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Contabilização de abertura de carta de crédito
16 Janeiro 2020
PT24046 – Contabilização de abertura de carta de crédito
13-01-2020

Quando um banco emite o SWIFT de carta de crédito, ao contabilizar as despesas de abertura de carta de crédito (68/12), deve refletir-se na conta de passagem o valor da proforma para ficar evidenciado a dívida, por contrapartida de uma conta no banco a crédito (equivalente a uma linha de crédito)?
No momento da contabilização da fatura, debita-se a conta 31 por contrapartida do fornecedor e, neste momento, salda-se o movimento efetuado com base na proforma (25/conta de passagem), de modo que a responsabilidade fique evidenciado apenas no fornecedor? Na data de vencimento efetivamos o pagamento da carta de crédito (22/12)?


Parecer técnico

A questão colocada refere-se à compra de inventários em países terceiros (importação), utilizando a abertura de carta de crédito documentário.
A Carta de Crédito de Exportação ou crédito documentário de exportação será uma forma de efetuar comércio internacional com maior segurança quanto ao seu pagamento, nomeadamente quando os intervenientes não se conheçam.
É principalmente uma garantia para o vendedor (exportador) receber o valor da mercadoria após ela ter sido embarcada no meio de transporte com destino ao comprador (importador).
Esse crédito documentário compreende um acordo pelo qual o banco emitente (normalmente do país do importador), agindo mediante um pedido do importador, é incumbido de efetuar um pagamento, através do banco intermediário (normalmente do país do exportador), ao vendedor (exportador), contra a entrega dos documentos comprovativos da exportação, desde que sejam respeitadas as condições estipuladas.
Na prática, é o importador que obtém um crédito do seu banco, mediante a abertura de linha de crédito ou de um pagamento, para efetuar uma importação.
O exportador recebe a informação da abertura do crédito, através da confirmação da carta de crédito de exportação, recebendo o montante acordado, após o envio das mercadorias (exportação) e respetiva entrega dos documentos comprovativos.
Face a este enquadramento, na ótica do adquirente (importador), a confirmação da carta de crédito de exportação não deve implicar qualquer registo contabilístico, por não se cumprir a definição e os critérios de reconhecimento de qualquer instrumento financeiro, nomeadamente de passivo financeiro.
Se, eventualmente, existirem confirmações de cartas de crédito em aberto à data de balanço, e enquanto estas não forem efetivamente utilizadas, atendendo a que se tratam de garantias bancárias obtidas para a realização de pagamentos futuros, a entidade proceder à respetiva divulgação nas notas do anexo às demonstrações financeiras dessa informação.
No momento da aquisição dos bens importados (ou momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente, dependendo das condições comerciais estabelecidas), a entidade importadora reconhece a compra dos inventários, incluindo os custos com a carta de crédito, por contrapartida do pagamento das despesas suportadas com a carta de crédito e da dívida a pagar ao fornecedor estrangeiro.
Pela obtenção do empréstimo obtido pela carta de crédito e respetiva liquidação da dívida a pagar ao fornecedor:
- Débito da conta 22 – Fornecedores por contrapartida a crédito da conta 25 – Empréstimos obtidos.
Pelo pagamento da dívida a pagar à entidade bancária:
- Débito da conta 25 – Empréstimos obtidos por contrapartida a crédito da conta 12 – Depósitos à ordem, pelo valor pago.
Pressupõe-se que com a utilização da abertura de carta de crédito, a importação dos inventários não implicou qualquer pagamento de adiantamento, estando acordado o pagamento para, ou após, a data da receção dos bens.
Em termos contabilísticos, os bens em causa apenas podem ser reconhecidos como ativos no balanço da empresa, quando satisfaçam a definição e os critérios de reconhecimento como tal.
De acordo com a Estrutura Concetual do SNC, apenas se considera um ativo quando exista o controlo dos bens, em resultado dessa aquisição, para a qual se espera que se obtenham benefícios económicos com a sua utilização ou venda. Esse ativo apenas pode ser reconhecido quando se estime que se obtenham os referidos benefícios económicos e o seu custo seja fiavelmente mensurado.
Na prática, apenas quando os bens forem colocados à disposição da empresa, se deve proceder ao respetivo reconhecimento do inventário pelo seu custo de aquisição, incluindo o preço de aquisição dos bens e todas as despesas necessárias para a compra, incluindo impostos não recuperáveis e custos de importação, conforme previsto no parágrafo 10 e 11 da NCRF 18 - "Inventários".
O momento dessa colocação dos bens à disposição da empresa adquirente e, portanto, do reconhecimento da compra de inventários, depende principalmente dos termos acordados com o vendedor para as condições de compra, os designados "Incoterms", que devem constar da referida carta de crédito documentário.
Assim, por exemplo, no caso de bens importados de país terceiro, por via marítima, se as condições forem DES - porto de Lisboa, como a responsabilidade dos bens passa para o adquirente na chegada dos bens ao porto de Lisboa, é nesse momento que deve ser reconhecido o ativo (compras de inventários) e o passivo (dívida a pagar ao credor).
Se a compra é FOB - porto do país terceiro, então a data de expedição e de faturação é relevante para o reconhecimento do ativo (compras de inventários) e o passivo (dívida ao fornecedor), pois a sua colocação à disposição acontece no momento da carga dos bens no porto de origem.
Se os bens forem adquiridos numa moeda estrangeira há que atender aos efeitos das alterações de taxas de câmbio.
O tratamento contabilístico do efeito de alterações de taxas de câmbio está previsto na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 23 - «Os efeitos de alterações em taxas de câmbio.»
A NCRF 23 estabelece que, quando o principal ambiente económico da empresa opere com uma moeda diferente da moeda normal de apresentação das demonstrações financeiras, se possam emitir demonstrações financeiras na moeda desse ambiente económico (moeda funcional).
A moeda de apresentação das empresas estabelecidas em Portugal será o euro, conforme determinado no parágrafo 8 da NCRF 1 - Estrutura e conteúdo das demonstrações financeiras, todavia, pela aplicação da NCRF 23, a empresa pode também emitir demonstrações financeiras na moeda funcional, ainda que diferente da moeda de apresentação.
O ambiente económico principal no qual uma entidade opera é normalmente aquele em que a entidade gera e gasta dinheiro.
Ainda que a entidade efetue algumas operações de compra e venda de bens em moeda estrangeira, se no seu ambiente económico principal, a empresa efetua normalmente os seus pagamentos e recebimentos em euros, nomeadamente pagamentos de salários, fornecimentos e serviços externos e mesmo algumas compras e vendas de bens de inventário, a sua moeda funcional é efetivamente o euro.
Nos termos do parágrafo 21 da NCRF 23, uma transação em moeda estrangeira, nomeadamente compra e venda de bens e serviços, empréstimos obtidos ou concedidos, deve ser registada, no momento do reconhecimento inicial na moeda funcional (neste caso o euro), pela aplicação à quantia de moeda estrangeira da taxa de câmbio entre a moeda funcional e a moeda estrangeira à data da transação.
Por razões práticas, é muitas vezes usada uma taxa que se aproxime da taxa real à data da transação; por exemplo, pode ser usada uma taxa média para uma semana ou um mês para todas as transações em cada moeda estrangeira que ocorram durante esse período. Este procedimento pode ser utilizado se existirem muitas operações em moeda estrangeira num determinado período. Porém, se as taxas de câmbio variarem significativamente, o uso da taxa média de um período não é apropriado.
No momento da liquidação das dívidas a receber ou a liquidar (itens monetários) resultantes das referidas transações de compra e venda de itens de inventários, há que efetuar o respetivo registo à data dessa operação de liquidação.
Se existir uma diferença entre o câmbio em que foi registado inicialmente esse item monetário (divida a receber ou a pagar) e a respetiva liquidação, essa diferença (positiva ou negativa) deve ser reconhecida nos resultados do período da referida liquidação, conforme previsto no parágrafo 27 da NCRF 23.
Subsequentemente, à data de cada balanço, o montante em saldo na conta de dívidas a receber ou a pagar em moeda estrangeira afetado pelo reconhecimento das liquidações efetuadas ao longo do período, sendo também um item monetário em moeda estrangeira, deve ser transposto pelo uso da taxa de fecho, sendo reconhecida a respetiva diferença de câmbio nos resultados desse período.
Na prática, haverá que remensurar o saldo final das dívidas a receber ou a pagar em moeda estrangeira, existente à data de balanço (31/12) tendo em conta a taxa de câmbio de fecho desse dia 31/12 entre a moeda estrangeira e o euro, reconhecendo a diferença de câmbio nos resultados do período.
Essa diferença de câmbio é a diferença entre a conversão da dívida a receber ou pagar para a moeda funcional à data da operação (ou à taxa média da semana, mês ou ano) e a conversão dessa dívida à taxa de fecho (31/12).
Como se constata, pressupondo que a moeda funcional da empresa é efetivamente o euro, as operações de compra e venda de bens, e as correspondentes dívidas a pagar e a receber, em moeda estrangeira devem ser reconhecidas inicialmente (convertidas para o euro) à respetiva taxa de câmbio da data dessas operações.
À medida em que se efetuam as liquidações dessas dívidas a pagar ou receber em moeda estrangeira, há que efetuar o reconhecimento das respetivas diferenças de câmbio (nos resultados do período) pela diferença entre as quantias escrituradas dessas dívidas (valorizadas à taxa de câmbio à data da operação ou taxa média do período) e o valor do pagamento ou recebimento, valorizado à taxa de câmbio da data desse pagamento ou recebimento.
Apenas quando ainda existam dívidas a receber ou a pagar à data de relato (fecho) das demonstrações financeiras, essas dívidas devem ser novamente valorizadas para a taxa de câmbio a essa data de fecho, reconhecendo-se as respetivas diferenças de câmbio também em resultados do período.
Tratando-se da aquisição de inventários, sendo esta uma atividade operacional, as diferenças de câmbio podem ser registadas nas contas 6887 - Diferenças de câmbio desfavoráveis e conta 7887 - Diferenças de cambo favoráveis, conforme resulta do entendimento da Comissão de Normalização Contabilística (FAQ 10 - Questões frequentes - setor empresarial) e no novo Código de Contas do SNC para os períodos a partir de 2016. A contrapartida será a conta do fornecedor.
Tal como referido, neste caso, as diferenças de câmbio são registadas apenas na data de fecho (31/12) ou no momento do pagamento das faturas. Não existem diferenças de câmbio entre a data da fatura e a data da colocação dos bens à disposição.