IVA – Adiantamentos recebidos de clientes
PT27998 - fevereiro de 2024
Determinada empresa com a atividade de medicina dentária presta serviços de valor elevado, permitindo aos clientes pagamento a prestações. Desta forma, fatura no momento do respetivo recebimento. No momento do último pagamento procede à anulação dessas faturas por nota de crédito, emitindo uma fatura do valor total. Sendo este procedimento errado, qual o procedimento correto?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento fiscal, em sede de IVA, dos adiantamentos recebidos de clientes.
Previamente à nossa análise, cumpre desde logo notar que entendemos que nos encontramos perante prestações de serviços prolongadas, as quais são pagas faseadamente e previamente à sua conclusão.
A este respeito, entendemos que não estamos perante meras condições comerciais e/ou de pagamento, ou seja, entendemos que não estamos perante serviços prestados num único momento e em que é acordado o pagamento faseado após a conclusão desse serviço.
Em sede de IVA, nos termos do artigo 1.º do Código do IVA (CIVA), estão sujeitas a IVA, entre outras, as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.
Neste sentido, refere o artigo 3.º do CIVA que se considera, em geral, transmissão de bens a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade.
Por sua vez, nos termos do artigo 4.º do referido Código, são consideradas como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens.
No caso em concreto é-nos referido que nos encontramos perante serviços realizados no âmbito da atividade médica dentária.
A este respeito, cumpre notar que, apesar das normas de sujeição, entendemos que tais operações, poderão estar isentas de IVA, nos termos do artigo 9.º do CIVA.
Adicionalmente, por força da alínea c) do n.º 1 do artigo 8.º do CIVA, se a transmissão de bens ou a prestação de serviços derem lugar ao pagamento, ainda que parcial, anteriormente à emissão da fatura, o imposto é devido no momento do recebimento desse pagamento, pelo montante recebido.
Por outro lado, nos termos do n.º 2 do artigo 8.º do CIVA, sempre que a operação dê lugar à obrigação de emitir uma fatura, ou pagamento, precedendo o momento da realização das operações tributáveis, o imposto torna-se exigível nesse momento, se o prazo para a emissão for respeitado.
Neste sentido, a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA determina que os sujeitos passivos devem «[e]mitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, (...) bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.»
Consagra-se, desta forma, a regra de que, sempre que se receba um adiantamento, deverá proceder-se à emissão de uma fatura e liquidação do imposto, caso este seja devido.
Dá-se, assim, uma antecipação da exigibilidade face ao facto gerador, o qual, nestes casos, só ocorre depois, quando os serviços forem prestados ou os bens transmitidos ao adquirente.
No que se refere ao cumprimento da obrigação de faturação, estabelece a alínea a) do n.º 1 do artigo 36.º do CIVA que a fatura deve ser emitida o mais tardar no 5.º dia útil seguinte ao do momento em que o IVA é devido nos termos do artigo 7.º.
A este respeito, notamos que o imposto é devido e torna-se exigível:
- Nas transmissões de bens, quando os bens são postos à disposição do adquirente; e
- Nas prestações de serviços, no momento da sua realização.
Contudo, se forem efetuados pagamentos relativos a uma transmissão de bens ou prestação de serviços ainda não efetuadas, ou quando o pagamento coincida com o momento em que é exigível o imposto, a fatura deve ser emitida na data do recebimento, conforme alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIVA.
Com efeito, a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA obriga à emissão de uma fatura, cuja data deve coincidir com a data do recebimento do respetivo montante, em conformidade com o n.º 1 do artigo 36.º do CIVA.
No caso em concreto, caso seja aplicável uma das isenções do artigo 9.º do CIVA, não será exigível o imposto pelo adiantamento, mantendo-se a obrigação de emissão da respetiva fatura.
De acordo com o disposto na informação vinculativa processo n.º 15 298, por despacho de 2019-04-23, da diretora dos serviços do IVA, (por subdelegação), disponível aqui, é entendimento da Autoridade Tributária o seguinte:
«O imposto relativo à transmissão de bens é exigível no momento do recebimento do adiantamento, pelo montante recebido, por aplicação do n.º 2 do artigo 8.º do CIVA, e o recebimento de adiantamentos determina a obrigação de emissão de fatura, em cumprimento da alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIVA.»
Adicionalmente, notamos que a fatura do adiantamento deve conter todos os requisitos do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, pelos pagamentos que sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou prestação dos serviços.
Aquando da transmissão dos bens ou da prestação dos serviços, o adiantamento efetuado inicialmente terá de ser de certa forma “anulado”, através do seu abatimento direto ao valor final da operação a constar na fatura que titule a transmissão dos bens ou a prestação dos serviços (base tributável da operação final, subtraída da base tributável do aditamento).
Desta forma, aquando da efetiva prestação dos serviços, deverá ser emitida a fatura definitiva fazendo menção à fatura que titulou o adiantamento (também esta com todos os requisitos referidos no n.º 5 do artigo 36.º CIVA), liquidando o imposto sobre a diferença entre o valor tributável inscrito nesta fatura final e o valor pago no adiantamento, caso esta venha a existir e seja devido.
Face ao exposto, e respondendo concretamente à questão colocada, entendemos que quando nos encontramos perante adiantamentos, ou seja, perante pagamentos que sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços, mas com vista à realização destas, o procedimento adotado deverá ser o anteriormente exposto.
No que se refere ao momento final, e por forma a responder diretamente à dúvida existente, remetemos ainda as respostas dadas pela AT, no tópico «Questões frequentes», nomeadamente na questão 32-5056, a qual transcrevemos por simplicidade.
«32-5056 Adiantamentos | No momento da transmissão do bem/prestação do serviço, como devo proceder para regularizar um adiantamento recebido?
Após a transmissão do bem ou a conclusão da prestação do serviço, deve emitir fatura para titular a operação, onde deve constar o valor tributável da mesma, o valor a abater, correspondente ao adiantamento, e a menção à fatura que o titulou. A liquidação do IVA deve incidir sobre a diferença entre o valor total da operação e o montante já pago a título de adiantamento.»
Assim, entendemos que as faturas inicialmente emitidas, relativas aos adiantamentos, não devem ser anuladas, mas sim "abatidas" na fatura final.