Pareceres
IVA - transmissões intracomunitárias
7 Março 2024
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

IVA - transmissões Intracomunitárias
PT27895 - janeiro de 2024

 

Uma empresa, mediante um contrato de venda celebrado a 31 de dezembro de 2022, vendeu imobilizado no montante de 666 906,92 euros (que correspondia ao seu valor líquido contabilístico registado na contabilidade) a uma empresa espanhola detida pelos mesmos sócios da empresa portuguesa.
Com base nesse contrato foram efetuados os movimentos contabilísticos de alienação dos bens. O contrato referia que os bens seriam enviados e faturados até 30 de junho de 2023.
A empresa tem prova do envio em março de 2023 de parte dos bens (CMR e fatura do transporte) e dos restantes bens em dezembro de 2023.
A fatura só foi emitida em dezembro de 2023 pelo valor total da venda e com isenção de IVA, ao abrigo do artigo 14.º do RITI.
Quando é que deve proceder-se ao envio da declaração recapitulativa de IVA?
O desfasamento entre a celebração do contrato de venda, a transmissão dos bens e a sua faturação poderá colocar em causa a isenção do IVA?

 

Parecer técnico

 

A questão colocada relaciona-se com o facto gerador nas transmissões intracomunitárias e com a obrigação da entrega da declaração recapitulativa.
Apesar de nada nos ter sido referido quanto ao recebimento sobre os valores das faturas iremos apenas clarificar o enquadramento em sede de IVA e de seguida as transmissões intracomunitárias.
Determina a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IVA que, os sujeitos passivos devem «emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.»
Refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 8.º do CIVA que o imposto se torna exigível a partir do momento em que se verifica o pagamento de uma transmissão de bens ou prestação de serviços (ainda que parcial), devendo ser emitida uma fatura nos termos do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, constando na mesma uma menção que refira que se trata de um adiantamento.
Dá-se, deste modo, uma antecipação da exigibilidade face ao facto gerador, o qual, nestes casos, conforme resulta do disposto na alínea a) do mesmo número 1 do artigo 7.º do CIVA, só ocorre depois, quando os bens são colocados à disposição do adquirente.
Logo, havendo exigibilidade de imposto, há também a obrigatoriedade de o entregar ao Estado, nos termos do artigo 27.º do CIVA, quando ocorre o respetivo pagamento.
No que se refere às transmissões intracomunitárias, assumindo que os materiais se encontram localizados em Portugal, indica o n.º 1 do artigo 6.º do CIVA que «são tributáveis as transmissões de bens que estejam situados no território nacional no momento em que se inicia o transporte ou expedição para o adquirente ou, no caso de não haver expedição ou transporte, no momento em que são postos à disposição do adquirente.»
Apesar da localização se verificar em território nacional, encontra-se previsto uma isenção para a mesma na alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do RITI, isenta as transmissões intracomunitárias de bens «expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado-membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou coletiva registada, para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado, em outro Estado-membro, que tenha utilizado e comunicado ao vendedor o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.» Esta isenção requerer uma análise com mais detalhe que faremos mais adiante.
No que se refere às obrigações subjacentes, o RITI no seu artigo 27.º refere que:
«2 - As faturas relativas às transmissões de bens isentas nos termos do artigo 14.º devem ser emitidas o mais tardar até ao 15.º dia do mês seguinte àquele em que os bens foram colocados à disposição do adquirente.
3 - As faturas a que se refere o número anterior devem ser emitidas pelo valor total das transmissões de bens, ainda que tenham sido efetuados pagamentos ao sujeito passivo anteriormente à data da transmissão dos bens.
4 - A obrigação de emitir fatura, a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IVA, não é aplicável aos pagamentos efetuados ao sujeito passivo anteriormente à data das transmissões de bens isentas nos termos do artigo 14.º.»
Já a exigibilidade do imposto, termos do artigo 13.º do RITI, só se verifica:
«1 - (...)
a) No 15.º dia do mês seguinte àquele em que o imposto é devido;
b) Na data da emissão da fatura, se tiver sido emitida antes do prazo previsto na alínea a).
2 - O disposto na alínea b) do número anterior não é aplicável quando a fatura respeitar a pagamentos parciais que precedam o momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente.»
Neste sentido, não se verifica a obrigatoriedade de emissão de fatura aquando dos adiantamentos de clientes intracomunitários caso tenham existindo, contudo verificasse a exigibilidade e consequentemente da emissão da emissão da fatura quando foram colocados à disposição os bens.
As faturas relativas às transmissões de bens isentas nos termos do artigo 14.º devem ser emitidas o mais tardar até ao 15.º dia do mês seguinte àquele em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, pelo que neste caso parece estar em falta o cumprimento dessa obrigação em março, aquando da colocação parcial dos bens, conforme referido na questão. Os restantes bens colocados à disposição em dezembro originariam uma outra fatura parcial pelos bens colocados à disposição nessa data.
No que se refere à isenção, verifica-se que estão isentas do imposto ao abrigo da alínea a) do artigo 14.º do RITI, as transmissões intracomunitárias de bens, efetuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado-membro com destino ao adquirente, quando relativamente a este se verifique cumulativamente que:
- Seja uma pessoa singular ou coletiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro;
- Tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição;
- Aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.
Para que possa aplicar a isenção referida, deve solicitar sempre aos seus clientes com sede noutros Estados-membros que lhes indiquem o número de identificação fiscal que aí usam e comprovar, mediante consulta do sistema VIES (Sistema de Informações de Trocas Intracomunitárias), que está disponível no sítio de Internet da União Europeia: (http://ec.europa.eu/taxation_customs/vies/vieshome.do), sendo que este registo de cadastro será fornecido pelas administrações fiscais de cada Estado-membro.
Assim, quando se efetuar a consulta ao cadastro do adquirente no sistema VIES, e este indicar que se trata de um número de contribuinte válido, significa que este adquirente estará enquadrado como um sujeito passivo de IVA e que estará abrangido no regime de tributação das transações intracomunitárias, podendo-se dessa forma isentar a transmissão intracomunitária de bens.
Caso venha a verificar, porém, que os números de identificação fiscal não constam do VIES, tal significa que os seus clientes não se encontram abrangidos nos respetivos Estados-membros por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, situação que determinará a obrigação de lhes liquidar IVA à taxa legal na fatura que emitir.
Ainda há outra condição a cumprir, deverá ter a prova de que os bens saíram de território nacional com destino ao Estado-membro do adquirente.
Para tal, começamos por referir que os meios de prova para a aplicação da isenção de IVA das transmissões intracomunitárias de bens estão previstos no Regulamento de execução da Diretiva IVA [Regulamento de Execução (UE) 2018/1912 do Conselho, de 4 de dezembro de 2018 (aditou ao Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho, de 15 de março, o artigo 45.º-A)].
Atendendo às alterações no âmbito da quick fixes, a OCC divulgou um resumo que contém as alterações a esta matéria que entram em vigor em 1 de janeiro de 2020 e que poderá ser consultado nesta ligação.
Sobre esta matéria foi publicado o Ofício-Circulado n.º 30 218/2020, de 3 de fevereiro.
Assim, para que se possa aplicar a isenção da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do RITI é necessário a verificação de três requisitos, cumulativamente:
- Em primeiro lugar, é obrigatório que o adquirente forneça ao fornecedor português o respetivo NIF atribuído pelo Estado-membro de destino dos bens, e que esse NIF seja válido no VIES.
- Em segundo lugar, a isenção passa também a estar dependente do fornecedor submeter a declaração recapitulativa, incluindo nessa declaração as respetivas transmissões intracomunitárias de bens a que seja aplicada essa isenção. Até final de 2019, apesar de ser obrigatória a submissão da declaração recapitulativa, do seu incumprimento não fazia depender a possibilidade de aplicação da isenção de IVA.
- Em terceiro lugar, para aplicar a isenção é necessário que o fornecedor dos bens tenha na sua posse documentos de prova. Relativamente aos meios de prova, Regulamento de Execução (UE) 2018/1912 do Conselho, de 4 de dezembro de 2018 aditou ao Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho, de 15 de março, o artigo 45.º-A).
Na que se refere à declaração recapitulativa, pode ser aferido nas próprias instruções de preenchimento que deve ser enviada pelo sujeito passivo sempre que este efetue transmissões intracomunitárias de bens e operações assimiladas nos termos do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI).
A declaração recapitulativa deve ser enviada por transmissão eletrónica de dados, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do RITI e da alínea i) do n.º 1 artigo 29.º do CIVA, nos seguintes prazos:
• Até ao dia 20 do mês seguinte àquele a que respeitam as operações, no caso de sujeitos passivos com periodicidade de envio mensal da declaração periódica;
• Até ao dia 20 do mês seguinte àquele a que respeitam as operações, no caso de sujeitos passivos com periodicidade de envio trimestral da declaração periódica, cujo montante total das transmissões intracomunitárias de bens a incluir na declaração recapitulativa exceda 50 mil euros, no trimestre civil em curso ou em qualquer um dos quatro trimestres civis anteriores;
• Até ao dia 20 do mês seguinte ao final do trimestre civil a que respeitam as operações, no caso de sujeitos passivos com periodicidade de envio trimestral da declaração periódica, cujo montante total das transmissões intracomunitárias de bens a incluir na declaração recapitulativa não exceda 50 mil euros, no trimestre civil em curso ou em qualquer um dos quatro trimestres civis anteriores.
Assim, no caso em concreto a entidade portuguesa que está a efetuar uma transmissão intracomunitária, na medida em que, os bens são expedidos de Portugal com destino a outro Estado-membro, pelo que, deverá declarar a operação na declaração recapitulativa (operação tipo 1) e declarar no campo 7 do quadro 06 de declaração periódica de IVA, na data em que o facto gerador se verificou. Tendo a operação sido efetuada parcialmente, somos da opinião que a primeira parte da operação (envio dos bens parciais) deveriam ter sido faturados, bem como incluídos na declaração recapitulativa e declaração periódica desse mesmo período. Não tendo sido efetuado, está colocada em causa a aplicação da isenção do artigo 14.º do RITI.
Tratando-se da alienação de um bem do ativo fixo tangível do sujeito passivo, a base tributável deve ser colocada no campo 104 do quadro 6-A, de modo a expurgar esta venda do volume de negócios do sujeito passivo por se tratar de uma operação prevista na alínea c) artigo 42.º do CIVA.
A fatura a emitir pela venda do ativo em causa deverá ser emitida pelo valor da contraprestação recebida ou a receber de acordo com o acordado comercialmente, valor este, que não terá de ser necessariamente pelo valor escriturado contabilisticamente.
Apesar de não ser alvo de questão salienta-se que quando se trata de operações entre sujeitos passivos com relações especiais, devem ser praticados os valores de marcado e não os valores contabilísticos, pese embora possam ser coincidentes, nos termos do artigo 63.º do CIRC e n.º 10 do artigo 16.º do CIVA.