Ordem nos media
Cessão de créditos do Estado e da Segurança Social
27 Outubro 2003
Opinião do secretário de Estado das Finanças e do Orçamento
A operação de cessão de créditos do Estado e da Segurança Social para efeitos de posterior titularização que o Governo decidiu montar em 2003, agora que a proposta de lei que define o seu enquadramento já foi apresentada, discutida e aprovada na generalidade na Assembleia da República, justifica alguns esclarecimentos públicos. Esses esclarecimentos tornam-se necessários face às dúvidas e perplexidades que a intenção de realização da operação suscitou, tanto mais surpreendentes quanto as cessões de créditos de contribuições para a Segurança Social e de créditos de impostos vencidos estão entre nós previstas há bastante tempo na lei e foram durante a década de 90 realizadas por diversas vezes. Com esse objectivo, convém recordar que uma operação de titularização consiste na cedência em bloco por uma entidade de determinados créditos com vista à subsequente emissão pela entidade adquirente (em Portugal, por imposição legal, tal entidade deve revestir a forma de uma sociedade de titularização de créditos ou de um fundo de titularização de créditos), de valores mobiliários (unidades de titularização ou obrigações titularizadas), cujos rendimentos são garantidos pelos créditos cedidos. No caso da operação que o Governo pretende realizar, os créditos a ceder são dívidas ao Fisco (IRS, IRC, IVA...) ou à Segurança Social, que não foram pagas ao Estado e/ou ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) «a tempo e horas» e que, por essa razão, são objecto de cobrança coerciva, exercida através do processo de execução fiscal. Significa isto que esta operação, ao envolver apenas créditos, em nada compromete a cobrança no futuro de receitas fiscais e de contribuições para a Segurança Social. No âmbito desta operação, uma questão que tem vindo a suscitar algumas dúvidas prende-se com o "preço da operação". Neste particular, há a referir que o preço a que os créditos serão cedidos é composto por um preço inicial (o preço de mercado estimado por uma comissão independente do Governo) e por um preço diferido, que permitirá ao Estado e à Segurança Social receber o excedente que, eventualmente, venha a ser cobrado, uma vez pagas todas as despesas e custos da operação de titularização. Um outro aspecto que importa sublinhar prende-se com o facto da cessão de créditos em apreço não implicar a extinção da obrigação tributária. Por outras palavras, não obstante o Estado e o IGFSS receberem o preço da respectiva cessão, as dívidas dos contribuintes-devedores não sofrem qualquer alteração. Mais ainda, nos termos da proposta de lei e em obediência ao princípio da indisponibilidade tributária, a entidade adquirente dos créditos não poderá nunca reduzir ou remir os créditos tributários a este ou àquele contribuinte. De resto, na prática, no âmbito desta operação, também não o poderia fazer porque não conhece - nem nunca poderá conhecer - a identificação dos contribuintes, não só em virtude do regime existente sobre confidencialidade fiscal, como porque a gestão e cobrança continua a ser realizada pelo Estado, através do processo de execução fiscal. Por outro lado, os contribuintes-devedores também mantêm todos os direitos e garantias que tinham anteriormente à cessão de créditos, designadamente ao nível dos procedimentos e/ou processos em que se discuta a legalidade da dívida exequenda. Finalmente, e de não somenos importância, com a realização desta operação o Governo estará a dar um sinal de confiança aos investidores no mercado bolsista nacional, dado que as obrigações titularizadas provenientes desta operação serão admitidas à negociação na Euronext-Lisbon.