Opinião
Ordem nos media
A eficiência fiscal e os direitos dos contribuintes (I)
2 Fevereiro 2007
Artigo de Domingues de Azevedo, presidente da CTOC

                                                 

Muitos dos nossos hábitos e comportamentos perante a fiscalidade portuguesa, têm sofrido, por diversas razões, profundas e significativas alterações.
Ao desleixo, até há bem pouco tempo cultivado nos serviços da Administração Pública, assiste-se, hoje, a um despertar de consciências e comportamentos completamente contrários a procedimentos não muito distantes no tempo.
Contudo, a este aumento de eficiência executiva, nem sempre está associada uma cultura de respeito pelos cidadãos, assistindo-se à consagração, a passos largos, da imagem do sujeito passivo como um "malfeitor".
Sabendo-se que os níveis de incumprimento são muito elevados, sabendo-se da propensão natural, pela ausência de contrapartidas directas, para o incumprimento, também se sabe que uma parte muito significativa da responsabilidade deste estado de coisas se deve à desresponsabilização e desmotivação reinantes, até há algum tempo atrás, na grande maioria dos serviços da Administração Pública.
A grande questão que hoje se deve colocar, já não é no domínio da eficiência dos serviços. Em grande medida, sem menosprezo do bom trabalho desenvolvido pelos seus responsáveis, assenta muito mais no aproveitamento das novas tecnologias, do que no concurso do factor humano, é a de saber se temos um sistema preparado para responder com rigor, eficiência e oportunidade aos erros e omissões geradas com o seu próprio funcionamento.
Ao crescimento dessa eficiência, sob pena de se gerarem desequilíbrios perante a lei, deve, em paralelo, haver a preocupação de criar serviços que, sem prejuízo para os contribuintes, reponham a verdade dos factos.
É que a não se materializar aquela preocupação, mais cedo ou mais tarde, assistiremos a resistências naturais ao cumprimento dos deveres de cidadania, na generalidade.
Já o tenho por diversas vezes afirmado e continua a ser essa a minha convicção, que o maior inimigo da implementação de uma cultura de cidadania é a injustiça da própria lei.
E, diga-se em abono da verdade, que no nosso ordenamento jurídico fiscal existem inúmeras situações em que esse desequilíbrio existe. Ora, se esse desequilíbrio existe na formulação da própria lei, acaba por constituir-se como um forte incentivo a que os funcionários que têm a responsabilidade da sua execução, deixem para último plano a salvaguarda dos direitos dos contribuintes. Na verdade, se atentarmos em algumas práticas do nosso sistema, que praticamente ninguém questiona, verificamos que nele abundam conceitos e orientações de salvaguarda excessiva dos direitos do Estado, deixando o contribuinte completamente desprotegido, quando alvo de abuso de poder dos próprios serviços da Administração.
Mas, mais grave do que aqueles factos, é quando começamos analisar o comportamento de alguns departamentos. À incompetência organizativa, corresponde um conceito de que nada têm a comprovar. Basta-lhes, apenas acusar, competindo ao sujeito passivo demonstrar que não é assim.
São práticas a que nos vamos habituando por parte do funcionamento da Administração Pública, em que, não havendo um mínimo de organização, profere acusações que mais não são do que autênticos atentados aos direitos dos contribuintes.
Foi o que recentemente aconteceu com a Segurança Social, em que sem qualquer fundamento ou justificação, mas única e simplesmente porque a sua organização não tinha o mínimo de credibilidade, emitiu um conjunto de liquidações que posteriormente se veio a comprovar que não tinham qualquer razão de ser.
É o que se passa com o facto de a Administração Fiscal exigir garantia para impostos reclamados ou impugnados, sem que no entanto minimamente se preocupe em responder às reclamações apresentadas pelos sujeitos passivos. Existe em muitos casos, até a situação caricata dos contribuintes terem que garantir dívidas provenientes de erros técnicos e aritméticos da própria Administração Fiscal. (Cont.)