PT27413 – fevereiro de 2023
A dissolução de determinada empresa foi decretada a 17 de agosto de 2022 e, por conseguinte, entrou em liquidação nessa mesma data. De acordo com o artigo 120.º, n.º 11, do Código do IRC, tem de se submeter uma declaração modelo 22 relativa ao período decorrido entre 1 de janeiro de 2022 e 17 de agosto de 2022 e outra relativa ao período decorrido entre 18 de agosto de 2022 e 31 de dezembro de 2022.
Acontece que a empresa apresentou prejuízos fiscais ao longo dos últimos anos e, ao olhar-se para o ano de 2022 completo, quer o resultado contabilístico quer o fiscal são negativos (prejuízo fiscal). Não obstante, até 17 de agosto de 2022 (data da dissolução), a empresa apresentou resultados negativos, mas no período que decorreu entre essa data e o final do exercício, foram parcialmente revertidos alguns acréscimos de gastos, o que faz com que o resultado apurado nesse "subperíodo" fosse positivo.
Como devem ser apresentadas estas declarações modelo 22, nomeadamente no que respeita à utilização de prejuízos fiscais e ao limite de dedutibilidade dos mesmos (70 por cento do lucro tributável), ou seja, o prejuízo fiscal apurado na primeira declaração (1 janeiro a 17 de agosto) já pode ser incluído como prejuízo fiscal acumulado na segunda declaração (18 de agosto a 31 de dezembro)?
Tendo em consideração que se está perante uma situação extraordinária, a dedução de prejuízos fiscais continua a ser limitada a 70 por cento do lucro tributável apurado na declaração em causa?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com a possibilidade de deduzir os prejuízos fiscais no período de liquidação.
No caso apresentado a entidade entrou em dissolução em 17 de agosto de 2022, tendo apurado prejuízos no período de 1 de janeiro de 2022 a 31 de dezembro de 2022. Agora, no período de tributação de 18 de agosto de 2022 a 31 de dezembro de 2022 apurou lucro.
Atendendo à questão colocada, consideramos importante começar por dar nota do seguinte: o encerramento da atividade de uma sociedade comercial compreende três fases, nomeadamente, a dissolução, a liquidação e a cessação, em conformidade com o Código das Sociedades Comerciais.
Na dissolução deve ser elaborado um relatório de contas reportado à data desta, evidenciando uma separação das contas antes e após a dissolução.
Além disso, deve ser elaborado um inventário detalhado dos bens e obrigações existentes na sociedade.
De seguida, inicia-se a liquidação que terá como referência o inventário elaborado aquando da dissolução e cujos liquidatários serão o órgão de administração, salvo cláusula no contrato ou deliberação dos sócios, em conformidade com o n.º 1 do artigo 151.º do Código das Sociedades Comerciais.
Numa sociedade por quotas, regra geral, o órgão de administração é constituído por um ou mais sócios da sociedade.
O n.º 3 do artigo 152.º do Código das Sociedades Comerciais estabelece que os liquidatários devem:
- Ultimar os negócios pendentes;
- Cumprir as obrigações da sociedade;
- Cobrar os créditos da sociedade;
- Reduzir a dinheiro o património residual, salvo o disposto no artigo 156.º, n.º 1;
- Propor a partilha dos haveres sociais.
Deste modo, os liquidatários devem tomar medidas no sentido de transformar o ativo da sociedade em meios financeiros líquidos com o objetivo de liquidar o passivo social, isto é, as dívidas da sociedade.
Na fase final da liquidação, os liquidatários devem apresentar as contas finais acompanhadas pelo relatório da liquidação e um projeto de partilha do ativo restante, em conformidade com o n.º 1 do artigo 157.º do Código das Sociedades Comerciais.
Acresce o n.º 3 do mesmo artigo que as contas finais devem ser organizadas de modo a discriminar os resultados das operações de liquidação efetuadas pelos liquidatários e o mapa da partilha, segundo o projeto apresentado.
De salientar que a liquidação tem um prazo máximo de dois anos, conforme previsto no n.º 1 do artigo 150.º do Código das Sociedades Comerciais.
O ativo restante da liquidação é partilhado, na sua totalidade, pelos sócios, reembolsando em primeiro lugar as entradas efetivamente realizadas, seguindo-se o reembolso de outros instrumentos do capital próprio efetuados pelos sócios. O saldo remanescente constituirá uma mais-valia.
Aprovadas as contas de liquidação pelos sócios e partilha do ativo restante, estão reunidas as condições para se proceder ao registo comercial do encerramento da liquidação.
O registo configura a cessação e extinção da sociedade.
Quanto aos procedimentos fiscais, nos termos do n.º 1 do artigo 79.º do Código do IRC, relativamente às sociedades em liquidação, o lucro tributável é determinado com referência a todo o período de liquidação.
Determina, ainda, o n.º 2 do mesmo artigo que para efeitos do disposto no número anterior, deve observar-se o seguinte:
- As sociedades que se dissolvam devem encerrar as suas contas com referência à data da dissolução, com vista à determinação do lucro tributável correspondente ao período decorrido desde o início do período de tributação em que se verificou a dissolução até à data desta;
- Durante o período em que decorre a liquidação e até ao fim do período de tributação imediatamente anterior ao encerramento desta, há lugar, anualmente, à determinação do lucro tributável respetivo, que tem natureza provisória e é corrigido face à determinação do lucro tributável correspondente a todo o período de liquidação;
No período de tributação em que ocorre a dissolução deve determinar-se separadamente o lucro referido na alínea a) e o lucro mencionado na primeira parte da alínea b).
Desta forma, na dissolução e na liquidação da sociedade em análise há dois momentos relevantes para efeitos de IRC, um primeiro período que decorre desde 1 de janeiro de 2022 até à data da dissolução (17 de agosto de 2022) e um segundo período que compreende a fase de liquidação (fase seguinte à dissolução), implicando o apuramento do rendimento tributável para cada um dos períodos.
O artigo 164.º da Lei n.º 144/2017, de 29 de dezembro, que aprova o Orçamento do Estado, aditou o n.º 11 ao artigo 120.º do Código do IRC, estabelecendo que no período de tributação em que ocorra a dissolução passam a ter de ser submetidas duas declarações periódicas de rendimentos que devem ser enviadas:
- Até ao último dia do 5.º mês seguinte ao da dissolução, independentemente de esse dia ser útil ou não útil, a declaração relativa ao período decorrido desde o início do período de tributação em que se verificou a dissolução até à data desta; (assinalar o campo 9 do quadro 02 da declaração e indicar a data da dissolução no campo 11)
- Até ao último dia do 5.º mês seguinte à data do termo do período de tributação, independentemente de esse dia ser útil ou não útil, a declaração relativa ao período decorrido entre o dia seguinte ao da dissolução e o termo do período de tributação em que esta se verificou (assinalar os campos 3, 6 e 10 do quadro 02 da declaração).
Assim, no caso em concreto, quanto à declaração modelo 22, de acordo com a alínea a) do n.º 11 do artigo 120.º do CIRC, procede-se à entrega de declaração modelo 22 do período de tributação de 2022, referente ao período antes da dissolução (com indicação do campo 9 do quadro 04.2 da folha de rosto da M22 e data da dissolução 17 de agosto de 2022 no campo 11 do mesmo quadro). Esta declaração terá de ser submetida no prazo limite de até ao último dia do 5.º mês seguinte ao da dissolução, independentemente de esse dia ser útil ou não útil (até 31 de janeiro de 2023), incluindo os rendimentos obtidos entre 1de janeiro de 2022 e 17 de agosto de 2022. O IRC apurado nesta declaração é definitivo.
Assumindo que o encerramento da liquidação apenas é efetuado em 2023 ou seguintes, terá de se proceder à entrega de outra declaração modelo 22 do período de tributação de 2022, referente ao período após a dissolução, incluindo os rendimentos obtidos entre 18 de agosto de 2022 e 31 de dezembro de 2022. Esta declaração modelo 22 terá que ser submetida até ao final de maio de 2023, nos termos da alínea b) do n.º 11 do artigo 120.º do CIRC. O IRC apurado nesta declaração pode ser provisório, caso se opte pela entrega de declaração do período total da liquidação prevista no artigo 79.º do CIRC.
Pressupondo o encerramento da liquidação em 30 de junho de 2023, terá ainda que se proceder à entrega da declaração modelo 22 do período de tributação de 2023, referente ao período da cessação de atividade, incluindo os rendimentos obtidos entre 1 de janeiro de 2023 e 30 de junho de 2023. Esta declaração modelo 22 terá que ser submetida até ao final de setembro de 2023, nos termos do n.º 3 do artigo 120.º do CIRC. O IRC apurado nesta declaração pode ser provisório, caso se opte pela entrega de declaração do período total da liquidação prevista no artigo 79.º do CIRC.
Opcionalmente, nos termos do artigo 79.º do CIRC, pode ser submetida uma declaração modelo 22 referente ao período da liquidação, incluindo os rendimentos obtidos entre 18 de agosto de 2022 e 30 de junho de 2022 (assumindo que é esta a data de cessação). Esta declaração modelo 22 terá que ser submetida até ao final de setembro de 2023, nos termos do n.º 3 do artigo 120.º do CIRC. O IRC apurado nesta declaração irá substituir aquele apurado provisoriamente nos termos do artigo 79.º do CIRC.
Relativamente aos prejuízos fiscais anteriores à dissolução e que na data desta ainda sejam dedutíveis nos termos do artigo 52.º do CIRC, de acordo com o n.º 4 do artigo 79.º do CIRC, podem ser deduzidos ao lucro tributável correspondente a todo o período de liquidação se este não ultrapassar dois anos.
Assim, no período do encerramento da liquidação, desde que o período de liquidação não ultrapasse dois anos (após alterações da Lei n.º 53-A/2006), poderão ser entregues duas modelos 22:
- A primeira obrigatória (desde o início do último período até à data da cessação);
- A segunda facultativa referente a todo o período de liquidação (desde a data de dissolução até à data da cessação).
A declaração periódica modelo 22 facultativa torna-se interessante no caso de existirem lucros que possam ser anulados por prejuízos posteriores, no período de liquidação.
Se o período de liquidação ultrapassar os dois anos:
- O lucro tributável determinado anualmente durante o período de liquidação deixa de ter natureza provisória;
- Os prejuízos anteriores à dissolução e na data desta ainda dedutíveis (nos termos do artigo 52.º, CIRC) deixam de poder ser deduzidos ao lucro tributável correspondente a todo o período de liquidação.
O prazo de entrega da declaração modelo 22 de cessação ocorre até ao último dia útil do terceiro mês seguinte ao da cessação (artigo 120, n.º 3, CIRC). Aplicando-se este prazo para a apresentação ou envio da declaração relativa ao período imediatamente anterior, quando ainda não tenham decorrido os prazos normais.
Face ao exposto, no caso apresentado, os prejuízos fiscais apurados antes da dissolução apenas poderão ser deduzidos no caso do período de liquidação for inferior a dois anos.