Os progressos no combate à fraude e evasão fiscais têm sido particularmente sensíveis nos anos mais recentes. Reconheça-se, contudo, que ainda há um longo caminho a percorrer. A imaginação dos infractores não conhece limites. Da mesma forma que a sofisticação tecnológica evolui quase na mesma desmesurada proporção. Os «novos» crimes de fraude fiscal andam de mãos dadas com o delito de falsidade informática.
A operação «self service», desencadeada pela Polícia Judiciária e pela Inspecção Tributária, é mais um exemplo de fuga fiscal em larga escala e, ao que parece, as autoridades ainda só conseguiram alcançar uma ínfima parte de um novelo que se adivinha extenso. Esta investigação confirma uma tendência que se vinha desenhando, mas que agora ganha contornos mais nítidos: a «guerra» entre polícias e ladrões, utilizando uma linguagem simplificada que o leitor decerto compreenderá, joga-se agora numa dimensão informática, diríamos mesmo virtual. Os esquemas para ludibriar as autoridades policiais e fiscalizadoras há muito que abandonaram as concepções mais tradicionais, entrando na era do high-tech.
O caso da contabilidade paralela nos restaurantes saldou-se com a apreensão de mais de uma centena de cópias de programas de «software» de gestão para aqueles estabelecimentos. A utilização ilegal de aplicações informáticas de contabilidade paralela permite fugas ao fisco em sede de IVA ou IRS em valores não declarados superiores a 50 milhões de euros. A fraude, de grande magnitude, explica-se em poucas palavras: instalado o referido programa clandestino, os dados são manipulados, subtraindo-se parte da informação, especialmente a referente a pagamentos em dinheiro, que deixa assim de figurar na contabilidade final, escapando à respectiva tributação. Segundo os especialistas, um programa informático ilegal pode «limpar» entre 10 a 70 por cento da facturação real e a «chave» que permite alterar os dados pode afectar entre 50 e 60 mil caixas registadoras.
Este esquema, tão inteligente quanto maquiavélico, escapa ao olhar mais atento do Técnico Oficial de Contas das empresas, a menos que o responsável pelo Terminal POS (caixa registadora) cometa algum deslize denunciador desta prática. Sem documentos na sua posse que levantem suspeitas, o TOC muito dificilmente perceberá que tem diante dos seus olhos rolos de facturação manipulados.
O indício que podemos estar apenas a levantar o véu de uma mega-fraude acontece quando os fabricantes de «software» acreditam que a adulteração de contas abrange outros sectores de actividade, nomeadamente pronto-a-vestir e calçado.
Hoje em dia, assistimos a uma pujança imparável da dimensão virtual. Para bem ou para mal, a vitalidade de pessoas, empresas e nações joga-se no terreno virtual. As potencialidades da net são infinitas: da mesma forma que, em escassos segundos, à distância de um simples clique, é possível aceder a uma informação só disponível numa volumosa e poeirenta enciclopédia ou obter a morada de um qualquer restaurante no outro lado do mundo, também é possível, possuindo um simples PC com ligação à world wide web, saber pormenorizadamente como e onde obter material para um atentado terrorista ou aceder, completamente à borla, a estes programas informáticos de contabilidade paralela que permitem fugas aos impostos de milhões.
É gigantesco o desafio que se depara às autoridades. A solução para refrear o ilícito informático na fraude fiscal passa por reforçar meios técnicos e humanos. Os crimes informáticos, vulgarmente designados pelos especialistas de «alta tecnologia», atrevemo-nos a dizer, têm hoje mais impacto económico do que o crime físico. Como alguns filmes «made in USA» nos demonstram, o tempo do assalto à mão armada numa dependência bancária faz parte do passado e está condenado ao insucesso. O presente joga-se na (in)vulnerabilidade dos sistemas de segurança informática e na agilidade das autoridades conseguirem bloquear a sofisticação dos crimes no domínio virtual.