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Capitalização de juros
14 Dezembro 2021
Capitalização de juros
23-11-2021

Relativamente a moratória de crédito de um leasing imobiliário, a contabilização destes juros que foram incorporados no capital em dívida são ou não aceites como custo fiscal do exercício de 2021?

Parecer técnico

A questão colocada relaciona-se com o documento suporte para registo contabilístico dos juros vencidos sobre um leasing financeiro.
A aplicação da moratória nos financiamentos está prevista no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março.
De acordo com o artigo 3.º do referido diploma, a moratória aplica-se a operações de crédito concedidas por instituições de crédito, sociedades financeiras de crédito, sociedades de investimento, sociedades de locação financeira, sociedades de factoring e sociedades de garantia mútua, bem como por sucursais de instituições de crédito e de instituições financeiras a operar em Portugal.
Para o caso em concreto, importa também lembrar que, uma moratória não é um perdão de dívida e, como tal, as demonstrações financeiras da entidade devem refletir o correspondente gasto com custos de financiamento imputados ao período (independentemente do fluxo financeiro correspondente ao pagamento) e o correspondente acréscimo do capital mutuado.
A NCRF 27 trata do reconhecimento de passivos financeiros, decorrentes de obrigações contratuais de pagar dívidas a terceiros.
A diferença entre os passivos, nomeadamente resultante de dívidas comerciais a pagar e financiamentos obtidos, os acréscimos de gastos e as provisões, é que os primeiros resultam de obrigações contratuais presentes de pagar uma quantia certa pela aquisição de um bem ou serviço ou financiamento concedido.
A obrigação contratual de um passivo resulta de uma fatura ou acordo contratualmente formalizado como o credor.
Pelo que este passivo, designado de passivo financeiro nos termos da NCRF 27, deve ser reconhecido no momento em que a entidade devedora se torne uma das partes contratuais, ou seja, quando formalmente (através de fatura ou contrato) assuma uma obrigação presente de pagar uma determinada quantia no futuro à outra parte.
Em termos práticos, os passivos apenas devem ser reconhecidos quando se receba a fatura ou assine o contrato a formalizar a dívida a pagar. É, nesse momento, que deve contabilizar essa dívida a pagar na respetiva conta corrente do credor (conta 22, 25 ou 271/8).
Os acréscimos de gastos devem ser reconhecidos por aquisições de bens ou serviços já recebidos ou utilizados, ou em que exista a obrigação de pagar juros por obtenção e utilização de financiamentos, mas em que não se tenha recebido a fatura ou assinado o contrato formal com o fornecedor ou outro credor, no cumprimento do pressuposto do acréscimo.
Na prática, os acréscimos de gastos são também passivos, pois representam obrigações presentes de pagar através de saídas futuras de recursos que incorporem benefícios económicos, mas que ainda não podem ser considerados como passivos financeiros (ou outro tipo de passivo) por não estarem ainda formalmente suportados por uma fatura ou contrato assinado.
Por vezes, os acréscimos de gastos devem ser determinados através de estimativas, por não se conhecer a respetiva quantia ou a tempestividade, no entanto, a incerteza dos acréscimos são muitos menores do que nas provisões.
No caso das provisões, apesar da incerteza quanto à tempestividade e quantia da saída de recursos no futuro, se existir uma obrigação presente que determine essa saída futura de recursos, sendo mais provável, do que não, de se verificar essa saída e sendo possível estimar com fiabilidade o montante da saída, haverá que reconhecer a referida provisão.
Se a obrigação não for presente, mas apenas possível, ou for uma obrigação presente mas for mais provável não existir saída de recursos no futuro ou não for possível determinar com fiabilidade a quantia, não se poderá reconhecer qualquer provisão, havendo que divulgar nas notas às demonstrações financeiras um passivo contingente.
Se a obrigação for apenas remota, não haverá nada a fazer.
Assim, na ótica da entidade financiada, o empréstimo obtido deve ser reconhecido como um passivo financeiro no momento da realização do contrato nos termos da norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 27 – Instrumentos financeiros.
Os passivos financeiros devem ser mensurados inicialmente pelo seu justo valor, que corresponde ao montante acordado entre as partes.
A mensuração subsequente deve ser efetuada ao custo amortizado, por se tratar de um empréstimo obtido detido à sua maturidade, nos termos do parágrafo 13 da NCRF 27.
Os passivos financeiros, mensurados ao custo amortizado, devem incluir os custos de transação, na respetiva mensuração inicial, conforme o parágrafo 10 da NCRF 27.
Efetivamente, pela utilização do método do juro efetivo, o valor do passivo financeiro, a reconhecer inicialmente, é o resultado dos pagamentos de caixa futuros (amortização de capital + juros) descontados para o momento presente, à taxa interna de rentabilidade da dívida, na respetiva quantia escriturada líquida, conforme conceito previsto no parágrafo 5 da NCRF 27.
Essa quantia escriturada líquida é o valor inicial do financiamento (valor nominal) acrescido dos custos de transação iniciais (se existirem, por exemplo, imposto do selo, comissões de negociação, despesas de dossier e outros).
Desta forma, no reconhecimento e mensuração inicial de um financiamento obtido que irá ser registado ao custo amortizado, há que acrescer à dívida a pagar todos os encargos com a operação, nomeadamente as comissões de contratação, imposto de selo, e outros similares.
A diferença entre a quantia total da dívida a pagar (capital e juros) e o respetivo custo amortizado, pela utilização do método do juro efetivo, irá sendo reconhecido como gastos de juros durante o período de pagamento acordado.
A taxa de juro efetiva é a taxa de mercado obtida por uma entidade nas mesmas condições de acesso ao crédito e para as mesmas características de crédito.
Esse juro a pagar é o juro determinado pela taxa efetiva, ou taxa interna de rentabilidade (TIR), associada a esse financiamento, que determina que o valor nominal do financiamento seja igual ao valor presente dos cash-flows associados ao financiamento durante o respetivo período do contrato.
De referir que mesmo que a dívida a pagar (passivo financeiro) seja recebida com base numa taxa de juro variável (por exemplo a Euribor) ou sejam alterados os momentos dos pagamentos, nomeadamente por acordo de moratória das prestações, esta pode ser mensurada ao custo amortizado.
Na ótica da empresa financiada, o empréstimo obtido deve ser reconhecido como um passivo financeiro no momento da realização do contrato nos termos da Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 27 – Instrumentos financeiros, com mensuração ao custo amortizado.
Os registos contabilísticos serão:
O registo contabilístico inicial, utilizando a mensuração ao custo amortizado pode ser:
Pelo reconhecimento inicial do empréstimo sem juros:
- Débito da conta 12 – Depósitos à ordem, pelo valor recebido (valor nominal);
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 258 – Financiamentos obtidos – Outros financiadores, pelo valor presente atualizado pela taxa de juro de mercado (valor recebido);
A mensuração subsequente do empréstimo obtido, pelo método do juro efetivo, deve implicar o aumento do passivo financeiro, pela respetiva capitalização dos juros.
Dessa forma, os juros implícitos no empréstimo, determinado pelo método do juro efetivo, devem ser reconhecidos como gasto de juros nos resultados do período, atendendo ao pressuposto do regime do acréscimo, por contrapartida da conta do passivo financeiro.
Em cada data de vencimento, pelo reconhecimento do gasto de juros:
- Débito da conta 691 – Juros suportados, pelo gasto de juros determinado pela taxa de juro efetiva sobre o capital em dívida à data;
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 258 – Financiamentos obtidos – Outros financiadores, pela atualização do passivo financeiro a cada data de relato e no final do empréstimo;
O reconhecimento do gasto de juros deve atender ao pressuposto do regime do acréscimo, em função do período decorrido do financiamento.
No momento do reembolso do empréstimo sem juros, pelo pagamento do valor nominal:
- Débito da conta 2531 – Financiamentos obtidos – entidade credora, pelo total do montante pago (valor presente e juros implícitos, determinados pela taxa de mercado);
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 12 – Depósitos à ordem, pelo montante pago.
Existindo uma alteração nas saídas de fluxos financeiros (datas de amortização financeira), em função do acordo estabelecido de moratória, deve voltar-se a determinar o gasto de juros, por aplicação da nova taxa de juro efetiva determinada por aumento do prazo do vencimento do empréstimo, tratando esta alteração duma alteração nas estimativas contabilísticas, com tratamento prospetivo, influenciando apenas o gasto de juros do período corrente e dos períodos futuros, nos termos do parágrafo 29 da NCRF 4.
Em termos fiscais, nos termos dos artigos 17.º e 18.º do Código do IRC, a determinação do lucro tributável tem como ponto de partida o resultado contabilístico, apurado de acordo com os princípios e regras contabilísticas.
No caso dos juros reconhecido nos resultados do período por aplicação do método de juro efetivo determinado nos termos da NCRF 27, há que referir que, é relevante para efeitos de determinação do lucro tributável de IRC, conforme previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 23.º do Código desse imposto.
A contabilização da alteração de estimativa contabilística decorrente da aplicação da moratória concedida pela entidade financiadora é suportada documentalmente, com o acordo assinado entre as partes nos termos do Decreto-Lei n.º 10-J/2020, não sendo obrigatória a emissão de qualquer outro documento pela entidade financiadora.
No entanto, no caso em que as entidades adotam a norma contabilística das microentidades (NC-ME) ou a NCRF-PE, nos termos dos parágrafos 17.3 da NC-ME e 17.6 da NCRF-PE, os ativos e passivos financeiros devem ser mensurados ao custo, pelo não tem que se utilizar o método da taxa de juro efetiva.
Nestes termos, na sequência das moratórias concedidas não há lugar a nenhuma atualização do saldo da divida a pagar (reconhecida na conta 25).
No entanto, atendendo ao pressuposto do regime do acréscimo (parágrafo 22 da estrutura concetual), os gastos são reconhecidos nos resultados do período a que respeitam, independentemente do momento do seu pagamento.
Assim, ainda que exista a moratória nos pagamentos da amortização financeira (capital e juros) do empréstimo, os juros continuam a decorrer pela passagem do tempo no contrato, pelo que a entidade reconhece os respetivos juros referente ao período da moratória, atendendo ao pressuposto do regime do acréscimo.
O registo contabilístico do acréscimo do gasto de juros é suportado com base na disposição legal e nos documentos decorrentes do pedido de moratória, não existindo qualquer adenda ao contrato.
Assim, pelos juros vencidos a entidade deverá debitar a conta 691 – Juros suportados, por contrapartida a crédito da conta 2722 – Credores por acréscimo de gastos, pelo valor dos juros relativos ao período.