Uma sociedade unipessoal por quotas, com CAE 68100, Imobiliária (sem alvará) com isenção Artigo 9º, está a terminar de reabilitar a moradia com quartos para arrendar a estudantes, com o uso comum de cozinha, sala e casa de banho. As rendas por si só seriam isentas de IVA, correto? No entanto, as Rendas vão incluir custos com eletricidade, água, net, limpeza, logo já terá que ser liquidado o IVA, correto? O IVA é aplicado ao valor total, visto que não serão discriminados os valores de cada rubrica? E qual a taxa de IVA? Poderá a empresa "abdicar” da isenção do Iva em toda a sua atividade? Passando assim ao regime normal, podendo passar a deduzir o IVA nomeadamente das obras da conclusão da vivenda, dos mobiliários a adquirir? Ou é o mesmo IVA de outros custos que até aqui não deduzia, por ser isenta?
Parecer técnico
Em resposta às questões apresentadas e de acordo com a informação de que dispomos presentemente, somos do seguinte entendimento:
Contrato de arrendamento a estudantes – IVA
1. A AT divulgou as informações vinculativas, nomeadamente as n.ºs 12101, 12475, 13540, 13830 e 13935 sobre o mesmo assunto, sendo que a última é a n.º 14882, sancionada por despacho de 14/08/2019.
2. Em todas elas, a AT refere o seguinte:
"O artigo 9.º alínea 29) do CIVA estabelece que a locação de bens imóveis é isenta de IVA. Contudo, a subalínea a) da alínea 29) deste artigo determina que a isenção não abrange, entre outras, as prestações de serviço de alojamento, efetuadas no âmbito da atividade hoteleira ou de outras com funções análogas.
O Decreto-lei n.º 39/2008, de 7 de março, alterado e republicado pelo Decreto-lei n.º 15/2014, de 23 de janeiro, que reúne num único diploma o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, estabelece, no artigo 11.º, que "são estabelecimentos hoteleiros os empreendimentos turísticos destinados a proporcionar alojamento temporário e outros serviços acessórios ou de apoio, com ou sem fornecimento de refeições, e vocacionados a uma locação diária", classificando os hotéis, hotéis-apartamentos (aparthotéis) e pousadas como estabelecimentos hoteleiros, nas condições da citada norma.
O Decreto-lei n.º 128/2014, de 29 de agosto, alterado pelo Decreto-lei n.º 63/2015, de 23 de abril, que aprova o regime jurídico da exploração dos estabelecimentos de alojamento local, estabelece, no seu artigo 2.º, que se consideram estabelecimentos de alojamento local aqueles em que são prestados serviços de alojamento temporário a turistas, mediante remuneração, e que reúnam os requisitos previstos nesse diploma.
O artigo 4.º, n.º 1, do diploma em referência determina que para todos os efeitos, a exploração de estabelecimento de alojamento local corresponde ao exercício, por pessoa singular ou coletiva, da atividade de prestação de serviços de alojamento.
As prestações de serviço que a requerente descreve como pretendendo realizar consubstanciam-se em serviços de alojamento e, de acordo com as características que descreve, esse alojamento é efetuado no âmbito de uma atividade com funções análogas à atividade hoteleira, pelo que tais prestações de serviços estão excluídas do âmbito de isenção do artigo 9.º alínea 29) do Código do IVA.
Uma vez que as prestações de serviço em causa estão, nos termos conjugados dos artigos 4.º n.º 1 e 1.º n.º 1 alínea a) do Código do IVA, sujeitos a IVA e dele não isentas, torna-se necessário apurar qual a taxa de imposto a aplicável.
A verba 2.17 da Lista I anexa ao CIVA, determina que são tributadas à taxa reduzida as prestações de serviços efetuadas no âmbito do alojamento em estabelecimentos do tipo hoteleiro. A taxa reduzida aplica-se exclusivamente ao preço do alojamento, incluindo o pequeno-almoço, se não for objeto de fatura ção separada, sendo equivalente a metade do preço da pensão completa e a três quartos da meia-pensão.
Conforme acima referido, o Decreto-lei n. º 39/2008, de 7 de março, alterado e republicado pelo Decreto-lei n.º 15/2014, de 23 de janeiro, considera que "são estabelecimentos hoteleiros os empreendimentos turísticos destinados a proporcionar alojamento temporário e outros serviços acessórios ou de apoio, com ou sem fornecimento de refeições, e vocacionados a uma locação diária".
A expressão "estabelecimento de tipo hoteleiro" utilizada na redação da verba 2.17 da Lista I anexa ao CIVA é mais abrangente que a expressão "estabelecimentos hoteleiros", uma vez que o conceito de "estabelecimento do tipo hoteleiro" inclui, não só os estabelecimentos hoteleiros a que se refere o artigo 11. º do Decreto-lei n.º 39/2008, de 7 de março, mas alojamento, o alojamento propriamente dito, assim como prestações de serviços acessórias a esse alojamento, nomeadamente limpezas e prestações de serviços de apoio.
Deste modo, se a requerente vier a prestar os serviços de alojamento nos termos enunciados, nas contraprestações que receba relativamente ao alojamento de estudantes, bem como ao alojamento de turistas no âmbito da sua atividade de alojamento local, deve, por enquadramento na verba 2.17, da Lista I anexa ao Código do IVA, liquidar IVA à taxa reduzida prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º, do mesmo Código.
Recordamos, ainda, que as restantes prestações de serviços não incluídas nos serviços de alojamento, nomeadamente, os serviços de lavandaria e a disponibilização de aspiradores, são, em qualquer caso, tributadas à taxa normal, de 23%, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 18.º do CIVA.”
3. Além disso, na informação vinculativa n.º 13935, a AT esclarece que:
"Embora as prestações de serviços que a requerente descreve possam corresponder a períodos superiores a 30 dias, as mesmas não podem deixar de se caracterizar como serviços de alojamento, atendendo ao conjunto de serviços complementares à dormida, prestados no âmbito de uma atividade com funções análogas à atividade hoteleira.
Os serviços em causa estão, assim, excluídos do âmbito da isenção prevista na alínea 29) do artigo 9.º do CIVA.”
4. A única informação vinculativa que refere a possibilidade de aplicação da isenção do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA é a n.º 14882, a última divulgada sobre a matéria, que refere o seguinte:
"11. Contudo, poderá beneficiar da isenção de IVA nos termos previstos na alínea 29) do artigo 9.º do CIVA, quando a operação de locação do imóvel/arrendamento de quartos se configurar na colocação passiva do imóvel à disposição do locatário (estudante), ou seja, sem outros serviços associados. Neste cenário, deve a Requerente, para efeitos de IVA, emitir faturas para titular as referidas prestações de serviços. Deve, ainda, mencionar na fatura o motivo justificativo da não liquidação do IVA”.
5. Permitimo-nos salientar, porém, que, de conformidade com o texto da informação vinculativa mencionada no ponto anterior, a cedência de quartos a estudantes apenas poderá beneficiar da isenção de IVA nos termos previstos na alínea 29) do artigo 9.º do CIVA, "quando a operação de locação do imóvel/arrendamento de quartos se configurar na colocação passiva do imóvel à disposição do locatário (estudante), ou seja sem outros serviços associados”.
6. Se analisarmos o teor da informação vinculativa n.º 15479, dela resulta que a isenção prevista no n.º 29 do artigo 9.º do CIVA se aplica à locação de imóveis "paredes nuas".
7. Porém, este conceito não se restringe ao facto de o espaço locado estar dotado ou não de móveis e equipamentos, estando antes relacionado com o facto de o imóvel locado não estar preparado para o exercício de uma atividade comercial, industrial ou de serviços, ou de a locação não ser acompanhada de outro tipo de prestações de serviços.
8. Ou seja, o que extravasa o conceito de "paredes nuas" ou locação passiva não é o facto de ser acompanhada de móveis e equipamentos, mas sim de ser destinada ao exercício de outras atividades tributáveis que vão para além da mera cedência do gozo do local arrendado, como é o caso do alojamento local ou alojamento turístico, ou incluir outras prestações de serviços, tais como serviços de limpeza e de manutenção de interiores ou exteriores, o fornecimento de água, luz, internet, comunicações, não estando estas operações abrangidas pela isenção.
9. Deste modo, a isenção em apreço apenas abrange a mera colocação do imóvel à disposição do cliente, em contrapartida de uma retribuição, não sendo acompanhada de qualquer prestação de serviços que extravase a locação.
10. Para efeitos desta isenção, esta operação deve consubstanciar-se, essencialmente, na colocação passiva do imóvel à disposição do cliente ligada ao mero decurso do tempo e que não gere valor acrescentado significativo.
11. Ao passo que as locações que se encontram excluídas da isenção de IVA correspondem a operações que vão para além da mera locação, denotando caraterísticas de outro tipo de contratos em que se destacam outras prestações de serviços que ultrapassam a mera cedência do gozo temporário do local arrendado.
12. No caso apreciado na informação vinculativa n.º 15479, não obstante o arrendamento ser acompanhado de móveis e equipamentos, conforme decorre das cláusulas do contrato de arrendamento, deste não constam quaisquer prestações de serviços para além da locação do espaço, estando expressamente estabelecido que a arrendatária suportará todas as despesas decorrentes da utilização do imóvel, designadamente, taxas, alugueres e consumos de água, gás, energia elétrica e comunicações, bem como os custos de manutenção da piscina e jardim.
13. E por isso, a AT considerou que, nesse caso, a locação em apreço não tem associada qualquer prestação de serviços para além da mera cedência do gozo do imóvel arrendado, pelo que beneficia da isenção prevista no n.º 29 do artigo 9.º do CIVA.
14. No caso colocado no pedido em apreciação no presente parecer, o "senhorio” suportará as despesas com eletricidade, água, net, bem como com a limpeza dos quartos e das partes comuns.
15. Segundo é referido no anterior ponto 9, a isenção do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA apenas abrange a mera colocação do imóvel à disposição do cliente, em contrapartida de uma retribuição, não sendo acompanhada de qualquer prestação de serviços que extravase a locação, considerando-se, conforme consta do ponto 8, que essa isenção não se verifica quando o proprietário (senhorio) suporta todas as despesas decorrentes da utilização do imóvel, designadamente, taxas, alugueres e consumos de água, gás, energia elétrica e comunicações.
16. Em face do exposto, parece que no caso colocado no pedido em apreciação, o proprietário (senhorio) deverá liquidar IVA sobre os valores recebidos dos estudantes, a título de serviços de alojamento, à taxa de 6%.
17. Pergunta a colega que coloca as questões se a empresa poderá "abdicar” da isenção do IVA em toda a sua atividade, passando assim ao regime normal.
18. Não se trata de abdicar ou não:
Se o espaço arrendado estiver de "paredes nuas”, o arrendamento é isento de IVA nos termos do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA;
Se o arrendamento incluir outras prestações de serviços, tais como serviços de limpeza e de manutenção de interiores ou exteriores, o fornecimento de água, luz, internet, comunicações, esse arrendamento não está abrangido pela isenção.
Direito à dedução do IVA suportado
19. Pergunta a colega se, ao passar a liquidar IVA no arrendamento de quartos a estudantes, poderá passar a deduzir o IVA suportado, nomeadamente das obras da conclusão da vivenda e do mobiliário a adquirir, ou mesmo o IVA de outros custos que até aqui não deduzia, em virtude de a atividade ser isenta.
20. Se a única atividade da sociedade imobiliária passar a ser o arrendamento de quartos a estudantes, nas condições indicadas, ou seja, se a sociedade imobiliária passar a liquidar IVA na totalidade das suas operações, a resposta à questão colocada é no sentido afirmativo.
21. No entanto, se além dessa atividade, a imobiliária realizar outras operações, isentas de IVA, então terá de aplicar a afetação real e deduzir exclusivamente o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços diretamente relacionados com a atividade de arrendamento de quartos a estudantes.
22. O IVA suportado nas aquisições de bens e serviços diretamente relacionados com a atividade isenta de IVA continuará a não poder ser deduzido.
23. Quanto ao IVA suportado nas aquisições de bens e serviços de utilização mista, ou seja, nas aquisições de bens e serviços nas aquisições de bens e serviços utilizados conjuntamente no exercício de uma atividade económica que confere direito a dedução, conjuntamente com operações fora do conceito de atividade económica, ele apenas pode ser deduzido na parte correspondente à atividade que confere direito à dedução.
Conclusão
24. Em face do exposto, sendo referido que, no caso colocado no pedido em apreciação neste parecer, o "senhorio” suportará as despesas com eletricidade, água, net, bem como com a limpeza dos quartos e das partes comuns, nestas condições, o arrendamento de quartos a estudantes está sujeito a IVA à taxa de 6%.
25. Se a única atividade da sociedade imobiliária passar a ser o arrendamento de quartos a estudantes, nas condições indicadas, ou seja, se a sociedade imobiliária passar a liquidar IVA na totalidade das suas operações, ela poderá deduzir o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços necessários ao desenvolvimento dessa atividade.
26. No entanto, se além dessa atividade a imobiliária realizar outras operações, isentas de IVA, então terá de aplicar a afetação real e deduzir exclusivamente o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços diretamente relacionados com a atividade de arrendamento de quartos a estudantes.