IRS – isenção em organismo da ONU
PT27406 - fevereiro, 2023
Como é feita a tributação de rendimentos e qual a legislação aplicável em sede de IRS para um consultor ao serviço da Organização Mundial de Saúde na Grécia?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento em sede de IRS de um consultor que presta serviços para a Organização Mundial de Saúde na Grécia.
A regra geral dos residentes fiscais é a tributação de todos os rendimentos, incluídos os rendimentos obtidos no estrangeiro de acordo com o artigo 15.º, n.º 1 do Código do IRS (CIRS).
Tratando-se de não residentes em território nacional apenas aqui são tributados pelos rendimentos considerados obtidos em território nacional de acordo com o n.º 2 do artigo 15.º do CIRS.
O conceito de residência fiscal consta do artigo 16.º, n.º 1 do CIRS que estabelece que são residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:
- Haja nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;
- Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;
- Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;
- Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de caráter público, ao serviço do Estado português.
Assim, é preciso aferir se o sujeito passivo reúne os requisitos para ser considerado residente fiscal. Sendo considerado residente fiscal, os rendimentos obtidos no estrangeiro são aqui declarados no anexo J, beneficiando do crédito por dupla tributação jurídica internacional constante do artigo 81.º do CIRS.
Há agora que equacionar se existe alguma especificidade relativamente a rendimentos auferidos nas Nações Unidas e a Organização Mundial de Saúde é um organismo das Nações Unidas.
A Resolução da Assembleia da República n.º 38/98, de 21/07/1998 aprovou, para adesão, à Convenção sobre os Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, adotada pela Assembleia Geral em 13 de fevereiro de 1946.
Em relação ao âmbito da Convenção há dois aspetos que devem ser destrinçados: o tipo de rendimentos que fica abrangido pela Convenção e a sua aplicabilidade aos sujeitos passivos tendo em consideração a reserva formulada no artigo 2.º da referida Resolução.
Como decorre da informação vinculativa - Despacho de 2010-11-30 - Processo n.º 6244/10, a isenção estabelecida no artigo V, secção 18, alínea b) apenas abrange rendimentos decorrentes da prestação de trabalho.
Somos de opinião que, as expressões «funcionários» e «salários e emolumentos» apenas permitirão que a isenção abranja rendimentos de trabalho dependente (categoria A) e não categoria B (trabalhadores independentes, nomeadamente consultores).
O outro aspeto a equacionar é a reserva formulada no artigo 2.º que estabelece: «A isenção estabelecida na alínea b) da secção 18 não se aplica aos nacionais portugueses e aos residentes em território português que não adquiram essa qualidade para o efeito do exercício da referida atividade.»
Na nossa interpretação a restrição relativa aos residentes em território português não está condicionada à condição de serem também pessoas de nacionalidade portuguesa. Trata-se de duas situações distintas e não necessariamente cumuláveis.
Não obstante, referimos que pela Resolução da Assembleia da República n.º 3/2018, publicada no «Diário da República», 1.ª série - n.º 5-8 de janeiro de 2018, foi aprovada a retirada da reserva da República Portuguesa à alínea b) da secção 18 da Convenção sobre os Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, adotada pela assembleia-geral, em 13 de fevereiro de 1946 e revogado o artigo 2.º da Resolução da Assembleia da República n.º 38/98, de 31 de julho.
Deve ser avaliado se o rendimento é obtido em território português, conforme regras do artigo 18.º do CIRS. E se a pessoa que obtém tal rendimento é considerada residente fiscal, conforme o disposto no artigo 16.º do CIRS.
Os rendimentos do trabalho dependente consideram-se obtidos em território português quando decorram de atividades nele exercidas, ou quando tais rendimentos sejam devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento (alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do CIRS).
Devem ainda serem tidas em consideração as normas antiabuso previstas nos números 6, 14 e 16 do artigo 16.º do CIRS.
Como referido, tratando-se de uma pessoa que é considerada residente fiscal em Portugal ficará sujeita a IRS, quer quanto aos rendimentos obtidos em território nacional quer quanto aos rendimentos obtidos fora de Portugal.
Como referido também, se estivermos perante um não residente fiscal em Portugal só pode haver sujeição a IRS quanto aos rendimentos considerados obtidos em território nacional. Neste cenário, quanto a rendimentos do trabalho dependente apenas haveria de equacionar a sujeição a IRS e depois a eventual dispensa ao abrigo da Resolução da Assembleia da República n.º 38/98, se as funções fossem exercidas em Portugal ou pagas por entidade com residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável neste país.
Ora, pressupondo que o trabalhador é residente fiscal na Grécia e aí obtém os rendimentos, pelo atrás exposto não há qualquer sujeição a IRS em Portugal.
Se, eventualmente, o referido trabalhador passa a ser considerado residente fiscal em Portugal terá de aqui declarar todos os rendimentos que tenha obtido, incluindo os rendimentos do trabalho dependente obtidos na Grécia, os quais são declarados no anexo J.
Se esse trabalhador é de nacionalidade portuguesa seria aplicável a reserva formulada no artigo 2.º. No entanto, deve atender-se à data de entrada em vigor da retirada da reserva e da revogação da norma que a estabelecia, no sentido de apurar se, à data em que os rendimentos sejam obtidos, ainda está em vigor a referida reserva.