PT25529 – Dedução de IVA
Determinado sujeito passivo pretende adquirir carro elétrico, cujo valor é superior a 70 mil euros (IVA incluído). Acontece que está no regime misto de IVA e no método de afetação real. As operações isentas de IVA (artigo 9.º) correspondem a 95 por cento do volume de negócios.
Pode ser deduzido a totalidade do IVA da viatura. Uma vez que o veículo será usado para as duas atividades que a empresa desenvolve, a isenta e a sujeita a IVA, qual a maneira mais correta de contabilizar?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se com o direito à dedução em Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), de uma viatura elétrica, por um sujeito passivo misto. É ainda referido na questão que, «as operações isentas de IVA (artigo 9.º) correspondem a 95 por cento do volume de negócios.»
De harmonia com o artigo 19.º do Código do IVA, só confere direito a dedução o imposto mencionado em faturas passados em forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo, considerando-se passados em forma legal os que contenham os elementos mencionados no n.º 5 do artigo 36.º e n.º 2 do artigo 40.º (fatura simplificada).
Por outro lado, determina o n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA que só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, nos termos da alínea a) ou nas operações elencadas na alínea b).
De acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA, é excluído do direito à dedução o IVA suportado com a aquisição, fabrico ou importação, locação, utilização, transformação e reparação de viaturas de turismo, barcos de recreio, helicópteros, aviões, motos e motociclos, sempre que a exploração destes bens não constitua objeto da atividade do sujeito passivo - alínea a) do n.º 2 do artigo 21.º do Código do IVA.
Considera-se «viatura de turismo» para efeitos de IVA, qualquer veículo automóvel, com inclusão do reboque que, pelo seu tipo de construção e equipamento, não seja destinado unicamente ao transporte de mercadorias ou a uma utilização com caráter agrícola, comercial ou industrial ou que, sendo misto ou de transporte de passageiros, não tenha mais de nove lugares, com inclusão do condutor - alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA.
Contudo, na sequência da reforma da chamada Fiscalidade Verde, a Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro, procedeu à alteração das normas fiscais ambientais nos setores da energia e emissões, transportes, água, resíduos, ordenamento do território, florestas e biodiversidade, alterando, para o efeito, o Código do IVA, aditando a alínea f) do n.º 2 do artigo 21.º.
Não se verifica, contudo, a exclusão do direito à dedução nos seguintes casos:
(…)
f) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação e à transformação em viaturas elétricas ou híbridas plug-in, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas elétricas ou híbridas plug-in, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na Portaria a que se refere a alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC (Depreciações e amortizações não dedutíveis para efeitos fiscais, n.r.);
Tal norma contempla a possibilidade de exercer o direito à dedução do IVA contido nas despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação e à transformação em viaturas elétricas ou híbridas plug-in de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas elétricas ou híbridas plug-in, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na Portaria n.º 467/2010, de 7 de julho, portaria esta, referida na alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC.
Nesse sentido, a Portaria n.º 467/2010, de 7 de julho, é clara na delimitação dos limites para o custo de aquisição ou valor de reavaliação das viaturas ligeiras de passageiros ou mistas para efeitos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC. Assim:
Viaturas adquiridas nos períodos de tributação que se iniciem em 1 de janeiro de 2015 ou após essa data:
62 500 euros - Veículos movidos exclusivamente a energia elétrica
50 000 euros - Veículos híbridos plug-in
37 500 euros - Veículos movidos a gases de petróleo liquefeito (GPL) ou gás natural veicular (GNV)
25 000 euros - Restantes viaturas
Assim, no caso concreto, considerando o anteriormente exposto, só confere o direito à dedução, a viatura elétrica cujo custo de aquisição seja igual ou inferior a 62 500 euros (IVA excluído).
Estando perante um sujeito passivo que pratique simultaneamente operações isentas que não conferem direito à dedução e operações que conferem esse direito (sujeito passivo misto), existem dois métodos de determinação do direito à dedução: método de dedução na percentagem ou pro rata e o método de afetação real. Para o efeito deve observar-se a doutrina prevista no artigo 23.º do Código do IVA, sugerindo-se também leitura do Ofício-Circulado n.º 30103/2008, de 23 de abril.
Relativamente ao problema de determinar o direito à dedução de um sujeito passivo que pratique simultaneamente operações isentas que não conferem direito à dedução e operações que conferem esse direito - sujeito passivo misto, existem dois momentos ou fases para calcular o montante de IVA dedutível:
- Identificação do IVA suportado em bens e serviços que são, ou virão a ser totalmente usados em operações que conferem direito à dedução ou totalmente usados em operações que não conferem esse direito - a chamada direct attribution.
Esta separação conduz:
- Ou à dedução integral do imposto, no caso dos bens e serviços serem integralmente utilizados em operações que conferem direito à dedução;
- Ou a que nenhuma parcela do IVA possa ser deduzida, se os bens e serviços forem utilizados apenas e só em operações que não conferem direito à dedução.
- Se houver qualquer montante de imposto suportado que não possa ser objeto desta imputação direta - direct attribution - por respeitar a bens ou serviços que são, ou serão, usados tanto em operações que conferem direito à dedução como em operações que não conferem esse direito, então esse imposto suportado tem de ser objeto de "repartição". E é neste passo que entram os dois métodos previstos no artigo 23.º do CIVA: pro rata e afetação real.
O método da percentagem de dedução ou pro rata caracteriza-se pelo facto de o direito à dedução ser proporcional ao valor das operações tributáveis e isentas com direito à dedução relativamente a todas as operações isentas ou fora do campo do imposto.
O n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, refere que a percentagem de dedução «(...) resulta de uma fração que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar a dedução nos termos do n.º 1 do artigo 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efetuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma atividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, bem como as subvenções não tributadas que não sejam subsídios ao equipamento.»
Neste sentido, deverá considerar no numerador os rendimentos obtidos com direito à dedução.
No denominador deverá considerar todos os rendimentos obtidos, incluindo os isentos que não conferem direito à dedução, excetuando-se as operações não decorrentes do exercício de uma atividade económica e os subsídios ao equipamento (investimento).
Naquele cálculo não serão, contudo, incluídas, como determina o n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, as operações que têm um caráter acessório em relação à atividade global da empresa, como as transmissões de bens do ativo imobilizado e operações imobiliárias ou financeiras.
Nos termos do n.º 7 do artigo 23.º do CIVA o sujeito passivo deve durante o ano praticar a dedução com base numa percentagem provisória estimada a inscrever na declaração de IVA.
O n.º 8 deste mesmo artigo 23.º refere ainda que na determinação da percentagem de dedução, o quociente da fração será arredondado para a centésima imediatamente superior, a qual será aplicada ao IVA dedutível para efeitos de apuramento do IVA a deduzir.
Esta percentagem representa o montante do imposto suportado que o sujeito passivo poderá deduzir, isto é, se a percentagem a considerar for de cinco por cento, quer dizer que o sujeito passivo relativamente a todo o imposto suportado referente a bens e serviços de utilização mista poderá deduzir cinco por cento.
Este pro rata será provisório até ao final do ano, altura em que se procede à determinação do pro rata definitivo de acordo com o volume de negócios definitivo do ano. Assim, o pro rata definitivo de um determinado ano será o pro rata provisório do ano seguinte, no primeiro ano de atividade será calculado um pro rata provisório com base no volume de negócios estimado para o ano.
Na determinação da percentagem de dedução pelo método do pro rata devem ser consideradas apenas operações ativas realizadas pelo sujeito passivo. Logo, valores referentes a aquisições de prestações de serviços, ainda que estas operações possam ser objeto de tributação pelo sujeito passivo adquirente, não devem ser utilizados na fórmula a que se refere o n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA.
No final do ano após a determinação do pro rata definitivo (com base no volume de negócios definitivo) deve proceder às respetivas regularizações ou seja:
- Se o pro rata definitivo for superior ao pro rata provisório, faz uma regularização a seu favor, (campo 40 da Declaração Periódica de IVA);
- Se o pro rata definitivo for inferior ao pro rata provisório, faz uma regularização a favor do Estado, (campo 41 da declaração periódica de IVA).
Estas regularizações terão que constar na declaração periódica do último período do ano a que respeita.
Face à questão colocada, temos, subjacente ao exercício do direito à dedução do imposto suportado, o facto de as operações que o suportam terem uma relação direta com operações praticadas a jusante e que serão operações tributáveis, assim resulta do disposto no artigo 19.º e seguintes do Código do IVA.
Considerando que a viatura esteja afeta a ambas as atividades, veja-se o ponto 10 da Inf. N.º 1023, de 06.01.94-SIVA:
«10 - Ao optar como método de dedução pela afetação real dos bens e serviços utilizados, observar-se-á o seguinte:
- Não permite à consulente qualquer direito à dedução relativamente ao imposto referente às aquisições destinadas à realização de operações isentas sem direito à dedução;
- Direito à dedução integral relativamente ao imposto que recaiu sobre as aquisições destinadas à realização de operações tributadas;
- Relativamente às aquisições de bens ou serviços cuja afetação for totalmente impossível de concretizar (custos comuns) deverá a dedução do imposto ser efetuada em proporção ao volume de negócios (pro rata específico).»
No entanto, destacamos o disposto no n.º 9 do artigo 23.º do CIVA que poderá aplicar-se na situação em análise:
«9 - Para efeitos do disposto neste artigo, pode o Ministro das Finanças, relativamente a determinadas atividades, considerar como inexistentes as operações que deem lugar à dedução ou as que não confiram esse direito, sempre que as mesmas constituam uma parte insignificante do total do volume de negócios e não se mostre viável o procedimento previsto nos n.ºs 2 e 3.»
Nesta matéria a doutrina administrativa fixou como sendo de considerar insignificante para tais efeitos a percentagem de 5 por cento, a qual sendo de apreciação casuística mediante iniciativa do contribuinte interessado, determina por si só a impossibilidade de eficácia retroativa dos efeitos pretendidos.
Naturalmente que tendo o sujeito passivo dúvidas na interpretação/aplicação da lei deverá questionar a Autoridade Tributária sobre a situação, sugere-se que formule um pedido de Informação Vinculativa à Autoridade Tributária nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária (LGT).