IRS - Atividades empresariais e profissionais
PT27217 - outubro de 2022
Determinado empresário em nome individual, com contabilidade não organizada e com o CAE 45200 - Manutenção e reparação de veículos automóveis, emite faturas com peças (material) e mão-de-obra.
No IRS, anexo B, deve separar o valor da mão-de-obra, considerando este item como prestação de serviços, registando no campo 404, e o valor dos materiais (peças) deve considerar como vendas de mercadorias e registar no campo 401 ou deve registar tudo como prestação de serviços no campo 404?
Parecer técnico
As questões colocadas referem-se ao enquadramento fiscal de prestações de serviços de «manutenção e reparação de veículos automóveis.»
No caso concreto, estamos perante um sujeito passivo de IRS, titular de rendimentos da categoria B, enquadrado no regime simplificado de apuramento do rendimento tributável.
Uma vez que o sujeito passivo efetua a separação da mão-de-obra e dos bens incorporados nos serviços por si prestados, pretende-se, para efeitos do preenchimento do anexo B à declaração modelo 3, saber se estamos, ou não, perante duas operações distintas.
Embora a questão apenas se prenda com o IRS, iremos, igualmente, aproveitar para abordar as implicações em sede de IVA desta questão.
Ora, antes de abordarmos as questões concretas, refira-se que, uma vez que estamos perante operações constituídas por um conjunto de elementos e atos, haverá que ter em conta todas as circunstâncias em que se desenvolve essa operação, por forma a determinar se estamos na presença de duas ou mais operações ou se em causa estão várias componentes de um único ato.
Neste contexto, é jurisprudência firmada pelo TJUE que «(...) se está perante uma prestação única designadamente no caso em que um ou vários elementos devem ser considerados a prestação principal, ao passo que, inversamente, um ou vários elementos devem ser considerados prestações acessórias que partilham do mesmo tratamento fiscal da prestação principal. Uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador.»
Pode igualmente considerar-se que se está na presença de uma única operação quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única operação económica indissociável cuja decomposição teria natureza artificial.
De facto, para efeitos de IVA, não é possível decompor uma operação pelos respetivos elementos que a constituem com o objetivo de se aplicarem enquadramentos distintos a cada um desses componentes, com prejuízo de, como referido no parágrafo anterior, conferir-lhe uma natureza artificial.
Assim, em operações congéneres, terá sempre de se distinguir as:
- Transmissões de bens, ainda que incluam montagem; das
- Prestações de serviços, ainda que incluam incorporação de bens.
Ora, no caso concreto, estamos perante um sujeito passivo que, na nossa opinião, tendo em conta o descrito, é contratado para efetuar a «manutenção e reparação de veículos automóveis», incorporando, nesses serviços, os respetivos materiais necessários.
Deste modo, em circunstâncias normais, deverão tais operações ser, na nossa opinião, tratadas como prestações de serviços, não podendo as mesmas ser decompostas entre mão-de-obra e materiais incorporados, com prejuízo de, sendo-o, passarem a ter uma natureza artificial e a desvirtuarem a realidade económica da operação contratada entre as partes.
Salientamos que o facto de o sujeito passivo discriminar na fatura as duas componentes não altera este enquadramento, pelo que, na situação exposta no parágrafo anterior, deverá ter-se em conta que a totalidade da fatura é relativa a uma prestação de serviços.
Situação distinta existirá se for transmitido um bem que não esteja relacionado com a realização do serviço de manutenção e reparação de veículos automóveis. Neste caso, essa transmissão do bem é uma operação distinta da realização do serviço, pelo que deve ter um enquadramento distinto para efeitos de IVA, nomeadamente quanto à aplicação da taxa de imposto.
Por exemplo, se estiver em causa transmissões de pneus novos (mesmo que sejam acompanhados da sua montagem), que não revistam natureza acessória relativamente a nenhum serviço, então, somos de opinião de que, neste caso, já estaremos perante transmissões de bens.
O mesmo acontecerá, por exemplo, com a transmissão de embalagens de óleo ou de líquido para os limpa-para-brisas.
Tendo já presente estas regras, tenha-se em conta o seguinte relativamente ao enquadramento em IRS:
Tratando-se de um ENI (titular de rendimentos da categoria B), enquadrado no regime simplificado, será preciso ter em conta os coeficientes previstos no número 1 do artigo 31.º do CIRS.
Destacamos, neste sentido, o disposto nas alíneas a), b) e c) deste número, que referem que:
«1 - No âmbito do regime simplificado, a determinação do rendimento tributável obtém-se através da aplicação dos seguintes coeficientes:
a) 0,15 às vendas de mercadorias e produtos, (...);
b) 0,75 aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º;
c) 0,35 aos rendimentos de prestações de serviços não previstos nas alíneas anteriores.»
Assim, relativamente às transmissões de bens que não se possam qualificar como sendo incorporados nos serviços realizados, e só em relação a estas, será aplicável o coeficiente 0,15, devendo tais montantes ser inscritos no campo 401 do quadro 4-A do anexo B à declaração modelo 3.
Relativamente às operações que sejam, na sua génese e nos termos descritos anteriormente, considerados como serviços prestados pelo sujeito passivo (ainda que sejam incorporados bens e independentemente de ser, ou não, feita a respetiva discriminação na fatura), será preciso averiguarmos se as atividades praticadas se enquadram, ou não, na lista anexa ao artigo 151.º do CIRS, de modo a apurarmos o seu correto enquadramento em sede deste imposto.
Todavia, analisando tal lista, não nos é possível encontrar as prestações de serviços manutenção e reparação de veículos automóveis, pelo que, na nossa opinião, será aplicável o coeficiente de 0,35, devendo tais montantes ser inscritos, tal como sugerido, no campo 404 do quadro 4A do anexo B à declaração modelo 3.