PT21131 - IRC - Reinvestimento - propriedades de investimento
01-09-2018
Uma sociedade por quotas "A” tem dois sócios ("X” e "Y”), detendo cada um 50 por cento do capital social. Estes sócios são, a título individual, proprietários de um imóvel "B” também na proporção de 50 por cento cada. Este imóvel "B” vai ser doado àquela sociedade "A”, e posteriormente a sociedade vai alienar este imóvel.
As mais-valias obtidas pela sociedade "A”, na venda deste imóvel "B”, podem ser excluídas de tributação por serem reinvestidas em obras a realizar num outro imóvel "C” de que esta sociedade "A” já é detentora?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico da aquisição a título gratuito de um imóvel, através de doação à sociedade.
O n.º 1 do artigo 940.º do Código Civil define que «doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício de outro contraente.»
Em termos contabilísticos, na ótica da entidade beneficiária da doação, há que considerar se a referida doação do imóvel cumpre a definição de ativo e se deve ser reconhecido como tal nas suas demonstrações financeiras.
De acordo com os parágrafos 52 a 58 e 81 da estrutura conceptual do SNC, existe uma relação direta entre um dispêndio e o reconhecimento de um ativo, pois tal constitui prova que benefícios económicos foram procurados com esses dispêndios. Todavia, tal não é prova suficiente de que se deve reconhecer um ativo, pois para além disso deve cumprir-se as restantes definições e critérios de reconhecimento como tal.
Da mesma forma, a não existência de um dispêndio com a aquisição de um item não significa que este não cumpra a definição de ativo, e não possa ser candidato a reconhecimento como tal. Estas situações são, por exemplo, a obtenção de ativos através de doações ou outras operações gratuitas, conforme previsto no parágrafo 58 da estrutura conceptual.
De acordo com este princípio previsto na estrutura conceptual, o beneficiário da doação pode reconhecer como ativos os itens doados pela outra entidade, nos termos do tratamento respetivo previsto nas normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) do SNC ou da norma contabilística para microentidades.
No caso em concreto, essa operação pode implicar o reconhecimento do imóvel como um ativo fixo tangível, nos termos da norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 7 - Ativos fixos tangíveis (se destinado a ser utilizado na atividade operacional ou administrativa da empresa), NCRF 11 - Propriedades de investimento (se destinado ao arrendamento ou para valorização de investimento) ou NCRF 18 - Inventários (se destinado a venda no decurso ordinário da atividade.
No caso em concreto, pressupõe-se que a entidade não exerce a atividade de compra e venda de imóveis. O imóvel, sendo destinado a ser vendido na atividade de investimento da entidade, com objetivo de valorização de capital, esse imóvel é classificado como uma propriedade de investimento, conforme conceito previsto na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 11 - Propriedades de investimento.
Ainda que a entidade em causa esteja a adotar a norma contabilística e de relato financeiro para pequenas entidades (NCRF-PE) ou a norma contabilística para microentidades (NC-ME), o imóvel em causa continua a ser definido e classificado como uma propriedade de investimento, ainda que seja reconhecido como um item do ativo fixo tangível nos termos dos parágrafos 7.5 da NCRF-PE e 7.2 da NC-ME.
Como contrapartida do reconhecimento desse ativo, a empresa beneficiária de tal doação pode não reconhecer um ganho no resultado do período, decorrente dessa entrega gratuita, refletindo-a diretamente como um ganho do capital próprio.
A contabilização de doações pode ser efetuada por contrapartida a crédito da conta 594 - Outras variações no capital próprio - Doações, que regista as doações que a empresa seja beneficiária.
Em termos de mensuração, não existindo um valor de contrapartida pela obtenção do imóvel, pode eventualmente utilizar-se o justo valor do imóvel à data da doação para a determinação dessa mensuração. Esse justo valor pode ser determinado pelo custo corrente do usufruto do imóvel, ou seja, pelo valor que teria pagar pela aquisição do mesmo imóvel em condições similares. Esse justo valor pode ser obtido pelo valor considerado na escritura de doação.
O registo contabilístico pode ser:
- Débito da conta 42x - Propriedade de investimento (ou conta 43x - Ativos fixos tangíveis nos termos da NCRF-PE ou NC-ME) por contrapartida a crédito da conta 594 - Outras variações no capital próprio - Doações, pelo justo valor do imóvel.
Em termos de IRC, o reconhecimento do imóvel adquirido através de doação, sendo uma variação patrimonial positiva não excecionada no artigo 21.º do Código do IRC, concorre para a formação do resultado tributável no período desse reconhecimento.
Nos termos do n.º 2 do artigo 21.º do CIRC, para efeitos da determinação do lucro tributável, considera-se como valor de aquisição dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito o seu valor de mercado, não podendo ser inferior ao que resultar da aplicação das regras de determinação do valor tributável previstas no Código do Imposto do Selo, ou seja, o valor patrimonial tributário (VPT) definitivo determinado nos termos do Código do IMI (cf. n.º 1 do artigo 13.º do Código do Imposto do Selo).
No período da obtenção a título gratuito do imóvel, a sociedade deve adicionar o valor do imóvel na determinação do lucro tributável, por inclusão no campo 702 do quadro 07 da declaração modelo 22.
Em termos de imposto do selo, a referida doação do imóvel deve ser tributada à taxa de 0,8 por cento sobre o valor da doação, pela verba 1.1 da tabela geral do imposto do selo.
Como o beneficiário da doação é uma pessoa coletiva, sujeito passivo de IRC, esta doação do imóvel não está sujeita à verba 1.2 da tabela geral do imposto do selo, conforme previsto na alínea e) do n.º 5 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo.
A alienação do imóvel, classificado como propriedade de investimento, ainda que classificado como ativo fixo tangível nos termos da NCRF-PE ou NC-ME, implica o apuramento de mais ou menos valias fiscais a serem determinadas nos termos do artigo 46.º do CIRC.
Como se trata duma propriedade de investimento, ainda que classificado como ativo fixo tangível nos termos da NCRF-PE ou NC-ME, essa mais-valia não pode beneficiar da redução prevista no regime de reinvestimento do artigo 48.º do CIRC, conforme previsto nos n.ºs 1 e 10 desse artigo.
Por outro lado, ainda que fosse classificado como um ativo fixo tangível, para beneficiar do regime de reinvestimento do artigo 48.º do CIRC, esse imóvel teria que ser detido pela empresa por um prazo não inferior a um ano, conforme o n.º 1 desse artigo.