Opinião
Ordem nos media
Os relatos de Gestão
28 Maio 2004
Opinião de J. F. Cunha Guimarães, presidente do Conselho Fiscal da CTOC
O art.º 65.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) determina que os membros da administração, i.e, o órgão de gestão (administração, direcção ou gerência, conforme a estrutura societária da empresa), devem elaborar e submeter aos órgãos competentes da sociedade (assembleia geral de sócios/accionistas) o relatório de gestão, as contas do exercício e os demais documentos de prestação de contas previstos na lei, relativos a cada exercício anual, i.e., o ano civil ou outro período, de acordo com os estatutos da sociedade. O art.º 66.º do CSC estabelece os elementos básicos e essenciais que o relatório de gestão deve conter, referindo que deverá ser efectuada uma exposição fiel e clara sobre a evolução dos negócios e a situação da sociedade. O n.º 2 desse articulado determina que o relatório de gestão deve indicar a evolução da gestão nos diferentes sectores de que a sociedade exerceu actividade, designadamente no que respeita a condições de mercado, investimentos, custos, proveitos e actividades de investigação e desenvolvimento, os factos relevantes ocorridos após o termo do exercício, a evolução previsível da sociedade, e, além de outra informação, uma proposta de aplicação de resultados devidamente fundamentada. De notar que este último articulado já foi recentemente alterado pelo Decreto-Lei n.º 88/2004, de 20 de Abril, no sentido de o órgão de gestão descrever os objectivos e as políticas da sociedade em matéria de gestão dos riscos financeiros, bem como a exposição por parte da sociedade aos riscos de preço de crédito, de liquidez e de fluxos de caixa, quando materialmente relevantes para a avaliação dos elementos do activo e do passivo, da posição financeira e dos resultados, em relação com a utilização dos instrumentos financeiros. Destas disposições resulta, inequivocamente, que o órgão de gestão é o responsável pela elaboração dos documentos de prestação de contas que incluem o relatório de gestão e as demonstrações financeiras. O normativo contabilístico nacional, designadamente o Plano Oficial de Contabilidade (POC) também prevê (item 3.1) que o órgão de gestão é o primordial responsável pela preparação da informação financeira, designadamente as demonstrações financeiras que englobam o balanço, as demonstrações dos resultados (por naturezas e por funções), a demonstração dos fluxos de caixa, bem como os respectivos anexos (anexo ao balanço e à demonstração dos resultados e anexo à demonstração dos fluxos de caixa). A Norma Internacional de Contabilidade n.º 1 (NIC n.º 1) prevê também que o conselho de directores e/ou outro órgão de gestão de uma empresa é o responsável pela preparação e apresentação das suas demonstrações financeiras. Ou seja, o POC está em sintonia total com a NIC n.º 1. Assim, os relatos da gestão da maioria das PME¿s circunscrevem-se a esses documentos. Porém, para as empresas com valores mobiliários cotados nas bolsas de valores (cerca de uma centena), o órgão de gestão terá de cumprir as regras de divulgação da informação estabelecidas pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) através do Regulamento da CMVM n.º 7/2001, alterado em Novembro de 2003 pelo Regulamento da CMVM n.º 11/2003, sobre o «Governo das Sociedades» (tradução da expressão anglo-saxónica «Corporate Governance»). De acordo com o art.º 1.º do Regulamento, as sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado e sujeitas a lei pessoal portuguesa devem publicar, em capítulo autónomo do relatório anual de gestão elaborado especificamente para o efeito ou em anexo a um relatório detalhado sobre a estrutura e as práticas de governo societário em obediência ao art.º 7.º do Código dos Valores Mobiliários e de acordo com o modelo constante do anexo ao Regulamento. Desta forma, os relatos da gestão para as empresas com valores mobiliários cotados em bolsa são, obviamente, mais exigentes, pela necessidade de os stakeholders (utilizadores internos e externos das demonstrações financeiras), especialmente os accionistas, pretenderem, cada vez mais, informação extra-contabilística (ou informação não financeira) relevante para suportar a tomada de decisões. Ainda a nível da divulgação da informação pelo órgão de gestão, sublinhamos a necessidade de relatar as matérias ambientais, cujo suporte legal consta da Recomendação 2001/453/CE da Comissão da União Europeia, de 30 de Maio, e da Directriz Contabilística n.º 29 (DC 29), alertando-se para a importância de os utilizadores poderem verificar em que medida a protecção ambiental faz parte da estratégia da actividade da empresa. Finalmente, acrescem, também, as necessidades da divulgação da política de sustentabilidade da empresa que tem a ver com o desenvolvimento futuro da empresa, promovendo-se o equilíbrio entre as gerações presentes e as futuras. Nesta, acolhe-se o conceito de «Corporate Social Responsability» (CSR), traduzido por «Responsabilidade Social da Empresa», o qual significa contribuir para o desenvolvimento sustentável, trabalhando de forma a melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, das famílias e da comunidade local, interagindo com vários stakeholders¿ (Björn Stigson, Revista «Impactus ¿ Empresa Susceptível», n.º 0, de Abril 2004). As matérias ambientais e o desenvolvimento sustentável são dois temas intimamente ligados cuja importância tem aumentado e suscitado debate público, falando-se de uma «educação para o desenvolvimento sustentável». Enfim, o órgão de gestão deve pautar a sua actuação no pressuposto de que o relato da informação financeira e não financeira deverá ser transparente e direccionada para facilitar as decisões dos diversos stakeholders/utilizadores.