IRS - atribuição de PPR aos sócios de empresa
PT27848 - dezembro de 2023
Uma empresa, com o CAE principal 74100 - Atividades de design, a aplicar a norma contabilística para microentidades e com dois sócios-gerentes, sendo um dos sócios remunerados e o outro não, pretende fazer um PPR para cada um dos sócios.
É possível a empresa fazer um PPR para o sócio não-gerente e este ser considerado gasto dedutível para a empresa?
Entende-se que seria possível, sendo o PPR considerado uma remuneração em espécie para o sócio-gerente. No entanto, da companhia de seguros foi dada a informação de que apenas seria possível fazer o PPR para o sócio-gerente remunerado.
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com a atribuição de planos poupança reforma (PPR) aos sócios de uma empresa.
Para efeitos de IRS, de acordo com o disposto no artigo 2.º do Código do IRS (CIRS), consideram-se rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular provenientes de trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado.
Nesta aceção, o n.º 2 do mesmo artigo clarifica que as remunerações referidas compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em multas, bem como as remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não.
Por sua vez, a redação da alínea b) do n.º 3 do referido artigo 2.º do CIRS dispõe que se consideram ainda rendimentos do trabalho dependente as remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica.
Ora, nestes termos, entende-se que todas as remunerações, direitos, benefícios ou regalias que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta, e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem, são considerados rendimentos do trabalho dependente.
Em suma, ao definir um conceito amplo de remuneração para efeitos fiscais, o legislador pretendeu abranger uma extensa diversidade de prestações que os colaboradores recebem no âmbito da sua relação laboral, quer se trate de rendimentos pecuniários quer se trate de rendimentos em espécie ou outras vantagens que consistam em compensações relacionadas com a prestação de trabalho.
Relativamente às normas de exclusão, prevê o n.º 1 do artigo 2.º-A do CIRS que não se consideram rendimentos do trabalho dependente:
«a) As prestações efetuadas pelas entidades patronais para regimes obrigatórios de segurança social, ainda que de natureza privada, que visem assegurar exclusivamente benefícios em caso de reforma, invalidez ou sobrevivência;
b) Os benefícios imputáveis à utilização e fruição de realizações de utilidade social e de lazer mantidas pela entidade patronal, desde que observados os critérios estabelecidos no artigo 43.º do Código do IRC e os 'vales infância' emitidos e atribuídos nas condições previstas no Decreto-Lei n.º 26/99, de 28 de janeiro;
c) As prestações relacionadas exclusivamente com ações de formação profissional dos trabalhadores, quer estas sejam ministradas pela entidade patronal, quer por organismos de direito público ou entidade reconhecida como tendo competência nos domínios da formação e reabilitação profissionais pelos ministérios competentes;
d) As importâncias suportadas pelas entidades patronais com a aquisição de passes sociais a favor dos seus trabalhadores, desde que a atribuição dos mesmos tenha carácter geral;
e) As importâncias suportadas pelas entidades patronais com seguros de saúde ou doença em benefício dos seus trabalhadores ou respetivos familiares desde que a atribuição dos mesmos tenha carácter geral;
f) As importâncias suportadas pelas entidades patronais com encargos, indemnizações ou compensações, pagos no ano da deslocação, em dinheiro ou em espécie, devidos pela mudança do local de trabalho, quando este passe a se situar a uma distância superior a 100 km do local de trabalho anterior, na parte que não exceda 10% da remuneração anual, com o limite de € 4 200 por ano.»
Feito este enquadramento, vejamos agora o caso dos planos de poupança reforma (PPR).
Os planos de reforma são um instrumento de constituição progressiva de poupança a médio e longo prazo para usufruto no momento de reforma da pessoa segura.
Para efeitos de enquadramento em sede de IRC dos encargos com planos de reforma suportados pelas empresas em favor dos seus trabalhadores, o primeiro aspeto a analisar é se esses encargos configuram ou não, na esfera dos respetivos beneficiários, a natureza de rendimentos do trabalho dependente - categoria A -, nos termos do artigo 2.º, n.º 3 alínea b) n.º 3 do CIRS, ou seja, se aqueles encargos constituem ou não direitos adquiridos e individualizados dos trabalhadores.
O n.º 9 do mesmo artigo 2.º clarifica a expressão «direitos adquiridos» como «(...) aqueles cujo exercício não depende da manutenção do vínculo laboral, ou como tal considerado para efeitos fiscais, do beneficiário com a respetiva entidade patronal.»
Por outro lado, tratando-se de rendimentos em espécie da categoria A, não serão sujeitos a retenção na fonte de IRS, de acordo com a dispensa disposta no artigo 99.º do CIRS.
A empresa deve identificar os trabalhadores abrangidos pela contribuição para o fundo de pensões, sendo essa informação relevante para a entidade gestora do fundo e para estabelecer o trabalhador que está a usufruir desse rendimento acessório em espécie.
Para além desta obrigação, a entidade patronal tem ainda de entregar à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), até ao 10 do mês seguinte a DMR (declaração mensal de remunerações), referente àqueles rendimentos pagos no mês anterior, conforme disposto no artigo 119.º, n.º 1, alínea c) subalínea i) do CIRS, com o código A - Rendimentos do trabalho dependente sujeitos, conforme resulta das instruções de preenchimento divulgadas pela Portaria n.º 307/2022, de 27 de dezembro.
Do ponto de vista do momento em que os rendimentos se qualificam como tal para efeitos de IRS, há que considerar duas hipóteses (teóricas) alternativas:
• As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo vida, contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários, são rendimentos do trabalho dependente, tributados na esfera do trabalhador, em sede da categoria A, de acordo com o estabelecido no artigo 2, n.º 3, alínea b) - 3), do CIRS. Sem prejuízos da aplicação da isenção prevista no artigo 18.º do EBF quando reunidos os seus pressupostos.
Apesar de eventualmente poderem beneficiar desta isenção de IRS, os trabalhadores beneficiários dos complementos de reforma têm que obrigatoriamente sujeitar a englobamento esses rendimentos isentos, uma vez que têm relevância para a determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos tributáveis, conforme disposto no n.º 4 do mesmo artigo 18.º do EBF.
• Não constituindo direitos adquiridos e individualizados, aquelas importâncias são igualmente rendimentos do trabalho dependente, tributados na esfera do beneficiário (trabalhador da empresa) em sede da categoria A, quando possam ser objeto de resgate, adiantamento ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade ou sempre que haja qualquer recebimento em capital.
Tendo em atenção que, se as contribuições para os planos de reforma não forem consideradas como rendimento de trabalho dependente do trabalhador, não constituindo, portanto, este encargo um direito adquirido e individualizado de cada beneficiário, tal como explicado em cima, estes gastos poderão não ser considerados pela empresa como custos fiscais na sua totalidade, uma vez que não estarão enquadrados na alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, por não serem considerados como remunerações.
No entanto, se a empresa determinar que as contribuições para os planos de reforma cumprem com as condições previstas no n.º 4 do artigo 43.º do CIRC, poderão ser aceites como encargos dedutíveis em termos fiscais, nos termos do artigo 43.º do CIRC, condições essas que de seguida se indicam:
- Os benefícios sejam atribuídos a todos os trabalhadores;
- Os benefícios sejam estabelecidos por critérios objetivos e idênticos para todos;
- O contrato de seguro seja estabelecido com uma seguradora com sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em Portugal; e,
- Esses benefícios não sejam considerados como rendimento de trabalho dependente;
Neste âmbito, os respetivos encargos poderão ser aceites como gasto fiscal, como o limite de 15 por cento dos restantes custos com o pessoal (ou 25 por cento se existir a situação prevista no n.º 3 do artigo 43.º do CIRC).
Assim, os planos poupança reforma (PPR) se forem nominativos e individuais constituem sempre direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários, logo, configurando os valores despendidos pela empresa rendimentos do trabalho dependente dos trabalhadores, tais valores serão considerados na sua totalidade como custo fiscal do exercício, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.
Caso os encargos, com planos de reforma, não constituam direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários, a dedutibilidade fiscal do custo que a empresa suporta dependerá de os mesmos estarem, ou não, abrangidos pelo disposto no n.º 4 do artigo 43.º do CIRC (Realizações de utilidade social) ou seja, os benefícios devem ser estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa, nos termos e dentro dos limites estabelecidos naquele artigo.
Nas situações em que não seja possível o enquadramento no artigo 43.º, estará prejudicada a dedutibilidade fiscal dos encargos com tais planos, conforme resulta da interpretação do n.º 1, alínea d) do artigo 23.º do CIRC.
A respeito do cumprimento dos requisitos impostos pelo artigo 43.º do CIRC, mais concretamente a necessidade do carácter de generalidade na atribuição a todos os colaboradores, e tendo em consideração que no caso em apreço nada é dito sobre se a empresa tem mais trabalhadores ao seu serviço, podendo o sócio-gerente ser o único trabalhador da empresa, notamos que a AT já se pronunciou sobre esta temática.
É entendimento da AT, proferido na ficha doutrinária processo: 2019 001289, PIV n.º 15 354, sancionado por despacho, de 24 de abril de 2019, da diretora de serviços do IRC que o «sócio gerente, o mesmo é o único trabalhador da empresa, pelo que a atribuição de "vales sociais" não tem caráter geral, aliás, trata-se, neste caso, de um benefício de caráter individual perfeitamente identificável, logo, tributado em sede de IRS como rendimento da categoria A, sendo o gasto aceite em sede de IRC, à luz do artigo 23.º do CIRC.»
Sobre a atribuição de seguros de vida e de doença pagas a sócios-gerentes, a AT emitiu a informação vinculativa Processo: 2020 0001706 - PIV 17196, despacho de 2020-04-06.
Refere a AT nesse processo que «entende-se que terá caráter geral se for atribuído a todos os trabalhadores em condições idênticas, não podendo a sua atribuição estar sujeita a outras condições adicionais impostas pela entidade empregadora. Ora, no caso apresentado, os benefícios só são dados ao único sócio-gerente que aufere uma remuneração.»
Sendo referido ainda que, «no caso em concreto, os benefícios em causa são atribuídos a um dos sócios-gerentes, único com remuneração na empresa, tratando-se, portanto, de um rendimento perfeitamente individualizado do respetivo beneficiário. Como tal, o mesmo é considerado um rendimento do trabalho dependente, nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, devendo ser tributado na esfera daquele sócio-gerente.
Assim, estando o rendimento em causa abrangido pelas normas de tributação do IRS (como rendimento da categoria A) deve o mesmo ser tributado na esfera do respetivo beneficiário, não sendo opcional a tributação ser efetuada na esfera individual ou na esfera da empresa. Isto significa que o beneficiário dos seguros em causa não pode ficar desobrigado da tributação de IRS que recair sobre esses rendimentos.»
Por último, os PPR estão dispensados de incidência contributiva para a Segurança Social, porquanto a alínea x) do n.º 2 do artigo 46.º do Código Contributivo não foi ainda regulamentada, conforme resulta do disposto no artigo 4.º da Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro.
Neste sentido, e respondendo às questões colocadas, a atribuição do PPR ao sócio-gerente e ao sócio não gerente, parece-nos que será um benefício de caráter individual perfeitamente identificável, tributado em sede de IRS como rendimento da categoria A e, consequentemente, representará um gasto fiscalmente dedutível em sede de IRC.