapitulativa, passarão, nas declarações periódicas respeitantes ao ano de 2021, a ser inscritas no campo 8 do quadro 06 e deixarão de ser incluídas na declaração recapitulativa.
15.     Estando em causa prestações de serviços abrangidos pela regra geral da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, adquiridos por um sujeito passivo português a um sujeito passivo do Reino Unido, que nas declarações periódicas respeitantes ao ano de 2020 eram incluídas no campo 16 do quadro 06, sendo o IVA autoliquidado incluído no campo 17, sendo a dedução do IVA, caso a ela haja direito, efetuada no campo 24, essas prestações de serviços passarão, nas declarações periódicas respeitantes ao ano de 2021, a ser inscritas nos campos 1, 3 ou 5 do quadro 06, conforme a taxa aplicável, e, simultaneamente, no campo 98 do quadro 06A. O IVA liquidado pelo sujeito passivo português, na qualidade de adquirente, passará a ser incluído nos campos 2, 4 ou 6, conforme a taxa aplicável. Quanto ao IVA dedutível ele continuará a ser incluído no campo 24.
16.     Após estas considerações, passemos à análise das situações expostas no pedido em apreciação no presente parecer, relacionadas com prestações de serviços de transporte de bens.
17.     1.ª situação: Cliente PT; Início da carga – Inglaterra; Descarga – Portugal
Tratando-se de uma operação entre sujeitos passivos – operação B2B – e sendo transportador um sujeito passivo com sede, estabelecimento estável ou domicílio em Portugal, aplica-se a regra geral contida na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, pelo que, sendo o adquirente um sujeito passivo português, a operação localiza-se em Portugal, sendo o transportador português o responsável pela liquidação do IVA, caso haja lugar à mesma.
Tais prestações de serviço de transporte beneficiam, no entanto, da isenção prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA, que estabelece uma isenção para "As prestações de serviços conexas com a importação cujo valor esteja incluído no valor tributável das importações de bens a que se refiram, conforme o estabelecido na alínea b) do n.º 2 do artigo 17.º”.
18.     2.ª situação: Cliente de um Estado-Membro diferente de Portugal; Início da carga – Inglaterra; Descarga – Portugal
Tratando-se de uma operação entre sujeitos passivos – operação B2B – e sendo transportador um sujeito passivo com sede, estabelecimento estável ou domicílio em Portugal, aplica-se a regra geral contida na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, pelo que, sendo o adquirente um sujeito passivo de um Estado-Membro diferente de Portugal, a operação não se localiza em Portugal, mas no Estado-Membro do adquirente, cabendo a este a obrigação de liquidação do IVA, caso haja lugar a essa liquidação (reverse charge).
Neste caso, o transportador português, deverá emitir a fatura correspondente ao transporte sem liquidação do IVA, mencionando na fatura "IVA – autoliquidação”.
19.     3.ª situação: Cliente de um Estado-Membro diferente de Portugal; Início da carga –Inglaterra; Descarga – Outro Estado-Membro diferente de Portugal.
Tratando-se de uma operação entre sujeitos passivos – operação B2B – e sendo transportador um sujeito passivo com sede, estabelecimento estável ou domicílio em Portugal, aplica-se a regra geral contida na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, pelo que, sendo o adquirente um sujeito passivo de um Estado-Membro diferente de Portugal, a operação não se localiza em Portugal, mas no Estado-Membro do adquirente, cabendo a este a obrigação de liquidação do IVA, caso haja lugar a essa liquidação (reverse charge).
Neste caso, o transportador português, deverá emitir a fatura correspondente ao transporte sem liquidação do IVA, mencionando na fatura "IVA – autoliquidação”.
20.     4.ª situação: Cliente PT; Início da carga – Inglaterra; Descarga – Outro Estado-Membro diferente de Portugal.
Tratando-se de uma operação entre sujeitos passivos – operação B2B – e sendo transportador um sujeito passivo com sede, estabelecimento estável ou domicílio em Portugal, aplica-se a regra geral contida na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, pelo que, sendo o adquirente um sujeito passivo português, a operação localiza-se em Portugal, sendo o transportador português o responsável pela liquidação do IVA, caso haja lugar à mesma.
Tais prestações de serviço de transporte beneficiam, no entanto, da isenção prevista na alínea p) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, que estabelece a isenção para "As prestações de serviços, incluindo os transportes e as operações acessórias, com exceção das referidas no artigo 9.º deste diploma, que estejam diretamente relacionadas com o regime de trânsito comunitário externo, o procedimento de trânsito comunitário interno, a exportação de bens para fora da Comunidade, a importação temporária com isenção total de direitos e a importação de bens destinados a um dos regimes ou locais a que se refere o n.º 1 do artigo 15.º”.
A este respeito e de conformidade com a informação vinculativa n.º 2379, sancionada por despacho de 01/09/2011, cabe referir que o Código do IVA não contém um conceito concreto de exportação, apenas preceituando uma isenção para as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por conta deste, bem como para outras operações que, nos termos legais, lhe são assimiladas.
O Código Aduaneiro da União (CAU) formula algumas definições relativas àquela realidade. Assim, nos termos do CAU, "Declaração aduaneira”: o ato pelo qual uma pessoa manifesta, na forma e segundo as modalidades prescritas, a vontade de atribuir a uma mercadoria um determinado regime aduaneiro, indicando, se for caso disso, os procedimentos específicos a aplicar (n.º 12 do artigo 5.º); "Estatuto aduaneiro": o estatuto das mercadorias enquanto mercadorias UE ou mercadorias não-UE (n.º 22 do artigo 5.º).
Face ao exposto, podemos considerar que as mercadorias destinadas a ser exportadas devem ser sujeitas ao respetivo regime aduaneiro e, consequentemente, ser objeto de declaração para esse mesmo regime, seja esta efetuada em formulário conforme modelo oficial aprovado para o efeito (DAU) ou em documento alternativo - documento comercial ou administrativo acompanhado de um pedido de sujeição das mercadorias ao regime aduaneiro em causa.
Apesar de as prestações de serviço de transporte internacional estarem relacionadas com exportações realizadas fora do território nacional, na situação em análise (4.ª situação) os bens transportados, originários do Reino Unido, são importados noutros Estados-Membros da União Europeia.
Ora, no caso das importações, determina o n.º 1 do artigo 17.º do CIVA que "O valor tributável dos bens importados é constituído pelo valor aduaneiro, determinado de harmonia com as disposições comunitárias em vigor”.
Estabelece, de seguida, o n.º 2 do mesmo artigo que, "O valor tributável dos bens importados inclui, na medida em que nele não estejam compreendidos:
Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos devidos antes ou em virtude da própria importação, com exclusão do imposto sobre o valor acrescentado;
As despesas acessórias, tais como despesas de comissões, embalagem, transportes e seguros, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens em território nacional, ou outro lugar de destino no território da Comunidade se este for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador na importação, com exclusão das despesas de transporte a que se refere a alínea t) do n.º 1 do artigo 14.º;
O valor das operações referidas na alínea p) do n.º 1 do artigo 14.º e nas alíneas b) a e) do n.º 1 do artigo 15.º.”
Se os transportes fazem parte do valor tributável das importações, caso os próprios prestadores desses serviços também liquidassem IVA sobre os mesmos serviços, havia uma dupla tributação.
É precisamente por isso que se preveem isenções para os transportes relacionados com importações (na alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA) e para os transportes relacionados com exportações ou com transmissões intracomunitárias de bens (respetivamente nas alíneas p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA).
Tais isenções têm natureza técnica, procurando evitar a dupla tributação das prestações de serviços de transporte.
Em face do que antecede, respeitando a situação em análise (4.ª situação) a transportes relacionados com operações de exportação, que vão dar origem a importações de bens noutros Estados-Membros, as prestações de serviços de transporte em causa, apesar de se localizarem em Portugal, beneficiam da isenção prevista na alínea p) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA.
É este o nosso entendimento sobre esta 4.ª situação. No entanto, uma vez que as prestações de serviços de transporte não são faturadas diretamente ao importador dos bens, embora o sejam de uma forma indireta, uma vez que o exportador repercutirá os custos do transporte no preço de venda, a AT poderá ter outro entendimento sobre a matéria, pelo que recomendamos a submissão, por parte da empresa portuguesa, de um pedido de informação vinculativa, nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária.
B)        Localização das transmissões de bens
21.     Tendo o Reino Unido passado a ser um país terceiro a partir de 01/01/2021, a entrada em Portugal de bens provenientes desse país passou a ser considerada uma importação.
22.     Como se sabe, nos termos do n.º 8 do artigo 27.º do CIVA, podem optar pelo pagamento do imposto devido pelas importações de bens nos termos do n.º 1, os sujeitos passivos que:
a)       Se encontrem abrangidos pelo regime de periodicidade mensal previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º;
b)      Tenham a situação fiscal regularizada;
c)       Pratiquem exclusivamente operações sujeitas e não isentas ou isentas com direito à dedução, sem prejuízo da realização de operações imobiliárias ou financeiras que tenham caráter meramente acessório;
23.     Nestes termos, o importador não terá de pagar qualquer IVA ao despachante ou ao transportador, caso opte pela autoliquidação do IVA nas declarações periódicas.
24.     Caso não seja efetuada essa opção, o IVA das importações é liquidado pela AT, através dos seus serviços aduaneiros.
25.     Ora, nos casos em que a liquidação é da competência dos serviços aduaneiros, ela é efetuada em nome do importador. O que sucede é que, normalmente, ocorre a intervenção de um despachante oficial e de um transitário, que procedem ao pagamento do IVA nos serviços aduaneiros em nome e por conta do importador, depois de, previamente, o cobrarem desse importador.
26.     Caso o importador não efetue a referida opção, existe a possibilidade de ele pagar o IVA diretamente ao despachante e não à empresa transportadora, desde que contratem entre todos que a conta da importação passe a ser apresentada ao importador pelo despachante. Nessa hipótese, o despachante, em vez de apresentar a conta ao transportador, para este a apresentar ao importador, passará a apresentá-la diretamente ao importador.
27.     Sendo celebrado um acordo, nesse sentido, entre as partes, a empresa transportadora passará a liquidar ao importador apenas o IVA do serviço de transporte.
28.     Ter em atenção, no entanto, que poderá não haver lugar a liquidação de IVA sobre o transporte, por lhe ser aplicável a isenção prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA.