IRS - mais-valias na venda de imóvel
PT28270 – agosto 2024
Determinada pessoa singular adquiriu em agosto de 2021 a totalidade de um imóvel para habitação própria e permanente por 172 500 euros. Desde agosto de 2021 até abril de 2024 manteve a sua habitação própria e permanente nesse imóvel.
Em abril de 2024 adquiriu 50 por cento de outro imóvel para habitação própria e permanente noutra localidade (alterando a residência para esta). Pretende vender o imóvel de que detém a totalidade por 300 mil euros. Ainda existe um empréstimo relativo a este imóvel para liquidar no montante de 130 mil euros.
Se esta pessoa vender o imóvel por 300 mil euros poderá deduzir no cálculo das mais-valias o valor do empréstimo em dívida de 130 mil euros e reinvestir na aquisição dos seus 50 por cento do novo imóvel para habitação própria e permanente que, entretanto, já adquiriu?
Como deverá declarar estes valores no anexo G da declaração modelo 3?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento fiscal, em sede de IRS, da transmissão da propriedade de imóveis.
Nos termos do artigo 1.º do Código do IRS (CIRS), os incrementos patrimoniais constituem uma das categorias de rendimentos definidas nos termos deste código, onde se incluem os ganhos gerados pela venda de imóveis pertencentes ao património particular do sujeito passivo do imposto.
De acordo com a definição do artigo 9.º do CIRS, constituem incrementos patrimoniais, ou seja, rendimentos da categoria G, desde que não considerados rendimentos de outras categorias, as mais-valias, tal como definidas no artigo 10.º do mesmo Código.
As mais-valias de imóveis resultam dos ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, provenham da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, assim como da afetação desses bens do património particular a atividade geradora de rendimentos empresariais e profissionais, exercida em nome individual pelo seu proprietário, conforme alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS. Para este efeito releva também a alienação de direitos reais menores, como sejam, a nua-propriedade e o usufruto.
O ganho obtido na alienação resulta da seguinte fórmula:
MV = VR - (VA x coef. + EV + DA), sendo
VR - valor de realização
VA - valor de aquisição
Coef. - Coeficiente de desvalorização monetária
EV - encargos com valorização
DA - despesas com a alienação e com a aquisição.
De referir que, nos termos do n.º 1 do artigo 50.º do CIRS, o coeficiente desvalorização da moeda apenas é aplicado se o sujeito passivo deteve a posse do imóvel por mais de 24 meses.
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 45.º e n.º 1 do artigo 46.º do CIRS, para efeitos de determinação da mais-valia resultante da alienação de bens imóveis, considera-se valor de aquisição aquele que foi determinado para efeitos de liquidação de imposto do selo ou do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT), consoante os bens imóveis tenham sido adquiridos a título gratuito ou a título oneroso, respetivamente.
Quando não tenha havido lugar a liquidação dos referidos impostos, considera-se valor de aquisição, o valor que lhes serviria de base, determinado de acordo com as regras próprias constantes dos respetivos códigos.
O valor de realização corresponde ao valor da respetiva contraprestação ou pelo valor patrimonial tributário, quando superior ao primeiro, conforme alínea f) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 44.º do CIRS.
Portanto, o valor da transmissão dos bens ou direitos reais sobre bens imóveis que servir de base (ou que pudesse ter servido de base) à liquidação do IMT, quando for superior a qualquer daqueles valores indicados nas alíneas a), b) e f) do artigo 44.º prevalecerá sobre qualquer outro.
Se o valor da contraprestação da venda do imóvel é superior ao VPT à data da transmissão, então, será o valor acordado que deve ser considerado como valor de realização.
São ainda considerados no cálculo da mais-valia, de acordo com o artigo 51.º do CIRS, os encargos com a valorização dos bens e as despesas inerentes à aquisição e alienação, nos termos da alínea a) daquele artigo.
De acordo com aquela alínea a) serão dedutíveis os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação (como exemplo a comissão imobiliária, quando exista), bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS.
A mais ou menos-valia é calculada pelo sistema central da Autoridade Tributária, cabendo ao contribuinte apenas o correto preenchimento do anexo G à declaração modelo 3.
A alienação de direitos reais sobre bens imóveis deve ser declarada no quadro 4 do anexo G, em conformidade com as respetivas instruções de preenchimento anexas ao formulário.
Para efeitos de tributação, a mais-valia apurada pelos serviços da administração tributária será, à partida, reduzida em 50 por cento, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS.
Não obstante a sujeição a tributação, um imóvel alienado que seja habitação própria e permanente (HPP) do sujeito passivo à data da alienação, poderá beneficiar do regime do reinvestimento previsto nos números 5 a 9 do artigo 10.º do CIRS, desde que observados os requisitos legalmente previstos.
A delimitação negativa expressa nos referidos números respeita aos ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados à HPP do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, no caso de reinvestimento do produto da alienação em imóvel com o mesmo destino.
A exclusão de tributação destas mais-valias, prende-se com o reconhecimento da proteção devida à aquisição ou melhoramento de imóveis destinados a habitação própria e permanente do contribuinte ou do seu agregado familiar.
Deste modo, o CIRS, no n.º 5 do seu artigo 10.º, permite a exclusão da tributação dos ganhos resultantes da venda de HPP nos seguintes termos:
«5 - São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, desde que verificadas, cumulativamente, as seguintes condições:
a) O valor de realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, seja reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para construção de imóvel e ou respetiva construção, ou na ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado-membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal;
b) O reinvestimento previsto na alínea anterior seja efetuado entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da realização;
c) O sujeito passivo manifeste a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionando o respetivo montante na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação;
d) (Revogada.)
e) O imóvel transmitido tenha sido destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, comprovada através do respetivo domicílio fiscal, nos 24 meses anteriores à data da transmissão; (Aditada pela Lei n.º 56/2023, de 6 de outubro)
f) Os sujeitos passivos não tenham beneficiado, no ano da obtenção dos ganhos e nos três anos anteriores, do presente regime de exclusão, sem prejuízo da comprovação pelo sujeito passivo, efetuada em procedimento de liquidação, de que a não observância da presente condição se deveu a circunstâncias excecionais. (Aditada pela Lei n.º 56/2023, de 6 de outubro).» (itálicos nossos)
O pressuposto em que assenta a exclusão tributária contida neste artigo é que no âmbito do património do contribuinte ou respetivo agregado familiar, haja uma identidade funcional entre o imóvel transmitido e o adquirido com o valor da realização. Isto é, tanto o imóvel vendido como o imóvel adquirido têm de desempenhar função idêntica: habitação própria e permanente do contribuinte ou respetivo agregado familiar.
Assim, a exclusão da tributação das mais-valias obtidas com a alienação de habitação própria permanente do sujeito passivo, ou do seu agregado, prevista no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS exige (entre outros requisitos) que o produto da venda (valor de realização abatido do valor remanescente do empréstimo, pago aquando da venda, caso exista) seja aplicado na aquisição de outra habitação própria permanente.
Este "produto da venda" corresponde ao valor de realização obtido na venda do imóvel ao qual é deduzido o valor do empréstimo incorrido para a aquisição desse imóvel (se o houver) ainda em dívida à data da venda e que é pago nessa data, conforme refere a alínea a) do n.º 5 do CIRS.
Por reinvestimento entende-se a utilização efetiva dos montantes recebidos, pelo que, se houver empréstimo para a compra da nova habitação, ou na parte em que exista em empréstimo, não se considera existir reinvestimento.
Face ao exposto, para que exista exclusão da mais-valia por alienação de HPP, é fundamental que o valor de venda deduzido do capital do empréstimo em dívida à data da alienação, seja reinvestido na aquisição ou construção de uma nova HPP, sendo igualmente fundamental que não exista recurso ao crédito, ou a existir que apenas se consubstancie na diferença de valores entre o valor de venda líquido do empréstimo em dívida e o valor da realização/venda.
Se se concluir que não se concretiza o reinvestimento nos termos e prazos legalmente estabelecidos para o efeito, será a mais-valia apurada sujeita a tributação, por englobamento, em 50 por cento do correspondente valor determinado com base nas regras aplicáveis ao caso.
Relativamente ao caso apresentado, há que calcular o montante efetivamente reinvestido, tendo em conta o empréstimo amortizado. No caso de reinvestimento parcial do valor de realização o benefício a que se refere o n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, respeitará apenas à parte proporcional dos ganhos correspondente ao valor reinvestido.
Por fim, é de referir que, no conceito de reinvestimento que releva para efeitos da aplicação da norma, é importante atender à substância económica dos factos tributários. Situação que leva a ter em consideração para efeitos de reinvestimento o valor que efetivamente foi utilizado, resultante da alienação efetuada. Existindo recurso a um empréstimo para a aquisição, apenas a diferença poderia ser considerada como afetação do capital realizado para o reinvestimento.
Na situação em análise, no pressuposto que os dados da questão estão corretos:
Valor de aquisição = 172 500€ majorado pelo coeficiente de atualização
Valor de realização = 300 000€
Valor a reinvestir (sem recurso a crédito) = Valor realização - Empréstimo em dívida para aquisição da HPP, se aplicável.
Valor a reinvestir (sem recurso a crédito) = 300 000€ - 130 000€ = 170 000€
Notamos que no caso de reinvestimento parcial o benefício a que se refere o n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, respeitará apenas à parte proporcional dos ganhos correspondente ao valor reinvestido.
Face ao exposto, e respondendo concretamente à questão colocada, entendemos que o valor de realização poderá ser utilizado para aquisição de parte de um imóvel, desde que este seja destinado ao mesmo fim (HPP).
No ano da venda do imóvel deverá ser declarada a respetiva mais-valia no quadro 4 do anexo G da declaração modelo 3, sendo referida a intenção de reinvestimento no quadro 5 deste anexo, conforme instruções disponíveis nesta ligação.