Ordem nos media
Empresas de construção contornam crise com fuga às facturas
9 Março 2005
«Das 46 mil empresas, entre 80 a 90% estão nos escalões mais pequenos, e é aqui que se concentram a maioria dos problemas», referiu Domingues de Azevedo
As empresas de construção conseguiram evitar maiores efeitos negativos da crise económica através da fuga às facturas, que a maioria dos construtores evita ter de passar. A opinião é do presidente do regulador do sector, o Instituto do Mercado de Obras Públicas e Privadas Imobiliárias (IMOPPI), Hipólito Ponce de Leão. Em conferência de imprensa, o responsável lembrou a chamada «sopa dos pobres», e disse que «nos últimos anos, apesar da crise, não notei isso na construção civil. Houve mesmo uma imigração vinda do leste, em força, e grande parte desses imigrantes vieram trabalhar nas empresas de construção». E explica que «o que se passou e que veio muito ao de cima nestes tempos foi o não passar a factura», uma prática bem conhecida da grande parte das empresas do ramo. «Até há construtores clandestinos nas Obras Públicas», lamentou Hipólito Ponce de Leão. Práticas ilegais que permitem a muitas empresas continuarem em actividade, mesmo sem condições para o fazerem. Por isso mesmo, o presidente do instituto quer avançar com uma espécie de «selecção» das empresas do sector que devem ou não continuar em actividade, ponderando mesmo «tornar as regras cada vez mais exigentes para reduzir o número de empresas do ramo». Com a nova Lei dos Alvarás, que é já mais exigente, a última fiscalização eliminou 4 mil empresas. Empresas clandestinas ascendem a 16 mil O IMOPPI conta com 46 mil associadas, empresas que estão legalizadas. Mas o Instituto Nacional de Estatística (INE) apresentou dados segundo os quais as empresas de construção civil e obras públicas ascendem a 62 mil. O que deixa 16 mil em situação de ilegalidade, «um potencial de empresas clandestinas muito elevado», refere o responsável, lembrando que o sector emprega cerca de 610 mil pessoas em Portugal. Para o combate a esta clandestinidade, o IMOPPI está já a fazer uso das declarações fiscais das empresas, onde pode verificar com maior clareza os seus dados, e espera receber, já em 2005, acesso às declarações electrónicas de impostos. Hipólito Ponce de leão diz que, de acordo com as novas regras, as empresas são avaliadas também pelo seu equilíbrio financeiro e económico, verificando-se se respeita ou não determinados mínimos e rácios de solidez. Uma variável cuja verificação conta com o apoio essencial dos técnicos oficiais de contas (TOC). «Não vamos poder continuar a ter o mesmo tipo de empresas que temos hoje no sector. Precisamos de ter é empresas especializadas, com o seu nicho de mercado, com qualidade», referiu Ponce de Leão. Também o presidente da Câmara dos Técnicos Oficiais de Constas (CTOC), Domingues Azevedo, teceu algumas críticas ao sector. «Das 46 mil empresas, entre 80 a 90% estão nos escalões mais pequenos, e é aqui que se concentram a maioria dos problemas». E acrescenta que «das 333 mil declarações fiscais de empresas em 2003, 97,3% tinham menos de 250 trabalhadores, não têm contabilidade organizada. No nosso país, para se ser empresário, basta quase saber assinar, não há uma cultura de responsabilização social, de observação de obrigações legais. Para os construtores civis, passar facturas é um grande problema, por isso é que se forem pedidas aos construtores todas as facturas, desde a instalação eléctrica, à canalização, etc¿ é mais fácil fiscalizar as suas verdadeiras condições». Hipólito Ponce de Leão lembra ainda que, para efeitos de financiamento, os bancos costumam exigir um mínimo de 20% de autonomia financeira, sendo que o IAPMEI e o programa PRIME para a construção já pediam 25%. Mas a construção civil continua cm 15% e há muitas empresas que não têm mais de 3, 4 ou 5% de autonomia financeira».