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IRC - representante fiscal
7 Junho 2022
IRC - representante fiscal
PT27012 - maio de 2022

Os cidadãos residentes no Reino Unido têm até 30 de junho deste ano para nomear um representante fiscal em Portugal. Esta alteração decorreu do Brexit.
Estão nesta situação não só os cidadãos portugueses que emigraram para o Reino Unido e que têm cá família e para quem será, porventura, fácil encontrar um representante fiscal, podendo ser uma pessoa da família ou conhecido, mas também há uma série mais vasta de cidadãos a quem foi concedida a cidadania portuguesa e que nunca vieram a Portugal nem falam português, como é o caso de naturais de Macau, Goa ou outras geografias.
Tendo determinada contabilista certificada sido contactada para ser representante fiscal de duas pessoas, quais as implicações desta decisão para a pessoa que aceita uma representação fiscal? No caso de dívidas, negócios ilícitos, etc., quais as implicações e salvaguardas a ter? Qual seria o valor considerado justo para ser cobrado?

Parecer técnico

Questiona-se relativamente às implicações associadas à aceitação da nomeação como representante fiscal de residentes no Reino Unido por parte de sujeito passivo português.
Na sequência da saída do Reino Unido da União Europeia e do termo do período de transição a 31 de dezembro de 2020, foi aprovado um regime transitório para o cumprimento da obrigação de nomeação de representante fiscal em Portugal para os residentes no Reino Unido.
Este regime transitório estabelece que os cidadãos e pessoas coletivas que se encontrem registados na base de dados da Autoridade Tributária (AT) e possuam morada no Reino Unido podem designar representante fiscal a partir de 1 de janeiro de 2021 até 30 de junho de 2022 sem qualquer penalidade. Até 30 de junho de 2022, e nos casos em que ainda não tenha sido nomeado representante fiscal, mantém-se o endereçamento da correspondência da AT para o Reino Unido.
A contabilista certificada foi abordada para aceitação de serviços de representação fiscal por parte de sujeitos passivos residentes no Reino Unido e pretende ser informada das implicações associadas à assunção de tal responsabilidade, bem como honorários a cobrar.
Relativamente aos honorários a cobrar, a OCC não pode dar qualquer indicação a tal respeito, desde logo porque a fixação de preços de serviços não é matéria da competência desta ordem profissional.
Note-se ainda que os serviços em causa não estão compreendidos no âmbito das funções estatutárias atribuídas por lei aos contabilistas certificados, o que os afasta da eventual cobertura do seguro de responsabilidade profissional.
No que se refere às implicações associadas à assunção de tal responsabilidade, o documento que foi divulgado e que anexa na sua mensagem encontra-se bastante completo e endereça os aspetos mais relevantes a ter em consideração.
Desenvolvemos nesta resposta os aspetos que não são abordados no documento ou que, sendo-o, aqui se completam.

Responsabilidade tributária dos gestores de bens ou direitos de entidades não residentes

Como é sintetizado no documento disponível aqui:
«Que responsabilidades assume um representante fiscal?
É responsável pelo cumprimento das diversas obrigações acessórias (por exemplo, obrigações declarativas) do contribuinte representado.
Pode responder por infrações fiscais decorrentes da sua ação ou omissão (por exemplo, atraso na entrega de uma declaração por causa que lhe seja imputável).
Se acumular a função de gestor de bens ou direitos, fica responsável por todas as contribuições e impostos do não residente relativos ao exercício do seu cargo. Consideram-se gestores de bens ou direitos as pessoas singulares ou coletivas que assumam ou sejam incumbidas, por qualquer meio, da direção de negócios de entidade não residente em território português, agindo no interesse e por conta dessa entidade.
O n.º 1 do artigo 27.º da LGT estabelece que «os gestores de bens ou direitos de não residentes sem estabelecimento estável em território português são solidariamente responsáveis em relação a estes e entre si por todas as contribuições e impostos daqueles em relação ao exercício do seu cargo.»
O estabelecimento da responsabilidade do artigo 27.º da LGT assenta na necessidade de garantia e segurança na cobrança dos impostos devidos por pessoas que detêm uma exígua conexão com o território nacional.
Por sua vez, o n.º 2 do artigo 27.º da LGT determina que «para os efeitos do presente artigo, consideram-se gestores de bens ou de direitos todas aquelas pessoas singulares ou coletivas que assumam ou sejam incumbidas, por qualquer meio, da direção de negócios de entidade não residente em território português, agindo no interesse e por conta dessa entidade.»
O conceito de gestor de bens ou direitos encontra-se relacionado com o conceito da gestão de negócios, embora não se confunda com este. Na verdade, o primeiro conceito é mais amplo que o segundo, incorporando não apenas as situações de gestão de negócios como também as situações em que alguém é mandatado ou autorizado para a gerir os bens ou direitos de entidade não residente em Portugal. Qualquer que seja a modalidade pela qual se processa a gestão de bens ou direitos, esta não se satisfaz com a relação de gestão de negócios, de mandato ou de mera outorga de poderes de representação estabelecida entre a entidade não residente e o pretenso gestor; para que exista gestão de bens ou direitos na aceção do artigo 27.º da LGT, o gestor, mandatário ou procurador devem encontrar-se materialmente investidos na direção de negócios da entidade não residente.
Tendo em conta a dificuldade da determinação do alcance do número 2 do artigo 27.º da LGT, o ofício-circulado n.º 60 084, de 28 de novembro de 2011, aponta indicações para advogados, mas que se entendem igualmente relevantes para outros profissionais, com as necessárias adaptações. Assim, por exemplo, refere que deve ser efetuada uma análise casuística do conteúdo do mandato em cada caso em concreto, por forma a determinar se o mandatário possui liberdade de atuação suficiente para que se possa concluir pela sua responsabilidade solidária na qualidade de gestor de bens ou direitos da entidade não residente sua representada. Por outro lado, a intervenção mediante procuração ou mandato representativo, por exemplo em escritura pública de compra e venda de imóvel, poderá constituir facto gerador de responsabilidade tributária solidária quanto ao cumprimento dos deveres de pagamento do imposto e de salvaguardas dos meios financeiros necessários para o efeito.
Recomenda-se, por isso, que, na sua atuação, o representante delimite o seu nível de intervenção, no sentido de apenas exercer funções de cumprimento das obrigações declarativas e dentro dos prazos legais.
Conforme decorre do exposto, a atuação de forma mais abrangente pode implicar a atração de responsabilidades tributárias e contraordenacionais.
Renúncia à representação fiscal
O artigo 130.º-A do Código do IRS estabelece os procedimentos de renúncia à representação, nos seguintes termos:
«1 - O representante pode renunciar à representação nos termos gerais, mediante comunicação escrita ao representado, enviada para a última morada conhecida deste.
2 - A renúncia torna-se eficaz relativamente à Autoridade Tributária e Aduaneira quando lhe for comunicada, devendo esta, no prazo de 90 dias a contar dessa comunicação, proceder às necessárias alterações.»
Por outro lado, a LGT regulamenta também os procedimentos de renúncia à isenção em termos gerais (e não apenas para efeitos de representação fiscal em sede de IRS).
Nos termos do n.º 9 do artigo 19.º da LGT, o representante pode renunciar à representação nos termos gerais, mediante comunicação escrita ao representado, enviada para a última morada deste.
Sendo que, de acordo com o n.º 10, a renúncia torna-se eficaz relativamente à AT quando lhe for comunicada, devendo esta, no prazo de 90 dias a contar dessa comunicação, proceder às necessárias alterações, desde que tenha decorrido pelo menos um ano desde a nomeação ou tenha sido nomeado novo representante fiscal.
Relativamente aos procedimentos de renúncia, a AT emitiu o Ofício-Circulado n.º 90 026, de 7 de fevereiro de 2019, do qual se destacam os aspetos mais relevantes.
A AT entende que a comunicação de renúncia deve ser feita por meio idóneo, considerando-se como tal somente o envio por carta registada com aviso de receção.
Por outro lado, no ponto 10 do Ofício Circulado consta que o representante deverá dar conhecimento da sua renúncia à AT, devendo, para o efeito, apresentar prova do envio da comunicação de renúncia ao representado, através de cópia da mesma e dos originais do registo da carta e do aviso de receção comprovativo da ocorrência da sua receção.
Verifica-se, assim, que o entendimento da AT é o de que a comunicação só será eficaz se o renunciante fizer prova, entre outros, da efetiva receção da sua comunicação pelo representado, o que, em certos casos, poderá ser impraticável, por exemplo, quando o representado mudou de morada sem informar o representante ou se o representado não proceder ao levantamento da carta de comunicação da renúncia, sendo a mesma devolvida.
Este entendimento da AT é contrário ao disposto no n.º 10 do artigo 19.º da LGT, que dispõe que a renúncia se torna eficaz relativamente à AT quando lhe for meramente comunicada.
Daqui resulta que, em sentido não concordante com as disposições legais citadas, a AT fixa um dever para o representante no sentido de o obrigara a fazer prova da efetiva receção da renúncia por parte do representado, exigindo-lhe, ainda, que o meio de comunicação a utilizar deverá ser carta registada com aviso de receção (e já não um email, por exemplo), embora a lei apenas exija que a comunicação assuma forma escrita.