A Direcção-Geral da Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros (DGITA) foi incumbida de desenvolver uma aplicação informática que permita a penhora de depósitos bancários por meios electrónicos, revelou ao PÚBLICO o ministério das Finanças. Este projecto, classificado de «prioridade elevada», necessitou há um ano de um pedido de autorização legislativa ao Parlamento, que não foi usado em 2004 nem renovado para 2005. A aplicação visa conceder à administração fiscal meios de identificar de forma célere as contas bancárias no conjunto do sistema financeiro para, em caso de necessidade, se proceder à sua penhora. Actualmente, a administração já poderá aceder a essas contas, mas terá de o fazer instituição a instituição e conta a conta.
Para esse efeito, a administração fiscal pretende a colaboração do conjunto da banca. «A DGCI tem vindo a desenvolver contactos com a Associação Portuguesa de Bancos [APB] com vista à elaboração de um protocolo para a efectivação da penhora de depósitos bancários», refere o ministério das Finanças em resposta a perguntas do PÚBLICO. «Como este projecto tem uma prioridade elevada para a DGCI, espera-se que a assinatura do referido protocolo ocorra no início de 2005, por forma a permitir logo de seguida a sua operacionalização». A APB entregou já um projecto de protocolo.
Da parte da APB, o processo não é novo nem tem tido desenvolvimentos. Como esclarece o seu presidente, João Salgueiro, a APB chegou, em Dezembro de 2003, a um acordo com o ministério da Justiça sobre um método que evitasse o sistema pesado então vigente. Na altura, e sempre que se pretendesse penhorar contas bancárias, solicitava-se ao Banco de Portugal para pedir aos diversos bancos que identificassem as diferentes contas bancárias. A solução encontrada não teve muita aplicação, devido a dificuldades informáticas com o ministério da Justiça.
No caso das Finanças, continua João Salgueiro, o processo encontra-se ainda numa fase mais recuada, devido igualmente a dificuldades informáticas. Efectuou-se uma reunião há dois ou três meses entre o ministério e os bancos (não com a APB), admitindo-se que possa ter sido entregue um projecto de protocolo, possivelmente próximo do assinado com o ministério das Finanças. Quanto à meta traçada para o início de 2005, Salgueiro desvaloriza essa intenção e prevê que esse projecto não se cumpra na altura esperada pelo ministério das Finanças.
Dúvidas legais
O projecto tem sofrido, na verdade, diversas vicissitudes, sem um resultado à vista. Há cerca de um ano, o ministério das Finanças - ainda coordenado por Manuela Ferreira Leite - enviou uma carta aos contribuintes faltosos. Na missiva ameaçava-se de que seriam efectuadas «acções de cruzamento de informação e automatização de processos com vista à penhora electrónica que permitem a apreensão de direitos e bens dos devedores». «Sua Excelência a ministra», continuava-se, «transmitiu aos serviços instruções rigorosas para a partir de 2 de Janeiro de 2004 utilizar todos os meios legais ao seu alcance para efectuar apreensões dos direitos suficientes para garantir a cobrança dos créditos do Estado». «Sua Excelência deu indicações de com a máxima celeridade proceda à venda e utilização dos valores para extinção das dívidas», avisava-se ainda.
A carta suscitou, na comunicação social, dúvidas sobre a legalidade da medida face ao Código do Processo Civil e o projecto deixou de ser referido entre os projectos a realizar. Mas o Governo pareceu ter dado razão às críticas feitas. No Orçamento do Estado para 2004, pediu autorização para legislar no sentido de «proceder à harmonização entre as normas dos códigos tributários e as normas da Lei Geral Tributária, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (...) com as recentes alterações no âmbito do Código de Processo Civil e da reforma do contencioso administrativo, relativamente a matérias de caducidade e prescrição, de recursos e procedimento de revisão da matéria tributária, de juros de mora, compensatórios e indemnizatórios, de responsabilidade subsidiária, de penhoras, de vendas, de citações, de notificações, de prazos, de certidões, de competências e de acções sujeitas às regras específicas do contencioso tributário».
Só que esse pedido de autorização legislativo não foi usado e o Governo não o renovou no Orçamento do Estado para 2005. Passado um ano e estando o Governo em gestão, eis que surge de novo a ideia - mais uma vez, aparentemente, sem a devida base legal. A aplicação informática estará em preparação, para ser aplicada no início de 2005, afirma o ministério das Finanças.