IVA - Inversão do sujeito passivo
PT27924 - janeiro de 2024
Determinada empresa "A", com o CAE principal 41200 - Construção de edifícios habitacionais e não habitacionais, é uma sociedade unipessoal por quotas no regime de IVA trimestral que se encontra a prestar serviços unicamente de empreitadas não sendo a empresa dona das obras.
A empresa contratou alguns serviços de subempreitada a uma sociedade por quotas (empresa "B"), igualmente inscrita no regime de IVA.
A empresa "B", ao longo do ano 2022, emitiu as faturas corretamente com o código de isenção M08 - Autoliquidação, mas em 2023 colocou o código de isenção M01 - artigo 16.º, n.º 6, ao invés do M31 - autoliquidação.
Só ao lançar-se o mês de dezembro é que se deu conta do sucedido e pretende-se corrigir a situação, até porque a empresa "A" quer solicitar reembolso de IVA.
Receberam-se seis faturas ao longo do ano 2023 como se fossem de autoliquidação e foram tratadas como tal.
Como proceder, antes de avançar para o pedido de reembolso, para que fique tudo correto? Solicita-se à empresa "B" que emita notas de crédito datadas de 2024 e emita novas faturas fazendo menção ao erro cometido nas faturas de 2023? Qual o tratamento a dar às faturas?
Parecer técnico
Determina a referida alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA que são sujeitos passivos de IVA «as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada.»
O ofício-circulado n.º 30101, de 24-05-2007, esclarece que, a norma abrange todos os serviços de construção civil, independentemente de verificarem o conceito de empreitada ou subempreitada definidos nos termos do Código Civil, que se consubstanciem numa obra e que se verifica a inversão do sujeito passivo quando, cumulativamente:
- Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil;
- O adquirente seja sujeito passivo do IVA em Portugal e aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA.
Contudo, só há lugar à regra de inversão quando o adquirente é um sujeito passivo sediado em Portugal, ou que aqui tenha estabelecimento estável ou domicílio e que pratique operações que conferem total ou parcialmente o direito à dedução.
A norma em causa é de tal forma abrangente que inclui todos os serviços de construção civil, independentemente de os mesmos fazerem ou não parte do conceito de empreitadas ou subempreitadas a que se referem os artigos 1 207.º e 1 213.º do Código Civil.
De acordo com o ofício-circulado n.º 30 101, consideram-se serviços de construção civil todos os que tenham por objeto a realização de uma obra, englobando todo o conjunto de atos que sejam necessários à sua concretização.
Por outro lado, deve entender-se por obra todo o trabalho de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza, restauro e demolição de bens imóveis, bem como qualquer outro trabalho que envolva processo construtivo, seja de natureza pública ou privada.
Concretamente, é referido no ponto 1.4 do referido ofício-circulado que «sempre que, no âmbito de uma obra, o prestador fatura serviços de construção propriamente dita ou quaisquer outros com ela relacionados e necessários à sua realização, (por exemplo, aluguer ou colocação de andaimes, aluguer de gruas e de outros bens, serviços de limpeza, sinalização, fiscalização, remoção de entulhos, serviços de projetistas ou de arquitetura, etc.), bem como materiais ou outros bens, entende-se que o valor global de fatura, independentemente de haver ou não discriminação dos vários itens e da faturação ser conjunta ou separada, é abrangido pela regra de inversão de sujeito passivo.
Contudo, a faturação de serviços, ao prestador dos serviços de construção, tais como os indicados e que isoladamente não relevam do conceito de serviços de construção (por exemplo, aluguer ou colocação de andaimes, aluguer de gruas e de outros bens, serviços de limpeza, sinalização, fiscalização, remoção de entulhos, serviços de projetistas ou de arquitetura, etc.) ou de meros fornecimento de materiais ou de outros bens, não é abrangida pelas normas de inversão, cabendo ao prestador dos referidos serviços ou ao transmitente dos bens a normal liquidação do IVA que se mostre devido.»
De igual forma excluem-se da regra de inversão os bens que, inequivocamente, tenham a qualidade de bens móveis, isto é, bens que não estejam ligados materialmente ao bem imóvel com carácter de permanência (ponto 1.5.3).
A simples montagem de aparelhos que não façam parte integrante do edifício (por exemplo, plataformas elevatórias e elevadores para cadeiras de rodas, a que se refere o n.º 39 do despacho n.º 26 026/2006, de 21 de dezembro e aparelhos de ar condicionado ou de vídeo vigilância funcionando isoladamente), não se encontra abrangida pela referida regra de inversão [alínea b) do ponto 1.5.4].
Acrescenta a AT no ponto 1.6.2 que «não há lugar à inversão, cabendo ao prestador de serviços liquidar o IVA que se mostre devido, quando o adquirente é:
a) Não sujeito passivo;
b) Sujeito passivo que pratica exclusivamente operações isentas que não se encontram previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA (4) (vulgo sujeitos passivos abrangidos pelo artigo 9.º ou pelo artigo 53.º do Código) considerando-se, como tais, os que constem, nessa situação, no registo informático da DGCI, incluindo aqueles que se encontram com enquadramento pendente por força do n.º 4 do artigo 28.º do CIVA;
c) Sujeito passivo que apenas o é porque efetua aquisições intracomunitárias, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 2.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias - RITI (Estado e demais pessoas coletivas de direito público abrangidas pelo disposto no n.º 2 do artigo 2.º do CIVA e qualquer outra pessoa coletiva não sujeito passivo nos termos do CIVA). Tais sujeitos passivos são indicados, em termos de enquadramento do IVA (ver ponto V), como "Aquis. Intracom." ou "Aquis. Intracom. por opção.»
Esclarece ainda o 1.6.3 que "No caso de adquirentes sujeitos passivos mistos, isto é, os que pratiquem operações que conferem o direito à dedução e operações que não conferem esse direito e, independentemente do método utilizado para o exercício do direito à dedução (afetação real ou pro rata), há lugar à inversão do sujeito passivo.» (itálico nosso)
Feito o enquadramento geral, na situação em análise, no caso de estarmos perante trabalhos de construção civil, contemplados nos termos da Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção (revogando o Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro e a Portaria n.º 19/2004, de 10 de janeiro) ou no anexo I do ofício-circulado n.º 30 101/2007, de 24 de maio, sendo o adquirente da prestação de serviços um sujeito passivo com direito à dedução total ou parcial, será aplicável a regra da inversão do IVA pelo prestador.
A aplicação desta norma não se limita à fatura emitida ao dono da obra, aplica-se em toda a cadeia económica.
Ou seja, será o adquirente do serviço de construção civil em questão, se sujeito passivo de IVA do regime normal ou misto, que terá de entregar o IVA da operação, devendo o fornecedor fazer a menção expressa no documento a emitir «IVA autoliquidação», sem indicar o valor do imposto.
Sobre esta matéria, sugere-se também a consulta da informação vinculativa do processo: n.º 23 524, por despacho de 2023-03-16, da diretora de serviços do IVA (por subdelegação), do qual citamos o parágrafo 36:
«36. Nas empreitadas de construção civil, em que o adquirente é um sujeito passivo de IVA, o serviço prestado pelo fornecedor é considerado como serviço de construção civil, pelo que se aplica a regra de inversão em causa e, por sua vez, ainda que o serviço tenha sido efetuado por um terceiro (subempreiteiro) fica, também, abrangido pela regra de inversão em causa, desde que o dono da obra seja um sujeito passivo de IVA nas condições já referidas.»
Com a publicação da nova estrutura de dados anexa à Portaria n.º 302/2016, de 2 de dezembro, concretamente, nas notas técnicas relativas ao campo "Código do motivo de isenção de imposto (TaxExemptionCode)", foi disponibilizada uma nova tabela onde foram elencados os motivos de isenção e os respetivos códigos a utilizar.
Assim, a partir do dia 1 de janeiro de 2023, todos os documentos emitidos, teriam de utilizar os novos códigos, sendo comunicados ao sistema e-Fatura já de acordo com a nova tabela.
No caso da aplicação da regra de inversão de sujeito passivo, nos termos da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, os documentos fiscalmente relevantes devem mencionar o código «M31».
Conforme resulta do n.º 7 do artigo 29.º do CIVA, quando o valor tributável de uma operação ou o imposto correspondente sejam alterados por qualquer motivo, incluindo inexatidão, deve ser emitido documento retificativo de fatura.
De acordo com o ofício-circulado n.º 30 141/2013, de 4 de janeiro, quer notas de crédito quer notas de débito, são considerados documentos retificativos válidos.
Estes documentos retificativos (notas de débito ou notas de crédito) das faturas anteriormente emitidas deverão ser emitidos com a inclusão, além da data e numeração sequencial, dos elementos identificativos do fornecedor ou prestador de serviços e do adquirente ou destinatário desses bens ou serviços, bem como da referência à fatura a que respeitam e das menções desta que serão objeto de alterações, conforme o n.º 6 do artigo 36.º do CIVA.
Assim, poderão ser emitidos documentos retificativos se houver uma alteração, incluindo por inexatidão, ao valor tributável de uma operação ou ao imposto correspondente.
Refere no ponto 14 do ofício-circulado n.º 30 136/2012, de 19 de novembro:
«14. (...)
Não pode, assim, ser emitida nova fatura, como forma de retificação do valor tributável ou do correspondente imposto, sem prejuízo da possibilidade de anulação da fatura inicial e sua substituição por outra, quando a retificação se deva a outros motivos.»
Relativamente à dedução, refere o n.º 8 do artigo 19.º do CIVA que «nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação.»
Conforme ponto 1.1 do ofício-circulado n.º 30 101, de 24-05-2007, o IVA devido pelo adquirente deve ser liquidado na própria fatura recebida do prestador ou em documento interno que, para o efeito, deverá fazer menção da fatura original (número, data e identificação do prestador). No caso de não recebimento da fatura, subsiste a obrigação de autoliquidação (ver ponto 2.4), devendo a mesma fazer-se em documento interno e mantendo-se o direito à dedução nos termos gerais do CIVA.
Em suma, para regularizar a situação, o sujeito passivo, subempreiteiro e prestador de serviços de construção civil, poderá anular as faturas e emitir novas, fazendo expressa menção ao motivo da anulação e o documento substituído, uma vez que não existe inexatidão do valor tributável da operação ou do respetivo imposto.
Uma vez que a exigibilidade do imposto, corretamente liquidado pelo adquirente, ocorreu no momento da realização dos serviços, então, caso sejam emitidas, em 2024, novas faturas para substituição das iniciais, as mesmas não deverão ser relevadas na contabilidade do adquirente, sendo os novos documentos apensos aos iniciais que titularam as operações.