PT19742 - IRC - Dupla tributação internacional (Portugal/Brasil)
01-10-2017
Determinada empresa portuguesa, ligada à área informática e desenvolvimento de software, começou a trabalhar (venda de serviço software e fee de gestão) com uma empresa brasileira.
Pela legislação brasileira, a empresa portuguesa será sujeita a uma taxa de retenção de imposto de 15% sobre o total da fatura à data do pagamento.
Quais os procedimentos a fazer em Portugal para recuperação do imposto retido?
Além destes 15% de retenção na fonte, a empresa brasileira ainda retém os impostos chamados de CIDE (10%), PIS (1,65%), COFINS (7,6%) e de imposto de selo (2%).
Na vertente portuguesa, estes impostos ficam perdidos. Há alguma maneira de evitar estes custos?
Existe alguma convenção entre Portugal e o Brasil que evite esta carga?
Parecer técnico
Vigora em território nacional, a vulgarmente denominada regra da universalidade (ou de base mundial). Esta, em sede de IRC, consta do n.º 1 do artigo 4.º, conforme se transcreve:
"...Relativamente às pessoas coletivas e outras entidades com sede ou direção efetiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território..."
Resulta desta norma que as pessoas coletivas residentes em território nacional são aqui tributadas pela totalidade dos rendimentos que obtêm, ainda que existam rendimentos obtidos no estrangeiro (e independentemente do país onde possam ter sido obtidos).
Não obstante, e no sentido de evitar ou atenuar uma eventual dupla tributação de rendimentos que possa resultar desta regra da universalidade, os sujeitos passivos poderão beneficiar do mecanismo de crédito de imposto por dupla tributação, disposto no artigo 91.º do Código do IRC.
No n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC consta:
"... 1 - A dedução a que se refere a alínea a) do n.º 2 do artigo 90.º é apenas aplicável quando na matéria coletável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro e corresponde à menor das seguintes importâncias:
a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;
b) Fração do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, acrescidos da correção prevista no n.º 1 do artigo 68.º, líquidos dos gastos direta ou indiretamente suportados para a sua obtenção..."
Assim, prevê-se, no ano em que se reconhece o rendimento, uma dedução à coleta da menor das seguintes importâncias:
a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;
b) Fração do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, acrescidos da correção prevista no n.º 1 do artigo 68.º, líquidos dos gastos direta ou indiretamente suportados para a sua obtenção.
Para efeitos de cálculo da fração de IRC que seria devida em território nacional deve considerar-se a derrama. Tal entendimento resulta do Despacho de 16-07-2010 - ao Processo: 2264/10.
Neste sentido, o sujeito passivo, nestas circunstâncias poderá inscrever o valor do crédito de imposto a que tem direito no campo 353 do quadro 10 da declaração periódica de rendimentos modelo 22. Deverá igualmente proceder à entrega do anexo H da IES, com o quadro 4 devidamente preenchido.
Contudo, parece-nos importante destacar o disposto no n.º 2 do artigo 91.º do Código do IRC, norma que deverá ser acautelada aquando da utilização do mecanismo do crédito de imposto por dupla tributação internacional.
O n.º 2 do artigo 91.º do Código do IRC refere "... quando existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efetuar nos termos do número anterior não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela convenção...".
Ora, o mecanismo do crédito de imposto por dupla tributação internacional apenas opera caso não exista convenção, ou caso a mesma determine imposto a pagar no outro país.
No caso em análise, importa proceder à correta qualificação do rendimento obtido. Admitindo que estamos perante royalties ou redevances, então as respetivas convenções internacionais preveem a tributação nos moldes efetuados. Pois, quando o rendimento se qualifica como royalties, por norma, os acordos internacionais repartem a tributação entre os Estados, fixando uma taxa máxima para o Estado fonte do rendimento.
A Resolução da Assembleia da República n.º 33/2001, de 27 de abril, aprovou a Convenção entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil destinada a evitar a dupla tributação e a prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento.
O artigo 12.º deste acordo internacional, sobre rendimentos qualificados como royalties permite ao Estado pagador a retenção à taxa de 15%.
Transcrevemos o conceito de royalties previsto neste acordo, n.º 3 do artigo 12.º: "... o termo «royalties», usado neste artigo, significa as retribuições de qualquer natureza atribuídas ou pagas pelo uso ou pela concessão do uso de um direito de autor sobre uma obra literária, artística ou científica, incluindo os filmes cinematográficos, bem como os filmes e gravações para transmissão pela rádio ou pela televisão, de uma patente, de uma marca de fabrico ou de comércio, de um desenho ou de um modelo, de um plano, de uma fórmula ou de um processo secretos, bem como pelo uso ou pela concessão do uso de um equipamento industrial, comercial ou científico e por informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico...".
Apenas uma última referência, que caso os rendimentos em questão se qualifiquem como prestação de serviços (e não royalties) então, os acordos internacionais, neste caso apenas conferem legitimidade ao Estado de residência do beneficiário do rendimento para tributação. Ou seja, neste caso, como a tributação realizada não estava de acordo com o disposto no acordo internacional, não poderia em território nacional utilizar o mecanismo do crédito de imposto. Neste caso deveria averiguar junto do outro Estado qual a forma de ser ressarcido da retenção sofrida.
O enquadramento aqui referido tem por base imposto sobre o rendimento, quaisquer outros valores pagos no Brasil a outro título que não este, não terão aqui enquadramento.